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3.2 NARRATIVA JORNALÍSTICA NO CONTEXTO DA CONVERGÊNCIA

3.2.4 Circulação multiplafatorma

A distribuição multiplataforma, como o nome diz, é a oferta de conteúdo em diversas plataformas. A dimensão está relacionada com as opções de distribuição e tratamento dado ao conteúdo multiplataforma.

Inicialmente, a dimensão da multiplataforma é uma consequência da diversificação midiática das corporações jornalísticas, ao expandirem seus negócios para distinta mídias em busca da ampliação e da diversificação da audiência e da publicidade. O leque de possibilidades da multiplataforma também é ampliado em função das apropriações das mídias sociais e da mobilidade.

A diversificação midiática está relacionada com estratégias de fusão e cooperação entre empresas do setor jornalístico e com outros campos da comunicação e da tecnologia de informação. Portanto, há relação com a aquisição de novas plataformas para a oferta de produtos jornalísticos, como uma emissora de televisão que adquire um jornal, e com a expansão para o meio digital, o que inclui, inicialmente, a versão online de um produto offline (jornal, revista, rádio e televisão), situação chamada de convergência retórica por Erdal (2007), bem como as versões para plataformas móveis, como smartphones e tablets.

Convergência tem mudado a forma como as notícias têm sido feitas. Digitalização e convergência tecnológica são os meios para que as plataformas midiáticas sejam facilmente cruzadas. Conteúdo pode facilmente ser compartilhado entre jornalistas que fazem notícias para televisão, rádio e web. Organizações midiáticas cada vez mais integram produção de diferentes plataformas midiáticas, a fim de incentivar cooperação entre redações. (ERDAL, 2007. p. 58)

As corporações jornalísticas começaram a explorar novas plataformas para a apresentação dos conteúdos, como os blogs, que, atualmente, voltam-se para nichos específicos da audiência122; para apresentar notícias de última hora – algumas vezes, inclusive, em tempo real; além de atualizar os mais diversos conteúdos e, em alguns casos, reproduzir colunas, charges e outros materiais provenientes das demais plataformas.

Na internet, os jornais e revistas apresentam versões digitalizadas completas sob o formato flip, que imitam o folhar das páginas impressas. As versões flip geralmente são

122O Link, espaço de tecnologia do Estadão.com.br, é um exemplo da diversificação dos blogs e da tendência a atender os mais diversos interesses dos leitores. Atualmente, o Link tem 14 blogs: Lol (coisas engraçadas da internet), Nhom (vídeos de bichos na internet), P2P (cultura digital), Personal Nerd (dicas de informática e internet), Que Mario? (games), Sempre a mão (mídia móveis), TV sem TV (mudança de comportamento dos telespectadores), Retrospectiva em Tempo Real e dos integrantes da equipe da editoria: Alexandre Matias, David Pogue, Gabi e Groc, Pedro Doria, Renato Cruz e Rodrigo Martins.

disponibilizadas de forma paga conjunta ou separadamente da assinatura. É possível que as versões flip sejam disponibilizadas por um período de experimentação de forma gratuita. Além dos blogs e das versões flip, como mostram os autores Salaverría e Negredo (2008), o meio digital pode significar uma oportunidade para investir em outros formatos, a exemplo de jornais, que hoje têm emissoras de rádio e/ou TV online.

A multiplataforma também compreende a disponibilização de conteúdo por meio de dispositivos móveis (celular, smartphone, tablets123), mídias sociais a partir das quais o conteúdo pode ser acessado ou comentado (Twitter, Facebook) e agregadores e recursos cuja finalidade é ampliar a circulação e diversificar a distribuição (RSS, SMS, MMS, newsletter).

Para Pellanda (2005), os conteúdos para plataformas móveis exigem que se pense em termos de interface, linguagem e experiência. Essas três questões devem nortear a produção e a circulação dos conteúdos para móveis, provocando, assim, alterações no consumo da informação jornalística em cada dispositivo. Ao considerar que existe um número expressivo de diferentes modelos de plataformas móveis, principalmente de smarphones, seria inviável conceber um aplicativo para cada um. No entanto, alguns produtos jornalísticos tendem a agrupar as plataformas móveis conforme as principais características (celulares, smartphones

e tablets124).

Com isso, a internet móvel torna-se uma questão essencial na circulação multiplataforma. Conforme Pellanda (2005), a mobilidade permite que se tenha um ambiente de mídia always on (sempre ligada). As mídias estão em todos os lugares, tornam-se onipresentes, podendo ser transportadas com o usuário e permitindo a conexão em todos os espaços em que existam redes, por exemplo, Wi-Fi125 e GSM/GPRS126. “Temos, pela primeira

123Dispositivos móveis em forma de prancheta cujos dados visíveis na interface são acessados mediante o toque dos dedos ou de uma caneta especial. Um dos principais exemplos de tablet é o iPad, da Apple. Mas também existem modelos de outras marcas, como Kindle (Amazon); Courier (Microsoft), Galaxy Tab ( Samsung), N900 ( Nokia), Daily Edition (Sony), Slate (HP) e Adam (Notion Inc.).

124Em palestra no Media On, o coordenador de infografia da Revista Época, Alberto Cairo, aponta que, apesar das incertezas em relação aos conteúdos jornalísticos voltados para os tablets, existem, atualmente três tendências: (1) produtos que reproduzem a experiência das demais mídias digitais, como USA Today e New York Times; (2) produtos que apostam no “pdf turbinado”, a exemplo da revista Wired, que oferece uma versão da revista impressa com diversos recursos multimidiáticos, inclusive aqueles que permitem manipulação da imagem; e (3) produtos híbridos, que mesclam as duas tendências anteriores, a exemplo da revista Época. 125Sigla para rede sem fio disponível, por exemplo, em aeroportos, universidades e cafés.

126Sigla para Global System for Mobile Communications (Sistema Global para Comunicações Móveis). É uma das tecnologias mais utilizadas pelos dispositivos móveis, a qual é modulada pelo sistema TDMA (Time Division Multiple Access ou Acesso Múltiplo por Divisão de Tempo), que divide o canal de frequência em até seis intervalos de tempo. Com o uso da tecnologia GPRS (General Packet Radio Service ou Serviço de Rádio de Pacote Geral), a taxa de transferência de dados da rede GSM é ampliada e o acesso à internet móvel de alta velocidade é possibilitado. Os dispositivos móveis com GSM também estão sendo modulados com a tecnologia EDGE (Enhanced Data rates for GSM Evolution), a qual possibilita melhorar e aumentar a confiabilidade da transmissão de dados.

vez, a potência da mobilidade física acoplada à mobilidade informacional, isto é, a possibilidade de consumir, produzir e distribuir informação em deslocamento pelo espaço urbano” (LEMOS; LÉVY, 2010, p. 108).

Ao comparar o período mais recente do uso das mídias móveis no jornalismo com as primeiras utilizações, Aguado e Martínez (2008) destacam que houve avanço do simples envio de alertas SMS para um cenário de Móvel 2.0. Os autores enfatizam que a denominação Móvel 2.0 não se restringe ao uso de ferramentas Web 2.0, mas contempla a mudança de estágio da comunicação móvel, repercutindo nos formatos de conteúdos, na produção e circulação de informação, nas rotinas profissionais e na relação com a audiência.

Sobre os conteúdos, Aguado e Martínez (2008) comentam que a reconfiguração ocorreu com a substituição da rede Wap para GPRS e Wi-Fi, e o salto qualitativo dos dispositivos móveis, também em termos de conexão, que tornaram possível a exploração de diferentes formatos, incluindo o uso de vídeo e de ferramentas da Web 2.0. Em relação aos conteúdos destinados às mídias móveis é importante acrescentar que além dos celulares e dos smartphones, os tablets configuram-se como um diferente dispositivo móvel destinado a outros usos e, portanto, requer conteúdos diversificados.

Na primeira etapa da mobilidade no jornalismo, a produção de conteúdos é de baixa complexidade e, como lembram Aguado e Martínez (2008), existe uma dependência grande das operadoras de telefonia móvel. Por isso, os primeiros conteúdos são principalmente reproduzidos de outras plataformas, como notícias de última hora, ou têm objetivo promocional, como os serviços obtidos a partir do envio de torpedo. Com a navegação móvel também de forma pública, a diversificação de conectividade e a ampliação de banda, as empresas jornalísticas ganham autonomia na produção e circulação de conteúdos para os dispositivos móveis.

Em relação às rotinas profissionais, Aguado e Martínez (2008) citam experiências desenvolvidas por empresas em conjunto com jornalistas, como plataformas e softwares de edição móvel e streaming, bem como o uso dos dispositivos móveis como uma ferramenta fundamental para os jornalistas que atuam para qualquer meio.

Os dispositivos móveis são considerados, pelos autores, como cruciais para ampliar o valor agregado a partir da participação da audiência por meio de fóruns, blogs e envio de informações, fotos e vídeos. Assim, “este aspecto situa o móvel na encruzilhada entre as práticas unicamente jornalísticas e aquelas outras próprias do jornalismo participativo”

(AGUADO; MARTÍNEZ, 2008, p. 114)127. Portanto, a mobilidade amplia o registro e a distribuição de todo o tipo de informações, das de cunho hiperlocal às de abrangência global.

Também se configura dentro do contexto da internet móvel o Mojo (Mobile

Journalist), caracterizado pelo uso de dispositivos móveis para obter, produzir e distribuir informação, seja em formato de texto, áudio, vídeo ou fotografia. Sobre o Mojo, Quinn (2010) aponta que todo cidadão portador de um celular com câmera é um potencial jornalista móvel. Reconhece-se que o simples fato de ter o equipamento não significa que se tenha domínio técnico, discernimento para saber o que é relevante para as demais pessoas e, até mesmo, interesse em atuar como Mojo. Entretanto, os celulares atuais ampliam a gama de apuração e produção dos conteúdos, tanto por parte dos jornalistas quanto pelos cidadãos.

Com o jornalismo móvel, é possível experimentar narrativas, como os blogs móveis ou moblogs. Pellanda (2008) explica que os moblogs são blogs narrados e consumidos em tempo real e, por isso, geram uma blogosfera móvel. Conforme o autor, os moblogs podem ser utilizados em aparelhos simples, mas com a possibilidade de envio de fotos e vídeos a narração se torna mais rica.

Além das práticas de jornalismo móvel, a ubiquidade possibilita uma outra categoria de produção, distribuição e apresentação de informações, considerada por Lemos (2009) como jornalismo locativo. Segundo o autor, o jornalismo locativo é feito a partir do uso de tecnologias e serviços de localização, como os celulares com GPS128. O jornalismo locativo faz com que o usuário tenha acesso às informações dos locais por onde passa ou pretende passar e, ainda, se tiver interesse, adicione comentários, fotos e vídeos.

O conjunto de transformações causadas pelo atual estágio da mobilidade, com internet sem fio, diversidade de conexões e de dispositivos móveis bem equipados, amplifica, ao mesmo tempo, a dimensão da multiplataforma e as funções pós-massivas. Promove alterações na narrativa jornalística, ao exigir e proporcionar diferentes formatos de apresentação das histórias, ao divulgar em tempo real o que ocorre em qualquer lugar que exista conexão móvel. Além disso, a mobilidade pode acrescentar narradores, personagens e histórias – as hiperlocais.

127No original: “este aspecto situá al móvel em la encrucijada entre las practicas netamente periodísticas y aquellas otras proprias del periodismo participativo” (AGUADO; MARTÍNEZ, 2008, p. 114) [Tradução do autor da dissertação].

128Geo-Posicionamento por Satélite ou Sistema de Posicionamento Global. Trata-se de um sistema de informação que fornece a um dispositivo móvel sua posição, tendo como referência as coordenadas terrestres.

As diferentes formas de tratamento da narrativa jornalística dentro do ambiente de convergência, em especial, potencializadas pela multiplataforma, é o tópico abordado a seguir.