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CARTA AO MUNDO E AOS CORAÇÕES

No documento AMPLAMENTE: SOCIEDADE EM (DES)CONSTRUÇÃO (páginas 95-100)

Mas sei que uma dor assim pungente Não há de ser inutilmente

Há31 esperança

(Elis Regina-1972)

Quase é impossível não se encontrar em uma quarentena, sem se esbarrar nos pensamentos ansiosos por respostas, além do sentimento de impotência que nos encontramos neste momento de pandemia e calamidade pública, e de também péssima gestão legislativa (meu sincero desabafo).

Como não questionar a estruturação social em que estamos envolvidos, onde a anistia de imposto para trabalhadores informais não é questão? Onde o número de

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carcerários que estamos enfrentando nos últimos tempo, não é discutido e reorganizado, sem entrar na pauta sobre: qual o perfil da população carcerária e de como estão sendo tratados? Não é discutível a vida dos idosos e dos jovens? São tantas problematizações que nos é conflitante atentarmos.

E a vida que está valendo menos que o salário mínimo, ou melhor, está valendo mais um operário doente, que faz gerar o capital para indústria, do que um operário que possa, pós pandemia, com apoio nacional, buscar meios de equilibração econômica, nessa suposta crise que tanto se tem medo.

É culpa de quem agora? Tentava-se há pouco achar um jeito de culpar alguém e de forma invasiva sempre apontar erros e incumbir a responsabilidade a uma pessoa.

Enquanto isso, não pautamos que a exploração mata, que o saneamento do bolso do pobre faz com que o miserável e os da linha de risco durem menos e bem menos do que o estimado para a sua classe social.

Olhando para tudo isso: o que tem a ver com o covid-19? Tudo! O capitalismo não quer saber sobre as condições pelas quais cada um está passando socialmente, sobre suas vulnerabilidades etc. Não se tem interesse no bem-estar da população e não é à toa que a cada dia os operários vêm ficando mais doentes, e que um dos fatores é a impossibilidade de o capitalista renunciar à exploração braçal do seu operário e reduzir a sua carga horária. Por quê? O empregador terá que colocar outro trabalhador, pagar mais direitos, pagar mais impostos (se é que ele paga).

O mesmo vale agora para pandemia que não é só brasileira: é mundial. Sabe o que mais dói? É que fortemente nosso país está sendo atacado por uma realidade desumana, pois estamos nas mãos de bárbaros, de neoliberais. Os empregadores não estão abrindo mão de seus operários, porque o que é importante é o gerenciamento do seu lucro.

O lucro esteve (e estará) sempre presente na vida do capitalismo, do empregador irresponsável, desumano, daquele não se desfaz facilmente da importância do dinheiro, daquele mesmo que não valoriza a igualdade de gênero, igualdade salarial, dentre outras.

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hospital, quem ocupará? O jovem que ainda tem muito que ser explorado, ou idoso que foi tanto explorado e contribuiu até mais do que deveria? Qual julgamento aqui é válido? É correto julgar uma vida?

Por um lado, fico aliviado em não estar no lugar de tantos médicos, por outro fico triste de ver tantos na linha de frente perdendo a sua vida. Mas como já passei por uma perda de alguém nessa realidade. O que acalma meu coração, é que estão fazendo o melhor para todos! Os nossos Médicos/Enfermeiros e tantos outros que estão no suporte estão se infectando para salvar vidas, estão morrendo para salvar vidas, estão fazendo horas extras para salvar vidas, eles estão lá para salvar vidas!

Acredito que seria também fora de contexto, pensarmos agora em uma linha não humanística, mas capitalista, que entre salvar um carcerário preto e um carcerário branco, o estruturalismo racial permitiria que o negro morresse. Não seria discutível, como ainda não é, termos uma população tão grande de homens e mulheres de pele preta, atrás das grades, pois já naturalizou-se termos 67% da população carcerária de cor preta, e isso não é eu homem preto que está dizendo é as pesquisas! Vejam segundo dados do IBGE (IBGE, 2010).

Figura 1. Constructo– População Brasileira

Fonte: IBGE, 2010

Questionar o porquê o número tão grande de prisioneiros, sendo que a população de pretos e pretas é menor que o número de pretos e pretas presos.

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Vejamos mais um quadro levantado pelos dados – INFOPEN32 (2014)

Figura 1. Constructo– Sistema Prisional

Fonte: INFOPEN 2014

É nítido que a desigualdade racial bate na nossa cara e não vemos, ou melhor fingimos que está tudo bem. Novamente me angustio ouvindo noticiário de carcerários sendo detectado a contaminação do vírus. Outra pergunta aqui é a ser feita: se o preso já estava preso, quem trouxe o vírus? Não estou e nem quero acusar ninguém, mas me preocupo com os carcerários, principalmente com a tamanha desigualdade que se dispara em nossa sociedade

Perceptível que não está em pauta, da mesma forma que não é pauta fazermos isolamento social, porque nossos governantes, administradores, empregadores não dão importância o quanto vale uma vida, esse é meu real sentimento pois para eles, custa muito ficar sustentando operários durante uma crise de saúde pública. Simples assim!

É quase que maçante debater com o capitalista, com o neoliberal, que não dá importância a uma anistia de impostos (suspensão de imposto) para aquele que trabalha informalmente, sem entrar na discussão das famílias que vivem só com dois salários mínimos, e outros nem com isso, salários que mal dão para o básico, de famílias que podem estar num status melhor, mas que ao longo de uma crise econômica também são

98 respingadas pela vulnerabilidade financeira.

Porém, foco aqui a discussão para quem não tem trabalho. E mesmo assim, sendo informais, geram renda para a nação, pois pagam imposto em qualquer produto básico que levam para dentro de suas casas. Enfim, a suspensão é para quem não tem renda, mas o salário oscila tanto quanto o dólar, quanto mais caro o dólar, mais caro os produtos, e consequentemente menos dinheiro o pobre/trabalhador informal terá e menos ele receberá. A sua reciclagem, o seu trabalho artesanal também sofre com qualquer movimentação da economia, ninguém da classe trabalhadora está sendo privilegiado com os abonos e as taxações. A forma de vida de um autônomo não é segura, é perigosa! Pois não lhe garante o pão de amanhã; o patrão é ele mesmo, não tem atestado, não tem plano de saúde, não tem benefício, só tem ele por ele.

O mal maior de uma pandemia é o rico, é o empresário, é o nosso presidente que pensa que “é só uma gripezinha” e que a economia pode cair se pararmos de trabalhar. Porém, o neoliberal é incapacitado de enxergar que cada dia está se construindo um vão entre o produto e o pobre; o pobre ficando mais pobre, o rico ficando mais rico. Só não pararam para pensar: e quando a classe trabalhadora não puder parcelar, não puder pagar, não puder consumir, o que faremos com tantos maquinários, produtos etc., que ficarão parados? Uma crise global da economia já está instalada há anos, apenas não enxergamos o rastro de problemas que estão se deixando, apenas ficamos acreditando na reprodução de uma fala pronta do capitalista: é necessário trabalhar, porque se não trabalharmos logo não teremos dinheiro no país. Esse é o problema maior de uma pandemia, não é entender que todos têm direito à vida e o direito de viver, e sim garantir esse direito. E quando isso é tirado, nós estamos ferindo uma constituição democrática, que nos assegura no artigo quinto, parágrafo três que:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 19888, p.13)

E ser exposto ao perigo, é ser arrancado de seus direitos e colocado à tortura do trabalho, é desvalorizar a pessoa humana. É humilhar na sua condição social, por isso Freire argumenta: “a vida Social é também vida política, na qual os seres humanos

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compartilham consensos e dissensos. Trata-se de algo mais amplo do que a mera desgastada ideia de “VIDA SOCIAL COMO DIREITOS E DEVERES” [...].” (FREIRE & NOGUEIRA, p 23, 2019).

CARTA DE UMA FILHA: UMA MEMÓRIA ETERNAMENTE DOLOROSA

No documento AMPLAMENTE: SOCIEDADE EM (DES)CONSTRUÇÃO (páginas 95-100)