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1 Conceito do “novo” direito comercial/empresarial

A evolução do que se entende por matéria comercial se vê obviamente nos conceitos de direito comercial que nos são apresentados pela doutrina, desde os mais genéricos aos mais específicos.

Num primeiro momento, Endemann define o direito comercial como “o com­ plexo de normas, que regulam os atos jurídicos do tráfico comercial” .1 Cesare Vivante nos define o direito comercial como “a parte do direito privado, que tem principalmente por objeto regular as relações jurídicas, que nascem do exercício do comércio”.2 Na mesma linha, Waldemar Ferreira definia o direito comercial como “o sistema de normas reguladoras das relações entre homens, constituintes do comércio ou dele emergentes”.3 Georges Ripert definia direito comercial como “a parte do direito privado relativa às operações jurídicas feitas pelos comercian­ tes, seja entre si, seja com seus clientes”.4

1 ENDEMANN, G. Manuale di diritto commerciale, marittimo, cambiario. Tradução de Cario Be- tocchi ed. Alberto Vighi. Napoli: Jovene, 1897, v. 1, p. 11, tradução livre de “il complesso di quelle norme che regolano gli atti giuridici dei traffico commerciale.”

2 VIVANTE, Cesare. Instituições de direito comercial. Tradução de J. Alves de Sá. 3. ed. São Paulo: Livraria C. Teixeira, 1928, p. 7.

3 FERREIRA, Waldemar. Tratado de direito comercial. São Paulo: Saraiva, 1960, v. 1, p. 9. 4 RIPERT, Georges e ROBLOT, René. Traité élémentaire de droit commercial. 5 ed. Paris: Librairie Générale de Droit et de Jurisprudence, 1963, v. 1, p. 1, tradução livre de “la partie du droit privé

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Diferente não é o raciocínio de Alfredo Rocco, para quem o direito comercial “é o complexo de normas jurídicas que regulam as relações derivadas da indús­ tria comercial”.5 Similar também é a definição de Giuseppe Valeri, que afirma que o direito é “aquela parte do direito privado, que resulta das normas disciplina- doras das relações entre particulares, consideradas comerciais pelo legislador”.6

Tal concepção era acertada, mas hoje se mostra extremamente genérica e deixa de abarcar algumas atividades econômicas, como a prestação de serviços, que se difundem e hoje já merecem o mesmo tratamento das atividades comer­ ciais em geral.

J. X. Carvalho de Mendonça, influenciado pela concepção de sua época, afirma que o direito comercial é “a disciplina jurídica reguladora dos atos de comércio e, ao mesmo tempo, dos direitos e obrigações das pessoas que os exercem profissio­ nalmente e dos seus auxiliares”.7 Conforme ressaltado, tal noção é fruto da orienta­ ção, então dominante,8 que dava primazia à figura dos atos de comércio, que não era de fácil compreensão e não conseguia sobreviver às críticas que foram feitas.

Modernamente, se formulam novos conceitos de direito comercial, tendo como ideia central um conjunto de atos praticados em massa. Especialmente com o Código Civil italiano de 1942 foi renovada toda a estrutura jurídica das ativida­ des econômicas, tomando-se por figura central a empresa.9

Joaquín Garrigues afirma que o direito comercial é destinado a regular os atos em massa, praticados profissionalmente.10

Paula Forgioni afirma que o direito comercial seria “o conjunto de regras e princípios jurídicos que regem a organização das empresas e as relações entre empresas no âmbito do mercado”.11

Giuseppe Ferri, já à luz do Código Civil italiano de 1942, afirma que o di­ reito comercial “constitui o complexo de normas que regulam a organização e o exercício profissional de uma atividade intermediária dirigida à satisfação das

5 ROCCO, Alfredo. Princípios de direito comercial. Tradução de Ricardo Rodrigues Gama. Campi­ nas: LZN, 2003, p. 5.

6 VALERI, Giuseppe. Manuale di diritto commerciale. Firenze: Casa Editrice Dottore Cario Cya, 1950, v. 1, p. 4, tradução livre de “quella branca dei diritto privato, che risulta dall’insieme delle nor­

me regolanti i rapporti fra privaü considerati commerciali dal legislatore”.

7 CARVALHO DE MENDONÇA, J. X. Tratado de direito comercial brasileiro. Atualizado por Ricardo Negrão. Campinas: Bookseller, 2000, v. 1, p. 24.

8 No mesmo sentido: BORGES, João Eunápio. Curso de direito comercial terrestre. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1971, v. 1, p. 20.

9 FÉRES, Marcelo Andrade. Empresa e empresário: do Código Civil italiano ao novo Código Civil brasileiro. In: RODRIGUES, Frederico Viana (Coord.). Direito de empresa no novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 51.

10 GARRIGUES, Joaquín. Curso de derecho mercantil. 7. ed. Bogotá: Temis, 1987, v. 1, p. 21. 11 FORGIONI, Paula A. A evolução do direito comercial brasileiro: da mercancia ao mercado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 17.

necessidades do mercado em geral e consequentemente os atos singulares nos quais essa atividade se concretiza”.12

É nessa linha que devem ser definidos os contornos do direito empresarial, a partir de um complexo de regras e princípios que disciplina a atividade econômi­ ca organizada dirigida à satisfação das necessidades do mercado, e todos os atos nos quais essa atividade se concretiza. À guisa de conclusão, podemos afirmar que o direito comercial é o direito que regula a atividade empresarial e todos os atos que normalmente são praticados no exercício dessa atividade.

2 Divisão do direito empresarial

Tendo em vista o âmbito de atuação do direito empresarial, não há como se negar um certo fragmentarismo, isto é, a existência de um conjunto de normas muito diversificadas, em decorrência da própria diversidade das situações abran­ gidas. Em função desse fragmentarismo, é frequente na doutrina a apresentação de divisões do direito empresarial.

Goldschmidt propõe uma divisão entre direito comercial público e direito comercial privado.13

Fran Martins apresenta a divisão clássica do direito comercial - em marítimo e terrestre - e acrescenta o direito aeronáutico.14 Todavia, o citado autor faz crí­ ticas a tal divisão e propõe uma nova:15

a) Direito do comerciante ou dos empresários - que abrangeria o estudo dos institutos gerais do direito comercial, como o empresário, indivi­ dual ou pessoa jurídica (sociedades), e os elementos necessários ao exercício da atividade (estabelecimento, auxiliares), bem como os con­ tratos que realizam no exercício da atividade e as medidas garantido- ras dos interesses de terceiros, quando o empresário não cumpre suas obrigações (falência).

b) Direito dos transportes - essa parte regularia o transporte terrestre, marítimo e aéreo, tendo em vista a importância da circulação de bens para a atividade empresarial.

12 FERRI, Giuseppe. Manuale di diritto commerciale. 4. ed. Torino: LJTET, 1976, p. 10, tradução livre de “complesso di norme che regolano Vorganizione e Vesercizio professionale di un’attività inter­

mediaria diretta al soddisfacimento dei bisogni dei mercato generale e conseguentemente i singoli atti in cui questa atività si concreta”.

13 GOLDSCHMIDT, Levin. Storia universale del diritto commerciale. Trad. Vittorio Pouchain e Anto­ nio Scialoja. Torino: LTTET, 1913, p.5.

14 MARTINS, Fran. Curso de direito comercial. 22. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 65. 15 MARTINS, Fran. Curso de direito comercial. 22. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 65-66.

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c) Direito creditório - que cuidaria da disciplina dos títulos de crédito, que representam meios eficazes de mobilização de crédito, permitindo o desenvolvimento da atividade empresarial.

Waldirio Bulgarelli,16 por sua vez, apresenta uma classificação mais detalha­ da do direito comercial:

a) Teoria geral do direito comercial: a parte geral do direito comercial, sua conceituação, sua delimitação.

b) Direito das empresas e das sociedades: abrangendo o estudo do empre­ sário individual ou coletivo.

c) Direito industrial: estuda o estabelecimento comercial e a propriedade industrial.

d) Direito cambiário ou cartular: estuda os títulos de crédito.

e) Direito das obrigações mercantis: compreende o estudo dos contratos mercantis.

f) Direito falimentar: abrangeria o estudo das falências e da recuperação de empresas.

g) Direito de navegação: abrangeria o estudo do transporte por ar ou água. Todas as divisões têm seu mérito e representam o ponto de vista de seu pro­ ponente da forma mais didática. A nosso ver, a divisão mais didática do direito empresarial é a seguinte:

a) Teoria geral do direito empresarial: abrangendo o estudo dos conceitos básicos de empresa, empresário, estabelecimento e todos os seus ele­ mentos.

b) Direito societário: abrangendo o estudo das diversas sociedades. c) Direito cambiário: abrangendo o estudo dos títulos de crédito. d) Direito falimentar: abrangendo o estudo da falência e dos meios de recu­

peração empresarial, além das intervenções e liquidações extrajudiciais. e) Contratos empresariais: abrange o estudo dos contratos interempresa-

riais e os voltados a organização da atividade empresarial.

3 Fontes do direito empresarial

Como vimos, o direito empresarial representa o conjunto de regras que regu­ la a atividade empresarial e os atos singulares que compõem essa atividade. Essas

regras que formam o direito empresarial podem advir de várias fontes. As fontes são os diversos modos pelos quais se estabelecem as regras jurídicas.

A individualização das fontes é matéria que não encontra uniformidade na doutrina.

No direito português, Jorge Manoel Coutinho de Abreu identifica como fon­ tes os atos legislativos (leis constitucionais, leis, decretos-leis, decretos legisla­ tivos, regulamentos), a jurisprudência, a doutrina e os usos e costumes.17 Na Espanha, Joaquín Garrigues identifica como fontes do direito comercial as leis, os usos comerciais e ainda as condições gerais de contratação.18 Georges Ripert e René Roblot identificam como fontes do direito empresarial a lei, os usos, os regulamentos corporativos e os tratados internacionais.19

Ercole Vidari identificava como fontes principais do direito comercial as leis comerciais, os costumes e o direito civil; e como fontes subsidiárias a analogia, a equidade, a doutrina e a jurisprudência.20 Giuseppe Valeri apresenta como fontes apenas as leis, regulamentos, normas corporativas e os usos comerciais.21 Alfredo Rocco elenca como fonte apenas a lei.22

No Brasil, Carvalho de Mendonça identifica como fontes primárias do direito comercial apenas as leis comerciais e como fontes secundárias as leis civis, os usos comerciais e a jurisprudência.23 De outro lado, João Eunápio Borges res­ tringe as fontes do direito comercial aos costumes e à lei.24 Waldirio Bulgarelli25 identifica como fontes primárias do direito comercial as leis comerciais e como fontes secundárias as leis civis, os costumes, a analogia e os princípios gerais de direito. Ricardo Negrão e Sérgio Campinho identificam como fontes do direito empresarial a lei, a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.26

17 ABREU, Jorge Manuel Coutinho de. Curso de direito comercial. Coimbra: Almedina, 1999, v. 1, p. 25-27.

18 GARRIGUES, Joaquín. Curso de derecho mercantil. 7. ed. Bogotá: Temis, 1987, v. 1, p. 109-125. 19 RIPERT, Georges e ROBLOT, René. Traité élémentaire de droit commercial. 5. ed. Paris: Librairie Générale de Droit et de Jurisprudence, 1963, v. 1, p. 20-31.

20 VIDARI, Ercole. Compendio di diritto commerciale italiano. 4. ed. Milano: Ulrico Hoepli, 1910, p. 7-11.

21 VALERI, Giuseppe. Manuale di diritto commerciale. Firenze: Casa Editrice Dottore Carlo Cya, 1950, v. 1, p. 24-29.

22 ROCCO, Alfredo. Princípios de direito comercial. Tradução de Ricardo Rodrigues Gama. Campi­ nas: LZN, 2003, p. 137.

23 CARVALHO DE MENDONÇA, J. X. Tratado de direito comercial brasileiro. Atualizado por Ricardo Negrão. Campinas: Bookseller, 2000, v. 1, p. 141-143.

24 BORGES, João Eunápio. Curso de direito comercial terrestre. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1971, v. 1, p. 76.

25 BULGARELLI, Waldirio. D ireito comercial. 14. ed. São Paulo: Atlas, 1999, p. 75; BERTOLDI, Marcelo M. Curso avançado de direito comercial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, v. 1, p. 47. 26 NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 1, p. 15; CAMPINHO, Sérgio. O direito de empresa à luz do novo Código Civil. 4. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 6.

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Considerando que as fontes do direito empresarial são as formas pelas quais se manifestam as regras jurídicas que regulam a atividade empresarial, entende­ mos que são fontes primárias do direito empresarial as leis e são fontes secundá­ rias os costumes e os princípios gerais de direito.

Jurisprudência e doutrina não são formas de manifestação das regras jurídi­ cas, mas formas de interpretação ou aplicação destas.27 Nas palavras de Alfredo Rocco, “a atividade dos juristas não tem, na verdade, por fim a criação de novas normas jurídicas, mas o estudo, a interpretação e a aplicação do direito vigente” .28 Na analogia, se “pesquisa a vontade da lei, para levá-la a hipóteses que a lite- ralidade de seu texto não havia mencionado”.29 Para lançar mão da analogia é ne­ cessário em primeiro lugar que exista uma lacuna. Havendo regra jurídica sobre a situação, não há como se cogitar da analogia. Além da lacuna, para aplicação da analogia, é essencial que exista uma norma aplicável a uma situação semelhante e que a semelhança entre as duas situações seja o motivo da regra existente. A título exemplificativo, poderia haver analogia das regras sobre ferrovias em rela­ ção a situações envolvendo os bondes elétricos.

Para Caio Mário da Silva Pereira, a analogia é processo lógico que representa verdadeira fonte do direito e não mera fonte de interpretação,30 na medida em que a analogia faz nascer regras de conduta para o caso concreto. Em outras pa­ lavras, a analogia daria origem a uma regra a ser aplicada em um caso específico, e por isso seria fonte do direito empresarial também.

Todavia, a nosso ver a analogia não pode ser considerada uma fonte do di­ reito, na medida em que a regra já existe. Quando se usa a analogia, na verdade se está aplicando uma regra já existente a outra situação. Assim, não é a analogia que cria a regra, ela apenas estende a aplicação da regra, não podendo ser consi­ derada uma fonte do direito empresarial.

3.1 A le i

Podemos encarar a lei de duas formas, no sentido formal e no sentido ma­ terial. Neste sentido, Enneccerus afirma que “lei é uma proposição jurídica ou um conjunto de proposições jurídicas, ditada e publicada pelos órgãos do estado

27 GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil. Atualização e notas de Humberto Theodoro Junior. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 46.

28 ROCCO, Alfredo. Princípios de direito comercial. Tradução de Ricardo Rodrigues Gama. Campi­ nas: LZN, 2003, p. 137.

29 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, v. 1, p. 47.

30 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, v. 1, p. 47.

competentes conforme a Constituição.”31 Já no sentido formal o mesmo autor afirma que a lei “é toda disposição emanada dos órgãos legislativos do estado na forma que, com base na Constituição, é a regular para legislação”.32

Seriam fontes do direito as leis em sentido material, vale dizer, aquelas pro­ posições jurídicas que disciplinam a atividade empresarial, e não apenas aquelas em sentido formal, emanadas dos órgãos legislativos. A origem no Poder Legisla­ tivo não é suficiente para se identificar uma fonte do direito, é essencial que haja uma proposição jurídica, uma regra de conduta.

Assim, seriam fontes do direito empresarial a Constituição Federal, as leis em sentido estrito, as medidas provisórias, os regulamentos, desde que contenham regras que se apliquem à atividade empresarial. A título exemplificativo, pode­ mos indicar como fontes do direito empresarial o Código Civil, a Lei de Falências, a Lei Uniforme de Genebra sobre Letras de Câmbio e Notas Promissórias, a Lei das Sociedades por Ações, dentre outras.

Não se deve mais falar na distinção entre leis civis e leis comerciais, na medi­ da em que não importa a natureza da lei, mas sim o âmbito de sua aplicação. Se a norma se aplica à atividade empresarial ela é fonte do direito empresarial, não tendo qualquer influência o nome que se dê à lei.

3.2 Costumes

As leis possuem uma certa estabilidade, inerente ao próprio processo de sua elaboração. Tal estabilidade é muito importante para a própria segurança jurídica dos cidadãos. Todavia, esta estabilidade toma as leis, por vezes, insuficientes à disciplina de todos os fatos que se apresentam. Essa insuficiência deveria implicar na edição de novas leis, o que toma certo tempo na medida em que deve ser obe­ decido todo o procedimento necessário para o surgimento de uma lei (iniciativa, aprovação, sanção, promulgação, publicação).

No direito empresarial, tal situação se apresenta com bastante frequência, porquanto a empresa é um organismo que se desenvolve todos os dias, criando novos fatos, ou dando novos contornos, novas aplicações aos fatos já existentes.33

31 ENNECCERUS, Ludwig; KIPÇ Theodor e WOLFF, Martin. Tratado de derecho civil. 2. ed. Traduc- ción: Bias Pérez González y José Alguer. Barcelona: Bosch, 1953, v. 1, p. 136 - tradução livre de “es

una proposición ju rídica o un conjunto de proposiciones jurídicas, dictada y publicada p or los órganos dei Estado competentes conforme la Constitución” .

32 ENNECCERUS, Ludwig; KIPP Theodor e WOLFF, Martin. Tratado de derecho civil. 2. ed. Tra- ducción: Bias Pérez González y José Alguer. Barcelona: Bosch, 1953, v. 1, p. 136, tradução livre de

“es toda disposition emanada de los órganos legislativos dei Estado en la form a que, con arreglo a la Constitución es la regular para la legislation”.

33 VIDARI, Ercole. Compendio di diritto commerciale italiano. 4. ed. Milano: Ulrico Hoepli, 1910, p. 9.

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Diante dessas situações, os próprios envolvidos acabam ajustando e padronizan­ do as condutas a serem seguidas, as quais, com o passar do tempo, acabam até adquirindo uma força obrigatória. Estamos falando aqui dos costumes, do direito consuetudinário.

O direito consuetudinário é um direito que não nasce do Estado, daí dizer- -se que o costume não é uma fonte formal ou primária do direito.34 Nas palavras de Enneccerus, o “direito consuetudinário é o direito não estatutário, produzido pela vontade jurídica geral de uma coletividade manifestada normalmente me­ diante o uso”.35

O costume, enquanto fonte do direito, é o uso geral constante e notório, observado na convicção de corresponder a uma necessidade jurídica.36 Não esta­ mos falando dos meros usos, que são as práticas reiteradas e estabilizadas,37 mas dos usos dotados de uma convicção geral de que o uso é necessário. A nosso ver, apenas essa convicção é que torna os costumes fontes do direito, enquanto meras práticas reiteradas não representariam regras de conduta, enquanto não houves­ se essa obrigatoriedade.38

O Código Civil de 2002 remete determinadas hipóteses aos costumes, de­ monstrando a condição destes de fontes do direito, na medida em que manifes­ tam regras de conduta. A propósito, veja-se o artigo 432 do Código Civil de 2002, que considera perfeito o contrato, no qual não seja costume a aceitação expressa se a recusa não chegar a tempo. O artigo 569, II, do mesmo Código, reconhece que o locatário possa pagar os alugueres, segundo o costume do lugar se não houver ajuste. No artigo 615 do Código Civil de 2002, prevê-se a obrigação do recebimento de obra contratada por empreitada executada segundo os costumes do lugar, ou segundo o ajuste.

No artigo 596, permite-se a fixação da remuneração da prestação de servi­ ços, segundo o costume do lugar. Em relação ao mesmo contrato, o artigo 597 menciona que o pagamento da prestação de serviços poderá ser adiantado ou em parcelas, conforme o costume. O artigo 599 também fala sobre a resolução do contrato de prestação de serviços segundo o costume do lugar, não havendo estipulação de prazo.

34 BORGES, João Eunápio. Curso de direito comercial terrestre. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1971, v. 1, p. 77.

35 ENNECCERUS, Ludwig; KIPP Theodor; WOLFF, Martin. Tratado de derecho civil. 2. ed. Traduc- dón: Blas Pérez González y José Alguer. Barcelona: Bosch, 1953, v. 1, p. 145, tradução livre de

“derecho consuetudinário es el derecho no estatutario, producido p or la voluntad jurídica general de una coletividad manifestada normalmente mediante el uso”.

36 GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil. Atualização e notas de Humberto Theodoro Júnior. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 42.

37 ABREU, Jorge Manuel Coutinho de. Curso de direito comercial. Coimbra: Almedina, 1999, v. 1, p. 27.

Conquanto se reconheça o costume como fonte de direito, é certo que não se pode negar que o costume não tem a mesma hierarquia e a mesma importância da lei. Esta é realmente a fonte primária do direito, devendo-se recorrer aos cos­ tumes apenas na ausência de lei. O costume não pode prevalecer contra a lei, não se deve admitir os costumes contra legem. A proliferação, cada vez maior, de leis faz com que os costumes venham perdendo importância.

No Brasil, o Decreto 1.800/96 prevê que as juntas comerciais devem fazer os assentamentos dos usos e práticas mercantis. Esses assentamentos podem ser promovidos de ofício, a requerimento da Procuradoria da Junta Comercial ou, ainda, a requerimento das entidades de classe interessadas. Feito o assentamento a prova dos costumes é mais simples, facilitando sua aplicação pelos juizes aos casos concretos.

3.3 Princípios gerais de direito

Os princípios gerais de direito representam a orientação geral de todo o or­ denamento jurídico. Eles são “a abstração lógica daquilo que constitui o substrato comum das diversas normas positivas”.39 Na condição de bases das normas po­ sitivas, é certo que há uma tendência na positivação dos princípios gerais, como ocorreu com o princípio da vedação do enriquecimento ilícito (art. 884 do Código