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De acordo com alguns estudiosos do ciclo de vida familiar como Carter e McGoldrick (2001), o momento de transição de uma fase para outra deste ciclo requer flexibilidade do

sistema para mudar regras e outros padrões de relacionamento, a fim de se adaptar à nova fase, o que pode ser estressante e difícil para alguns membros da família, podendo gerar sintomas em um ou mais membros.

Para Minhuchin e Fishman (2003), o essencial do processo de desenvolvimento do ciclo de vida familiar é que a família deve atravessar estágios de crescimento e amadurecimento, enfrentando períodos de crise e de transição. Segundo Minuchin, Lee e Simon (2008), a família deve organizar-se para ajustar-se aos preceitos socioculturais que são modificados em resposta ao crescimento e à mudança de circunstancias, devendo se reestruturar para se adaptar às necessidades modificadas e às expectativas revisadas.

O ciclo de vida familiar vem sendo estudado por diversos autores que se diferenciam com suas classificações distintas. Para Nichols e Schwartz (2007), as famílias precisam se reorganizar para acomodar o crescimento e a mudança de seus membros, uma vez que desenvolvimentos em qualquer geração da família podem ter impacto em um ou em todos os seus membros, mudanças em uma geração complicam os ajustes em outra.

Na opinião de Cerveny e Berthoud (2002), o ciclo de vida individual acontece dentro e concomitante ao seu ciclo de vida familiar, sendo que o indivíduo passa de uma relação dependente nas fases iniciais da vida gradativamente para formas mais independentes de se relacionar com os membros da família até que seu padrão de relações se torna mais equilibrado. Ao longo desse processo, afetos, percepções de papéis e funções, dinâmica das relações e investimento emocional também estão em constante mudança e reorganização, fazendo com que em cada etapa o significado que o sistema adquire na vida particular de cada um seja diferenciado. “A subjetividade individual é construída a partir da subjetividade do sistema, da mesma forma que é construída pelas subjetividades individuais” (p. 22).

As autoras acima citadas caracterizam o ciclo vital da família em quatro etapas não rigidamente circunscritas que são: 1- Família na Fase de Aquisição; 2- Família na Fase Adolescente; 3- Família na Fase Madura e 4- Família na Fase Última.

Carter e McGoldrick (2001) oferecem uma visão do ciclo de vida em termos do relacionamento intergeracional na família, sendo que em cada estágio existe um complexo de papéis distintos para os membros da família, uns em relação aos outros. As autoras propõem seis estágios no ciclo de vida familiar: 1 - o lançamento do jovem adulto solteiro; 2 - a união das famílias através do casamento: o novo casal; 3 - tornando-se pais: famílias com filhos pequenos; 4 - famílias com adolescentes; 5 - lançando os filhos e seguindo em frente e 6 - famílias no estágio tardio da vida. Para elas, o estresse familiar é geralmente maior nos pontos de transição de um estágio para outro e os sintomas tendem a aparecer mais quando há uma interrupção ou deslocamento no ciclo de vida familiar.

Neste contexto e considerando a família como sendo a unidade emocional operativa desde o berço até o túmulo, Carter e McGoldrick (2001) definem o ciclo de vida familiar começando no estágio Saindo de Casa: jovens solteiros. Nesse momento, os “jovens adultos”, têm a tarefa de estabelecer objetivos de vida pessoais e de se tornar um “eu” antes de juntar-se a outra pessoa para formar um novo subsistema familiar, diferenciando-se do programa emocional da família de origem a fim de proporcionar menos estressores verticais para lhe acompanhar no ciclo de vida de sua nova família. Nesta fase os problemas normalmente centram-se na falta de reconhecimento, seja do jovem adulto, seja dos pais e a terapia, freqüentemente, busca ensinar os jovens adultos a se comprometerem com seus pais de uma maneira nova e que modifique o seu status no sistema.

Segundo Carter e McGoldrick (2001), a segunda fase do ciclo de vida familiar é A união das famílias no casamento: o casal. Trata-se do nascimento da família, pela união formal ou informal, sendo caracterizada pela tarefa de aquisição de modo geral: patrimônio,

novas formas de relacionamento, reorganização do sistema, definição e adoção de novos papéis. Os cônjuges re-negociam valores e regras de relacionamento a fim de construir um novo modelo particular da família que se forma.

As mudanças atuais na família estão colocando uma carga muito maior sobre os casais, no sentido de definirem seu próprio relacionamento, do que ocorria nas estruturas familiares tradicionais. Em nossa cultura atual, os casais estão menos amarrados por tradições familiares e mais livres do que nunca para desenvolverem relacionamentos diferentes daqueles que experenciaram em suas famílias de origem. Dessa forma, conseguir uma boa transição para o estado conjugal na nossa época, quando se tenta chegar à igualdade dos sexos, em termos educacionais e ocupacionais pode ser realmente difícil (CARTER; MCGOLDRICK, 2001).

Ainda segundo as autoras, os problemas que refletem a incapacidade em modificar o status familiar são normalmente indicados por fronteiras deficientes em torno do novo subsistema, o que pode indicar que os membros do casal estão muito emaranhados com suas próprias famílias para definirem um novo sistema e aceitarem as implicações desse realinhamento.

Segundo Penso (2003), para se separar e criar um novo sistema familiar, o indivíduo deve ser cada vez menos essencial para sua família de origem, que continuará existindo sem ele, mas à qual ele não deixará de pertencer. A família extensa vai participar do processo de redefinição dos relacionamentos, exigindo mudanças estruturais e renegociação de papéis.

Neste período inicial é importante que os cônjuges elaborem acordos (explícitos ou não) sobre como interagir com seus familiares, como lidar com as diferenças e quanto aos aspectos práticos da vida a dois. Tais decisões são permeadas pela concepção de cada um a respeito do modelo familiar e pelo que foi aprendido até aqui (SATTLER; ESCHILETTI; BEM; SCHAEFER, 1999).

Pittman (1994, apud SATTLER et al., 1999) afirma que o casamento é um ritual que marca para o casal o inicio de uma nova fase em busca de independência ao mesmo tempo em que conserva o vínculo emocional com os parentes. Após um tempo de casado, surge o final do período do romance, é o luto da paixão que pode gerar desilusões e desapontamentos. Essa fase termina quando a pessoa consegue se desfazer dessas desilusões e os cônjuges se aceitam como são, dando início à fase da estabilidade, que pode durar anos através do perdão e da aceitação das características individuais de cada um, o que facilita a negociação das diferenças, permitindo espaço para a individualidade. O investimento em aspectos individuais se for intenso, pode resultar em separação, mas pode, se na medida certa, levar à fase do comprometimento na qual o casal adquire capacidade de manejar tensões e conflitos, cedendo sem que isso represente uma perda, dando início à fase da co-criação, pois estão comprometidos com o futuro e se sentem em condição de devolver ao mundo o que construiu ao longo da vida em comum.

Para Carter e McGoldrick (2001), a mudança para o estágio do ciclo de vida da Família com filhos pequenos requer que os adultos avancem uma geração e se tornem cuidadores da geração mais jovem. Problemas típicos que ocorrem quando os pais não conseguem fazer essa mudança são as brigas entre eles sobre assumir responsabilidades, recusa ou incapacidade de comportar-se como pais com seus filhos, que podem estar não aceitando a fronteira geracional entre eles.

A briga central nessa fase é quanto à disposição das responsabilidades e cuidados à criança e pelas tarefas domésticas quando ambos os pais trabalham em tempo integral. Para trabalhar de forma proveitosa com esses casais é necessário lidar com as questões de gênero e com o impacto do funcionamento de papel sexual que ainda é considerado como a norma pela maioria dos homens e das mulheres. Para as autoras não é de se surpreender que esta seja a

fase do ciclo de vida familiar que possui o índice mais elevado de divórcios (CARTER; MCGOLDRICK, 2001).

A adolescência introduz uma nova época, pois assinala uma nova definição dos filhos dentro da família e dos papéis dos pais em relação aos seus filhos. As famílias com adolescentes, quarta fase do ciclo de vida da família, devem estabelecer fronteiras qualitativamente diferentes das famílias com filhos mais jovens, um trabalho dificultado, em nossa época, pela ausência de rituais que facilitem essa transição. As fronteiras, agora, devem ser permeáveis e flexíveis, permitindo aos adolescentes se aproximarem e serem dependentes nos momentos em que não conseguem manejar as coisas sozinhos, e se afastarem e experimentarem, com graus crescentes de independência, quando estão prontos (CARTER; MCGOLDRICK, 2001).

Nesse momento, pais e filhos estão vivendo a adolescência, período de profundas transformações pessoais e relacionais caracterizada pelo questionamento de crenças, regras e valores. Há, então, uma alteração no sistema, as relações são revistas e readaptadas, havendo mudanças de segunda ordem na organização familiar o que permite a família prosseguir seu desenvolvimento (CERVENY; BERTHOUD, 2002).

2.5.1 – Lançando os filhos e seguindo em frente

Para Carter e McGoldrick (2001), essa fase do ciclo de vida familiar é a mais nova e a mais longa, sendo também a mais problemática de todas as fases, onde ocorre o maior número de saídas e entradas de membros da família. Essa fase necessita de uma nova estruturação do relacionamento conjugal, agora que não são mais necessárias as responsabilidades paternas.

Em virtude do baixo índice de natalidade e do longo período de vida da maioria dos adultos, os pais lançam seus filhos quase 20 anos antes de aposentar-se, e devem então

encontrar outras atividades de vida. As dificuldades dessa transição podem levar as famílias a se agarrarem aos filhos ou conduzir a sentimentos paternos de vazio e depressão (CARTER; MCGOLDRICK, 2001).

Nesse momento, os filhos atingem a idade adulta e a família passa a vivenciar o período da maturidade, com a tarefa de mudar os relacionamentos entre pais e filhos, que agora são iguais em independência e capacidade de gerenciar as próprias vidas. Os filhos, nesse momento, desafiam os pais a rever suas metas de vida e geram transições importantes, levando à reestruturação do sistema conjugal. Além disso, os pais estão lidando, nesse momento, com a perda do papel funcional pela aposentadoria e mudanças no padrão de vida e precisam se adaptar à entrada de novos membros na família extensa e, mais uma vez, renegociar regras e padrões de relacionamento (CERVENY; BERTHOUD, 2002).

Segundo Minhuchin e Fishman (2003), neste estágio do ciclo de vida familiar, os filhos já formaram seus próprios compromissos, carreira, amigos e parceiro. A família originária é novamente uma família de dois, formada pelo subsistema conjugal. Este novo estágio requer uma clara reorganização sobre formas de relacionamento entre pais e filhos, todos adultos.

2.5.2 – Família no estágio tardio da vida

Na visão de Carter e McGoldrick (2001) existem poucas visões na cultura norte americana que nos fornecem perspectivas positivas para um ajustamento sadio na terceira idade. Os mitos atuais nessa sociedade são de que a maioria dos idosos não têm famílias ou que pouco se relacionam com elas e normalmente são colocados em instituições. Porém, a vasta maioria dos adultos acima de 65 anos de idade não vive sozinha, mas com outros membros da família. Outro mito sobre os idosos é que eles são doentes, senis e frágeis, e que

podem ser manejados melhor em asilos ou hospitais. Somente 4% dos idosos vivem em instituições e a idade média de admissão é 80 anos.

Entre as tarefas das famílias no estágio tardio da vida estão os ajustamentos à aposentadoria, a insegurança, a dependência financeira e a perda de um cônjuge que pede a reorganização da vida sozinho, depois de muitos anos como casal. A condição de avós pode proporcionar um renovado interesse pela vida nesses casais que experienciam uma satisfação conjugal aumentada após ajustar-se ao lançamento dos filhos e durante seus últimos anos juntos. O companheirismo, o interesse e cuidados mútuos tornam-se altamente valorizados no relacionamento conjugal, bem como a intimidade sexual, que continua para muitos em anos avançados (CARTER; MCGOLDRICK, 2001).

Além disso, segundo essas autoras, os relacionamentos passados e presentes desempenham papel importante na resolução da tarefa de obtenção de um senso de integridade com relação à aceitação de nossa própria vida e morte. Para elas, a resposta de cada família aos desafios do estágio tardio da vida decorrem de padrões familiares anteriores desenvolvidos ao longo do ciclo de vida familiar para manter a estabilidade e a integração, sendo que a maneira pela qual a família e seus membros lidam com essa situação depende do tipo de sistema que criaram ao longo dos anos e da capacidade e formas do sistema de ajustar- se às perdas e às novas exigências.

Na opinião de Santos e Dias (2008), é uma etapa que tem se estendido bastante, dada a maior longevidade humana, porém traz à tona a velhice como a fase que se aproxima da finitude pessoal e da ideia inevitável da viuvez e perda de amigos e parentes. Para as autoras, as transformações pelas quais a família passa ao longo do tempo como também o papel do idoso no contexto familiar leva a uma nova relação inter e transgeracional.

Camarano (2003) afirma que o envelhecimento, que antes trazia para as mulheres brasileiras pobreza e isolamento, hoje não significa mais que é o final da vida ativa, podendo

significar uma nova fase do ciclo de vida, pois deixou de ser residual para ser uma fase de duração até maior do que a infância e a adolescência. As idosas hoje estão assumindo papéis e tornando-se importantes agentes de mudança social. Tais mulheres passaram do seu papel tradicional para o de provedoras nas famílias.

Hayflick (1997, apud REIS, 2007) refere que o tornar-se velho é um fenômeno relativamente novo, pois as pessoas morriam antes de envelhecer. Tal fato vem impondo uma revisão e readaptação nos conceitos e concepções do envelhecimento, que é uma fase do desenvolvimento humano.

Compreender o casal a partir da perspectiva do ciclo de vida familiar facilita na compreensão dos modelos e padrões de comportamento transmitidos e/ou construídos pelo casal e família de origem para se adaptar aos momentos de tensão enfrentados pela família. Isso irá nos ajudar na identificação e compreensão desses padrões de enfrentamento à aids.