• Nenhum resultado encontrado

Estudo de casos: Vidraria Santa Marina (atual Saint Gobain), Companhia Goodyear do Brasil (antiga

7.3 Companhia Melhoramentos de São Paulo:

A Companhia Melhoramentos de São Paulo, difere dos casos anteriores, por ser constituída basicamente de uma única quadra com dois blocos edificados (um de 1923 e outro de 1948) e não ter passado por outras ampliações. Como apresentado, os projetos tanto da oficina gráfica quanto do edifício administrativo foram concebidos para acolher tais funções. O edifício do início da década de 1920 erguido pela Companhia Construtora em Cimento Armado, sob a responsabilidade dos engenheiros Kramer e M. Pinto10 (SÃO PAULO – cidade, SMC/CONPRESP, Res. 05/09, p. 82). Foi projetado em 1923 especificamente para atender a demanda da empresa para a instalação do setor gráfico: “Espaço, luz, acesso fácil, tudo foi conseguido na planificação moderna da oficina. 10000 metros construídos, ao custo de um milhão e quinhentos e sessenta e três contos de réis. Nada parecido, em matéria gráfica, no país.” (DONATO, 1990, p.67). O amplo galpão foi uma das primeiras edificações da região da Vila Romana constitui-se de um único pavimento com fachadas de singela ornamentação, embasamento em pedra e cobertura em sistema de shed que proporcionava iluminação zenital complementar à fenestração.

A empresa mantém um acervo iconográfico em que a obra da década de 1920 está bem documentada. Foi possível consultá-lo e verificar o processo construtivo de toda a estrutura em concreto, bastante sintomático do momento da construção civil na cidade de São Paulo11. A partir da década de 1920, modificam-se os padrões construtivos na em medida que há um melhor aproveitamento dos materiais, a utilização do tijolo e o dimensionamento das estruturas em concreto armado possibilitam novas modulações. Com a ampliação do uso do concreto armado nesse período, muitas fábricas passaram a ser construídas utilizando esse sistema estrutural, cujas propriedades permitiam grandes vãos. Ainda assim, a estruturação do partido arquitetônico e o resultado formal eram semelhantes às soluções anteriores.

10

As plantas originais foram consultadas junto ao DPH - Seção Técnica de Levantamento e Pesquisa durante o processo de tombamento. O projeto de 1922 é o processo No 56095, Rua Tito – esse material atualmente se encontra no Arquivo Municipal (Secretaria Municipal de Gestão) – e não se teve autorização por parte da empresa proprietária para a divulgação.

11

Nesse período pós Primeira Guerra Mundial, a importação de materiais de construção passava por dificuldades; o uso do concreto armado se expandia como nova técnica construtiva na cidade, introduzido por profissionais italianos e por empresas francesas e alemãs. Dentro das escolas de engenharia, criaram-se setores interessados na pesquisa de materiais brasileiros como cimento, cal dentre outros. Na Escola Politécnica, haviam sido feitos estudos no Gabinete de Resistência de Materiais em 1912 analisando metais tendo em vista o emprego de barras de aço no concreto armado (BENCLOWICZ, 1989, p.125). Em 1917, foi fundada a Companhia Siderúrgica Belgo – Mineira, com objetivo de produzir aço em escala industrial ampliando o uso do concreto armado nas construções paulistanas e em 1924 foi instalada a Companhia Brasileira de Cimento Portland em Perus (SP), cuja produção foi aos poucos suprindo as necessidades do mercado interno.O concreto armado firmou-se então como sistema estrutural mais adequado sob as fachadas ornamentadas de acordo com o gosto de seus construtores, substituindo inclusive as estruturas de ferro geralmente importadas.

Fig. 88 A: Companhia Melhoramentos de São Paulo,

construção 1922. Fonte: Acervo da empresa. Fig. 88 B: Companhia Melhoramentos de São Paulo, construção 1922. Fonte: Acervo da empresa.

Fig. 88 C: Companhia Melhoramentos de São

Paulo, construção 1922. Fonte: Acervo da empresa. Fig. 88 D: Companhia Melhoramentos de São Paulo, construção 1922. Fonte: Acervo da empresa.

Fig. 88 E: Companhia Melhoramentos de São Paulo, construção 1922.

Fonte: DONATO, 1990, p.73.

Essas instalações por serem novas despertaram a curiosidade e transformaram-se em objeto de turismo empresarial visitado por várias personalidades. Em 1924 o deputado federal por São Paulo, João Pires do Rio esteve na gráfica, e produziu um relatório referente à organização produtiva da oficina, de acordo com o relato de Hernani Donato:

Observou 18 seções em funcionamento (a ordem é a empregada por ele): litografia, zincografia, tipografia, pautação, encadernação, confecção de blocos de folhinhas, fabricação de cromos, de envelopes, depósito de mercadorias, expedição, galvanoplastia, estereotipia, douração, fabricação de baralhos, sala de gravadores, sala de linotipos, oficina mecânica, escritório. Mencionou estoques de mapas, ações, cartazes, reclames, carteiras de cigarros, estampas finas, várias qualidades de envelopes para correspondência, folhinhas, cartões de felicitações, menus, papéis para correspondência, baralhos, estampas religiosas, almanaques, blocos, livros em branco e comerciais, clichês e almanaques produzidos para laboratórios farmacêuticos. [...] O maior e mais atualizado estabelecimento gráfico da América Latina. (DONATO, 1990, p.74)

Após a construção do edifício da gráfica foram construídos galpões para depósito na década de 1930 no quarteirão em frente ao original. E, na década de 1940, foi construído pela firma Freitas Jank o prédio administrativo de quatro andares nas equinas das ruas Tito e Espártaco apresentando uma arquitetura diversa, de influência art-decó o prédio administrativo possui revestimento de pedras na fachada do embasamento até o primeiro pavimento e as esquadrias são em linhas retas, definindo os pavimentos.

Fig. 89: Mapa cidade de São Paulo, 1930, recorte Companhia Melhoramentos de São Paulo.

Fig. 90 A: CMSP, prédio gráfica. R. Vespasiano com

R. Camilo, década de 1930. Fonte: Acervo da empresa.

Fig. 90 B: CMSP, prédio gráfica. Rua Vespasiano com

Rua Tito, década de 1930. Fonte: Acervo da empresa.

Ao longo das décadas, as adaptações se concentraram basicamente no remanejamento interno das linhas produtivas com maquinários tecnologicamente mais avançados, como apresentado no capítulo anterior. Além dessas necessárias adaptações automatizando paulatinamente a linha produtiva, o Prof. Hernani Donato fez referência em entrevista (31.03.2008) à necessidade de subdivisão interna do galpão em fins da década de 1960 (1967) para atender à necessidade de criar uma área de segurança dentro das instalações para acomodar produção e impressão de cheques.

O acervo iconográfico da empresa está organizado basicamente em função dessas evoluções tecnológicas. Ao verificar essas imagens é possível constatar, naquilo que tange à materialidade da edificação, alterações no sistema de forro, nos dispositivos das instalações elétricas, posterior inclusão de ar condicionado e substituição das antigas telhas francesas por telhas de amianto.

Fig. 91 A: CMSP, impressão máquinas Minerva, sem

data. Fonte: DONATO, 1990, p. 74. Fig. 91 B: CMSP, vista geral do setor tipográfico (máquinas Minerva), sem data. Fonte: Acervo da empresa.

Fig. 91 C: CMSP, setor da Litografia, década de

1940. Fonte: Acervo da empresa. Fig. 91 D: CMSP, setor de zincografia, sem data. Fonte: Acervo da empresa.

Fig. 91 E: CMSP, impressão máquina rotativa, 1942.

Fonte: Acervo da empresa. Fig. 91 F: CMSP, impressão Off-set, década de 1940. Fonte: Acervo da empresa.

Fig. 91 G: CMSP, impressão máquina Minerva

automática, sem data. Fonte: Acervo da empresa automática, sem data. Fonte: Acervo da empresa. Fig. 91 H: CMSP, impressão máquina Minerva

Fig. 91 I: CMSP, impressão Off-set, provável década

de 1970. Fonte: Acervo da empresa Fig. 91 J: CMSP, em primeiro plano máquina Rolland (impressão a 4 cores), década de 1970. Fonte: Acervo da empresa

Fig. 92 A: Mapa cidade de São Paulo, 1970, recorte da Companhia Melhoramentos de São Paulo.

Ao meio, quarteirão da gráfica e, à esquerda, quarteirão dos depósitos. Fonte: Acervo Biblioteca FAUUSP.

Fig. 92 B: Companhia Melhoramentos de São Paulo, quarteirão Ao lado esquerdo, quarteirão com edificações

residenciais no local dos antigos depósitos. Fonte: Google Earth, 2010.

Como mencionado no capítulo anterior, com a terceirização da parte gráfica em 2001 o galpão foi locado para uma empresa que deu continuidade à atividade. Nesse processo foi feito um laudo de constatação 12 para verificar o estado do imóvel em que consta um levantamento fotográfico da situação naquela ocasião (março de 2001) com a última ocupação com atividade gráfica. Nesse documento há basicamente descrições da situação interna enfatizando revestimentos, tipo de forro, situação das esquadrias e portas, instalações elétricas

12

Material obtido através do Laudo de constatação da situação do imóvel fornecido pela empresa em entrevista com Marina Oehling Gelman (Advogada da empresa) em 31 Mar. 2008.

e hidráulicas, sistema de iluminação; em relação à idade aparente do imóvel destaca-se as obras de conservação que foram feitas e o fato de que apesar do prédio ter sido construído por volta de 1920, tendo, portanto, uma idade real de 80 anos, a idade aparente estimada é entre 40 e 60 anos em razão de sucessivas obras de conservação e manutenção. Além dessas informações foi possível também verificar a disposição da linha de produção na época, já que consta de uma planta com a setorização produtiva.

Fig. 93: CMSP, planta esquemática (s/ esc.) com setorização da última atividade gráfica, 2001. Legenda: 1.

Administração; 2. ambulatório; 3. Produção; 4. Conserto de livros; 5. Almoxarifado / mecânica; 6. Supervisão; 8. Ventilação; 9. Exaustor; 10. Depósito de livros inacabados; 11. Arquivo de filmes; 12. Manutenção; 13.

Depósito; 14. Sanitários / vestiários; 15. Bomba; 16. Limpeza; 17. Sanitários. Fonte: Acervo da empresa (elaborado pelo autor).

Fig. 94 A: CMSP, última ocupação do galpão com

Fig. 94 C: CMSP, última ocupação do galpão com

atividade gráfica, 2001. Fonte: Acervo da empresa.

Fig. 94 D: CMSP, última ocupação do galpão com

atividade gráfica, 2001. Fonte: Acervo da empresa.

Fig. 94 E: CMSP, última ocupação

do galpão com atividade gráfica, 2001.

Fonte: Acervo da empresa.

Fig. 94 F: CMSP, última ocupação

do galpão com atividade gráfica, 2001.

Fonte: Acervo da empresa.

Fig. 94 G: CMSP, última

ocupação do galpão com atividade gráfica, 2001. Fonte: Acervo da empresa.

Fig. 94 H: CMSP, última ocupação do galpão com

Em visita 13, foi feito um levantamento fotográfico no qual se verifica as atuais condições do galpão tanto interna, quanto externamente. Internamente, ele apresenta uma situação similar àquela descrita em 2001 no laudo de constatação. O piso é na maior parte em granilite, tendo partes em cimentado, concreto ou cerâmica; as paredes perimetrais tem pintura a óleo até meia altura e o restante em látex; o forro praticamente não existe mais; o sistema de cobertura se manteve do tipo shed, com estrutura em madeira e algumas partes em metal, com telhas de fibrocimento na posição inclinada e de plástico na vertical, para iluminação zenital; o sistema estrutural se mantém em pilares de concreto; o sistema de iluminação artificial é na maioria em pendentes fluorescentes; as esquadrias das janelas são em ferro com vidros simples martelados e das portas em aço de enrolar ou madeira, grande parte dos vãos estão vedados por questões acústicas; as instalações hidráulicas são aparentes, com tratamento dos efluentes industriais; as instalações elétricas contam com cabine de força, trifásicas, e também são aparentes, correndo basicamente sobre bandejas; instalação de sistema de ar condicionado. Foi verificado além da subdivisão interna decorrente dos departamentos que demandavam maior segurança mencionados, a construção em datas não identificadas de outros blocos de sanitários e mezanino em que se localizava parte do departamento administrativo. Além disso, o edifício possui instalações referentes à segurança contra-incêndio, dentre outras ações que o adéqua às necessidades atuais possibilitando a manutenção da atividade gráfica.

Fig. 95 A: CMSP, vista interna. Sistema de cobertura

em shed, telhas em cimento amianto (não são mais as telhas cerâmicas originais).

Foto: Autor, 2008.

Fig. 95 B: CMSP, vista interna. Sistema de cobertura

e partes de forro remanescente. Foto: Autor, 2008.

13

Fig. 95 C: CMSP, detalhes estruturais.

Foto: Autor, 2008. Fig. 95 D: CMSP, detalhes estruturais. Foto: Autor, 2008.

Fig. 95 E: CMSP, mezanino construído.

Foto: Autor, 2008. Fig. 95 F: CMSP, blocos construídos ao longo das décadas. Foto: Autor, 2008.

Fig. 95 G: CMSP, estrutura em concreto, sistema de

cobertura em shed, alguns vão de janelas fechados. Foto: Autor, 2008.

Fig. 95 H: CMSP, estrutura em concreto, sistema de

cobertura em shed, alguns vão de janelas fechados. Foto: Autor, 2008.

Fig. 95 I: CMSP, sistemas de tubulações e iluminação

instalados ao longo das décadas. Foto: Autor, 2008.

Fig. 95 J: CMSP, sistemas de iluminação e ar

condicionado instalados ao longo das décadas. Foto: Autor, 2008.

Fig. 95 L: CMSP, pilares da caixa d`água.

Foto: Autor, 2008. Fig. 95 M: CMSP, caixa d´água. Foto: Autor, 2008. Externamente é possível constatar que pinturas foram refeitas inclusive no antigo embasamento de pedra, além do caso de um relógio com 1 metro de diâmetro (originalmente instalado na unidade da Rua Líbero Badaró) que, quando transferido ficava no alto da entrada pela Rua Vespasiano - em frente à Praça Alfredo Weiszflog - e foi subtraído pela empresa no ano 2007; atualmente esse relógio está localizado na esquina das ruas Vespasiano e Tito, encoberto por galhos de árvores (SÃO PAULO – cidade, SMC/CONPRESP, Res. 05/09 p.82).

Fig. 96 A: CMSP, detalhe molduras da fachada. Foto:

Autor, 2008. Fig. 96 B: CMSP, detalhe embasamento de pedra da fachada. Foto: Autor, 2008.

Fig. 96 C: CMSP, relógio reposto na fachada da R. Vespasiano com R. Tito.

Fig. 96 D: CMSP, fachada R. Espártaco.

Foto: Autor, 2008. administração e à esquerda galpão da gráfica. Fig. 96 E: CMSP, vista interna. À direita Foto: Autor, 2008.

Fig. 96 F: CMSP, fachada R. Tito.

Foto: Autor, 2008. Fig. 96 G: CMSP, fachada R. Tito. Foto: Autor, 2008.

Fig. 96 H: CMSP, vista externa, esquina R. Espártaco

e R. Camilo. Foto: Autor, 2008. Fig. 96 I: CMSP, fachada R. Camilo. Foto: Autor, 2008.

Fig. 96 J: CMSP, vista esquina R. Camilo e R.

Frente aos levantamentos realizados e a análise dos documentos e do imóvel, pode-se fazer duas constatações, em primeiro lugar, a edificação que foi originalmente projetada na década de 1920 para abrigar a atividade gráfica foi suficientemente compatível com tal atividade até o início de 2008, que embora tenha ocasionado algumas alterações e adaptações no imóvel, necessárias para sua própria manutenção, não causou uma degeneração muito comprometedora do conjunto. As adaptações se concentraram primordialmente na tecnologia da linha produtiva. Nesse caso, diferente e mais evidente que nos anteriores, a possibilidade da manutenção da atividade fabril não encontrava propriamente uma limitação espacial ou arquitetônica. A maior problemática era de âmbito econômico, e nesse sentido a própria configuração urbana teve um papel determinante para o encerramento da gráfica, como apresentado no capítulo anterior.