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4. METODOLOGIA

4.4. Coleta dos dados

As coletas iniciaram-se em Janeiro de 2006 e finalizaram em fevereiro de 2007. O contato com os informantes foi feito através de indicações pessoais, de amigos e conhecidos. As gravações foram realizadas, preferencialmente, na residência dos informantes. A

preferência pela gravação na residência deve-se ao fato de as crianças ficarem mais à vontade já que esse é o ambiente mais familiar. Além disso, a criança pode mostrar objetos usados no seu cotidiano, o que contribui para uma melhor produção lexical.

Aos pais, foi previamente apresentado um termo de consentimento (Anexo D), no qual se identificam os objetivos da pesquisa, os procedimentos de coleta de dados e o tempo de duração do estudo. Os pais preencheram um questionário com informações sobre o filho(a), como data de nascimento, endereço e outras informações pertinentes. Foi também feito um levantamento sobre as palavras comumente produzidas pela criança.

As gravações ocorreram em um local com menor interferência possível de ruídos, tendo janelas e portas fechadas e aparelhos eletrônicos, como televisão e computador, desligados. As sessões de gravação foram realizadas com a presença de um adulto responsável pela criança, podendo ser a mãe, o pai ou o cuidador. Aos pais é solicitado que estimulem a produção de fala espontânea, evitando-se a repetição.

As sessões foram gravadas em áudio e vídeo e tiveram a duração de 30 minutos. Para obter uma consistência entre os informantes, mesmo se a gravação ultrapassou o tempo, são analisados apenas os primeiros 30 minutos. Foi utilizado um gravador digital DAT (Digital Áudio Tape- Sony TCD – D8), com um microfone de lapela unidirecional Sony. O microfone foi fixado à roupa da criança, a uma distância apropriada da boca. Porém, caso a criança não aceite a colocação do microfone, este permanece na mão de um adulto (da pesquisadora ou do responsável), que o direciona à boca da criança. É importante que se respeite a distância do microfone para não haver interferência na análise acústica. Porém, ressalta-se que a criança necessita de mobilidade e, além disso, em geral, varia muito o volume da voz. Assim, nem sempre, foi possível obter dados claros, que gerassem espectrogramas de alta qualidade.

Foi utilizada câmera de vídeo digital, da marca Sony (Digital 8 – DCR-TRV110), com fita 8 mm.19 A câmera foi colocada em um tripé, em uma posição que focalizasse a criança em interação com os objetos e a pesquisadora. A coleta de dados foi filmada, para que se pudesse fazer uma análise posterior da interação da criança com os brinquedos, observando-se a referência a objetos específicos. Isso porque, em algumas situações, somente a gravação em áudio não permite identificar a qual objeto a criança está referindo-se, especificamente. Considere, por exemplo, uma criança que produz a seqüência [ta ta]. Há várias possibilidades de objetos a serem nomeados com essa seqüência sonora, além de onomatopéias (imitação do som de batida, por exemplo). Nesse caso, o vídeo pode mostrar que a criança segura a “tartaruga” e se refere, especificamente, a ela. Muitas vezes, apenas com a gravação em áudio, pode não ser possível saber qual objeto está sendo referenciado. Mesmo com a filmagem, conta-se, é claro, com o auxílio dos pais e acompanhantes, para decifrar o significado das produções da criança. A seguir, especifica-se o procedimento de coleta de dados.

4.4.1 Procedimento de coleta de dados

Obter amostras de fala de crianças, em um período bastante inicial de aquisição, como o período em questão, não é tarefa fácil. A epígrafe que abre este capítulo expressa com bastante clareza essa dificuldade. Assim, sabe-se que o paradoxo do observador opera não só para o estudo da fala do adulto. O paradoxo do observador refere-se ao fato de o pesquisador desejar saber como as pessoas falam quando não estão sendo gravadas, porém a presença do pesquisador e de todo o aparato para gravação pode impedir a produção da fala

19 Agradeço à Professora Marylin Vihman pela sugestão de utilização da câmera. Agradeço também ao

verdadeiramente espontânea (LABOV, 1972). Também a criança pode perceber que está sendo observada e, por isso, mudar sua fala ou, até mesmo, não falar. Além disso, conforme Crystal (1995), a própria mãe pode ser afetada pela presença do pesquisador e, assim, influenciar a produção da criança.

Dessa forma, um meio deve ser buscado de se superar, pelo menos em parte, as dificuldades de coletar dados de crianças com pouca idade. De acordo com Lamprecht et al. (2004), a utilização de brinquedos é uma maneira satisfatória de contornar a dificuldade de obter amostras de crianças muito novas. A faixa etária observada compreende um período no qual a criança interage com o ambiente, manipulando objetos (INGRAM, 1976). Assim, a utilização de objetos e brinquedos, com os quais a criança possa interagir efetivamente, embora possa influenciar a produção lexical, parece ser um meio eficiente, pois contribui para tornar mais amigável a aproximação inicial entre a criança e a pesquisadora, propiciando um ambiente lúdico.

Inicialmente, foram selecionados alguns brinquedos a serem levados pela pesquisadora. A princípio, cogitou-se utilizar a nomeação de brinquedos selecionados a partir de uma lista de palavras específicas (com o intuito de garantir uma produção mínima, por sessão, de palavras contendo a africada). Porém, com o tempo, observou-se que, muitas vezes, é difícil fazer com que a criança produza um item lexical relacionado a um objeto específico (INGRAM, 1976). Uma lista com o nome dos brinquedos utilizados encontra-se no Anexo C. Por exemplo, mostra-se uma “zebra” e a criança a identifica como “cavalo”. Pode acontecer também o que Cançado (2006) denomina sub-extensão e super-extensão. A sub- extensão ocorre quando a criança usa um determinado nome, que identifica uma categoria, para referir-se apenas a um objeto específico. Por exemplo, a palavra “gato” refere-se somente ao seu gato de estimação. Já a super-extensão ocorre quando a criança amplia o uso de determinado conceito. Por exemplo, todo animal de quatro patas é denominado cachorro. Isso

é bastante comum na aquisição e envolve questões semântico-pragmáticas. Há também o fato de que a criança, muitas vezes, evita palavras que não se encaixem a seu padrão articulatório (FERGUSON; FARWELL, 1975). Assim, com uma lista de palavras elaborada previamente, corria-se o risco de não obter todo o conjunto de itens esperado, ou obtê-los de forma não espontânea.

Além dos brinquedos levados pela pesquisadora, a criança foi incentivada a utilizar os próprios brinquedos e objetos pessoais, como fotografias, o que incitava a produção de um número significativo de itens. Se a criança utiliza seus próprios brinquedos e objetos de casa, os itens mais familiares emergem mais facilmente.

Ressalta-se, assim, que os brinquedos foram utilizados mais como uma forma de aproximação com a criança do que como objetos que elicitariam itens específicos. Além disso, ressalta-se que a nomeação de brinquedos, além de se tornar cansativa para a criança ao longo do tempo, poderia culminar em dados extremamente artificiais. No Anexo C, apresenta- se uma lista com o nome dos objetos e brinquedos levados pela pesquisadora.