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Nesse tópico apresentamos nossas reflexões acerca dos componentes do currículo de enculturação – Simbólico, Social e Cultural – quanto à presença e/ou à ausência, nas atividades e abordagens apresentadas nos livros didáticos analisados nesse estudo.

Nosso objetivo mais específico com essa categoria é de identificar as ideias subjacentes na abordagem dos conteúdos e nas atividades apresentadas pelo livro didático, quanto aos componentes do currículo enculturador. É, antes, uma tentativa de explicitar essas ideias subjacentes que, de alguma forma, se fazem presentes nesses materiais, e não um juízo de valor por contemplar ou não esses componentes.

Apresentar conceitos matemáticos através das seis atividades – contar, medir,

localizar, desenhar, jogar e explicar – são características da presença do componente

simbólico no currículo de matemática. Tanto a coleção Viver, Aprender quanto a Tempo de

Aprender fazem uso dessas atividades em diferentes momentos em suas abordagens. Vejamos:

FIGURA 10: Números opostos ou simétricos

FIGURA 11: Número negativos e positivos

FONTE: Tempo de Aprender, 7º ano, 2009, p.167 – Livro do aluno.

Essas abordagens presentes nas figuras 10 e 11 apresentam operações com números inteiros, ideias relacionadas aos números positivos e negativos, correspondência, unidades de medida, localização na reta e sentido positivo ou negativo. Esses conceitos estão atrelados às atividades de contar, localizar e medir.

Algumas atividades apresentadas nessas coleções partem de situações do entorno do aluno, fator que entendemos como favorável à acessibilidade dos alunos ao saber matemático. Observamos um exemplo dessa situação:

FIGURA 12: Utilizando um guia de ruas

FONTE: Viver, Aprender, 7º ano, 2009, p.150 – Livro do aluno.

Uma das questões que sucedem a exposição do mapa acima é: “Como encontrar um caminho para ir da Rua Marquês de Itu, que um guia localiza na página 143, até a Rua Antônio Bicudo, que está localizada na página 162” (VIVER, APRENDER, 7º ano, 2009, p.152).

Identificamos, nessas situações, a atividade de localizar. Vale salientar que os autores utilizam essa situação para empregar conceitos matemáticos tais como: circunferência, retas, segmentos de retas, retas paralelas, concorrentes e perpendiculares,

entre outros. Essa é uma atividade de exploração, o aluno estuda o mapa, faz traçados, expressa a ideia de coordenadas, direção (horizontal, vertical), sentido (norte, sul, leste, oeste). O aluno, portanto, partindo de uma situação que é do seu cotidiano, explora conceitos matemáticos. A partir dessas situações, o livro apresenta também a ideia de ângulo e suas medidas, o que caracteriza também a atividade de medir.

Essa abordagem, além de incluir tais atividades, que para nós caracteriza a presença do componente simbólico, pode, também, propiciar ao aluno a percepção do uso que a sociedade faz do conhecimento matemático, o que para nós implica o componente social, apesar de situação não ter sido desenvolvida a partir de projetos que são a característica principal desse componente.

As atividades de desenhar, medir e explicar também se fazem presentes nos livros didáticos da Educação de Jovens e Adultos, em situações como às que estão apresentadas abaixo:

FIGURA 13: Atividade soma dos ângulos internos de um triângulo.

FONTE: Viver, Aprender, 7º ano, 2009, p.158 – Livro do aluno.

Percebemos, nessa situação, que o livro não indica inicialmente que a soma dos ângulos internos de um triangulo é 180º. A situação induz o aluno a chegar a essa

conclusão, a partir da sua interação com os materiais e com o objeto. Este fato explicita o valor do objetivismo que é contemplado pelo componente simbólico. A situação também pode propiciar ao aluno a exploração e a investigação; ele pode sentir-se como “ator principal” na construção de seu conhecimento. No momento em que o aluno precisa explorar a situação matemática, questionar, demonstrar e comunicar suas conclusões, fica evidente a atividade de explicar e a presença do componente cultural.

Outra atividade que se faz presente nesses livros refere-se a jogar,

FIGURA 14: O jogo do resto

FONTE: Tempo de aprender, 7º ano, 2009, p.132 – Livro do aluno.

Para Bishop (1999), o desenvolvimento do jogo pode ser visto como uma atividade matemática muito significativa. A atividade de jogar envolve regras, procedimentos, planos, estratégias, competição, raciocínio hipotético entre outros.

As atividades de contar, medir e explicar fazem-se presentes nos materiais analisados, em outros momentos, além dos que foram citados acima. Assim, vejamos:

FIGURA 15: Árvore genealógica

FONTE: Viver, Aprender, 7º ano, 2009, p.167 – Livro do aluno.

FIGURA 16: Sugestão de atividade, combinatória.

Além dessas atividades expostas nas figuras 15 e 16, nessa mesma sessão do livro, são apresentadas aos alunos outras atividades que envolvem as unidades de medida relacionadas aos computadores, mas utilizando as mesmas ideias matemáticas, envolvidas nas figuras acima.

Alguns conceitos estão imbuídos nessas atividades, como o princípio fundamental da contagem, combinatória, sistema de numeração binário, relações numéricas e potências que são desenvolvidos a partir da atividade de contar e as unidades de medidas estão atreladas à atividade de medir.

Ao analisarem esses problemas de contagem, os alunos precisam contar as possibilidades, organizar os elementos em tabelas, diagramas ou árvore de possibilidades e, ao fazer isso, o aluno está fazendo uso de explicações figurativas, desenvolvendo, portanto, a atividade de explicar. Além disso, as atividades propiciam o pensamento indutivo explicitando assim o valor do racionalismo, podendo também explicitar o valor do

controle e da abertura, à medida que o aluno vai compreendendo os processos envolvidos na situação e consegue ordenar e até mesmo generalizar os termos das sequências. Então, ele percebe que isso foi possível a partir de estruturas matemáticas que eles já dominam. Por essas considerações, percebemos o componente simbólico e cultural do currículo enculturador.

Atividades envolvendo sequências numéricas, padrões, regularidades aparecem em diferentes momentos nos livros didáticos, principalmente da coleção Viver, Aprender. Além das situações apresentadas nas figuras 15 e 16 identificamos esse tipo de abordagem em outras situações:

FIGURA 17: Número áureo - números sob a forma de radicais.

FIGURA 18: Atividade - Sequência de Fibonacci.

FONTE: Viver, Aprender, 6º ano, 2009, p.131 – Livro do aluno.

Essas situações permitem aos alunos a exploração e a investigação, propiciando os atos de conjecturar, generalizar e outros afins. Bishop (1999) propõe algumas ideias para investigações da cultura matemática, dentre as quais podemos destacar: Números figurados (triangular, quadrados); Sequência de Fibonacci; Probabilidades experimentais. Essas ideias foram contempladas nas abordagens e atividades propostas pelos livros analisados, como pudemos observar nas figuras17 e 18. Identificamos, então, mais uma vez, a presença do componente simbólico e cultural.

Como vimos anteriormente, apresentar os conceitos matemáticos a partir das seis atividades é uma característica do componente simbólico para o currículo enculturador. E identificamos essas atividades em várias abordagens apresentadas pelo material explorado. Vejamos outros exemplos em que subjaz essa perspectiva:

FIGURA 19: Atividade – Ampliação de figuras.

FIGURA 20: Atividade – Volume de prisma.

FONTE: Viver, Aprender, 8º ano, 2009, p.192 – Livro do aluno.

Nessas situações, a atividade de desenhar explora conceitos tais como: Figuras planas, sólidos geométricos, propriedades das formas, congruência entre figuras, ampliação e redução, razão, proporção, simetria entre outros. Na atividade de medir são construídos os conceitos de: área, volume, unidades de medidas. Para Bishop (1999), a atividade de desenhar,

Centran la atención del alumno en las formas y tanto los objetos naturales como los artificiales pueden ser una rica fuente para tareas de correspondencia comparación. Semejanzas, congruencias y transformaciones revelan y explican muchos aspectos de nuestro entorno. (p. 139).

As situações apresentadas nas figuras 19 e 20 convergem para essa ideia de Bishop, ao propor as atividades a partir de observações do seu entorno, de figuras que estão presentes no seu cotidiano. Além disso, a atividade desenvolvida com os mosaicos, a observação da simetria e das arquiteturas (figura 8) evidenciam, também, a vertente estética da matemática, a partir da atividade de desenhar. Esse fato, a arte e a matemática, explicitam, igualmente, o uso que a sociedade faz da matemática, evidenciando assim o

componente social do currículo com enfoque cultural.

Nessa mesma perspectiva, identificamos outras situações, nas quais a atividade de

FIGURA 21: Atividade – Concentração de pessoas numa área.

FONTE: Viver, Aprender, 7º ano, 2009, p.183 – Livro do aluno.

Nessas atividades, bem como em outras situações presentes nos livros didáticos, percebemos que o conhecimento sobre área de uma figura, é construído pelo aluno, não é o professor que o transmite. Assim, o aluno pode atribuir mais significado a esse conceito que é puramente abstrato, e pode compreendê-lo a partir da sua interação com os materiais que lhes foram disponibilizados. Ficam explícitos, portanto, os valores do racionalismo e

do objetivismo.

Além dessa situação (figura 21) observemos a seguinte sugestão de projeto de construção civil:

FIGURA 22: Projeto construção civil – escalas e medidas

Após apresentarem essa planta, é solicitada aos alunos a construção de uma maquete contendo um dos cômodos da casa. Para isso é necessário que os alunos utilizem régua, transferidor, compasso; é necessário, também, que façam pesquisas de preços para saberem quanto custaria a obra real, e um relatório contemplando todos os custos materiais necessários para obra. Essas duas situações (figura 21 e 22) fomentam também a necessidade de participação e engajamento do aluno para desenvolver a atividade, a utilização de diferentes materiais, a reflexão, a explicação e análise da relação entre as situações reais e as ideias matemáticas.

Essas atividades, por sua vez, dependendo de como o professor irá conduzi-las em sala de aula, podem ser caracterizadas pelo desenvolvimento de projetos e explicam algumas situações presentes nas interações sociais dos alunos, a partir de conceitos matemáticos, fatores estes que marcam a presença dos componentes simbólicos e sociais.

No capítulo 1 inserido no volume 8 da coleção Viver, Aprender, os autores apresentam o seguinte texto:

FIGURA 23: Texto de introdução do capítulo 1.

FONTE: Viver, Aprender, 9º ano, 2009, p.125 – Livro do aluno.

Numa sessão intitulada aplicar conhecimento, inserida no volume 6 da coleção, os autores apresentam a seguinte atividade:

FIGURA 24: Atividade – Escalas, plantas e mapas.

FONTE: Viver, Aprender, 7º ano, 2009, p.192 – Livro do aluno.

Percebemos que, tanto no texto (figura 23) quanto na atividade (figura 24), fazem- se presentes algumas das atividades que Bishop classifica como universais, e os usos que a sociedade faz delas, expressando, portanto, o componente social. Para esse autor, essas atividades, são desenvolvidas por povos de diferentes culturas; trazê-las para a sala de aula e compreender conceitos matemáticos a partir dessas atividades, pode perpetuar a ideia da matemática como fenômeno pancultural, a de que ela existe em todas as culturas.

Esse fator expressa uma das características do componente cultural. Apesar dessa nossa interpretação, percebemos que a situação proposta na atividade 2 (figura 24), são evidenciados apenas alguns instrumentos de medida. Acreditamos que essa atividade poderia explorar diferentes instrumentos e unidades de medidas, principalmente numa Educação de Jovens e Adultos, uma vez que muitos alunos já trabalharam com muitos desses instrumentos ou os conhecem, o que valorizaria mais a cultura matemática desses alunos e explicitaria ainda mais a Matemática como fenômeno pancultural, para os colegas de sua classe.

Podemos identificar, a partir dessas reflexões que, de uma maneira geral, os livros analisados apresentam os componentes simbólico, cultural e social essenciais para um currículo enculturador. Como pudemos observar, através das diferentes abordagens e atividades contidas no material, esses componentes aparecem com mais ênfase em algumas atividades do que em outras, ou ainda, em alguns momentos existe a presença de um

componente, em outros há uma interação entre alguns dos componentes. Existem ainda aqueles momentos nos quais não conseguimos identificar esses componentes em questão.

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