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Competências no Ordenamento do território

CAPÍTULO 4 ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO COMO TAREFA DO ESTADO

4.3 Competências no Ordenamento do território

As competências na gestão do território estão muito repartidas. Para além da parte do território sobre a responsabilidade dos municípios, a nível central são várias as entidades a atuar neste domínio.

4.3.1 Ao nível central

O ordenamento do território enquanto política pública está sob a responsabilidade do Ministério de Ambiente, Habitação e Ordenamento do Território (MDHOT) que tutela a Direção Geral do Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano (DGOTDU). Compete à DGOTDU o acompanhamento e avaliação regular do funcionamento do sistema de gestão territorial e das práticas de gestão territorial, coordenar, promover e assegurar a elaboração de planos e projetos no domínio do Ordenamento do Território, propor e promover medidas normativas e regulamentares e de orientação e apoio técnico respeitantes ao domínio da sua competência. A junção das políticas de ordenamento do território e de ambiente no mesmo ministério aconteceu após as eleições legislativas de 2011. As duas áreas têm grandes afinidades, o que poderá potenciar uma integração mais eficaz. Porém, mantêm-se separadas a DGOTDU e a Direção Geral do Ambiente (DGA).

Para além do MAHOT, são várias as instituições com responsabilidades sobre partes do território. A Cabo Verde Investimento e a Sociedade de Desenvolvimento Turístico de Boavista e Maio gerem as Zonas de Desenvolvimento Turístico Integral - ZDTI; as florestas e reservas agrícolas são geridas pelo Ministério do Desenvolvimento Rural; a orla marítima pelo Ministério das Infraestruturas, Transportes e Telecomunicações; os parques eólicos e industriais sob a responsabilidade de Ministério da Economia. E ainda há as redes de equipamentos, de educação e de saúde, com tutelas próprias.

Fazendo uma breve retrospetiva, verificamos que devido à ausência generalizada de meios organizacionais, humanos, materiais, financeiros nas Câmaras Municipais, a par da insuficiência e/ou ausência de legislação no âmbito do planeamento e da organização e funcionamento do poder local, no passado a responsabilidade de elaboração dos planos urbanísticos recaía sobre o órgão central (Direção Geral de Urbanismo, Habitação e Meio Ambiente - DGGUHMA). Não obstante carências variadas, a DGUHMA, elaborou uma

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primeira geração de planos urbanísticos para alguns municípios, posteriormente suspensos por dificuldades financeiras (TAVARES, 2006).

Em 1992 foi criada a Direção Geral do Ordenamento do Território e Ambiente (DGOTA), que deveria assumir a elaboração dos Planos de Ordenamento do Território e deixar os Planos Urbanísticos Municipais aos Municípios. Na sequência foi publicada, em 1993, a LBOTPU. Mas, após a lei de 1993 seguiram-se apenas atividades pontuais e uma prática de planeamento coerente não foi desenvolvida nesses anos (FIDLER, 2011).

No entanto, o esforço para agarrar a política do Ordenamento do Território perdeu-se quando a DGOTA foi extinta, em 1996, e só recriada em 2001 e dotada em 2002, tomando a designação de Direção Geral de Ordenamento do Território e Habitação (DGOTH) e de DGOTDU em 2010. Assim, entre 1996-2001, instalou-se um certo vazio institucional, originando por parte de diversos setores tomadas de posições que se traduziram em sobreposição de competências, a exemplo do ocorrido com a gestão das áreas turísticas especiais. A par desse aspeto verificaram-se intervenções desarticuladas e descoordenadas que originaram dispersão de esforços e de meios (TAVARES, 2006).

Neste momento a DGOTDU encontra-se muito mais capacitada, mas ainda insuficiente para os desafios que há no setor.

4.3.2 Ao nível Local

O Programa de Governo 1981-85 instituiu o poder local como poder político, num contexto de permanência do centralismo democrático, com o Estado a desempenhar o papel central em todos os domínios. A descentralização só deu passos consistentes nos finais dos anos 80 e início dos anos 90, com a publicação de um conjunto de diplomas, nomeadamente: lei de bases das autarquias locais (Lei 47/III/89), lei eleitoral municipal (Lei 48/III/89), lei das finanças locais (Lei 101-0/90), lei da organização e funcionamento da administração municipal (D.L. 52-A/90) e com a revisão da Constituição da República, de 1992, que fortaleceu o poder local, admitindo que as autarquias têm finanças e patrimónios próprios (PNUD – CEA, 2002). Em 1991 foi adotada uma estrutura política multipartidária e o país avançou rumo à descentralização política, tendo ocorrido as primeiras eleições autárquicas.

Segundo TAVARES (2006:74) “muitas das atribuições que antes pertenciam ao poder central (Ministério da Administração Local e Urbanismo - MALU), foram transferidas para o poder local (promoção social, obras públicas, licenciamento, infraestruturas no domínio do

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saneamento, cobranças taxas). Com a descentralização, as autarquias passaram a ter um papel importante no planeamento e gestão do território. Porém, foram atribuídas ao poder local funções e responsabilidade de elaboração de planos sem os meios necessários, dificultando a sua execução”.

Os meios materiais, humanos e financeiros faltavam, a articulação entre os agentes era insuficiente e a indefinição das responsabilidades evidente. A par, ocorreram constrangimentos associados ao atraso nas verbas escassas do Governo (PNUD – CEA, 2002:7). Portanto, muitas das atribuições e competências das autarquias não foram exercidas cabalmente por falta de meios e regulamentação, que se arrastaram até à atualidade.

Mas foram lançadas algumas iniciativas como a criação do Gabinete de Apoio Técnico Intermunicipal (por conjunto de ilhas ou por concelhos da mesma ilha), com o intuito de apoiar a elaboração de planos de desenvolvimento municipal. Em 1995 foi criada a Associação Nacional dos Municípios (ANMCV), que tem como objetivo a defesa dos interesses comuns dos municípios, estimulando sinergias e complementaridades. A ANMCV tem promovido esforços para dotar a administração local de mais condições, mas com resultados modestos (TAVARES, 2006).

De acordo com os Estatutos dos Municípios (Lei 134/IV/95, de 3 de Julho de 1995), a atuação dos municípios concretiza-se nas áreas do urbanismo, na administração, saneamento básico, saúde, habitação, comércio, ambiente, proteção civil, emprego, transportes, educação, promoção social, na elaboração de planos, estabelecimento de regulamentos, taxas e tarifas, concessão de licenças, etc. Porém, há uma disparidade entre as competências e os recursos dos municípios. Por isso, a maioria dos municípios recorre a geminações e a cooperações com municípios estrangeiros, no sentido de colmatar as dificuldades financeiras e técnicas.

A baixa qualificação dos recursos humanos e a insuficiência de meios técnicos e financeiros limitam o desempenho dos municípios, fazendo com que a situação atual do planeamento municipal esteja longe do desejável. Há um grande desequilíbrio na distribuição dos recursos humanos, sendo diminuto o pessoal qualificado nos municípios do interior/periféricos. E muitos municípios não dispõem do Gabinete Técnico Municipal, o que dificulta a gestão urbanística e a assumção das atribuições.

Os municípios reivindicam maior capacidade financeira para a assunção integral das responsabilidades urbanísticas. As autoridades centrais reconhecem a necessidade de capacitar institucionalmente os municípios para o exercício das suas competências e

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atribuições, sobretudo no que diz respeito à autonomia financeira. A Lei das Finanças Locais, de 1998, (Lei 76/V/98) incorpora mecanismos que permitem aos municípios ter uma maior capacidade financeira, podendo, assim, levar a cabo a sua responsabilidade de elaboração de instrumentos de ordenamento e gestão municipal. Em Setembro de 2005 foi aprovado a atual lei das finanças locais (Lei n.º 79/VI/2005 de 5 de Setembro), que define o alargamento do leque de taxas e receitas a favor dos municípios (art.º 5º). A nova lei permite que os municípios tenham acesso a créditos internos (art.º 1, alínea d) no quadro da cooperação descentralizada. Em termos gerais a lei tem como objetivo:

 reforçar e consolidar a autonomia financeira municipal, alargar a base tributária Municipal;

 clarificar os mecanismos de transferência de recursos financeiros para os municípios;  redefinir e fixar os critérios para a distribuição do Fundo de Financiamento Municipal;  aumentar a base para o cálculo do Fundo de Financiamento Municipal;

 introduzir maior rigor e transparência na gestão municipal;  introduzir maior previsibilidade de mobilização de recursos.

No entanto, iniciou-se em 2012 um processo para a revisão da Lei das Finanças Locais, propondo um aumento de 10 para 17% da comparticipação dos municípios nas receitas do Estado, reforçando assim, as transferências de recursos financeiros para os municípios.

Os municípios reclamam maior autonomia financeira, pois continuam a depender excessivamente do Governo para obter meios para a realização dos investimentos necessários à promoção do desenvolvimento local. As transferências da Administração central para os municípios atingiram em 2009, o montante de 3.345.619 contos, sendo que o peso do Fundo de Financiamento Municipal foi de 75% deste valor. O grau de dependência financeira é de 51,86%. (MDHOT, Anuário Financeiro dos Municípios, 2009).

A lei-quadro da descentralização política (Lei n° 69/VII/2010, de 16 de Agosto) veio orientar, disciplinar, harmonizar e uniformizar o processo de descentralização, reforçando a sua credibilidade e enformando juridicamente o processo de transferências de competências do Estado para as autarquias locais, de modo a que o processo seja orientado e regido por um instrumento normativo e deixe de depender da vontade política de cada sujeito institucional; definir as competências suscetíveis de serem descentralizadas; definir a metodologia do processo de descentralização; indicar as condições em que as transferências devem ocorrer;

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fixar os recursos financeiros que acompanham cada ato de transferência; apontar os mecanismos de acompanhamento e seguimento do processo.

De acordo com a Direção Geral da Administração Local, o Governo aponta como pilares da agenda da descentralização:

 apoio e desenvolvimento institucional municipal;

 desenvolvimento de competências dos recursos humanos municipais;  consolidação e reforço da autonomia financeira municipal;

 modernização da administração municipal;

 implementação efetiva do regime da tutela de legalidade;

 consolidação e reforço das atribuições e competências municipais;  cidadania e Participação;

 desenvolvimento da Cooperação Descentralizada

Os novos Estatutos dos Municípios estão em discussão para a posterior aprovação do Parlamento. A revisão dos Estatutos dos Municípios (Lei 134/IV/95, de 3 de Julho de 1995) visa:

 reforçar os poderes dos Municípios, clarificar e delimitar as competências dos seus órgãos e evitar zonas de conflito com a Administração Central;

 efetivar a responsabilidade da Câmara Municipal (CM) perante a Assembleia (AM) reforçando as competências das AM;

 adequar a configuração dos órgãos municipais, ao artigo 230º da Constituição da República de Cabo Verde;

 parlamentarizar o Sistema de Governo Municipal;  introduzir a liberdade na escolha dos Vereadores;

 reforçar a autonomia municipal e o papel das Associações de Municípios;

 realinhar os Estatutos com as iniciativas de Reforma do Estado e a Lei-quadro de Descentralização (Lei n° 69/VII/2010).

Não obstantes as dificuldades enfrentadas pelos municípios, é inequívoco o seu protagonismo nos vários setores de desenvolvimento de Cabo Verde. O poder local está a afirmar-se como fundamental na resolução dos problemas das populações, na construção de uma administração mais próxima dos cidadãos, na melhoria do bem-estar e progresso das comunidades locais e no desenvolvimento dos municípios.

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