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CATEGORIA 1: CONCEPÇÕES ACERCA DA FORMAÇÃO DOCENTE E OS SABERES

5 APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS “DADOS”

5.1 CATEGORIA 1: CONCEPÇÕES ACERCA DA FORMAÇÃO DOCENTE E OS SABERES

Os sujeitos demonstraram que compreendem a docência como uma profissão, sendo assim necessária formação específica. Nas falas foi observado que eles acreditam não ser suficiente a formação inicial em alguma área do conhecimento para atuar na docência, pois estes espaços não preparam para as práticas educacionais. Podemos identificar estas compreensões nas seguintes falas:

[...] docente é aquele profissional que tem formação específica na área que ele esta apto a lecionar, não só no que tange as questões específicas da área mesmo, ao conhecimento técnico específico, como também pedagógico, o docente antes de mais nada é um educador, então não basta ser fisioterapeuta, enfermeiro para ser professor, ele tem que ter uma formação [...]. Informante “a”.

[...] formação docente seria toda a estrutura necessária didático-pedagógica que possa dar condições para que o indivíduo possa exercer a prática da docência [...]. Informante “b”.

[...] e eu como professor, como docente, minha formação permite que eu utilize de estratégias que atraia esse indivíduo para poder, assumir uma responsabilidade, como uma pessoa que vai ser um futuro profissional, tenha digamos motivação para poder se inserir no ritmo, na rotina do estágio, eu acredito que nós não temos essa formação, e às vezes nós estamos perdendo esses estagiários ou eles estão perdendo o estágio por essa falha também que existe [...]. Informante “c”.

[...] eu entendo que o processo de formação docente ele é muito amplo, e na verdade nós como bacharéis não somos preparados para a docência [...]. Informante “d”.

[...] a gente tem que vincular um pouco da nossa profissão inicial que é a fisioterapia e começar a ler mais sobre a pedagogia e a docência entendeu, que é um mundo imenso, para gente desenvolver a partir daí o nosso perfil docente, porque são vários estudiosos, várias linhas diferentes, existem avaliações de várias formas, cada um segue uma linha, então eu acho que é um mundo assim imenso [...]. Informante “e”.

[...] quando você fala em docência você ta falando em passar conteúdo, em trocar informações [...]. Informante “c”.

[...] nós estamos na docência (caímos de pára-quedas, como o nosso colega Fabiano falou) e nós não fazemos um planejamento, do jeito que começa praticamente termina [...]. Informante “c”.

Os sujeitos demonstraram que não estavam preparados para atuar na docência, mas que procuravam nos cenários de suas práticas desenvolverem estratégias que pudessem minimizar as suas carências formativas. Algumas intervenções demonstram estas percepções:

[...] a gente tentando assim: copiar o professor que a gente mais gostou na graduação nossa, tentando roubar aquelas idéias que ele fazia [...]. Informante “e”.

[...] a gente acaba criando com o passar dos anos, você acaba criando métodos, você acaba criando conceitos e você segue, certo ou errado, duvidoso, você acaba se adaptando a esse sistema que você mesmo criou e segue, em algum momento você vai achar falha ai você corre para literatura, você começa a pesquisar mais, para você tentar corrigir esses problemas [...]. Informante “f”.

Um ponto de partida para toda discussão é a compreensão conceitual do objeto de análise. Assim, procurou-se analisar quais eram as concepções formativas dos sujeitos informantes da pesquisa.

No início da realização do grupo focal, uma professora perguntou se seria possível um esclarecimento da questão apresentada ao grupo. A questão era: “O que o(a) Senhor(a) entende por formação docente?” Nesse momento a professora indagou: “Pode tirar dúvida se tiver dúvida na questão? Formação dos alunos? Ou a minha formação enquanto docente?”. O mediador esclareceu que se tratava da formação do docente e não dos seus discentes.

Esse questionamento inicial reflete de maneira significativa as carências conceituais sobre formação docente. De fato, percebeu-se que os sujeitos ainda não têm de maneira lúcida o conceito sobre a formação docente. Neste aspecto, os conceitos do ser professor, seus saberes e o processo formativo para tal não são claros para os docentes de fisioterapia.

Após o esclarecimento inicial, as falas mostraram que os sujeitos entendem ser necessário um conhecimento didático-pedagógico para o exercício da docência. As discussões entre o conhecimento específico e o conhecimento pedagógico ganharam destaque. Foi consensual a idéia de que não basta o conhecimento específico da fisioterapia para a atuação docente.

Masseto (1998) destaca que durante muito tempo acreditou-se na crença de que quando um profissional era convidado para ser professor em uma instituição e aceitava o convite, tanto ele quanto a instituição baseavam-se na idéia de que: quem sabe (ou detém o conhecimento), automaticamente sabe ensinar (ou transmiti-lo). Para o autor, somente recentemente os professores foram percebendo que assim como a pesquisa e o exercício de qualquer outra profissão, a docência exige formação específica.

Um sujeito da pesquisa colocou: “formação docente seria toda a estrutura necessária didático-pedagógica que possa dar condições para que o indivíduo possa exercer a prática da docência”. Nesta fala, o conceito dos saberes docentes mostra- se muito evidente, ou seja, para o exercício da docência é necessária formação e essa formação seria o conjunto de saberes didático-pedagógicos – os saberes docentes.

As concepções formativas dos professores pesquisados corroboram com os teóricos em relação a essa necessidade de formação específica e os saberes docentes. Em outro recorte, temos:

de uma forma muito sumária, eu creio que a nossa preparação para que a gente desenvolva um projeto pedagógico adequado para determinada disciplina, ela deva incluir: formação em técnicas de diálogo, em técnicas de atividade em grupo, a própria avaliação em si e toda uma formação das bases da escola. Informante “d”.

Nesse contexto, podemos evidenciar que pontos como didática, elaboração de conteúdos programáticos e a avaliação do processo ensino-aprendizagem são percebidos pelos sujeitos como fundamentais no processo das práticas docentes.

A didática e as relações de ensino-aprendizagem foram apontadas pelos informantes como uma das competências necessárias para a prática docente. De acordo com os docentes, as estratégias para que o conhecimento específico da fisioterapia seja compreendido e refletido pelos discentes são fundamentais nas relações de aprendizagem.

Nesta fala podemos perceber essas questões: “a forma de passar o conteúdo, de você saber ministrar determinada aula, e você usar diferentes tipos de recursos, textual, recursos de mídia, de recurso de literatura, para que você consiga ampliar, digamos assim, o conhecimento dos seus alunos.”

Os recursos e estratégias utilizados nas aulas foram identificados pelos docentes como o meio principal na busca pela qualidade na formação dos futuros fisioterapeutas. De acordo com eles, é papel do docente tornar suas aulas mais atrativas, interativas, reflexivas e que busquem resgatar do aluno os conceitos teóricos que eles acumularam durante toda a vida acadêmica.

Além disso, os professores destacaram que o planejamento e a organização das disciplinas, incluindo a divisão dos conteúdos teóricos e práticos, são peças fundamentais no processo de ensino-aprendizagem.

Para uma determinada professora, um docente deve antes de tudo ter um rigoroso planejamento das atividades que pretende desenvolver, sob pena de comprometer em muito a formação discente. Temos o seguinte relato:

um professor sem planejamento não é um bom professor. Um professor que ele não tem noção do conteúdo que vai dar hoje, do conteúdo que vai dar amanhã e assim por diante ele é um professor que não desorganiza só a si mesmo ele desorganiza seus próprios alunos. Informante “d”.

De acordo com esta professora o planejamento é imprescindível para as práticas docentes. Durante sua entrevista ela relatou a experiência que viveu em uma instituição de ensino superior privada que adotava uma metodologia própria no planejamento e organização das práticas educativas. Na sua visão, os saberes e

competências docentes vão além dos espaços da sala de aula e das antigas e conhecidas aulas expositivas.

A metodologia utilizada por esta instituição, na visão da professora, contribui de maneira significativa na formação didático-pedagógica dos docentes. No entanto, acredita-se que os docentes que nunca exerceram o magistério enfrentam sérios obstáculos no cumprimento das normas estabelecidas por esta instituição. A professora relatou: “é uma aula teórica seguida de uma aula prática rigorosamente, é um rigor, mas aquele rigor pra alguém que não foi preparado para docência, vamos usar um termo que talvez não seja o mais adequado: ele se treme.”

A percepção de que cabe à instituição de ensino a responsabilidade pela formação docente foi destacada pela professora. Durante a discussão sobre as responsabilidades pela formação docente retornaremos a este relato, no entanto cabem nesse momento algumas reflexões acerca das competências e saberes docentes nas relações entre os docentes e as instituições de ensino.

A professora colocou que as competências e saberes docentes exigidos nesta instituição na qual ela lecionou, como já colocado anteriormente, extrapolam a sala de aula. Todo o planejamento e desenvolvimento das disciplinas fica sob responsabilidade dos docentes, incluindo funções administrativas como elaboração de horários e distribuição das salas utilizadas no semestre.

Em seu relato, a professora deixou claro de que o ponto marcante na metodologia utilizada na instituição em debate é o rigor. Para ela a pressão pelo rigor no cumprimento do método é um fator positivo no desenvolvimento das atividades de ensino. As aulas teóricas deveriam ser encaminhadas via correio eletrônico para os discentes com no mínimo uma semana antes dos encontros em sala de aula. Além disso, deveriam seguir também as leituras recomendadas para aquele determinado assunto que seria abordado, para que os discentes chegassem à aula com uma leitura prévia de todo o conteúdo planejado e pudessem estudar e discutir de maneira crítica e reflexiva com seus professores.

Mas, surge o seguinte questionamento: esse rigor exigido pela instituição é capaz de resolver as carências formativas dos seus docentes e otimizar notoriamente o processo de ensino-aprendizagem?

Para a professora que vivenciou essa metodologia a resposta é não. Ela destaca: “na prática eu vivenciei, lecionei lá durante dois anos: não funciona. O método deles é falho.” Ela acredita que o método tem suas vantagens, no entanto o grande problema está no discente, que não realiza as leituras prévias dos materiais enviados pelos professores.

As práticas docentes, nesse sentido, adotam uma relação de dependência com os discentes, em uma espécie de pacto bilateral para encortinar as fraquezas de ambos os atores nos cenários educativos. Em outro trecho da entrevista a professora revela:

eu estaria em um quadro, ou um áudio-visual, blá, blá, blá, e o aluno sentado fingindo que está prestando atenção, ou prestava de vez enquanto, conversava daqui a pouco, ficava ali marcando a sua presença, quando eu falava que algo era importante ele começava a registrar porque sabia que aquilo ia cair na prova. Informante “d”.

Este discurso revela uma espécie de pacto entre os sujeitos formadores e formandos, na busca por um final feliz onde todos saem ganhando.

As metodologias ativas de aprendizado têm assumido destaque nas pesquisas em educação. Diversos trabalhos discutem as formas de construção do conhecimento através de um papel mais ativo dos discentes nas relações de ensino e aprendizagem.

Um professor participante desta pesquisa pontuou sua experiência em um curso desenvolvido em 2005/2006 pelo Ministério da Saúde, em parceria com a Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Ârouca (ENSP)/FIOCRUZ e a Rede Unida, intitulado: Curso de Especialização em Ativação de Processos de Mudança na Formação Superior dos Profissionais de Saúde. Este curso procurou desenvolver a formação de sujeitos multiplicadores de metodologias ativas de aprendizagem, baseando-se na “concepção construtivista do processo ensino-aprendizagem, na integração teoria-prática, nos referenciais da aprendizagem significativa e de adultos e na utilização de metodologias ativas de aprendizagem”. (BRASIL, 2005).

O professor destacou a importância de sua participação neste curso, ressaltando: “depois que eu fiz o curso de especialização em ativadores do processo de mudança, que eu descobri outras metodologias, metodologias ativas, esclareceu

bastante essa questão do desenvolvimento da prática docente.” De acordo o docente, o curso veio contribuir sobremaneira na sua forma de exercer as práticas educativas e acredita que estratégias como essa deveriam ser seguidas pelas Instituições de Ensino. Voltaremos a essa discussão na categoria que debate as responsabilidades pela formação docente.

Os saberes docentes, assim como em outros campos do saber, reúne de maneira complementar diversas competências e habilidades intrínsecas às práticas docentes. O caminho nada fácil do ser professor é por vezes desenvolvido e aprimorado em um jogo de certo e errado, geralmente mediado, dosado e avaliado pelos outros atores que fazem parte destas relações construtivas e reflexivas: os discentes.

Essa constante avaliação e re-avaliação das práticas docentes levam às vezes a situações de confronto de idéias, concepções e pontos de vista bastante divergentes. Faço referência aqui ao meu início na carreira docente, precisamente minha primeira aula como professor.

Como já relatado no início desta dissertação, ingressei na Universidade como professor substituto em 2003 para lecionar as disciplinas: Fisioterapia em Neurologia e Fisioterapia Comunitária. A docente titular das disciplinas já havia desenvolvido a maior parte dos conteúdos previstos no plano de curso das disciplinas.

Após aprovação e nomeação, entrei em contato com a professora que estava saindo para licença-maternidade e conversamos a respeito da continuação das atividades da disciplina. Lembro que ela solicitou que eu ministrasse duas aulas sobre os conteúdos que estavam faltando: uma sobre a Síndrome do Túnel do Carpo e Síndrome do Desfiladeiro Torácico. Ambas são patologias neurológicas e seriam os conteúdos finais da disciplina Fisioterapia em Neurologia. Em relação à disciplina Fisioterapia Comunitária a mesma já havia sido encerrada, não sendo necessária minha participação.

Logo que fiquei sabendo quais seriam que eu deveria ensinar começou uma grande angústia, a de como preparar uma aula sobre tais conteúdos. Busquei em várias fontes da literatura e elaborei uma espécie de esquema norteador sobre quais os pontos seriam abordados e sua sequência lógica, passando desde as definições fisiopatológicas das patologias, avaliação fisioterapêutica dos pacientes e por último

(que eu considerava o mais importante) os métodos e técnicas utilizadas no arsenal terapêutico para tratamento destas enfermidades.

A pressão inicial do primeiro contato com a sala de aula foi uma experiência inesquecível e inigualável. Reservei no setor de áudio-visual um kit multimídia (composto de uma televisão e um computador), para utilização do programa PowerPoint. Confesso que foi o meu primeiro contato com esse tipo de recurso, sendo necessária a perda de algumas noites para conseguir descobrir de maneira autodidata a forma de utilização do programa.

Como não poderia deixar de acontecer em se tratando dos nossos inseparáveis computadores, o kit reservado não abriu o arquivo com minha aula. Enquanto os técnicos do setor tentavam resolver o problema, eu notava que os discentes não faziam outra coisa a não ser comentar em voz baixa e olhar para o novo professor substituto que acabava de chegar.

Após alguns longos e eternos minutos e algumas incansáveis trocas de componentes nas máquinas a aula começou, apresentando conceitos teóricos sobre a síndrome do túnel do carpo. Retornando aos saberes docentes, a questão era: qual conteúdo teórico abordar, o porquê desse assunto, como narrar sobre ele e por último como avaliar se o que havia sido proposto tinha sido alcançado.

Assim, os saberes são solicitados em todas as fases e experiências educacionais. Em especial, para os fisioterapeutas que foram formados para promover ações de saúde e são inseridos em uma sala de aula para qualificar novos fisioterapeutas, as necessidades de formação docente tornam-se evidentes.

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