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A palavra Filologia origina-se do vocábulo grego φιλολογία (philologia), sendo formada por dois elementos: a raiz do verbo “amar” e o substantivo “logia”, designando seman- ticamente “amor à palavra”. Cambraia (2005) fala da polissemia do termo Filologia, que teria sido cunhado na Grécia antiga e ressalta que naquela época, o mesmo já apresentava sentidos diversos. Coutinho (1976) diz que qualquer estudo feito no sentido de reconstruir textos antigos de uma língua, corrigi-los quando errados, restituí-los à sua genuinidade quando inter- polados, constitui o trabalho de Filologia. Houaiss (2001) regis- tra quatro significados para a palavra Filologia:

1. estudo das sociedades e civilizações antigas através de documentos e textos legados por elas, privilegiando a língua escrita e literária como fonte de estudos.

2. estudo rigoroso dos documentos escritos antigos e de sua transmissão, para estabelecer, interpretar e editar esses textos.

3. estudo científico do desenvolvimento de uma língua ou de famílias de línguas, em especial a pesquisa de sua história morfológica e fonológica baseada em docu- mentos escritos e na crítica dos textos redigidos nessas línguas (p. ex., filologia latina, filologia germânica etc.); gramática histórica.

4. estudo científico de textos (não obrigatoriamente antigos) e estabelecimento de sua autenticidade através da com- paração de manuscritos e edições, utilizando-se de técni-

cas auxiliares (paleografia, estatística para datação, histó- ria literária, econômica etc.) esp. para edição de textos. Apesar da polissemia do termo retratada por Cambraia (2005) e observada na definição de Houaiss, sabemos que é o texto o objeto de estudo da Filologia, mas nem sempre foi fácil determinar as funções da atividade filológica. Spina (1977) já o preconizava:

Não tem sido fácil determinar com precisão o âmbito da Filologia, cujos objetivos têm varia- do conforme as épocas em que se praticou a atividade filológica, conforme os autores que a exerceram e até os lugares em que ela floresceu. Se fizermos abstração desses fatores, podemos dizer que, embora complexíssimo, o labor filo- lógico tem seu campo específico e tanto quanto possível bem determinado. Visto que a Filologia não subsiste se não existe o texto (pois é o texto a sua razão de ser), partamos dele para, de uma forma abrangente, configurar o seu campo. A Filologia concentra-se no texto, para explicá-lo, restituí-lo à sua genuinidade e prepará-lo para ser publicado. (SPINA, 1977, p. 75).

Sendo o texto o objeto da Filologia e sabendo que a escri- ta foi e tem sido, durante milênios, a principal forma de represen- tação da história e da memória da humanidade, ao estudar os textos escritos, a Filologia resgata a importância desses textos, não só atestando sua autenticidade, mas também salvando-os dos estragos acometidos pelo tempo. Não podemos deixar de mencionar que tal atividade cumpre um papel importante, pois resgata também grande parte da memória da humanidade.

Para alguns teóricos, o termo Filologia pode assumir um caráter amplo, como relata Swiggers (1998):

Uma posição bastante ‘liberal’ consiste em to- mar o termo ‘filologia’ num sentido bastante amplo, como acumulação extensiva de três do- mínios (ou níveis) de estudo: linguística, litera- tura e edição de textos (ou ‘filologia no sentido estrito’). Incluída em si mesma, a filologia desli- za, portanto, do estudo de línguas (e de textos) à ciência (ou a arte, cf. Bédier: ‘a arte de editar textos’) de estabelecer uma edição crítica dos textos. (SWIGGERS, 1998, p. 5-6).

A Filologia relaciona-se com diversas ciências, mas tal- vez a relação mais estreita delas seja com a Linguística em si, já que alguns teóricos como Elia (1970) e o próprio Saussure, em seu Curso de Linguística Geral, afirmam que a Filologia prece- deu a Linguística, mas hoje ela faria apenas parte dos estudos linguísticos. O que mais nos interessa nesse momento é atestar a importância da Filologia não apenas para os estudos linguís- ticos, mas também para outras ciências ou disciplinas que dela se beneficiam direta ou indiretamente, como a história. O la- bor filológico propicia o acesso aos textos por profissionais de diversas áreas e o filólogo é a ponte entre os textos antigos e todos os pesquisadores que se beneficiam do trabalho desse profissional, já que a leitura dos textos manuscritos é uma ta- refa árdua e, para alguns, impossível de ser desenvolvida por olhos não treinados e sem habilidade para fazê-lo. Ao editar os textos antigos, o filólogo lhes dá voz, trazendo-os à luz para que possam ser estudados e contemplados por todos aqueles que se interessarem por seu conteúdo, seja apenas para o es- tudo das formas ou das práticas sociais narradas nos textos.

Segundo Carvalho (2003), a Filologia praticada hoje es- taria dividida em dois campos:

1. da Linguística que faz o estudo científico das línguas do ponto de vista sincrônico (em uma dada época, em seu estado atual), Linguística Descritiva, e/ou diacrônico (através dos tempos), Linguística Histó- rica. Mais especificamente, o que melhor delimita este campo é o estudo comparativo e histórico das línguas;

2. da Filologia Textual/Crítica Textual que se ocupa do processo de transmissão dos textos, com a finalida- de de restituir e fixar sua forma genuína. Embora historicamente a Crítica Textual tenha privilegiado o estudo dos textos literários, atualmente considera tanto os textos literários como os não literários. Martins (2006), no prefácio da obra Diferentes perspec- tivas dos estudos filológicos, fala da expectativa de pesquisas filológicas cada vez mais ancoradas em estudos modernos e afirma que “a Filologia pressupõe diálogo, aproximação entre disciplinas” (MARTINS, 2006, p. 11). Tal aproximação buscamos realizar nesta discussão que, ancorada na linguística aplicada, busca revestir a ciência dos alexandrinos de uma roupagem modernizada, viva e dinâmica, como é a própria linguagem.