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O interesse de Raymundo Ottoni de Castro Maya (1894 - 1968) por livros raros foi, provavelmente, herdado de seu pai36, que possuía uma biblioteca com exemplares requintados e luxuosamente encadernados. A família de Castro Maya possuía o gosto pelo colecionismo e pelo financiamento das artes. Castro Maya pai se destacou na elite cultural carioca do século XIX, como preceptor dos filhos de Dom Pedro II, além de ter sido vice-cônsul do Brasil em Paris. A coleção da família começou com a aquisição de objetos da elite imperial no Leilão do

Paço37. Em Paris, a coleção aumentou com a aquisição de telas de Gustave Courbet, Theodore

Rousseau, Hippolyte Bellangé, Nicolas-Antoine Taunay e de um vasto acervo bibliográfico. (HERKENHOFF, 1996). Entretanto, a biblioteca paterna foi desfeita em leilões parisienses em 1932.

É possível situar a ideia de criar a Sociedade dos Cem Bibliófilos do Brasil depois que Castro Maya resgatou o livro de Baudelaire, Les Fleur du mal, (Fig. 4) ilustrado por Armand Rassenfosse, editado pelo grupo Les Cent Bibliophiles, em 1899. Esse exemplar era da biblioteca de Castro Maya pai e havia sido vendido em um leilão. Surgiu a partir daí a motivação do filho em criar um grupo semelhante no Brasil. (SIQUEIRA, 2010).

Figura 4 – BAUDELAIRE, Charles. Les fleurs du mal. Ilustração: RASSENFOSSE, Armand, Les Cent Bibliophile, 1899.

Fonte: Biblioteca de Castro Maya do Museu Chácara do Céu – Rio de Janeiro. Foto: Da autora.

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Raymundo Ottoni de Castro Maya (1856-1935) pai de Raymundo Ottoni de Castro Maya (1894 - 1968), criador da Sociedade dos Cem Bibliófilos do Brasil. Para evitar ambiguidades, nos referiremos ao pai como: Castro Maya pai, e ao filho por Castro Maya.

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Realizado após a Proclamação da República, em 1889, nesse leilão havia objetos históricos, mobiliário, antiguidades, artefatos arqueológicos e obras de arte. (HERKENHOFF, 1996).

51 No final do século XIX, a família de Castro Maya38 retornou ao Brasil e adquiriu duas propriedades no Rio de Janeiro, uma na Floresta da Tijuca, mais tarde transformada no Museu

do Açude, a outra em Santa Teresa, atual Museu da Chácara do Céu39. As coleções de Castro

Maya são formadas por obras da cultura francesa e também da Arte Moderna, seu acervo possui obras representativas da primeira metade do século XX. O interesse de Castro Maya pelas artes resultou em inúmeras ações, dentre as quais, a criação do grupo Os amigos da

Gravura, em 1952, e a concepção do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, em 1948.

Castro Maya também se interessava por gravuras dos pintores viajantes do século XIX, possuía vasta coleção de Debret e inúmeras obras produzidas sobre o Rio de Janeiro. Seu interesse pela cidade rendeu a publicação de A muito leal e heróica cidade de São Sebastião

do Rio de Janeiro (BARAÇAL; BANDEIRA; MOUTINHO, 2002).

Castro Maya tinha um amplo gosto artístico, seu acervo também é formado por obras de artistas modernos como Henri Matisse, Maurice de Vlaminck e Andre Derain. Além disso, sua coleção também possuía inúmeros objetos da arte oriental, uma vasta biblioteca e peças de arte popular brasileira. O historiador e crítico de arte HERKENHOFF (1996, p. 42) ressaltou:

A coleção de Castro Maya é o primeiro legado de uma reconstrução individual de uma história de arte brasileira, que integra exemplares da produção nativa (com uma urna marajoara) e artesanato popular, o Brasil holandês de Post, Barroco e a Missão Francesa, a produção da academia e o Modernismo, além de rupturas contemporâneas.

O colecionismo de Castro Maya estava aliado ao incentivo às artes e aos artistas, ele procurou constituir seus acervos com base em práticas museológicas, procurando ―certificados de autenticidade, expertises, avaliações, recibos de aquisição, fotografias e fichas de classificação de suas peças‖ (SIQUEIRA, 2010, p. 60). Essas certificações serviam para preservar a história do objeto colecionado, além da evidente garantia da posse.

A biblioteca de Castro Maya, que se encontra no Museu da Chácara do Céu, é formada pelo conjunto de exemplares da coleção de sua família. Cada um desses conjuntos apresenta particularidades, sendo possível distinguir a quem pertenciam os exemplares a partir

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Familiares de Castro Maya: seu pai: Raymundo Ottoni de Castro Maya; sua mãe: Theodosia (1866-1953) e seus irmãos: Christiano (1890-1923) e Paulo (1905-1928). A biblioteca que se encontra no Museu da Chácara do Céu é formada pelas coleções de livros de toda essa família. (BARAÇAL; BANDEIRA; MOUTINHO, 2002).

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―Os Museus Castro Maya – Museu do Açude, no alto da Boa Vista e o Museu da chácara do céu, em Santa Teresa - foram residências de Castro Maya por ele doadas à Fundação que levava seu nome, criada em 1963 e extinta em 1983, quando ambos os museus foram incorporados ao governo brasileiro e hoje integram o IBRAM (Instituto Brasileiro de Museus), do Ministério da Cultura. Os prédios, acervos e parques dos Museus Castro Maya foram tombados pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), em 1974.‖ (Disponível em: museuscastromaya.com.br, acesso em: 16 de mai. de 2015).

52 do conteúdo, das dedicatórias e dos ex-libris – já que cada membro da família possuía um diferente. Os gostos eram bem variados. Enquanto sua mãe se interessava por textos religiosos, seu irmão Paulo preferia poemas eróticos e de amor. Castro Maya, por sua vez, herdou de seu pai o gosto pela literatura francesa e pelos livros finamente decorados e ilustrados. (BARAÇAL; BANDEIRA; MOUTINHO, 2002).

A biblioteca de Castro Maya é formada por três grandes grupos: ―a da Brasiliana [...]; a dos livros de sociedades e clubes bibliófilas; a das suas produções editoriais‖ (BARAÇAL; BANDEIRA; MOUTINHO, 2002, p 37). O acervo é formado por cerca de cinco mil livros, dos quais 750 são raros. Castro Maya, como já mencionado, participou de inúmeras sociedades bibliófilas europeias, latino-americanas e brasileiras.

A coleção proveniente de sociedades bibliófilas se configura como uma das mais importantes da Biblioteca do Museu Chácara do Céu. É o caso da obra Flandre (Fig. 5), com ilustrações de M. P. L. Moreau. Essa obra se destaca pelas qualidades estéticas das imagens e pelo bom acabamento da impressão das gravuras.

Figura 5 – DUHAMEL, Georges. Flandre. Ilustração: MOREAU, M. P. L. Les Cent Bibliophiles, 1935. Exemplar N º 32 de Raymundo Ottoni de Castro Maya.

Fonte: Biblioteca do Museu Chácara do Céu – Rio de Janeiro. Foto: Da autora.

A biblioteca de Castro Maya também possui exemplares de livros de artistas modernos como, Carnet de Dessins, 1948, de Pablo Picasso (1881-1973); Jazz, 1947, de Henri Matisse (1869-1954); Les dessins, 1887-1888, de Georges Seurat (1859-1891). Essa obra de Seurat se encontra exposta, como um objeto museológico, sendo um dos destaques da Biblioteca do

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Figura 6 –SEURAT, Georges. Les dessins, 1887-1888.

Fonte: Biblioteca do Museu Chácara do Céu – Rio de Janeiro. Foto: Da autora.

Paralelamente às edições da SCBB, Castro Maya publicou Viagem pitoresca e

histórica ao Brasil, em 1955. Essa obra possuía tiragem limitada a 400 exemplares e foi feita

com papel especial e a edição de Castro Maya foi encadernada em Paris. Após essa edição, Castro Maya produziu A muito leal e heróica cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, em 1965, na qual se encarregou de vários aspectos como a diagramação do texto, escolheu a fonte do tipo e a encadernação dessa edição. Castro Maya também publicou outros títulos como: Os

Reis, de 1953, escrito por Augusto Frederico Schimdt e ilustrado por Darel Valença Lins; O Pároco, de 1961, escrito por Coelho Neto e ilustrado por Darel e Hugo Mund Jr. (1933-)

(BARAÇAL; BANDEIRA; MOUTINHO, 2002).

É notável a presença de Castro Maya no cenário cultural brasileiro. A Sociedade dos Cem Bibliófilos do Brasil reflete seu interesse em difundir a arte e a literatura brasileira. Na produção dos livros desse Grupo, é possível reconhecer alguns traços da bibliofilia e do colecionismo de Castro Maya, que concebeu essa coleção de livros com as qualidades que só as edições artesanais possuíam.

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