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Caraterísticas dos Movimentos do Braço

2.3 Manipulação Bimanual nos Humanos

2.3.1 Caraterísticas do Braço Humano

2.3.2.1 Caraterísticas dos Movimentos do Braço

Baseado em observações do comportamento humano, Fitts (1954) apesar de ter apenas estudado quatro experiências em humanos, afirmou que em qualquer movimento humano existem regularidades na sua execução. Mais tarde, Rosenbaum et al. (1995), Flash and Hogan (1985), Morasso (1981) estudaram o comportamento do braço humano na simples tarefa de alcançar um objeto, estas observações levaram a concluir que a trajetória da mão apresenta um perfil de velocidade em forma de sino (traduzido da expressão original em Inglês bell-shaped), ver figura 2.14. De acordo com Flash and Hogan (1985) foi , ainda, sugerido que o SNC planeia os movimentos do braço tendo em conta um mínimo deslocamento das articulações (minimum angle jerk), desde o início até ao fim do movimento.

Figura 2.14: Perfil bell-shaped da velocidade tangencial da mão (imagem retirada de (Flash

and Hogan, 1985)).

Contudo, Rosenbaum et al. (2001) fizeram estudos com humanos em que estes tinham que alcançar e agarrar um objeto, foi proposta a hipótese de que o SNC planeia

os movimentos tendo em conta uma série de posturas memorizadas, o Posture-Based

Motion Planning Model. Basicamente, este modelo seleciona a postura final mais

adequada à tarefa (de entre as posturas em memória) de acordo com uma hierarquia de restrições, nomeadamente: evitar colisões, minimizar os esforço, precisão do movimento e eficiência. Consequentemente, de acordo com Elsinger and Rosenbaum (2003) ficou claro que a seleção da postura final mais adequada à tarefa é selecionada primeiro e só depois vem a execução do movimento. Assim sendo, o processo de planeamento de movimentos é dividido em duas fases: 1) seleção de uma postura

final; 2) seleção da trajetória. A figura 2.15 ilustra todo este modelo.

(a) (b) (c) (d)

Figura 2.15: Posture-Based Motion Planning Model introduzida em (Rosenbaum et al.,

2001). (a) posição inicial e respetivo alvo; (b) representação das sete posturas memorizadas e postura inicial; (c) seleção da postura final; (d) execução do movimento. Imagem retirada de (Rosenbaum et al., 2001).

A seleção de uma postura final mais adequada é uma caraterística importante, pois segundo Zhang and Rosenbaum (2008) a forma como nós, humanos, agarramos um objeto depende do que pretendemos fazer com este. Assim sendo, em simples tarefas de manipulação de objetos, com um só braço, os humanos preferem adotar uma posição um quanto desagradável que permita uma postura final bem mais confortável. Esta caraterística foi descoberta graças a experiências feitas com humanos por Rosenbaum et al. (1990), em que se chamou a este efeito: end-state comfort effect. Posteriormente, mais investigações foram levadas a cabo por Rosenbaum e a sua equipa, para um revisão mais detalhada ver (Rosenbaum et al., 2006). Além de Rosenbaum, outros investigadores tal como Creem and Proffitt (2001) debruçaram-se

sobre este efeito, mas para simples tarefas unimanuais.

2.3.2.2 “End-State Comfort Effect” em Tarefas Bimanuais

As tarefas ou atividades bimanuais, em que requerem o uso dos dois braços e mãos são tarefas que representam um problema de controlo bem mais complexo, de um ponto de vista neuro-cognitivo. Veja-se o caso de quando é necessário que as mãos desempenhem diferentes movimentos, cada mão tende a assimilar caraterísticas espaciais e temporais do movimento da outra mão. De acordo com os estudos feitos por Franz et al. (1991) esta caraterística foi demonstrada quando as pessoas (nas experiências) eram instruídas a desenhar um círculo com uma das mãos e uma linha com a outra mão, resultando num círculo com uns traços em linha e uma linha com uns traços de círculo. Ou seja, houve uma assimilação dos padrões espaciais e temporais de cada movimento. Portanto, por um lado, o SNC tem uma preferência na sincronização espacial e temporal dos movimentos dos dois braços e mãos, mas, por outro lado também se preocupa com a antecipação do planeamento atendendo ao objetivo/ fim da ação, ou seja, o end-state comfort effect para ambos os braços.

Em (Hughes and Franz, 2008) foram realizadas experiências com pessoas de forma a examinar uma possível interação entre o end-state comfort effect e as restrições de acoplamento bimanual espaciais e temporais. Neste estudo os participantes adotam uma idêntica posição inicial, para as duas mãos, que os permite satisfazer o efeito de conforto final, em tarefas em que o objetivo é colocar os objetos em orientações finais idênticas. No entanto, quando o objetivo é colocar os objetos em orientações finais diferentes, a sensibilidade para obter posturas finais confortáveis interfere com a tendência de adotar posturas iniciais idênticas (em ambos os braços e mãos), e assim, nem o end-state comfort effect nem o acoplamento bimanual aparece como uma restrição de planeamento dominante.

Adicionalmente, Weigelt et al. (2006) também realizaram estudos com o obje- tivo de estudar o end-state comfort effect em casos de manipulação bimanual de objetos. As experiências foram conduzidas, a fim de se realizar simples tarefas onde os participantes tinham que alcançar, simultaneamente, duas barras e colocar as

extremidades de cada barra num respetivo local da mesa. Os resultados mostraram que os participantes quase sempre têm tendência para minimizar o desconforto para ambas as mãos no final da tarefa, mesmo sob condições em que o end-state comfort

effect pode apenas ser alcançado através de diferentes posturas iniciais para cada

braço.

Outros estudos recentes têm sido desenvolvidos por Janssen e os seus colegas (Janssen et al., 2011, 2010, 2009). Em (Janssen et al., 2010) concluíram que :

• Os participantes quase sempre preferem alcançar uma postura final confortável, aquando tarefas de manipulação simples em que estes manuseiam dois objetos com as suas mãos, mesmo tendo que selecionar uma postura inicial assimétrica (em relação à postura da outra mão) ou estranha e ter que coordenar movimentos

diferentes entre as mãos (mesma conclusão que em (Weigelt et al., 2006)); • Perante movimentos mais complicados, os participantes já não se preocupam

com o alcançar uma postura final confortável, mas têm em conta uma melhor postura inicial (ou intermédia);

• Movimentos em que os participantes eram livres de escolher as suas postu- ras iniciais (para os braços), priorizavam o planeamento de posturas finais confortáveis relativamente à simetria do movimento.

Além disso, em (Janssen et al., 2010) os autores sugerem que existe uma hierar- quia entre as duas mãos, sendo uma mais dominante que a outra. Posteriormente, em (Janssen et al., 2011) os autores vieram a observar que o end-state comfort

effect é mais pronunciado no braço direito em comparação com o braço esquerdo,

concluindo, assim, que o planeamento motor é uma função especializada do hemisfério esquerdo do cérebro (hemisfério esquerdo controla os músculos do lado direito do corpo humano). Contudo, em (Hughes et al., 2011) os resultados não confirmaram esta hipótese de dominância do hemisfério esquerdo no planeamento de movimento, talvez porque, e como argumentado por estes autores, a sua experiência tinha um nível de precisão menor do que a executada por Janssen e colegas.

Esta hipótese de um braço ser mais dominante que o outro, de um hemisfério ser mais especializado no planeamento do movimento levanta a pergunta de como é que o cérebro humano processa toda a informação, de como é que planeia e controla os movimentos dos dois braços e mãos e o porquê de certas assimilações temporais e espaciais dos movimentos dos dois braços. No ponto seguinte pretende-se abordar estas questões relativas ao processamento da coordenação dos dois braços.

2.3.2.3 Coordenação Motora dos Braços

A capacidade de coordenação motora depende de vários músculos que atuam em torno das articulações e fazem mover um determinado membro do corpo humano. No entanto, os principais problemas da coordenação motora centram-se na coordenação dos movimentos de membros diferentes, como os dois braços, que neste caso é o ponto central deste trabalho de dissertação.

A partir da investigação do comportamento humano foi possível recolher dados que permitem fazer uma descrição do comportamento de coordenação dos dois braços humanos. Portanto, e de acordo com Cardoso de Oliveira (2002) existem três modelos que foram projetados segundo essas descobertas, estes são: o programa motor generalizado (PMG), intermanual crosstalk e o modelo de sistemas dinâmicos.

Programa motor generalizado - Uma das caraterísticas dos movimentos dos

braços humanos que levou ao desenvolvimento do modelo PMG foi a forte similaridade de caraterísticas espaciais e temporais dos movimentos dos dois braços. Este modelo é baseado na ideia de que um plano motor comum é responsável pelo movimento dos dois braços, ver figura 2.16.

Intermanual crosstalk model - este modelo, contrariamente ao PMG, considera

que existem dois planos motores, cada um responsável por um braço. Admite que existem interações entre os movimentos dos dois braços em determinados níveis do processo, resultado de entrelaçamentos (crosstalk) de sinais de controlo dos braços, ver figura 2.17.

Figura 2.16: Conceito do programa motor generalizado para representar a coordenação

dos movimentos dos braços (representado pela função F ). Imagem retirada de (Cardoso de Oliveira, 2002).

Figura 2.17: Intermanual crosstalk model, onde diferentes movimentos são planeados para

os braços em planos diferentes e podem interagir entre eles em dois níveis. Imagem retirada de (Cardoso de Oliveira, 2002).

do sistema nervoso. A atividade neuronal no sistema nervoso central parece trabalhar num regime dinâmico metaestável. Interações neuronais são a chave para a dinâmica do sistema nervoso e regulando essas interações, diferentes estados dinâmicos podem ser realizados, que é a base de diferentes tendências de acoplamento espaço-temporal entre os braços. A formalização matemática proporciona uma descrição da organização funcional do sistema sob a forma de um modelo computacional que automaticamente prevê o comportamento. Por- tanto, os modelos dinâmicos da coordenação bimanual podem ser compatíveis com os outros dois modelos descritos anteriormente.

Relativamente a este assunto não existe um consenso nesta área, pois existem estudos controversos em cada uma destas abordagens o que torna necessário a conti- nuação do estudo na psicologia e neuropsicologia humana, subjacente aos movimentos bimanuais.

Plataforma Robótica ARoS

Este capítulo começa por apresentar, de uma forma geral, como está construída a plataforma robótica antropomórfica - ARoS, usada na implementação e validação deste trabalho de dissertação. Adicionalmente, no subcapítulo seguinte é apresentado o modelo da cinemática direta e inversa dos braços e mãos robóticas.

3.1

Construção e Caraterísticas

Como, anteriormente, foi dito na secção 1.2.1, esta plataforma foi projetada e construída no Laboratório de Robótica Móvel e Antropomórfica do Departamento de Eletrónica Industrial da Universidade do Minho. O ARoS, de uma forma geral, é constituído por um torso (ou tronco) estático, equipado com dois braços e duas mãos robóticas, um sistema de visão estéreo e um ecrã disposto no seu peito.

Devido ao facto da forma antropomórfica de um robô facilitar a interação entre humano e robô, como discutido na secção 1.1.2, esta plataforma foi projetada com dimensões de acordo com estudos antropométricos (Costa e Silva, 2011). O torso tem uma altura de 1.5 metros e uma largura de 40 centímetros (ver figura 3.1a), permitindo ao robô ter no total uma altura de 1.85 metros. A figura 3.1b ilustra o aspeto geral da plataforma robótica.

Relativamente aos braços, cada um é constituído por diferentes segmentos rígidos conectados por sete juntas rotacionais que permitem um movimento relativo das

(a) (b)

Figura 3.1: Representação geral da plataforma robótica ARoS, em (a) as dimensões do

seu torso e em (b) o seu aspeto completo.

ligações vizinhas. Assim, cada braço apresenta 7-DOFs. Mais, cada braço tem um peso de 12 kg e consegue levantar pesos a partir do seu end-effector (ou extremidade do manipulador) num total de 3 kg. A figura 3.2 apresenta imagens do braço, uma é a foto real do braço, figura 3.2a, enquanto as outras duas figuras 3.2b e 3.2c são uma representação do braço direito e esquerdo com os seus pontos caraterísticos: S - ombro, E - cotovelo, W - pulso e H - mão; os sete graus de liberdade, θ1, θ2, θ3, θ4,

θ5, θ6, θ7 do braço direito e θ12, θ13, θ14, θ15, θ16, θ17, θ18 do braço esquerdo, as suas

respetivas direções de rotação e as dimensões dos diferentes segmentos dos braços (L1, Lu, Ll, Lh).

(a) Braço real do ARoS (b)Braço Direito (c) Braço Esquerdo

Figura 3.2: Representação dos braços robóticos do ARoS

Segmento Dimensão (mm) Descrição

L1 340 distância da base do braço (origem) ao ombro

Lu 395 comprimento do braço superior

Ll 370 comprimento do antebraço

Lh 95 distância do pulso à palma da mão

Tabela 3.1: Dimensões do braço robótico do ARoS.

proporcionais às do braço humano, ver tabela 3.1. Uma outra caraterística importante é o limite máximo e mínimo que cada uma das sete juntas se pode mover. Como ambos os braços são dispostos de maneira diferente, um no lado direito e outro no esquerdo, a direção de rotação em algumas das juntas não são iguais para os dois. Posto isto, no ponto seguinte abordam-se as caraterísticas da disposição dos braços, um no lado direito e outro no lado esquerdo da plataforma robótica.