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P ARÂMETRO ACÚSTICO I MPRESSÃO AUDITIVA

5 Procedimentos metodológicos

5.4 A avaliação fonética auditiva e acústica

5.4.2 A codificação pela análise acústica

A análise acústica foi realizada através do programa praat119, utilizando,

principalmente, os recursos do oscilograma e do sonagrama, adicionado à visualização de quatro formantes. O sonagrama foi configurado para mostrar as freqüências de 0 a 5.500Hz, sendo aumentado, quando necessário, especialmente no caso das fricativas, para freqüências de 0 a 10.000Hz.

A escolha dos parâmetros para a descrição acústica é orientada por Hess

(2005:2)120, que especifica os critérios abaixo para a descrição de consoantes, aos quais adicionamos o critério de vibração (5), que é específico dos róticos.

119 Comparar seção 5.4.1.

120 A paginação, neste caso, se baseia no documento disponível na internet em formato pdf na URL: www.ikp.uni-bonn.de/dt/ lehre/materialien/aap/aap_3f_4p.pdf

1) Transições entre os formantes

- alcançando o locus formantal: sim ou não

2) Vozeamento (voice bar)  esse critério foi posteriormente descartado - sim ou não

3) Explosão / Estouro - sim ou não

- caso sim: em qual freqüência? 4) Fricção

- sim ou não

- caso sim: em qual freqüência? 5) Vibração

- sim ou não

- caso sim: quantas batidas, em que freqüência?

Porém, devido à filtragem diferente empregada nas diversas gravações, não

obtivemos dados acústicos relativos a todos esses critérios para todos os falantes. As freqüências altas, especialmente, às vezes não são bem distinguidas no material digitalizado.

Na análise acústica revisamos primeiro as propriedades acústicas de todos os 9 tipos de rótico descritos pelos critérios auditivos mencionados anteriormente. Essa revisão levou a uma segunda proposta de classificação. Após a comparação entre resultados auditivos e acústicos, chegamos a recodificar aqueles dados que antes tinham sido marcados como casos de dúvida. A recodificação atingiu

aproximadamente 15% do corpus, recaindo especialmente nos tipos auditivos 1 e 2, que precisamos rever completamente depois da análise acústica. Vejamos, nos parágrafos a seguir, as etapas de análise desses dois tipos.

Escolhemos, para a ilustração dessa comparação entre análise auditiva e acústica, um exemplo identificado como tipo “2”. Esse é um dado que mostra uma alta correlação entre as características auditivas e acústicas, o que não acontece em todos os tipos e todas as ocorrências. Optamos por mostrar essa ocorrência em primeiro lugar, para depois discutir os casos em que as análises auditiva e acústica não convergem tão bem uma com a outra. Nas duas figuras abaixo vemos primeiro (figura 23) a imagem do oscilograma e do sonagrama em um trecho de

aproximadamente 0,18s do rótico na freqüência de até 8.000Hz. A consoante é realizada dentro da seqüência “bem caro também”, ou seja, encontra-se entre as vogais “a” e “o”. Em seguida, temos a figura 24, comparando em uma sinopse as características perceptuais e acústicas do rótico nessa ocorrência. A descrição da análise acústica segue logo após as figuras.

Figura 23. Oscilograma e sonagrama do rótico do tipo 2 no exemplo de “bem caro também”.

exemplo: “bem caro também” critérios auditivos

no. estouro vibração aspiração fricção zona

2 com sem Sem sem alveolar

critérios acústicos

no. estouro vibração fricção transição formantal 2 redução de energia

antes; amplitude até 8.000Hz

sem sem locus da consoante alveolar é

marcado pela direção que o formante 2 apresenta (em torno de 1800Hz) Figura 24. Quadro dos critérios e características auditivas e acústicas do tipo 2.

Na comparação direta entre as características descritas pela análise auditiva e acústica vemos que se verificou a impressão perceptual da presença de um estouro que apresenta no sonagrama duas faixas de maior energia, a primeira entre 1400Hz e 2700Hz, e a segunda entre 4500Hz e 8000Hz. Não estão presentes batidas de uma vibração, nem temos indícios de uma fricção no sonagrama. O vozeamento é interrompido por aproximadamente 0,002s, imediatamente antes do estouro, que logo é acompanhado por vozeamento novamente. O segundo formante (F2) aponta na direção de 1800Hz (ver HESS, 2005) que indica a articulação alveolar. Na classificação articulatória de consoantes, trata-se, no caso, do rótico tipo 2 do tepe alveolar [ɾ].

Com o sonagrama abaixo apresentamos um exemplo de uma variante que

classificamos anteriormente como tipo auditivo no. 2, ou seja, como tepe alveolar. Porém, na análise acústica revelaram-se propriedades muito diferentes do tepe, conforme acabamos de descrever acima. Depois de conhecer suas propriedades acústicas, percebemos que essa variante apresenta características consonantais muito vagas, de difícil classificação. Revimos, então, todas as ocorrências de classificações do tipo 1 e 2 e recodificamos mais que 220 casos. A grande maioria deles foi recodificada de 2 para 1.

Figura 25. Oscilograma e sonograma do rótico do tipo 1 em “o morro todinho”. Na figura 25., no caso do tipo 1, vemos uma diminuição de energia até a marcação vertical vermelha e depois disso percebemos um aumento. Ambos os processos ocorrem continuamente sem um movimento abrupto (um estouro). A transição dos formantes é quase linear. Não há uma faixa de energia de fricção visível.

exemplos: “o morro todinho” critérios auditivos

no. estouro vibração aspiração fricção Zona

1 sem sem ? ? alveolar?

critérios acústicos

no. estouro vibração fricção transição formantal 1 não, diminuição e aumento da energia contínuos sem muito pouca ou sem

segundo formante (F2) quase linear, na faixa de 1.700Hz

Figura 26. Quadro dos critérios e características auditivas e acústicas do tipo 1 no exemplo “o morro todinho”.

O que chama atenção é a ausência de características consonantais marcantes que mostrem nessas ocorrências a qualidade de um tepe, por exemplo, já que se trata de uma articulação alveolar, ou de uma vibração. A impressão de propriedades consonantais vagas se mantém, quer as resultantes da análise auditiva, quer as da análise acústica. Concluímos que pode se tratar de uma articulação semi-vogal ou aproximante. No capítulo 6 voltaremos a discutir esse tipo com mais detalhes.

No caso da avaliação auditiva do tipo número 8, não chegamos a uma conclusão sobre a zona de articulação. Na análise acústica percebemos a aproximação e, muitas vezes, até o cruzamento dos formantes F3 e F4, o que aponta para a articulação uvular. Na seção 6.1 mostramos o sonagrama e o oscilograma dessa variante, mas antecipamos aqui o resumo da comparação auditiva e acústica, de modo análogo ao que foi feito nos casos anteriores.

exemplo: ”aquela barragem” critérios auditivos

no. estouro vibração aspiração fricção Zona

8 sem sem ? com ?

critérios acústicos

no. estouro vibração fricção transição formantal 8 sem sem faixas de energia

baixa até 800Hz

F3 e F4 aproximam-se em torno de 3.000Hz, F1 abaixa-se

Figura 27. Quadro dos critérios e características auditivas e acústicas do tipo 8, no exemplo “aquela barragem”

Com a exposição acima, iniciamos a apresentação dos nossos resultados, explicando e dando exemplos da codificação realizada nas avaliações auditiva e acústica. Pela seqüência analítica do paradigma da grounded theory, segue, após a codificação, a amostragem teórica, cujo processo é percorrido na apresentação dos resultados no capítulo 6. Em seguida, no capítulo 7, descrevemos as variantes representadas na gramática de cada indivíduo, buscando por indícios da organização e relação (= nível fonológico) entre as variantes (fonéticas).

5.5 Resumo do capítulo

Neste capítulo introduzimos o paradigma metodológico da grounded theory,

analisando a sua adaptabilidade ao nosso quadro teórico, exposto no capítulo 4, e ao nosso objetivo de chegar a uma análise fonético-fonológica dos róticos

representados nas gramáticas individuais de falantes de Blumenau e Lages. Argumentamos em favor de um procedimento qualitativo, exploratório e aberto. A metodologia guiada pela grounded theory exige, como uma das suas partes

integrantes, a explicitação transparente e detalhada dos passos analíticos, o que fizemos, elaborando e exemplificando o caminho pelo qual chegamos à codificação auditiva e acústica dos dados. Enquanto a codificação é compreendida como uma pré-seleção de possíveis categorias, em nosso caso, as 9 variantes encontradas em todo o corpus, a próxima etapa, a amostragem teórica, que percorremos no capítulo 6, consiste em uma análise mais aprofundada, testando a robustez das categorias. Já antecipamos que, no capítulo 6, argumentaremos não em favor de variantes com delimitações categóricas, e sim, em prol de tratar essas variantes como pontos proximais em uma escala contínua.

No que concerne à forma como estão à nossa disposição os dados no banco do VARSUL, descrevemos o seu levantamento nas entrevistas com os falantes de Blumenau e Lages conforme a metodologia utilizada pelo referido projeto. Depois explicamos a investigação dos fatores biográficos e o nosso recorte dos dados lingüísticos intrínsecos. Nas informações biográficas, o nosso interesse principal recai, no caso de Blumenau, sobre a aquisição dos dois idiomas e o contato com o alemão durante a vida dos informantes até hoje em dia. No caso de Lages,

perquirimos as informações fornecidas pelos entrevistados em relação a possíveis influências culturais e / ou lingüísticas do alemão também nessa cidade.