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CAPÍTULO 3. CAMPO DE PESQUISA: REDES SOCIAIS, INTERAÇÃO SOCIAL E

3.1 Ciberespaço e Cibercultura: aspectos da tecnologia

A complexificação da sociedade tem sido associada às emergências das novas tecnologias, o que tem causado transformações nas mais diversas áreas. No entanto, “We know

that technology does not determine society: it is society” (CASTELLS, 2006, p. 3). A sociedade

trata da tecnologia de acordo com suas necessidades, valores, princípios e interesses, sobretudo daqueles que manuseiam essas tecnologias. A globalização e as inovações tecnológicas proporcionaram uma sociedade baseada em redes sociais e em uma comunicação mediada por tecnologias (CASTELLS, 2006).

A partir da Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945) há uma evolução tecnológica que permitiu um crescimento demasiado de instrumentos/aparelhos eletrônicos, além de recursos e viabilidade da Internet para além das grandes empresas (CAPOBIANCO, 2010). O surgimento do World Wide Web (W.W.W) é resultado da criação da Internet (CAPOBIANCO, 2010; CASTELLS, 2018), o qual possibilitou espaços para que ocorressem o armazenamento de informações e a comunicação em meios ou sítios eletrônicos. Lévy (2010) aponta que um

movimento social contracultural californiano ampliou as técnicas, contribuindo para o acesso ao computador pessoal. Com essas inovações tecnológicas e com a expansão do mercado eletrônico há uma melhor acessibilidade não só aos computadores, mas a outros aparelhos que possibilitam a comunicação interinstitucional e interpessoal, de modo on-line23.

O acesso aos aparelhos e aos sistemas tecnológicos se tornaram importantes na vida dos seres humanos, articulando-se com o meio e com as relações interpessoais, uma vez que essa comunicação passou a ser mediada e facilitada (MARTINO, 2015). As atividades, por mais triviais que sejam, passaram a ser realizadas por esses mecanismos. As informações são trocadas de maneira infinita pela Internet e em velocidades cada vez mais rápidas (LEMOS, 2004).

Observa-se, no século XXI, uma nova era da sociedade, momento em que ocorrem diversas modificações sobre as práticas sociais como consequência do impacto da internet e dos aparelhos tecnológicos. Para Lemos (2004), o período atual tem sido marcado por uma produção e consumo de informações característicos das sociedades contemporâneas. Uma gama de informações é tratada dentro dos espaços tecnológicos a todo instante, desde situações mais formais até as mais informais. As práticas sociais e os comportamentos humanos nessa nova fase tecnológica “gira em face” não somente com respeito às relações interpessoais e com o meio ambiente, mas com o mundo virtual. Em análise, o virtual não deixa de ser uma reprodução das manifestações que existem fora do mundo on-line, havendo um impacto mútuo entre o real e o virtual (JUNGBLUT, 2004). Jungblut (2004) também ressalta que “O virtual [...] está associado à emergência da Internet e que possibilitou criar formas de comunicação e interação social [...]” (p. 102).

Não obstante, surge com a facilidade da Internet a problemática do que é considerado espaço público e privado no mundo virtual. Nesse contexto, Lemos (2004) discute sobre a redefinição dos espaços e das fronteiras, propondo haver uma “des-re-territorialização”. Esse ponto permite entender o ser humano e toda a estrutura de sentido e significado que o meio virtual, ou cyber, tem sobre os sujeitos. Quando pensamos em produtores e consumidores de informações, podemos fazer uma relação com a “des-re-territorialização”, pois são nos espaços da Internet, em páginas, blogs, redes sociais, que os sujeitos tentam se enquadrar, criando mecanismos de controle de informações naquele espaço, produzindo e consumindo outras tantas informações para se legitimar nesse território (LEMOS, 2004).

Recuero (2014) também considera a distinção sobre o ambiente público e privado nos meios virtuais. A autora (2014) entende que as fronteiras existentes nesse contexto não são bem definidas, o que viabiliza o encaminhamento de determinadas situações para diversas áreas. A definição de conversação privada fica restrita a espaços fechados, ou seja, espaços que definem limitações a algumas pessoas. A exemplo disso, temos perfis e páginas no Facebook e no

Instagram que são fechados para usuários que não fazem parte do círculo de amigos,

concedendo visualização e oportunidade de respostas somente a aqueles do círculo. Diferente desse tipo de conversação, a conversação pública não possui delimitação para a visualização de determinadas postagens e/ou informações, onde quaisquer usuários podem visualizar e interagir através de comentários. Alguns sites possuem procedimentos para limitar as postagens, o

Facebook, por exemplo, possui a ferramenta de gerir quem poderá visualizar e comentar,

mesmo que a pessoa seja do círculo de amigos e/ou conhecidos (RECUERO, 2014).

A globalização e as modificações estruturais oportunizaram a acessibilidade aos mecanismos tecnológicos. A proporção de usuários tem crescido nos últimos anos, não somente pela diversidade de aparelhos eletrônicos que oportunizam a comunicação on-line, mas, pela expansão da Internet e a forma como ela é operada. Para se ter uma ideia da amplitude de acessos à Internet, foi realizada a seguinte análise estatística pelo Miniwatts Marketing Group no final do ano de 2017:

Figura 5 _ Estatísticas de uso e população da Internet no mundo Fonte: Miniwatts Marketing Group (2018)

A Ásia é a região que possui maior quantitativo populacional, tendo também o maior número de usuários da Internet, chegando à proporção de 48,7% (Figura 5). Ao analisar somente a região das Américas (Figura 6), a maior incidência de usuários é na América do Norte (44,1%), seguido pela América do Sul (39,2%). Filtrando ainda mais os dados (Figura

7), o Brasil é o primeiro no ranking do número de usuários de Internet (48,7%). Esses dados expõem como estão os processos de conectividade através da Internet por meio dos diversos aparelhos que possibilitam essa utilização. Para Capobianco (2010), há uma distinção entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento24, sendo que a incidência de acessibilidade à Internet é menor. Entendemos que as políticas governamentais e de determinadas instituições não atendem aos interesses e necessidade de todos; com isso, acabam por não facilitar essa ascensão. Corroboramos a ideia de que “[...] o impacto da Internet depende de fatores econômicos, políticos e sociais de cada comunidade.” (CAPOBIANCO, 2010, p. 178).

Figura 6 _ Usuários da Internet e estatística da população de 2018 para as Américas Fonte: Miniwatts Marketing Group (2018)

Figura 7 _ Estatísticas sobre uso e população da Internet na América do Sul Fonte: Miniwatts Marketing Group (2018)

24 Destacamos como em desenvolvimento os países que de algum modo e por algumas instituições são considerados como países subdesenvolvidos.

As informações no meio tecnológico são quaisquer dados que percorrem o espaço da Internet. Essas informações existentes no sistema tecnológico são quaisquer dados novos que geram um feedback (CAPOBIANCO, 2010; MARTINO, 2015). Por meio desses elementos existentes são criados códigos para interpretá-las. Essa relação entre informação, feedback e código pode ser entendida como um binary digit ou, simplesmente, bit. Essas informações só são possíveis mediantes ao contato humano e a relação que se estabelece com a máquina. As relações estabelecidas por meio da comunicação, da geração de informações, dos feedbacks, constituem uma cultura própria desse meio tecnológico (LÉVY, 2010).

Para Lévy (2010), os relacionamentos situados nesse espaço podem ser considerados como cibercultura que só é possível mediante o ciberespaço. O ciberespaço faz referência a todos os sistemas que conectam os aparelhos eletrônicos e mecanismos que possibilitam as mediações tecnológicas existentes na modernidade. No entanto, há a necessidade de uma conexão em rede para que a troca de informações ocorram de forma eficiente entre esses aparelhos. Assim, entendemos a rede e o ciberespaço como um ambiente em que ocorrem essas interações e conexões. Martino (2015) considera que ciberespaço não deve ser confundido com os aspectos estruturais dessa tecnologia, pois refere-se à forma de vínculos que oportunizam essas conexões.

[...] a expressão “estar no ciberespaço” pode levar a metáfora geográfica um pouco longe demais. “Estar lá”, no caso, significa ter a possibilidade de navegar entre documentos, páginas, textos e informações diversas. Isso implica que o ciberespaço não “está lá” até que se converta em algum tipo de interface em uma tela, seja de um computador, tablet¸ou celular; ao mesmo tempo, cada computador é parte de um conjunto maior de elementos, formando uma espécie de “computador único”, no qual o número de trocas tende potencialmente ao infinito (MARTINO, 2015, p. 30).

No que se refere à cibercultura, apreendemos que essa não é desvinculada com as questões culturais da realidade, sendo um reflexo do que existe no mundo off-line. Para Jungblut (2004), a virtualização causa uma “desrealização” do mundo, que constitui-se como um simulacro. Mesmo que esse espaço seja uma representação da realidade, entendemos que também possui as suas particularidades, justamente pelas interações, comunicação e conexões ocorrerem mediadas por computadores em um ciberespaço (LÉVY, 2010; MARTINO, 2015). Martino (2015, p. 27) aponta que “[...] é a cultura – entendida em um sentido bastante amplo como a produção humana, seja material simbólica, intelectual – que acontece no ciberespaço”. Para além disso, retornamos à ideia de Geertz (2017, p. 32) de que “[...] a cultura é vista melhor não como complexos de padrões concretos de comportamentos [...], mas como um conjunto de mecanismos de controle [...] para governar o comportamento.

Outro aspecto particular dessa cibercultura é a sua sistemática. Diferente da realidade ou do espaço off-line, não existem regras e normativas que se impõem dentro desse espaço, o que o caracteriza como um lócus desorganizado. Mesmo que desorganizado, a cibercultura é múltipla, por agregar diferentes sujeitos e grupos que possuem diferentes ideias, valores e princípios. O ambiente virtual e a cultura que se organiza nesse espaço virtual se configura de modo particular, mesmo que reproduzindo determinadas situações da realidade (MARTINO, 2015). Os mecanismos de controle no plano virtual ou no ciberespaço também determinam os comportamentos daqueles que ali se relacionam, sejam sujeitos com sujeitos, sujeitos com máquinas ou máquinas com máquinas (SANTOS; DOS SANTOS, 2014; MARTINO, 2015). Isso pode ser exemplificado quando determinado comentário é realizado em alguma rede social sem que atenda aos princípios ideológicos dela, podendo os moderadores excluírem e/ou banirem o ator do comentário.

Contudo, esse espaço tem a característica de flexibilidade e inconstância, pois depende daqueles que ali interagem e da forma de pensamento dos atores sociais. Assim, ora um sujeito pode defender e realizar uma postagem sobre uma ideia, ora ser contrário ao que postou (LÉVY, 2010; MARTINO, 2015). A flexibilidade existente na cibercultura pode ser modificada a qualquer momento, justamente pela facilidade que os sujeitos têm de apagar algumas informações25. Outra ideia da flexibilidade e inconstância é a existência de grupos, o que, para Latour (2012), é uma incerteza e que por vezes agrupa-se a um ou mais grupos, podendo fazer ou não parte deles a qualquer momento. Latour (2012) discorre sobre a fragilidade da palavra grupo e prefere compreendê-la a partir da infralinguagem26.

Quando tratamos sobre sociabilidade e formação de grupos, identificamos que a Internet possibilitou a migração de várias relações humanas do mundo off-line para o mundo on-line. Martino (2015) trata especificamente dessas questões, levantando a premissa qualitativa de que as relações no universo on-line são mais frágeis e menores do que no off-line. Isso é demarcado pela não aproximação entre os sujeitos e pela relação intermediada por uma máquina, o que não possibilita comportamentos que promovam o estabelecimento de uma relação mais consolidada. No entanto, os mecanismos tecnológicos, juntamente com a Internet,

25 Salientamos nesse momento, que as informações no ciberespaço sempre ficam armazenadas em algum lugar na “nuvem”. Mesmo que o sujeito comece a escrever algo e depois apague, esses dados, códigos e parâmetros de digitação ficam armazenados.

26 Para Latour (2012, p. 53), a infralinguagem é “[...] algo que não possui outro sentido além de permitir o deslocamento de um quadro de referência a outro”. Nesse sentido, é possível entender que determinadas palavras por não terem uma definição e significado concreto, pode ser levada a contemplar outras situações, nesse caso, a palavra grupo, pode se referir a diversas situações, como por exemplo sociedade, comunidade e outros.

possibilitaram manter laços entre os sujeitos, apesar das distâncias espaciais, evitando o rompimento das relações já estabelecidas (MARTINO, 2015).