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Não foram poucos os autores que, desejando valer-se do sucesso obtido por obras alheias, puseram-se a narrar as aventuras dos filhos de heróis consagrados em outros livros. Por isso, como observa com certa ironia Rodrigues Lapa, “aqui temos como se ordenavam as novelas de cavalaria: nasciam umas das outras, como os filhos nascem das mães; e como os filhos se parecem com os pais, também as novelas, no geral, se pareciam umas com as outras”54. Dentre os ciclos assim formados, os dois mais

importantes são o gerado a partir do Amadís de Gaula e o chamado “ciclo dos Palmeirins”, inaugurado pela obra anônima Palmerín de Olivia, publicada em Salamanca no ano de 1511. Após brevíssimo intervalo de apenas 6 meses, publicou-se

52 As informações sobre os livros de cavalarias em Portugal foram baseadas em Lima de Almeida, Isabel

Adelaide, op. cit., p. 19-23 e Díaz-Toledo, Aurelio Vargas, Os livros de cavalarias em Castela e Portugal, op. cit., itens 1 e 2. Note-se que, além dos livros referidos, há notícias sobre quatro outros títulos desaparecidos: as Aventuras do gigante Dominiscaldo, de Álvaro da Silvieira, a História do espantoso

cavalleiro da lux, de Francisco Morais Sardinha, o Clarindo de Grécia, de Tristão Gomes de Castro, e um

livro cujo título se desconhece, escrito por Fernão Lopes de Castanheda.

53 A Novela de Cavalaria no Quinhentismo Português. O Memorial das Proezas da Segunda Távola

Redonda, de Jorge Ferreira de Vasconcelos. São Paulo, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da

USP, Boletim 218, 1957, p. 47.

54 Lapa, M. Rodrigues. Introdução, in: Morais, Francisco de. Palmeirim de Inglaterra. Seleção, prefácio e

já a primeira seqüência do livro, intitulada Libro segundo del Emperador Palmerín, en

que se cuentan los grandes y hazañozos fechos de Primaleón y Polendus, sus fijos

(Salamanca, 1512), obra que, a partir da edição de 1534, passou a ser conhecida simplesmente como Primaleón.

A autoria dos dois livros é uma questão ainda em aberto. Embora sejam muitos os elementos a apontar para a hipótese de um mesmo autor ter redigido o Palmerín e o

Primaleón55, nenhuma das duas obras fornece indicações seguras sobre sua identidade.

Juan Augur de Trasmiera, que publicou versos anexos à primeira edição de ambas, as atribui a “mano de dueña prudente” de Ciudad Rodrigo. Não obstante a sedutora tese da autoria feminina dos livros ter sido bastante difundida (e ainda hoje não ser de todo descartável), os especialistas na matéria têm se inclinado a admitir como hipótese mais provável o nome de Francisco Vázquez, vizinho da mesma Ciudad Rodrigo, que figura como responsável pela revisão do texto no cólofon da primeira edição do Primaleón56.

Não é possível saber em que medida a atribuição dos livros a uma autora feminina contribuiu para sua difusão, pela novidade que representava; o dado concreto é que eles gozaram de grande prestígio. Prova disso é que o Palmerín conta com ao menos 13 edições até o fim do séc. XVI, sendo três delas no Exterior (duas em Veneza e uma em Évora), ao passo que o Primaleón foi impresso dez vezes, consideradas as duas edições lisbonenses e a veneziana. Além de estarem entre os livros de cavalarias castelhanos que mais se editaram no séc. XVI, sua influência ultrapassou as fronteiras ibéricas e dilatou-se no tempo. O Palmerín de Olivia não apenas foi traduzido para diversas línguas (italiano, francês, inglês, alemão e holandês, já no séc. XVII), como ainda serviu de inspiração para um drama de Pérez de Montalbán (1650) e um “romance” de Joseph Blas (1755). Como observou M. Carmen Marín Pina, narrativas orais sobre Palmeirim (ou Palmeiriz) de Oliva ainda foram recolhidas em Portugal no princípio do séc. XX57. Alguns episódios e temas do Primaleón (entre os quais o mais

famoso é a conquista do amor de Flérida por D. Duardos disfarçado de jardineiro) tiveram larga sobrevivência literária, servindo de sugestão para o D. Duardos de Gil

55 Cf. Ferrario de Orduña, L. “Palmerín de Olivia” y “Primaleón”. Algunas observaciones sobre su

autoría, in: Actas del VIII Congreso Internacional de la AHLM. Santander: Consejería de Cultura del Gobierno de Cantabria, 2000, p. 718-728.

56 Cf. a introdução de M. Carmen Marín Pina a sua recente edição do Primaleón (Alcalá de Henares:

Centro de Estudios Cervantinos, 1998), p. IX-XI.

57 Cf. a introdução da autora à edição do Palmerín de Olivia (Alcalá de Henrares: Centro de Estudios

Vicente, o Le prince déguisé de Scudéry (1629) e até mesmo para uma comédia setecentista de autor cubano58.

Em que pese ao grande sucesso desses livros, alguns estudiosos modernos têm reprovado o estilo despretensioso de seu autor. Menéndez y Pelayo refere-se ao

Palmerín de Olivia como “nulidade”, classifica-o de imitação servil do Amadís e

conclui, sentenciando: “el estilo es pobre, el sentimiento ninguno”59. Ainda que sem anuir com a severidade do crítico espanhol, Luciana Stegagno Picchio também encontra “suficientes razões para condenar o Palmerín de Olivia no plano estético”, reprovando a linguagem coloquial, a pobreza do léxico, a monotonia do estilo e (ao nosso ver, injustamente) a sintaxe confusa60. De fato, a simplicidade quase rústica do Palmerín e do Primaleón distanciam-nos grandemente do tom elegante e doutrinal impresso por Montalvo ao Amadís de Gaula; mas isso não quer dizer que eles não ofereçam outros atrativos. William Purser, por exemplo, considerou o Palmerín como “the most amusing of all the romances of chivalry I have read”61.

A importância das duas obras no processo de consolidação do gênero é inegável. Escritos num momento em que a voga dos livros de cavalarias estava apenas no início, o autor do Palmerín soube realizar uma sábia combinação entre elementos inspirados no modelo amadisiano e certas inovações que marcaram de modo duradouro as trilhas que seriam percorridas pelas futuras obras congêneres. Além de deslocar pela primeira vez o centro de gravidade das aventuras para Constantinopla (cenário secundário em obras anteriores, como o Tirant lo Blanc e o Amadís), as duas primeiras partes do que estaria destinado a converter-se no ciclo dos Palmeirins introduziram motivos até então desconhecidos em livros de cavalarias – como o amor entre representantes de famílias inimigas (Primaleão e Gridônia) e o já referido meio inusitado encontrado por D.

58 Cf. a introdução ao Primaleón, op. cit., p. XXI-XXII. A primeira parte da Crônica de D. Duardos que

transcrevemos também menciona o tema dos amores entre Flérida e D. Duardos oculto sob o disfarce de Julião (cf. no segundo volume deste trabalho, o cap. 18, nota 13). O fato de Jorge Ferreira de Vasconcelos citar o Primaleón em seu Memorial das proezas da segunda Távola Redonda, conforme vimos, também atesta sua popularidade.

59 Op. cit., v. 1, p. 422-423. 60 Op. cit., p. 194.

61 Palmerin of England. Some remarks on this romance and on the controversy concerning its authorship.

Dublin: Browne and Nole, 1904, apêndice XII, p. 431. É preciso notar, porém, que o crítico não faz o mesmo juízo positivo acerca do Primaleón, que considera excessivamente longo.

Duardos para conquistar Flérida – que ajudaram a demonstrar a viabilidade do gênero para além das continuações do Amadís62.

O autor do Primaleón provavelmente não contava com a possibilidade de nova continuação a prolongar o nascente ciclo. Esta deve ser a explicação para o fato de, nos capítulos finais da obra, ele apresentar sumariamente a trajetória de Platir, um dos filhos de Primaleão. Nesta seção final – excrescente a ponto de abalar a complexa estrutura da obra, até então bem equilibrada apesar das múltiplas tramas de que é composta – tudo é anômalo: além de ser protagonizada pelo quarto filho de Primaleão (e não pelo primogênito, como de hábito), o trecho prolonga sem qualquer necessidade uma narração que já se havia encaminhado naturalmente para a conclusão. Dessa forma, a história de Platir, condensação do que seria um novo livro da série, torna-se enfadonha para o leitor e praticamente inviabiliza o surgimento de novas seqüências – pois se, de um lado, a vida do novo herói já não poderia atrair a curiosidade dos leitores (que já saberiam “o fim da história” pelo rápido resumo do Primaleón), por outra parte, ao declarar que, dentre os quatro filhos de Primaleão, Platir foi o mais valente, o narrador desacreditava de antemão qualquer tentativa de seqüência protagonizada por um de seus irmãos.

Ainda assim, o ciclo dos Palmeirins não foi interrompido, muito ao contrário: do mesmo Primaleón brotaram duas continuações paralelas, bifurcando-se. A primeira delas teve vida fugaz e pequena descendência; a outra, representada pelo Palmeirim de

Inglaterra, prosseguiu gerando novos frutos até o início do séc. XVII.

Em 1533 – mais de duas décadas depois do Primaleón, portanto – é publicada em Valladolid a terceira parte da série palmeriniana, intitulada Platir. O autor do livro, que M. Carmen Marín Pina crê ser Francisco Enciso Zárate, decide narrar a seu modo a biografia deste herói e, para isso, não hesita em alterar o final da obra anterior, desmentindo-a abertamente. Já no primeiro capítulo, após informar que o protagonista nascera no mesmo dia do falecimento de Palmeirim de Oliva, seu avô, o narrador observa: “aunque en Primaleón se tiene el contrario, ésta fue la verdad”. Por isso, a editora da obra diz que a decisão do autor “es la de un lector insatisfecho no contento

62 É preciso lembrar que, quando surgiu o Palmerín de Oliva, estavam editados apenas os três primeiros

títulos do ciclo dos Amadises (Amadís, Espladián e Florisando), além de uma série de outros textos cavaleirescos que estudos recentes não consideram como representantes legítimos do gênero dos livros de cavalarias, tais como o Oliveros de Castilla ou o Henrique, fijo de doña Oliva, não acolhidos no rol da já citada Bibliografía de los libros de caballerías castellanos de Eisenberg e Marín Pina.

con el desenlace de la obra que desea continuar, algo similar a lo que sucedió con el

Amadís primitivo y después con ciertas continuaciones amadisianas”63. São numerosas

as retificações impostas por Enciso Zárate a seu predecessor, a começar pela mudança de nomes de alguns personagens importantes: a esposa de Platir, por exemplo, que no

Primaleón chamava-se Sidela, agora é rebatizada como Florinda.

Não obstante sua grande originalidade, e talvez mesmo em função dela, o Platir parece ter sido recebido com relativa frieza pelos leitores espanhóis. É possível que o protagonismo conferido a Florinda – a qual, vestida de cavaleiro para resgatar o amado de um encantamento, protagoniza algumas aventuras e chega mesmo a conquistar o amor de outra donzela, sem que ela percebesse tratar-se de mulher disfarçada – tenha desagradado ao público, ainda refratário a tentativas de renovação de um gênero que àquela altura estava no auge da popularidade. Mas se na Península Ibérica o Platir não voltou a ser editado depois de 1533, sua fortuna em Itália foi muito mais feliz. A tradução da obra foi lançada em 1548 e alguns anos depois foi editada uma continuação sua, protagonizada pelo filho de Platir, chamado Flortir, personagem já mencionado na obra castelhana de 1533, onde se prenunciam inclusive algumas aventuras futuras do jovem. Embora os editores do Flortir apresentem a obra como tradução de original castelhano, não restam dúvidas de que o autor do livro seja Mambrino Roseo da Fabriano – o que implica reconhecer a existência de contribuições italianas ao ciclo dos Palmeirins. Há notícias de diversas outras edições do conjunto Platir-Flortir realizadas na Itália até o início do séc. XVII64.

O sucesso dos dois livros no estrangeiro não impediu, contudo, que eles passassem a ocupar posição um tanto marginal no desenvolvimento da série palmeriniana. O famoso Palmeirim de Inglaterra – que estaria destinado a transplantar

63 Platir. Ed. de M. Carmen Marín Pina, Alcalá de Henares: Centro de Estudios Cervantinos, 1997, p. 13

(1º cap.) e p. X da introdução.

64 As informações aqui resumidas estão baseadas nas fornecidas por Marín Pina (introdução ao Platir, op.

cit., p. XVI) e Purser (op. cit., p. 433- 437). Entre os dois autores há, inclusive, uma discrepância quanto à data da publicação do Flortir: segundo Marín Pina ela teria ocorrido em 1560; mas, de acordo com Purser, a primeira edição é de 1554 (em 1560 teria sido publicada a Segunda parte do Platir; não dispomos de informações suficientes para afirmar se esta Segunda parte é o mesmo Flortir com outro nome). Além do Flortir, Mambrino Roseo da Fabriano escreveu várias outras obras ligadas ao ciclo dos Palmeirins, inclusive novas continuações do Primaleón e do Palmeirim de Inglaterra, como atesta H. Thomas (op. cit., p. 142): não tivemos oportunidade de examinar nenhuma dessas obras, sobre as quais também não conhecemos estudos ou edições recentes. Convém mencionar aqui, brevemente, que durante muito tempo se considerou que o Polindo (ou Polendos) fosse obra integrante do ciclo dos Palmeirins, erro esclarecido por H. Thomas, op. cit., p. 76 e 142. Ainda assim, a informação é registrada por Jerusa Pires Ferreira, em seu O tapete preceptivo do Palmeirim de Inglaterra, op. cit., p. 7, nota 3.

o ciclo para Portugal, onde ele iria adquirir novo impulso – liga-se diretamente ao

Primaleón, desconsiderando por completo as alterações sugeridas no Platir. É

impossível determinar com segurança o que teria motivado tal fato: não se sabe se Francisco de Morais teria desaprovado os rumos impressos ao ciclo pelo Platir ou se ele simplesmente desconhecia a existência do livro de Enciso Zárate, o que não seria improvável em vista de sua restrita difusão65. Fato é que, no Palmeirim, o herói do livro de 1533 ficará relegado a segundo plano, juntamente com sua esposa (que readquire o nome original de Sidela); o protagonista das novas aventuras será seu primo, filho de D. Duardos e Flérida.

Assim como Platir, Palmeirim de Inglaterra é neto do iniciador da estirpe, Palmeirim de Oliva. A diferença entre eles é que Platir descende do velho Imperador de Constantinopla por linha masculina, ao passo que no caso de Palmeirim de Inglaterra a descendência ocorre por via feminina, como ficará claro ao leitor que consultar o quadro genealógico dos personagens do ciclo (cf. apêndice 1 deste volume). A insólita herança das virtudes cavaleirescas por via materna obriga a examinar mais detidamente a relação do Palmeirim com as demais partes da série.

Para justificar a opção de negar a Platir o papel de protagonista da nova obra não é preciso recorrer à hipótese de Morais ter tomado ciência do fato de que outro autor já se encarregara de compor um livro dedicado a este cavaleiro: conforme vimos anteriormente, a conclusão do Primaleón criava obstáculos suficientes para dissuadir qualquer escritor que desejasse fazê-lo. Neste caso, a opção natural talvez fosse eleger algum dentre os outros três irmãos de Platir não nomeados no final do Primaleón para dar prosseguimento à saga do clã, solução facilitada pelo fato de saber-se que Platir era o caçula da família (com efeito, no Palmeirim, o filho de Primaleão que mais se destaca é o primogênito Florendos, que protagoniza as famosas aventuras do castelo de Miraguarda). Mas Francisco de Morais evitou o caminho mais comum à tradição dos livros de cavalaria, em que o sucessor do herói costuma ser seu filho primogênito. E o fez sem razões aparentes, porque em todo caso gozaria de plena liberdade de criação: se Morais forjou Florendos, personagem não previsto na apressada conclusão do

Primaleón, o que o impediria de forjar também outro Palmeirim, filho de Primaleão? A

única explicação plausível é que a inovação foi resultado de escolha deliberada, fruto de

65 Quanto ao Flortir, o problema sequer se coloca: se a primeira edição do Palmeirim é dos anos 1540,

uma predileção pela figura de D. Duardos. Como se sabe, o príncipe da Inglaterra compartilha com o herdeiro do reino de Constantinopla o protagonismo no Primaleón, onde os dois percorrem trajetórias paralelas e complementares. Ambos são cavaleiros invencíveis e namorados leais; o que os diferencia é que o traço dominante no caráter de Primaleão é a valentia, ao passo que em D. Duardos prevalece a característica do amante perfeito. Esta sutil diferença, possivelmente reforçada pela difusão do D.

Duardos, de Gil Vicente (1522), deve ser a responsável pela subversão do andamento

esperado no desenvolvimento de um ciclo de livros de cavalarias. Note-se, contudo, que a preeminência concedida a um herdeiro do trono inglês, como Palmeirim, não deslocou o centro para o qual convergem os personagens e aventuras da obra, que continua sendo a corte de Constantinopla, tanto no livro de Morais como nos de seus continuadores.

O Palmeirim de Inglaterra foi objeto de acalorada contenda entre portugueses e espanhóis que reivindicavam a paternidade da obra66. Hoje não restam dúvidas que seu

autor seja o português Francisco de Morais, o qual deixou inclusive registro de elementos autobiográficos num curioso episódio da obra: trata-se do envolvimento de Floriano do Deserto, irmão de Palmeirim, com quatro fúteis damas francesas que levam os mesmos nomes de mulheres com quem o autor teria convivido durante sua permanência em França como secretário da embaixada enviada por D. João III entre os anos de 1541 e 154467. A biografia de Francisco de Morais é muito lacunosa: ele teria

nascido por volta de 1500; a serviço do conde de Linhares, D. António de Noronha, seguiu com seu filho para a França na referida embaixada e, depois de retornar a Portugal, casou-se com Bárbara Madeira. Seus serviços aos Noronha renderam-lhe uma pensão régia a partir de 1550, mesmo ano do famoso torneio cavaleiresco promovido

66 Eximimo-nos aqui da tarefa de referir em detalhes a discussão, não apenas porque isso escaparia ao

nosso objetivo, que se restringe a situar a posição da obra no interior do ciclo dos Palmeirins, como também porque se trata de questão definitivamente encerrada há mais de um século (mais precisamente desde 1904, quando Purser publica seu Palmerin of England: some remarks on this romance and on the

controversy concerning its authorship). O leitor interessado poderá encontrar na bibliografia as

referências dos principais lances do debate, ao qual contribuíram, entre outros, o filólogo brasileiro Odorico Mendes, os espanhóis D. Pascual Gayangos e Nicolás Díaz de Benjumea, além do inglês William E. Purser.

67 O episódio é narrado nos caps. 137-142 da segunda parte do Palmeirim. As damas francesas que

inspiraram a passagem são referidas no texto “Desculpa de uns amores”, de Francisco de Morais, que se encontra em apêndice da edição do Palmeirim de Inglaterra preparada por Geraldo Ulhoa Cintra (São Paulo: Anchietana, 1946, v. 3, p. 397-405). A crítica tem enxergado na referência às damas francesas um meio de Morais vingar-se da desilusão amorosa que lhe foi imposta por Torsi, uma dama de companhia da rainha Leonor da França (Cf. Díaz de Benjumea, Nicolas. Discurso sobre el “Palmerín de Inglaterra”

y su verdadero autor, presentado a la Academia de Ciencias de Lisbona. Lisboa: Imprenta de la Real

em Xabregas, ao qual Morais assistiu. Por fim, sabe-se que Francisco de Morais foi assassinado em Évora no ano de 1572, por motivo desconhecido68.

Se em Espanha o Palmeirim foi impresso uma única vez (Toledo, 1547), em Portugal há notícias de ao menos quatro edições no séc. XVI, embora sejam conhecidos exemplares de apenas duas: a de 1567 (Évora: André de Burgos) e a de 1592 (Lisboa: António Álvares). É provável que a obra tenha sido impressa pela primeira vez em 1544 e, de acordo com Eugenio Asensio, a esta edição deve ter se seguido outra igualmente perdida, anterior à eborense de 156769. Além do fato de ter conhecido quatro

impressões, fato único no corpus dos livros de cavalarias portugueses, o prestígio da obra no Portugal de Quinhentos é atestado pelas referências a Francisco de Morais e Miraguarda em duas redondilhas de Camões e pela alusão a Palmeirim no Auto dos dois

irmãos, de António Prestes, publicado em 158670. No entanto, o dado que parece ter garantido a fama posterior do livro foi o juízo formulado pelo cura cervantino na sempre lembrada cena do expurgo da biblioteca de D. Quixote:

esa palma de Ingalaterra (sic) se guarde y se conserve como a cosa única y se haga para ello otra caja como la que halló Alejandro en los despojos de Dario, que la diputó para guardar en ella las obras del poeta Homero. Este libro, señor compadre, tiene autoridad por dos cosas: la una, porque él por sí es muy bueno, y la otra, porque es fama que le compuso un discreto rey de Portugal. Todas las aventuras del castillo de Miraguarda son bonísimas y de grande artificio; las razones, cortesanas y claras, que guardan y miran el decoro del que

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