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Capítulo 2. Estratégia de desenvolvimento do setor de recursos naturais e competição

2.2. Competição Política

2.2.1 Competição Eleitoral (as regras de fato)

Para a utilização da variável competição política, pressupomos existência de um regime democrático competitivo (Dahl, 1999; Sartori, 1994; e Downs, 1999). Sartori (1994, p. 124), a partir da contribuição de Dahl e Schumpeter, define a democracia competitiva como “um procedimento e/ou mecanismo que (a) gera uma poliarquia aberta cuja competição no mercado eleitoral (b) atribui poder ao povo e (c) estabelece a responsividade dos líderes para com os liderados” (grifo do autor). Essa definição enfatiza que a escolha das Elites Governantes – Legislativo e Executivo – ocorre através de eleições livres e periódicas, na qual há o sufrágio dos cidadãos adultos e a representação através de partidos políticos. Além disso, que as Elites têm de responder às demandas da população a fim de que possam permanecer no poder.

Nossa abordagem de competição política deriva de Downs (1999), que oferece uma abordagem da escolha racional – eleitor vota racionalmente – na qual identifica, através de um modelo espacial, como se opera a competição eleitoral. Nesse modelo, a seleção das Elites Governantes (EGs) é feita de seguinte forma: a cada eleição a População vota em determinados partidos que governarão durante o próximo período

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eleitoral (t + 1). Cabe a essas Elites governar a sociedade durante o período ( t ) em que estão no poder, e ter, portanto, a capacidade decisória sobre os rumos da sociedade.

O eleitor é um ator racional, que vota de maneira “eficientemente planejada para alcançar os fins econômicos ou políticos conscientemente selecionados”58. Em outras palavras, vota no partido que ele acredita que lhe proporcionará uma maior renda de utilidade. A renda de utilidade da população é proveniente da atividade governamental, que são os “benefícios que o beneficiário não percebe que está recebendo” e os “benefícios que ele sabe estar recebendo, mas cuja fonte exata ele não conhece” 59. Para completar o modelo do voto racional, lembra que, no jogo político, os governos tentam fazer com que os eleitores percebam os benefícios que estão recebendo (provimento de informação), pois os eleitores votam de acordo com os benefícios que tomam consciência.

Se a informação é importante, uma maneira pela qual os cidadãos podem identificar os benefícios é através das ideologias60: “ferramentas que permitem os eleitores economizarem os custos de informação relacionados às posições políticas dos diferentes atores políticos”61. Assim, os partidos simbolizam, através de distintos programas ideológicos, as suas posições diferenciadoras em relação aos outros partidos de tal forma a permitir ao eleitor compará-los e tomar uma decisão. Como a preferência do eleitor pode ser expressa em um pico único, Downs (1999) procura calcular como as ideologias mudam em conteúdo à medida que os partidos manobram pelo poder.

Para tanto, utiliza um modelo espacial unidimensional para representar as orientações ideológicas que cercam os cidadãos. Na Figura 2.6, está representado o modelo de Downs (1999) que reduz a questão política ao grau de intervenção governamental na economia62. Nesse modelo, Esquerda e Direita63 representam agendas econômicas distintas: nos extremos, a Esquerda representa um maior controle

58

DOWNS, A. (1999). Uma teoria econômica da democracia. São Paulo: Edusp. p. 58

59

Idem, ibid., p. 58.

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A ideologia é “uma imagem verbal de boa sociedade e dos principais meios de construir tal sociedade”. Ibid. p. 117.

61

ROSAS, G. (2010). Issues, Ideologies, and Partisan Divides: Imprints of Programatic Structure on Latin American Legislatures. In: H. KITSHELT, K. A. HAWKINS, J. P. LUNA, G. ROSAS, & E. J. ZECHMEISTER, Latin American party system (pp. 70-94). New York: Cambridge University Press.p. 71.

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Estamos ocupados aqui unicamente com a ideologia política na dimensão econômica, nos termos de Rosas (2010).

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Os rótulos ideológicos vinculam a Esquerda-Direita a determinados programas. Segundo , Rosas (2010, p. 110), na dimensão econômica, a Direita aparece ligada a valores como a privatização e menor proteção social e a Esquerda “means being secular, in favor of social redistribution to the poor, and protectionist or nationalist”.

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governamental, enquanto a Direita representa um mercado livre. Podemos relacionar o grau de intervenção governamental na economia com as estratégias de desenvolvimento baseadas em estatização ou privatização em cada ponta da linha. Governos de Direita tendem à privatização, enquanto governos de esquerda tendem à estatização.

O modelo de Downs implica, ainda, distintas distribuições dos partidos ao longo da linha. Nos sistemas bipartidários, cada partido tentará se parecer com o seu oponente, ou seja, caminham em direção ao centro a fim de conquistarem o eleitor mediano. Em um sistema multipartidário64, os partidos se empenham para se distinguir ideologicamente dos outros e manter a pureza de suas posições, já que a mobilidade deles ao longo da reta não proporciona um maior número de votos. (ao longo da reta, A e B representam partidos no sistema bipartidário, e D, E, F, G representam partidos no sistema multipartidário com distintas propostas ideológicas).

Figura 2.6 Orientação espacial da posição ideológica dos partidos

A→ ←B D E F G Esquerda Direita 0 50 100 Estatização Privatização (maior intervenção gov.) (menor intervenção gov.) Fonte: Elaboração do autor a partir de Downs (1999)

Cumpre ressaltar que os partidos nesse modelo não podem se movimentar livremente pela linha. A movimentação ocorre pelos eleitores, que podem modificar a sua renda de utilidade. Além disso, fatos novos como a alteração da legislação eleitoral – incorporando novos eleitores ou criando novos distritos eleitorais – podem reorganizar a posição dos atores na estrutura Esquerda-Direita. Somente com a mudança da distribuição dos eleitores na escala política podem surgir novos partidos e novas ideologias preponderantes (Downs, 1999).

Retomando o conceito de Sartori (1994), a competição eleitoral na presença do eleitor racional implica que a População seleciona as Elites Governantes por meio da comparação dos possíveis desempenhos futuros que espera dos partidos concorrentes

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O interesse pelos sistemas multipartidários é crucial para este trabalho, por isso nos deteremos apenas a esse sistema partidário. A redemocratização da América Latina tem como uma característica o

multipartidarismo. Além disso, o nosso caso de análise, a Bolívia, tem por característica ter um sistema multipartidário.

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com o desempenho do partido que está no poder, ou seja, julgando as políticas do partido no poder. Considerando que há diferenças ideológicas entre os partidos no poder e de oposição, a População escolhe “entre as futuras projeções desses dois conjuntos de políticas”65. Assim, a população projeta no campo econômico o cenário em que perceba o recebimento de maior benefício. O problema que se põe é: como operacionalizar a medida da renda de utilidade do cidadão neste trabalho?

Tomamos como parâmetro a expectativa da População (seção 2.2) em relação aos recursos, no qual a renda de utilidade é uma função da expectativa dos cidadãos em relação aos recursos. Assim, quando a renda de utilidade do cidadão é frustrada, cresce a possibilidade de voto em partidos que tenham projeções de políticas distintas ao status quo. Consideramos o status quo o tipo de estratégia de recurso vigente no período ( t ) e a mudança a ocorrer no período ( t + 1 ).

Delinearemos, na próxima seção, a estrutura do nosso modelo de preferências. Em seguida, pontuamos algumas questões acerca do impacto dos sistemas multipartidários da competição política no mundo empírico.