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Para Anton (2000), a mulher hoje almeja satisfações eróticas e se sente no direito de experimentá-las e o homem tem manifestado interesse e empenho em agradar suas parceiras. Essa mudança de posturas tem sido estimulada e diretamente validada por mudanças em um contexto cultural mais amplo, conforme relatado. Além disso, a autora acredita que as crenças abrigadas e compartilhadas pelos casais influenciam intensamente sua vida sexual e afetiva por possuírem forte significado para eles.

Segundo Zampieri (2004), a sexualidade conjugal necessita da abordagem sistêmica para ser compreendida, uma vez que a trama de aspectos clínicos, hormonais, psicológicos, culturais, antropológicos, sociais e comportamentais tem múltiplas, complexas e infinitas combinações. Além disso, a sexualidade é um processo dinâmico e mutável que atravessa estágios e crises ao longo da vida. Cada estágio sexual enfrentado precária ou adequadamente pode ser considerado um rito de passagem. Em conformidade com esse pensamento, Ribeiro (1996) afirma que a sexualidade está presente durante toda a vida do indivíduo, do nascimento à morte, sendo que sua expressão sofre variações de acordo com a fase do ciclo vital que a pessoa estiver vivendo.

Estando a sexualidade presente na vida dos indivíduos, casais e famílias, e diante do exposto sobre transformações nos papéis sexuais e na função do sexo na vida conjugal, faz-se necessário discutir tal questão no que diz respeito à capacidade de desfrutar de uma vida sexual satisfatória e saudável, sem riscos de doenças sexualmente transmissíveis, principalmente a partir da década de 1980, com o surgimento da aids, que inicialmente atingiu alguns grupos específicos para ser realidade na vida sexual de qualquer pessoa, principalmente os casais heterossexuais, entre os quais a doença vem se disseminando mais rapidamente.

A expressão da sexualidade também vem sofrendo mudanças, porém de forma mais lenta por se tratar de um tema tabu no Ocidente. Com o surgimento da pílula que libertou mulheres e homens dos riscos de gravidez, libertou também o próprio relacionamento sexual que foi avançando e as relações foram-se construindo em torno dessa liberdade. Com o surgimento da aids, o relacionamento sexual enfrenta novos desafios, surgindo o fantasma que limita a liberdade sexual pelo medo da infecção pelo HIV. Contudo, existem crenças que dificultam a prevenção, como o fato do desejo estar culturalmente constituído como perda de racionalidade, do pensar e do prevenir (ZAMPIERI, 2004).

Na relação heterossexual, a confiança e o romantismo que permeiam as relações amorosas, o significado de fidelidade e de relacionamento conjugal, bem como a interiorização dos valores familiares e de sexualidade e o processo de construção de crenças por um casal, favorecem ou não o comportamento de prevenção.

Para Zampieri, M. A. J. (2004), existe no Brasil consciência sobre o risco de aids, porém quando se trata de mulheres casadas, que desempenham papéis de esposa e de mãe, estas negam sua vulnerabilidade. Quanto ao homem casado, essa consciência de risco à aids esbarra na definição de masculino e na crença disseminada de que as mulheres não transmitiam o HIV a seus parceiros. Além disso, a autora afirma que não basta propor o uso

do preservativo, pois a maioria dos casais não se considera vulnerável ao HIV. Para o homem o uso do preservativo com sua companheira pode sugerir que está tomando precauções, uma vez que supostamente teria uma doença sexualmente transmissível e levaria a companheira a supor que há algo de errado, criando uma situação de discriminação e constrangimento. Somado a isso, a autora acredita que a submissão cultural feminina tem a ver com a dificuldade da mulher em negociar firmemente o uso de preservativo com seus maridos, caso eles não queiram usar.

Para Finkler (2004), a questão preventiva da aids em casais não pode ser tratada fora do contexto conjugal, uma vez que a negociação para a prática do sexo seguro é permeada pelo estilo do casal que engloba as regras e acordos relacionais, a maneira como se comunicam e como definem sua relação, podendo ser um desafio para muitos casais. Além disso, o casamento e as relações a longo prazo são vistos como incompatíveis com o uso de preservativo, já que sua utilização sugere a ruptura com o modelo monogâmico de sexualidade no casamento, assim como honestidade e confiança na relação.

Zampieri (2004) aborda o assunto trazendo o conceito de co-dependência sexual a fim de denunciar sua gravidade. A autora se refere aos casos em que os parceiros, mesmo temendo contrair doenças sexualmente transmissíveis, omitem-se ou consentem em continuar se relacionando. Isso tende a calar parceiros frente aos riscos, muitas vezes, evidentes, o que, segundo a autora, não pode acontecer perante os índices crescentes de HIV em mulheres casadas. Para ela, a co-dependência sexual é socialmente admitida e culturalmente estimulada.

A vida sexual é considerada um dos eixos da vida em casal, por meio da qual os sentimentos e o amor são expressos, sendo uma forma íntima de comunicação e entrega onde o que é negociado é a satisfação do desejo e do prazer e não a saúde sexual. O risco que casais heterossexuais têm de se verem como portadores ou como possíveis portadores do HIV é

mínimo, visto que não se consideram sujeitos desta realidade, nem como receptores nem com necessidades de prevenção (ZAMPIERI, 2004).

A sexualidade é, então, complexa e sistêmica, envolve questões de gênero, papéis, poder, hierarquia, crenças e mitos. É importante identificar os padrões relacionais de um casal heterossexual e sua sexualidade, cuja compreensão visa favorecer a conscientização quanto às atitudes sexuais de vulnerabilidade à aids. Verifica-se que, embora exista um bom nível de conhecimento sobre a aids e sua prevenção, isso não leva os indivíduos a adotarem medidas preventivas, que são, muitas vezes, barradas por crenças e mitos construídos social e culturalmente e existentes na família e na relação conjugal. Tal questão implica mudanças sociais e de re-negociação no relacionamento conjugal no que diz respeito a gênero, poder, comunicação, papéis e sexualidade.