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4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 CARACTERÍSTICAS DOS FILMES BIOPOLIMÉRICOS

Esta etapa visou a caracterização e seleção dos filmes com as propriedades mais

adequadas para a aplicação pretendida. Filmes contendo vários dos tensoativos testados

apresentaram-se quebradiços ou não conseguiram formar uma matriz coesa. Dentre todos, o

óleo de canola saponificado, OCaS, foi o tensoativo que apresentou os resultados mais

satisfatórios, formando filmes coesos, homogêneos e de matriz contínua, sendo por isso

escolhido e usado nas outras etapas desse estudo. De modo semelhante ocorreu a determinação

da concentração de tensoativo e cera de carnaúba. Das diferentes relações testadas o valor de

5% de OCaS em relação à massa de cera de carnaúba foi considerada como de melhor resultado,

pois, era capaz de incorporar toda a cera na mistura, deixando um mínimo de particulado ou

sobrenadante lipídico.

Estes testes preliminares revelaram ainda que, para as condições utilizadas, a

concentração máxima de cera de carnaúba que se podia incorporar às soluções filmogênicas era

de 2 gramas por litro. Em outros estudos uma quantidade maior de cera pôde ser incorporada

com auxílio de um homogenizador rotor estator que alcança velocidades elevadas, mas o

presente estudo utilizou apenas a temperatura e baixas agitações. Apesar da limitação dos

equipamentos, o valor alcançado é considerado satisfatório e capaz de originar filmes com boas

propriedades térmicas, mecânicas, físicas e de barreira (CHIUMARELLI; HUBINGER, 2014).

As propriedades de barreira dos revestimentos afetam a respiração, perda de massa e,

consequentemente, o metabolismo do fruto (HUANG et al., 2014; SORADECH et al., 2017;

DENG et al., 2017), sendo a TPVA apontada como a característica de filmes e revestimentos

com maior capacidade de influenciar a vida de prateleira dos frutos, servindo como indicativo

das propriedades de barreira de filmes e revestimentos (ZHANG; XIAO; QIAN, 2014;

VELICKOVA et al., 2013; SUN; SUN, C.; XIONG, 2013).

Desse modo a primeira característica avaliada foi a TPVA dos filmes, conforme mostrado

no Figura 4.

Figura 4: Dados de TPVA para os Filmes sem cera (a) e com cera(b).

Fonte: Autoria própria. Letras distintas indicam diferença estatística (p< 0,05) nos tratamentos, a

comparação é realizada pelo teste de Tukey 5%.

A figura 4 mostra os valores da TPVA para os filmes analisados. Figura 4 (a), os filmes

sem cera (da direita para a esquerda: filmes 1, 2, 3, 4 e 5) e Figura 4 (b), filmes sem cera (da

direita para a esquerda: filmes 1c, 2c, 3c, 4c e 5c).

Os filmes contendo cera, Figura 4 (b), apresentaram TPVA inferior em relação a seus

correspondentes sem cera, Figura 4 (a). Como esperado e de acordo com a literatura, a

incorporação da cera de carnaúba resultou em melhora das propriedades de barreira dos filmes

(MATTOS et al., 2017; SINGH et al., 2016; GALUS; KADZIŃSKA, 2015; RODRIGUES et

al., 2014; ZHANG; XIAO; QIAN, 2014; MEHYAR et al., 2012; CHIUMARELLI;

HUBINGER, 2012).

Além disso, foi possível verificar, para a metodologia adotada no presente trabalho, a

influência da concentração da fécula e da quitosana, na TPVA, de modo que o aumento da

concentração de quitosana, a partir de certo intervalo, elevou os valores da TPVA dos filmes.

O aumento da TPVA está associado à maior afinidade e capacidade de ligação entre as

moléculas de água e da quitosana, favorecendo a transferência desta através da matriz do filme

(TALÓN et al., 2017; REN et al., 2017; BOF et al., 2015; KOWALCZYK et al., 2015;

BONILLA et al., 2013).

As Formulações 1c e 2c, barras mais à direita da Figura 4 (b), cujas concentrações de cada

material podem ser encontradas na Tabela 1, resultaram em filmes com melhores valores de

TPVA.

Os valores das outras características investigadas dos filmes podem ser encontrados na

Tabela 2.

Tabela 2: Dados das propriedades de barreira, mecânicas, cor e opacidade para os filmes 1c e 2c.

Letras diferentes nas colunas indicam diferença estatística (p<0,05).

Filme

Propriedades

Espessura

(mm)

Solubilidade

(%)

Resistência à

Tração (Mpa)

Alongamento

à ruptura (%)

Módulo de

Young (Mpa) Opacidade L a* b*

1c 0,092±0,0053

a

33,25±0,72

a

0,004±0,00016

b

10,31±5,44

a

0,0016±0,0007

a

45,78±0,17

b

85,47±0,42

a

-3,10±0,36

a

8,07±0,15

b

2c 0,098±0,0074

a

28,53±0,37

b

0,010±0,0005

a

14,67±4,22

a

0,0015±0,0004

a

47,08±0,10

a

80,93±0,06

b

-3,13±0,23

a

21,17±0,15

a

A espessura dos filmes não apresentou diferença estatística para os filmes analisados,

conforme Tabela 2. Como no planejamento experimental foi mantida fixa a massa seca total

dos filmes 1c e 2c, o somatório das massas de fécula, quitosana, cera de carnaúba e tensoativo

não variou. A substituição parcial da fécula por quitosana não foi capaz de impactar

significativamente na espessura dos filmes obtidos. A massa seca total é apontada como sendo

um dos principais fatores a influenciar a espessura dos filmes e, em filmes compostos por

blendas, alterações nas proporções (mantendo a massa seca total fixa) geralmente não resultam

em diferença significativa na espessura dos filmes (MENDES et al., 2017; WANG et al., 2017;

MOSTAFAVI et al., 2016).

Quanto à solubilidade em água, conforme Tabela 2, o Filme 2c apresentou valor inferior

ao do Filme 1c, 28,53±0,37

b

e 33,25±0,72

a

, respectivamente, mais adequado para a aplicação

pretendida, uma vez que os frutos liberam vapor de água. Apesar de ser hidrofílica, a quitosana

é solúvel apenas em meio ácido e mesmo aparecendo em menor proporção no filme, influenciou

significativamente nesse aspecto, outros estudos encontraram resultados semelhantes em

relação à interação desses dois biopolímeros. Quando a concentração de quitosana era

aumentada em filmes de amido/fécula foi observado redução na solubilidade em água,

fenômeno atribuído às interações de hidrogênio que ocorrem entre as moléculas de quitosana e

fécula, de modo a aumentar a coesão da matriz, o que lhe confere maior estabilidade (DANG;

YOKSAN, 2016; SANTACRUZ; RIVADENEIRA; CASTRO, 2015; VÁSCONEZ et al,

2009).

Quanto às propriedades mecânicas, as composições dos filmes 1c e 2c resultaram em

valores diferentes para a resistência à tração 0,004±0,00016

b

e 0,010±0,0005

a

, mas valores

semelhantes para o alongamento na ruptura e módulo de Young, de acordo com a Tabela 2

(significância de 5%). As ligações de hidrogênio formadas entre os grupos NH

3+

da quitosana

protonada e os grupos OH

-

do amido/fécula conferem mais estabilidade à matriz polimérica,

em relação à matriz composta apenas pela fécula (REN et al., 2017; TALÓN et al., 2017;

SANTACRUZ; RIVADENEIRA; CASTRO, 2015). Quanto aos valores de alongamento na

ruptura e módulo de Young, nos quais não foi observada diferença estatística, é provável que a

influência de outros fatores, como quantidade de plastificante, massa seca total de polímeros e

condições de obtenção, tenham preponderado, não permitindo a identificação do efeito da

substituição de parte da fécula por quitosana nessas propriedades.

Conforme a Tabela 2, o Filme 1c possui menor opacidade que o Filme 2c,

respectivamente: 45,78±0,17

b

e 47,08±0,10

a

. A fécula apresenta-se como pó branco, assim

formar um filme de mesma característica. Por sua vez a quitosana é amarelada, assim como as

soluções e filmes que forma. A substituição parcial da fécula pela quitosana no Filme 2c explica

a diferença de opacidade entre eles. Outros estudos mostraram o mesmo comportamento da

diminuição da luminosidade quando da substituição de parte da fécula por quitosana na

composição de filmes biopoliméricos. Quanto ao parâmetro 'a', não foi observada diferença

significativa entre os filmes, ou seja, valores baixos (devido ao módulo do valor), nos quais não

foi observada diferença estatística em relação à presença de verde ou vermelho nos filme. Já o

parâmetro 'b' mostrou diferença para os dois filmes, sendo bem maior no filme de quitosana,

indicando amarelamento do filme que continha quitosana, 21,17±0,15

a

enquanto o filme com

3% de fécula o valor do parâmetro ‘b’ de cromaticidade foi 8,07±0,15

b

(REN et al., 2017; BOF

et al., 2015).

É válido frisar que devido à seleção dos filmes com melhor TPVA, nessa etapa do estudo

a única variação nas propriedades dos filmes (1C e 2C) se deu devido à substituição parcial da

fécula de mandioca pela quitosana, havendo na literatura trabalhos que mostram

comportamentos semelhantes, mas também trabalhos com resultados diferentes. Isso ocorre

pelo fato de que, embora a concentração dos biopolímeros influencie nas propriedades do filme

(fator investigado nesse estudo), outros fatores também apresentam essa capacidade, como a

massa seca total de polímeros e outros constituintes, grau de desacetilação e peso molecular da

quitosana, teor de amilose e amilopectina da fécula e ainda parâmetros associados à elaboração

das soluções filmogênicas (temperatura e velocidade de agitação, quantidade e tipo de

plastificante) e à obtenção dos filmes (método de obtenção, tempo e temperatura de secagem),

sendo pertinente sua consideração na comparação de resultados de diferentes estudos

(BERGEL; LUZ; SANTANA, 2017; REN et al., 2017; DANG; YOKSAN, 2016 ;

SANTACRUZ; RIVADENEIRA; CASTRO, 2015; CHIUMARELLI; HUBINGER, 2014;

MEI et al., 2013a; MEI et al., 2013b; CHIUMARELLI; HUBINGER, 2012).

Foi ainda avaliada a morfologia da superfície dos filmes por meio de Microscopia

Eletrônica de Varredura (MEV), conforme mostrado na Figura 5.

Figura 5: Microscopia Eletrônica de Varredura dos Filmes 1c (A) e 2c (B), x10K.

Fonte: Autoria própria.

Ambos apresentaram homogeneidade em sua matriz, o que configura gelatinização

adequada da fécula; É possível observar uma quantidade maior de grânulos de cera no filme 1c,

o que é atribuído à dificuldade de solubilizar esse composto com o equipamento utilizado.

Apesar da semelhança, é possível observar que o Filme 1c, Figura 5 (A), composto

apenas por fécula, apresenta uma matriz mais contínua, enquanto o Filme 2c, Figura 5 (B),

apresenta formação de grânulos, aparentanto ser ligeiramente mais áspero, resultado similar ao

observado por Dang & Yoksan (2016), que afirmam ainda que o fenômeno torna-se mais

evidente quando as concentrações de quitosana são mais elevadas.

Para verificar o efeito da incorporação da quitosana sob a topografia superficial dos filmes

foi realizada Microscopia de força atômica. Na Figura 6 é possível observar a topografia dos

filmes.

Figura 6: Microscopia de Força Atômica dos Filmes 1c (A) e 2c (B).

Fonte: Autoria própria.

Fonte: Autoria própria.

A microscopia de força atômica revelou significativa diferença na topografia dos filmes

analisados. O Filme 1c, Figura 6 (A), apresentou rugosidade média (Anexo E) de 29,966 nm e

rugosidade média quadrática (Anexo E) de 38,886 nm; enquanto o Filme 2c, Figura 6 (B),

apresentou para os mesmos parâmetros os respectivos valores de 33,351 nm e 42,881 nm;

aumento de rugosidade ocasionado pela substituição parcial da fécula por quitosana. Apesar

disso, o filme ainda mantém sua integridade e continuidade devido a compatibilidade entre os

polímeros e o plastificante, segundo Ren e colaboradores (2017), quando trabalharam com os

mesmos compostos. Pelos resultados similares, conclui-se haver ainda compatibilidade da cera

de carnaúba com os biopolímeros e com o plastificante.

O comportamento térmico dos filmes foi analisado por termogravimetria, com o objetivo

de determinar a sua estabilidade térmica, além do efeito da substituição parcial da fécula de

mandioca pela quitosana. A Figura 7 mostra os comportamentos dos filmes estudados.

Figura 7: Curvas de TG e DTG dos filmes 1c (A) e 2c (B).

Fonte: Autoria própria.

0 100 200 300 400 500 600 700 800 900 0 20 40 60 80 100 Filme 1C

T

G (%)

-12 -10 -8 -6 -4 -2 0

DTG

0 100 200 300 400 500 600 700 800 900 20 40 60 80 100 Filme 2C

TG

(%)

-7 -6 -5 -4 -3 -2 -1 0

D

TG

A

B

É possível observar na Figura 7 (a) o comportamento normal para filmes baseados em

fécula e glicerol, iniciando pela evaporação da água livre, seguido pela evaporação da água, o

que ocorre até os 250°C, e por último, degradação da fécula e formação de resíduos, a partir

dos 250°C. Já o Filme 2c, Figura 7 (b), apresenta comportamento similar, atribuído também à

desidratação da amostra, todavia, divergem nas faixas de temperatura entre 160-500°C pelo

fato do Filme 2c apresentar valores mais baixos de degradação em relação ao Filme 1C, o que

é atribuído à presença da quitosana.

A observação desse fenômeno torna-se mais clara ao analisar os picos da DTG, a derivada

da TG, ou ainda, a taxa de variação da massa de filme em função da temperatura. Ambos

apresentam um grande pico na faixa dos 300°C, característico dos filmes baseados em

amido/fécula, mas apenas o Filme 2c (linha azul da Figura 7 'b') apresenta um pico entre

450-500°C, característico de filmes que contêm quitosana (MENDES et al., 2016; PELISSARI et

al., 2009; CYRAS et al., 2008). Além de confirmar a presença da quitosana, essa análise mostra

que a adição desse biopolímero aumentou a estabilidade térmica dos filmes de fécula de

mandioca e glicerol, já que o Filme 2c apresentou menor degradação para as mesmas faixas de

temperatura.

Vale salientar que filmes e coberturas não são sinônimos. Filmes são moldados como

folhas sólidas, enquanto coberturas são formados diretamente sobre os alimentos (FALGUERA

et al., 2011). Nesse trabalho será adotada a nomenclatura Revestimento 1 ou Tratamento 1, para

o revestimento formado a partir da Formulação 1c, e Revestimento 2 ou Tratamento 2, para o

revestimento formado a partir da Formulação 2c.