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Para Bishop (1999), ao se estruturar um currículo de Matemática é preciso contemplar três componentes que são essenciais para um enfoque cultural: O Componente

Simbólico, o Componente Social e o Componente Cultural.

O primeiro refere-se à tecnologia simbólica da matemática, às explicações significativas dos conceitos, do sistema simbólico e da linguagem matemática. É o componente que apresenta de maneira explícita os valores do Racionalismo e do

Objetivismo.

O segundo refere-se às explicações matemáticas utilizadas pela sociedade, componente esse que exemplifica e apresenta explicitamente os usos que a sociedade faz com as explicações matemáticas. É o componente responsável por apresentar de maneira

explícita os valores do controle e do progresso existentes nesses múltiplos usos das explicações matemáticas.

O terceiro deles, o componente cultural, refere-se à ideia da matemática enquanto fenômeno presente em todas as culturas, sendo o componente responsável pela ideia da cultura matemática. Esse componente também apresenta explicitamente os valores da

abertura e do mistério.

Os três componentes estão apresentados de uma maneira mais detalhada nos próximos tópicos, para o que nos baseamos nas considerações de Bishop (1999) a esse respeito.

3.5.1 Componente Simbólico

Esse componente refere-se ao sistema simbólico da matemática, à tecnologia simbólica específica e à linguagem própria da matemática e se estrutura a partir das seis atividades – contar, medir, desenhar, localizar, jogar e explicar.

As duas primeiras atividades descritas por Bishop (1999), contar e medir referem- se às ideias relacionadas ao número, e diferenciam-se quanto às principais características, pois contar está relacionado ao aspecto discreto, enquanto que medir está relacionado ao aspecto contínuo, referente aos sistemas de numeração. As atividades localizar e desenhar estão voltadas para as estruturas espaciais e dão origem a tipos distintos de ideias geométricas. Localizar refere-se aos aspectos topográficos e cartográficos do ambiente, já desenhar refere-se às especificações dos objetos e conduz à ideia fundamental de forma. As duas últimas atividades jogar e explicar giram em torno das relações sociais, das interações dos indivíduos uns com os outros, diferente das quatro anteriores que estão relacionadas aos aspectos físicos. Segundo Bishop (1999) “Jugar se refiere a las reglas y los

procedimientos sociales para la actuación y también estimula el aspecto <<como si>> de la conducta imaginada e hipotética”.(p. 43). E explicar refere-se às abstrações e formalizações, sua função é indicar os diversos aspectos cognitivos de investigar e conceituar o ambiente ou o objeto matemático, e compartilhar estes conceitos.

Para Bishop (1999) existem alguns conceitos que explicitam melhor os princípios do currículo matemático, os quais, por sua vez, se devem fazer presentes na estrutura e na organização desse currículo. Portanto, o componente simbólico do currículo enculturador deve estar baseado em conceitos; no entanto, esses conceitos não podem ser estruturados como lista de conteúdos ou temas estanques, e sim como eixos organizadores do currículo.

Os conceitos deveriam,

Ser los centros de interés y se deberían abordar mediante actividades realizadas en contextos ricos relacionados con el entono, deberían ser explorados por su significados, su lógica y sus conexiones Matemáticas, y se deberían generalizar a otros contextos para ejemplificar y validar su poder explicativo. (BISHOP, 1999, p. 132)

Entendemos que o ensino baseado em conceitos deve fazer-se presente no currículo de Matemática, não como uma lista de conteúdos, dos quais o professor seria o transmissor e o aluno o receptor, mas sim como organizadores do currículo em que o aluno constrói o conhecimento a partir do desenvolvimento de atividades inseridas numa variedade de contextos e situações que potencializem o entendimento dos conceitos e as explicações matemáticas.

3.5.2 Componente Social

Apesar de o currículo conceitual, característico do componente simbólico, ser desenvolvido mediante atividades ricas, significativas e baseadas no entorno do aluno, Bishop acredita que essas atividades, por si só, não gerariam uma consciência crítica do desenvolvimento dos valores matemáticos dentro da sociedade.

O componente social parece cumprir esse papel, no sentido de permitir ao aluno, a compreensão e uma postura crítica frente aos múltiplos usos que a sociedade faz da matemática. Para isso é importante incluir as atividades destinadas ao desenvolvimento de conceitos – componente simbólico – mas, essas atividades precisam ser abordadas

mediante um enfoque “ejemplarizador y paradigmático el desarrollo histórico y futuro del conocimiento”. (BISHOP, 1999, p. 144). Observamos, portanto, que os dois componentes não são dispares, mas se complementam e interagem com o objetivo de favorecer à Enculturação Matemática.

Esse componente social representa a dimensão histórica completa do desenvolvimento matemático, por exemplificar os múltiplos usos da Matemática pelas sociedades tanto do passado, quanto do presente e do futuro. Fazer isso, para Bishop não significa apresentar para nossos alunos um curso sistemático de história da Matemática mas, “Podemos hacer, mediante una elección acertada de situaciones paradigmáticas, que la interface entre las Matemáticas y la sociedad sea más manifiesta, más analizable de una manera crítica y, en consecuencia, mejor comprendida”. p. (144).

Para Bishop, o componente social pode ser baseado em projetos, principalmente por entender que os alunos precisam participar de situações paradigmáticas. Assim, destaca três aspectos dos projetos que têm relação com esse componente:

1. En primer lugar, los proyectos permiten la participación personal profundizando cuanto se desee para una situación dada y, en consecuencia, otorgan a la enseñanza ese aspecto individualizador y personalizador que con tanta frecuencia está ausente del currículo Matemático típico.

2. En segundo lugar, los proyectos fomentan el empleo de una variedad de materiales que estimulan el pensamiento sobre la importancia del enfoque Matemático a la interpretación y explicación de la realidad. El simple hecho de entrar en contacto con el abundante material existente en forma de libros, películas, cintas de vídeo puede hacer que los valores y las ideas de las Matemáticas se conecten con otros aspectos del currículo escolar.

3. En tercer lugar, participar en proyectos fomenta la actividad a nivel reflexivo. Mediante la investigación y la documentación de una situación societal e con el apoyo de enseñante para analizar la relación entre las ideas Matemáticas y la situación concreta, el alumno puede iniciar el proceso de análisis crítico que tan necesario es si no queremos que los valores que las Matemáticas ofrecen a la sociedad no se tomen meramente por sentado. (BISHOP, 1999, p. 145)

A ideia seria desenvolver projetos para compreender, explicar situações vividas no cotidiano do aluno, permitindo a compreensão e reflexão acerca dos usos da matemática pelas diferentes sociedades, tanto atuais como as do passado e as do futuro; deve favorecer o currículo, permitindo a manifestação das individualidades, favorecer a interpretação e a explicação da realidade, e pode permitir ao educando a compreensão das ideias matemáticas e a relação desta com as situações reais. E referindo-se ao aluno jovem e adulto, essa prática pode ser ainda mais significativa.

3.5.3 Componente Cultural

Esse componente pretende demonstrar a matemática como cultura, bem como a relação dos matemáticos com a abstração e com a Matemática. Ele se preocupa muito mais com os critérios internos do que os critérios externos a ela.

Para Bishop (1999), o componente simbólico e social está associado às ideias matemáticas num contexto social, mas isso não significa necessariamente que a criança, o jovem ou o adulto compreendam a natureza das atividades dentro da matemática, ou seja, a

gênesis das ideias matemática. Para esse autor, até certo ponto o componente simbólico indica quais saberes matemáticos precisamos conhecer, ao passo que o componente social explica qual uso fazemos desses saberes, enquanto que o componente cultural indica como se geraram esses saberes e permite refletir sobre o que é a Matemática.

No processo de ensino e aprendizagem, Bishop (1999) pretende inserir os alunos no nível técnico da cultura matemática; para isso, é preciso permitir ao educando a postura de um matemático frente às ideias matemáticas, por isso o componente cultural é baseado em investigação, cujo objetivo principal é imitar o trabalho de um matemático. Haveria, para o pesquisador, duas fases distintas no processo de investigação:

En primer lugar, la fase creativa e inventiva caracterizada por la exploración, el análisis y el desarrollo de ideas Matemáticas. La segunda fase se dedica a redactar un informe sobre la actividad realizada durante la primera fase. La primera es el experimento, mientras que la segunda es la reflexión y la comunicación por escrito de ese experimento. (p.149)

Propiciar ao aluno o desenvolvimento da atividade de investigação pode lhe permitir a apreciação dos valores da abertura e do mistério, mistério não no sentido negativo, mas no sentido de despertar a curiosidade do aluno e o estímulo a explorar os desafios.

Podemos observar que esses três componentes, apesar de terem sido apresentados separadamente nesse texto, interagem entre si e se complementam. Para Bishop, os componentes simbólico, social e cultural não só é necessário como também é suficiente

para criar um currículo capaz de permitir a Enculturação Matemática dos alunos, além de conservar e estimular a cultura matemática.

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