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COMPROMISSO COM A QUALIDADE NAS POLÍTICAS DE ACESSO E PERMANÊNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

A educação superior no Brasil, da maneira como está apresentada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei nº 9.394 (BRASIL, 1996), tem, entre outras, as finalidades de: incentivar o trabalho de pesquisa 1 A pesquisa inicial foi apresentada em: BERTELLI, E. M.; PENTEADO, A. L. Os desafios da qualidade da educação superior brasileira com a implantação das políticas de expansão, acesso e permanência. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE POLÍTICAS E ADMINISTRAÇÃO DA EDUCAÇÃO, 26; 2013, Recife. Anais... Recife: ANPAE, 2013. Disponível em: <http://www. anpae.org.br/simposio26/1comunicacoes/EliseuMiguelBertelli-ComunicacaoOral-int. pdf>. Acesso em: 20 dez. 2016.

2 Em 2014 completou-se uma década de existência do Prouni, regulamentado pela Lei nº 11.096, de 13 de janeiro de 2005. No período de 2005 a 2014 foram atendidos 2.027.238

e investigação científica, visando ao desenvolvimento da ciência e da tecnologia e da criação e difusão da cultura, e, desse modo, desenvolver o entendimento do homem e do meio em que vive; promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber por meio do ensino, de publicações e de outras formas de comunicação; suscitar o permanente desejo de aperfeiçoamento cultural e profissional e possibilitar a correspondente concretização, integrando os conhecimentos que vão sendo adquiridos numa estrutura intelectual sistematizadora do conhecimento de cada geração (BRASIL, 1996).

Nesse sentido, entende-se que as determinações da educação superior, no Brasil, acompanham muitas exigências internacionais. Uma das ideias mais alinhadas e presentes nos discursos sobre a educação superior assinala a excelência e a qualidade como premissas para sua realização. Entretanto, Duarte (2007, p. 691) ressalta que “[...]a realidade demonstra que a educação de qualidade ainda é um sonho distante, sobretudo para os setores mais vulneráveis de nossa sociedade”.

A Declaração da Conferência Regional de educação superior na América Latina e no Caribe – CRES 2008 proclamou a educação superior como “um direito humano e um bem público social” e, ao apontar questões sobre acesso e permanência, assevera:

[...] satisfazer o aumento das exigências sociais pela Educação Superior requer aprofundar as políticas de equidade para o ingresso e instrumentar novos mecanismos de apoio público aos estudantes [...] como o acompanhamento acadêmico, destinados a permitir sua permanência e bom desempenho nos sistemas (UNESCO, 2008, p. 239). A formulação de políticas educacionais, visando promover ações afirmativas que garantissem maior equidade social, se iniciou no Brasil na década de 90. Contudo, o sentido da expansão e democratização se tornou mais expressivo na década posterior. Nesse período emergiram políticas públicas com programas específicos de expansão, acesso e permanência, como por exemplo o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), o Sistema de Seleção

Unificada (SISU), o Programa Universidade para Todos (PROUNI), o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES) e o Plano Nacional de Assistência Estudantil (PNAES), entre outros.

Programas pautados em ações afirmativas3, compensatórias, são

formulados e implantados envoltos em questionamentos e polêmicas produzidos por parcelas da população que acreditam ter seu direito de acesso diminuído ou ameaçado. A questão se desloca para indagações que questionam a qualidade do ensino a partir da inserção de uma parcela da população que historicamente estava fora da educação superior. A concepção de qualidade vem, segundo Morosini (2008, p. 423):

[...] imbricada ao desenvolvimento destes movimentos como meta da avaliação da educação superior, comandados por organismos multilaterais. Enquanto que na década de 80/90, internacionalmente, discutia-se mais além da concepção de qualidade, ou seja, propunham-se estratégias e medidas de obtê-la, no Brasil era um tema quase que supérfluo.

A qualidade da educação superior é sistematicamente avaliada, via programas nacionais de avaliação. Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB nº 9.394 (BRASIL, 1996), art. 9º, estão previstas a criação e a implantação de um sistema nacional de avaliação. O inciso VI estabelece que a União deve “assegurar processo nacional de avaliação do rendimento escolar no ensino fundamental, médio e superior, em colaboração com os sistemas de ensino, objetivando a definição de prioridades e a melhoria da qualidade do ensino” (BRASIL, 1996, p. 3). No inciso VIII, está previsto que a União deve “assegurar processo nacional de avaliação das instituições de educação superior, com a cooperação dos sistemas que tiverem responsabilidade sobre este nível de ensino” (BRASIL, 1996, p. 3).

A avaliação da educação superior, realizada em larga escala, se orienta em legislação, procedimentos e instrumentos próprios. Castro (2011, p. 27) assinala que:

3 Entende-se por ações afirmativas o conjunto de medidas especiais voltadas a grupos discriminados e vitimados pela exclusão social constituídos no passado ou no presente (MEC/SECADI).

A LDB foi seguida por novos instrumentos regulatórios, entre os quais se destaca o Decreto nº 2.306, de agosto de 1997, que forneceu as bases legais para regular o funcionamento do sistema nacional de ensino superior[...] Posteriormente, esse Decreto foi revogado pelo Decreto nº 3.860/2001 (revogado pelo Decreto nº 5.773/2006). Nesse cenário, foi aprovada a Lei nº 10.861, em 14 de abril de 2004, que estabelece como finalidade a regulação da expansão e a melhora da qualidade da educação superior. Na prática, segundo Castro (2011), essa regulamentação imprimiu uma nova lógica ao sistema educacional do país, na qual a avaliação da qualidade é exercida pelo Poder Público, mediante instrumentos específicos.

A relação avaliação-qualidade, segundo análise de Morosini (2008), é composta por três características indissociáveis: isomorfismo, diversidade e equidade. A autora defende que tais características compõem os modelos ideais para a realidade brasileira em um ensaio denominado Qualidade Universitária: isomorfismo, diversidade e equidade, escrito em 2001. Ainda para Morosini (2008, p. 426), “o jogo de tensões e de incertezas na educação superior que vem acompanhando o desenrolar deste século está sendo marcado pela tendência aos compromissos com o desenvolvimento humano e social”.

Silva (2009) acentua que a qualidade educacional, ao herdar o conceito de qualidade do setor econômico, tem como preocupação básica o rendimento quantitativo dos alunos, e assinala quatro fatores que podem contribuir para a referência da qualidade na educação:

a) fatores socioeconômicos; b) fatores socioculturais;

c) fatores financeiros, considerando financiamento público adequado; d) fatores formativos, abrangendo o compromisso dos gestores centrais

com a formação dos docentes e demais profissionais da educação. Além desses fatores externos, há ainda os fatores internos, que definem os contextos escolares, a dinâmica de seus processos e os resultados educativos em cada IES.

de Arelaro (2003, p. 14, grifo do autor), como critério científico e político, a efetivação de três condições educacionais:

1) a democratização do acesso e da permanência dos alunos [...] na escola, traduzida em números, tendo como referência o atendimento a todos [...]; 2) a qualidade de ensino adotada pelo sistema educacional como uma variável da permanência, pois se o ensino e a escola forem considerados pelo aluno (des)qualificados, ele aí não permanece; 3) gestão democrática da educação [...].

Sendo assim, as IES carregam em si o desafio do ensino com qualidade expresso nas avaliações, tanto internas e externas, quanto nas de larga escala sobre o desempenho de seus estudantes, no contexto da implantação de políticas de expansão, acesso e permanência.

Atenta à discussão sobre o que significa uma educação de qualidade, Morosini (2008, p. 429), amparada em documentos da UNESCO, aponta sete características de uma educação de qualidade, quais sejam:

- Apoio ao enfoque fundamentado nos direitos a todos os esforços educativos. A Educação é um direito humano, consequentemente, a educação de qualidade apoia todos os direitos humanos;

- fundamento nos quatro pilares de la educación para todos – aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser (Delors et al., 1996);

- considera o estudante como um indivíduo, membro de uma família, de uma comunidade e cidadão do mundo que aprende para fazer-se competente em seus quatro papéis;

- defende e propaga os ideais de um mundo sustentável – um mundo justo, equitativo e pacífico no qual as pessoas se preocupam com o meio ambiente para contribuir com a equidade intergeracional; - toma em consideração o contexto social, econômico e o meio ambiental de lugar específico e configura o currículo como o programa para refletir essas condições específicas. A educação de qualidade é localmente importante e culturalmente adequada; - está conformada pelo passado [...], é significativa no presente e prepara as pessoas para o futuro;

- constrói conhecimentos, habilidades vitais, perspectivas, atitudes e valores; proporciona instrumentos para transformar as sociedades atuais em sociedades mais sustentáveis; e é possível de ser mensurada. Os anais da Conferência Mundial sobre o Ensino Superior, ocorrida em Paris de 05 a 09 de outubro de 1998, que gerou o documento denominado

Tendências da educação superior para o século XXI, assevera: “a qualidade do

ensino superior é inseparável da pertinência social [...] e está em função da qualidade de pessoal, dos programas, dos estudantes e da infraestrutura da gestão na instituição [...]” (UNESCO, 1998, p. 97-98).

A qualidade do ensino superior é solicitada ainda no Plano Nacional de Educação (PNE), Lei nº 13.005 (BRASIL, 2014), nas metas 12, 13, 14 e 15. Peixoto (2012, p. 69) comenta que “são enfatizados dois aspectos [...]: a necessidade de ampliação do acesso com permanência e de realizar a expansão com qualidade”.

A análise do Prouni, como uma política de ação afirmativa, que contribui para o acesso e qualidade do ensino superior, precisa ir além dos indicadores de desempenho, porém sem deixar de considerá-los. O programa, com dados nacionais e estaduais, é apresentado no próximo item.

PROGRAMA UNIVERSIDADE PARA TODOS

Criado pelo Governo Federal em 2004 e institucionalizado pela Lei nº 11.096, em 13 de janeiro de 2005, o Programa Universidade para Todos (PROUNI), tem como finalidade:

[...] a concessão de bolsas de estudos integrais e parciais a estudantes de baixa renda, em cursos de graduação e sequenciais de formação específica, em instituições privadas de educação superior, oferecendo, em contrapartida, isenção de alguns tributos àquelas que aderirem ao Programa (BRASIL, 2005, p. 7).

Na sua versão inicial, nos artigos 2° e 3° da referida lei as bolsas integrais eram concedidas a pessoas que tinham concluído o ensino médio e cuja renda familiar mensal não ultrapassasse o valor de um salário mínimo e meio, per capita, e as bolsas de estudo parciais de 50% ou de 25% seriam concedidas a brasileiros com renda familiar mensal per capita de até três salários-mínimos. Atualmente as bolsas parciais contemplam apenas 50%, deixando de existir a bolsa parcial de 25%.

O número de bolsas parciais e integrais ofertadas no Estado do Paraná durante o período de 2005 a 2014 contemplou 204.854 estudantes.

Tabela 1 – Bolsas ofertadas no estado do Paraná – 2005/2014

Ano Bolsa integral Bolsa parcial Total

2005 5.615 3.868 9.483 2006 8.054 7.427 15.481 2007 6.246 14.365 20.611 2008 7.324 15.169 22.493 2009 11.850 11.867 23.717 2010 7.249 12.592 19.841 2011 8.677 12.636 21.313 2012 8.855 19.101 27.956 2013 8.807 10.415 19.222 2014 10.293 14.444 24.737 Total 82.970 121.884 204.854

Fonte: Adaptado de SISPROUNI (2014).

Tabela 2 –Bolsas ofertadas no BRASIL – 2005/2014

Ano Bolsas 2005 112.275 2006 138.668 2007 163.854 2008 225.005 2009 247.643 2010 241.273 2011 254.598 2012 284.622 2013 252.374 2014 306.726 Total 2.227.038

O Programa é destinado também aos estudantes portadores de deficiência, nos termos da lei. Os professores da rede pública de ensino, matriculados nos cursos de licenciatura, normal superior e pedagogia, destinados à formação do magistério da educação básica, independentemente da renda a que se referem os parágrafos 1o e 2o do art. 1o da Lei de implantação

do Prouni, também poderão ser beneficiados pelo programa.

Dirigido aos estudantes egressos do ensino médio da rede pública ou da rede particular, estes na condição de bolsistas integrais, o Prouni possui um sistema de seleção informatizado que confere transparência e segurança ao processo. Os candidatos são selecionados pelas notas obtidas no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), conjugando-se, desse modo, inclusão à qualidade e mérito dos estudantes com melhor desempenho acadêmico.

O prazo máximo para concessão da bolsa de estudos para a conclusão do curso de graduação ou sequencial depende do cumprimento de requisitos de desempenho acadêmico estabelecidos pelo MEC.

No ano da sua implantação, em 2005, foram ofertadas 112.275 mil vagas, possibilitando, aos jovens que se enquadrassem às exigências da portaria que institui o Prouni, o ingresso em uma instituição de ensino superior, sendo que destas, 71.905 foram bolsas integrais e 40.370 bolsas parciais. Esta perspectiva aumentou, na ocasião, em 60% a oferta de ensino gratuito num único ano. O Prouni já atendeu, desde sua criação até o processo seletivo do segundo semestre de 2014, cerca de 2,2 milhões de estudantes, destes, em torno de 60% com bolsas integrais.

Embora o Programa tenha recebido muitas críticas pelo fato de o Governo Federal abrir mão de receitas previstas com a arrecadação de im- postos, de acordo com Haddad e Bachur (2004), com o Prouni, o MEC não compromete o seu orçamento, conforme constitucionalmente assegurado. Para as instituições com e sem fins lucrativos não filantrópicas que aderirem ao programa, o governo exige que ofereçam bolsa integral para cada 10 estudantes regularmente pagantes e devidamente matriculados ao final do correspondente período letivo anterior, excluído o número correspondente a bolsas integrais concedidas pelo Prouni ou pela própria instituição. Alternativamente, as instituições poderão oferecer uma bolsa

matriculados desde que ofereçam bolsas parciais de 50% na proporção necessária para que a soma dos benefícios concedidos atinja o equivalen- te a 10% da receita anual efetivamente recebidas dos períodos letivos que já têm bolsistas do Prouni em cursos de graduação ou sequencial de for- mação específica, em troca da isenção de Imposto de Renda (IR), Contri- buição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL), Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS).

Carvalho (apud PEIXOTO, 2012, p. 82) menciona que:

[...] o programa assumiu forte cunho de ação afirmativa, uma vez que levou em conta fatores como renda e categoria administrativa da escolaridade prévia, a cor/raça e a deficiência para a seleção de bolsistas, ademais de contemplar professores em exercício na educação básica em cursos vinculados à carreira docente. A iniciativa mudou a lógica de priorizar apenas a oferta via mercado, na medida em que promoveu o acesso das camadas mais pobres, sem contrapartida ou contraprestação de serviços.

Do ponto de vista das políticas de ações afirmativas e das considerações de Morosini (2008) sobre as características de isomorfismo, diversidade e equidade, o Prouni apresenta resultados que denotam a expansão do ensino superior. A experiência do programa em uma IES analisada é apresentada no item seguinte.

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