• Nenhum resultado encontrado

4.1 DA BIOÉTICA

4.1.3 Chip de monitoramento em detentos

Em um mundo cada vez mais globalizado, a ciência criminal tem por escopo acompanhar as constantes evoluções tecnológicas, com o fito de garantir a correta aplicação da lei e, por conseguinte, atingir o ideal de justiça e de promoção da paz social (CONTE, 2010).

A sociedade contemporânea, dita sociedade da informação, de modo geral, reclama a revisão da atuação estatal no procedimento criminal brasileiro, e em especial, nas formas de execução das penas impostas ao fim desta persecução (CONTE, 2010).

Essa ascensão importa abordar uma nova perspectiva do poder punitivo, qual seja o de monitoramento de presos, que tem por fim retornar a real finalidade da pena para garantir o bom êxito da sanção penal (CONTE, 2010).

Ao tratar do sistema de encarceramento tradicional, que embora seja a forma mais difundida de cumprimento de pena no mundo, tem se tornado a mais indigna, degradante e propiciadora dos mais variados abusos de direitos humanos (CONTE, 2010).

Para melhor elucidação do tema, cabe refletir o conceito de pena, que de modo doutrinário geral é a consequência jurídica da prática de uma infração penal. Nas palavras de Fragoso (2003, p. 343) assim preceitua:

O sistema punitivo do Estado constitui o mais rigoroso instrumento de controle social. (...) destina-se, portanto, à defesa social na forma em que essa defesa é entendida pelos que têm poder de fazer leis. Esse sistema opera através da mais grave sanção jurídica, que é a pena (...).

Portanto, se a pena não cumpre as suas finalidades, seja ela de retribuição, de prevenção, há a necessidade de que medidas efetivas sejam tomadas. Assim, as novas tecnologias podem servir de instrumento para efetivação da justiça, através de uma responsabilização efetiva e proporcional (FRAGOSO, 2003).

Nessa toada, o emprego de tecnologia nas prisões, em especial, ‘o chip de monitoramento em detentos’ como nova forma de punição e de vigilância do condenado, desponta como uma das soluções possíveis, para desafogar o sistema penitenciário castigado pela superlotação (CONTE, 2010).

Pertinente destacar as principais opções técnicas de monitoramento eletrônico de infratores, que são: a pulseira; tornozeleira; cinto; microchip implantado no corpo humano, e ficará a critério de cada Estado a escolha (BRANCO, 2010).

Vale examinar o funcionamento desses dispositivos, que se dá da seguinte forma: o equipamento – chip, dá sinal a um transmissor que é colocado no Centro de Controle de Monitoramento. O transmissor é conectado a um satélite que permite saber a localização exata do infrator através do sistema de posicionamento global – GPS, que por sua vez, calcula a longitude, latitude, velocidade do portador do dispositivo o tempo todo. Assim, alerta o Centro de Controle de Monitoramento, caso venha o infrator penetrar em uma área de

exclusão determinada pelo juiz e também serve para provar a inocência do infrator, na hipótese de acusação mentirosa (CONTE, 2010).

Já o bracelete-emissor, integra fibras óticas que permitem assinalar os defeitos de funcionamento e as tentativas de danificá-lo, e pode ser fixado no punho ou tornozelo. Dotado de bateria que avisa por meio de alarmes quando há uma pane. Tem a função de emitir automaticamente sinais de rádio que permitem atestar a presença da pessoa monitorada no lugar designado ao receptor. Possui tamanho pequeno, e tem por finalidade não tornar degradante o cumprimento da pena (CONTE, 2010).

No entanto, o receptor-transmissor é ligado à linha telefônica e colocado em determinado lugar do domicílio, tal como: local de trabalho ou estudo. Registra os sinais do emissor e os transmite a um computador central. Tem por objetivo captar todas as operações: de retorno, deslocamentos, pane, tentativa de violação do aparelho entre outras. Também funciona com uma bateria que garante a autonomia em caso de falta de energia elétrica. Para isso fica tudo registrado em uma memória (CONTE, 2010).

Como regra, o Centro de Controle de Monitoramento, localiza-se nos estabelecimentos prisionais. Assim, um funcionário analisa as fichas dos monitorados e indica as horas do controle e o computador compara os sinais enviados pelo receptor instalado na casa do monitorado ao programa-horário estabelecido, caso ocorra qualquer falha, um alarme é acionado no terminal de controle (CONTE, 2010).

Após todo esse percurso, o terminal de controle de monitoramento é posto de gestão operacional situado dentro do serviço encarregado do monitoramento, que é o estabelecimento prisional e registra os alarmes recebidos com as indicações que permitem identificar o condenado e cuidar dos alertas emitidos pelo Centro de Controle e Monitoramento.

Neste passo, o alarme é acionado quando ocorre alguma falha técnica ou em face da ausência do condenado, servindo para alertar a autoridade competente, qual seja: o juiz, promotor, supervisor entre outros, acerca do desrespeito aos horários, degradação do material ou cometimento de nova infração (CONTE, 2010).

Assim, a tecnologia de rastreamento por meio de GPS em detentos utilizada nos Estados Unidos desde 1987, passa também a ser adotada no Brasil. De acordo com um levantamento realizado pelo Departamento Penitenciário Nacional, em junho de 2007 a população prisional brasileira já estava com mais de 420 mil detentos que ocupavam um espaço destinado para 290 mil. Com esses dados, o Governo Federal viabilizou alguns

projetos que visam minimizar os problemas de superlotação das prisões e de modernização do sistema (BRANCO, 2010).

Um dos projetos é o da Lei nº 1.288/07 aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados pelo qual autoriza a utilização de equipamentos de rastreamento e monitoramento eletrônico em presos. Porém, o projeto prevê o uso da tecnologia apenas em determinadas situações, são elas: pena restritiva de liberdade e cumprida em regime aberto ou semi-aberto; saída temporária autorizada em regime semi- aberto; aplicação de pena restritiva de direito que estabeleça limitação de horários ou da frequência a determinados lugares; prisão domiciliar; livramento condicional ou suspensão condicional da pena, cujo monitoramento poderia evitar a reincidência (BRANCO, 2010).

Relevante ponderar, que o tema gera muitas discussões. Se por um lado a tecnologia permite à reintegração do indivíduo e melhor individualização da pena, como bem explicita Nucci (2009, p. 554):

Não vemos óbice para a implantação da denominada vigilância eletrônica, consistente na utilização de aparelhos próprios para fiscalizar, à distância, a atividade do sentenciado, quando em gozo de benefícios penais, tal como o livramento condicional. Ilustrando, dentre as condições possíveis, pode o juiz fixar a obrigação de se recolher à habitação em hora certa (art. 132, § 2.º, b, da LEP ( LGL 1984\14 ) ). A única maneira eficiente de se controlar o cumprimento da condição é a fiscalização, que pode ser feita por agentes do Estado (Serviço Social Penitenciário) ou, mais modernamente, por vigilância eletrônica.

Haja vista, o sistema de monitoramento eletrônico se coaduna com o princípio da individualização da pena, pois evita os efeitos nefastos da dessocialização causados pelo encarceramento, principalmente por delinquentes primários, bem como facilita a manutenção dos laços familiares e o exercício da atividade profissional pelo condenado, propiciando efetiva reinserção social e diminuindo a reincidência e a taxa de ocupação dos estabelecimentos penitenciários (CONTE, 2010).

Outra vantagem é a redução de custos, o sistema de monitoramento demonstra ser mais econômico do que as prisões tradicionais, vez que reduz gastos com os encarcerados e consequentemente com funcionários (CONTE, 2010).

Neste ponto, D’Urso (2010), fortalece a defesa do monitoramento. Por certo é sabido mesmo nas prisões cautelares, nas quais os presos provisórios devem ficar separados em celas distintas dos presos definitivamente condenados, poucas vezes se tem garantia dessa separação, igualando o suspeito ao condenado e sujeitando ambos a tratamento desumano, não garantindo a sua integridade física, são propicias a sevícias sexuais, doenças como Aids, tuberculose e também a rebeliões.

Assim, o monitoramento evitaria o confinamento e os problemas dele decorrentes e manteria a responsabilidade do Estado diante de uma condenação de pequena monta ou prisão antes da condenação (D’Urso, 2010).

Por outro lado, esse sistema pode estigmatizar o preso. Sob este ponto de vista, Carlos Roberto Mariath, coordenador de Elaboração e Consolidação de Atos Normativos do Depen/Ministério da Justiça, acredita que dependendo do sistema utilizado, o monitoramento eletrônico pode marcar o usuário, eis que, por ser fixado um dispositivo que não poderá ser violado enquanto perdurar a condição imposta ou a execução de sua pena (BRANCO, 2010).

E acrescenta que, diante do quadro atual do sistema carcerário não se pode negar a oportunidade de o indivíduo aguardar o trânsito em julgado da sentença em sua residência, alegando que este deve se recolher ao cárcere porque o instrumento que poderia salvaguardá- lo fere o princípio da intimidade ou ainda o da presunção da inocência (BRANCO, 2010).

De acordo com informações do Departamento Penitenciário Nacional, o custo de um preso no Brasil gira em torno de 1,5 mil reais por mês. A transição para o sistema de monitoramento por satélite é resultado de uma economia de aproximadamente 40% (BRANCO, 2010).

Diante deste quadro, Mariath (2009 apud BRANCO, 2010, p. 1) afirma que o monitoramento não consiste apenas em minimizar gastos, a tecnologia é uma forma de tornar a liberdade do indivíduo vigiada e poderá ser utilizada para outras finalidades, tais como: para detenção, ou seja, a certeza de que o indivíduo fique no lugar pré-determinado; para restrição, garantia de ida ou não a determinados lugares, ou ainda à aproximação de determinadas pessoas para fins de serem testemunhas, vítimas ou co-autores; para vigilância, monitoramento contínuo sobre o indivíduo; e para otimização de trabalho, ou seja, para facilitar o trabalho das Polícias Federais e Estaduais e de agentes que fazem o trabalho de fiscalização.

Um ponto que também merece destaque está relacionado à humanidade das penas e a dignidade humana. Nesse sentido, a Constituição Federal garante em seu artigo 5º inciso XLVII que, “não haverá penas cruéis; em consonância com o inciso XLIX “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”. (BRASIL, 1988).

Neste ínterim, a implantação de microchip no corpo afeta a integridade física do condenado, protegida pelo ordenamento jurídico e Constituição Federal.

Notadamente, sabido que a pena não tem por fim fazer sofrer o condenado, e a ressocialização pretendida não se pode fazer sem respeitar a dignidade e autonomia do réu, motivo pelo qual tal sistema de monitoramento deve ser oferecido e não imposto, como forma

de prevenir a prática de novos crimes, possibilitando ao condenado uma vida adaptada à sociedade (CONTE, 2010).

Não se pode olvidar que tal sistema abre fendas quanto ao direito à privacidade, propiciando conflito entre interesse público e o privado. Cabe citar a lição de Oliveria (2007, p. 8), sobre a questão:

No âmbito dos complexos aspectos do monitoramento eletrônico disciplinado por decisão judicial, há dúvida de que existem hipóteses em que o interesse do indivíduo é superado pelo interesse público, justificando o sacrifício da privacidade. Assim, a submissão às regras da conduta monitorada implica sacrifício da limitação ao sagrado direito de liberdade e de manter-se em reserva. De um lado, está o interesse do indivíduo, titular de um patrimônio moral personalíssimo. De outro, o interesse da coletividade que reivindica o conhecimento de determinados fatos ou a exposição de particularidades da conduta inerente à vida associada. A valoração desse sacrifício equivale a uma redução ou diminuição das diretrizes sobre a privacidade, por ser legal a intromissão do interesse público na ação da Justiça socialmente adequada ao 'communit oprimio', especialmente e considerar a condição de adesão do indivíduo para o gerenciamento da alternativa do monitoramento eletrônico. Resta claro que a esfera íntima, individual do monitorado deve ser preservada, com intuito de evitar a ingerência do Poder Público. Deve-se, portanto, tal sistema de monitoramento, prescindir da autorização ou consentimento do condenado e de sua família, a fim de evitar eventual violação à sua privacidade, bem como não poderá colocar em risco a saúde do acusado ou investigado sob pena de responsabilidade do Estado (CONTE, 2010).

Não obstante a aplicação de chip encontra-se disseminada externamente, ou seja, de aplicações externas do chip, existem também as aplicações internas que são implantadas no tecido subcutâneo da pele. A seguir.