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Concepção dos Mosaicos de unidades de conservação

2 INSTRUMENTOS E ESTRATÉGIAS PARA CONSERVAÇÃO DA

3.9 GESTÃO DE MOSAICOS

3.9.1 Concepção dos Mosaicos de unidades de conservação

Os mosaicos podem ter distintas dimensões e formas, ocupando um ou vários municípios e Estados. Seu contorno depende, a princípio, da disposição inicial das Unidades de Conservação que o compõem. Considerando as teorias de biologia da conservação, para definição do contorno do mosaico, é necessário fazer com que sejam fomentadas as conexões entre os fragmentos, tornando maior a área de circulação das espécies e, conseqüentemente, o fluxo de genes. Antes de tudo, porém, um corpo técnico deve estar ciente das funções esperadas de cada conexão entre os fragmentos, segundo Hess & Fischer (2001). Toma-se a precaução de se fazer uma conexão entre fragmentos que haja como filtro, por exemplo, de espécies não desejáveis. As espécies de fauna e flora, sobretudo as espécies guarda-chuva e metapopulações têm de estar identificadas de modo a considerá-las como foco de conservação.

De acordo com o foco de conservação, os corredores ecológicos que conectam os fragmentos dentro do mosaico devem ser planejados, com suas funções bem definidas. Corredores planejados para uma função específica podem servir a outras funções de forma não intencional. A capacidade dos animais se moverem dentro da área do corredor é, geralmente, a mais observada no planejamento. Entretanto, para determinadas espécies, é necessário que o corredor seja mais do que um meio de passagem. Se o corredor servir como habitat para essa espécie ele vai demandar uma estrutura diferente, podendo variar a largura, extensão, contorno da borda, tipo de espécies vegetais a serem inseridas num eventual programa de recuperação, entre outros fatores estruturais (HESS & FISCHER, 2001).

Corredores mais estreitos podem servir de área de passagem para indivíduos numa escala de tempo que varia de horas até meses. À medida que se aumenta a largura dos corredores, aumenta-se o número de espécies que utilizam aquele espaço para transitar de um fragmento a outro, bem como a escala de tempo em que eles utilizam esse determinado corredor, podendo até mesmo usar o espaço como habitat em si, e não apenas como passagem (HESS & FISCHER, 2001).

Entretanto, o meio físico e biofísico no qual se encontra o mosaico pode impor limitações aos planejadores. Muitas vezes, propriedades rurais e áreas já urbanizadas fazem parte da área do mosaico. Instrumentos de ordenamento territorial como os planos diretores e zoneamentos precisam ser observados ao se planejar o mosaico, numa escala mais ampla, e os corredores ecológicos, numa escala mais aproximada. Portanto, o formato e tamanho do mosaico vão depender do equacionamento das variáveis: espécies foco de conservação, função dos corredores, escala de tempo trabalhada, capacidade de gestão, e limitações impostas pelos instrumentos de ordenamento territorial.

Nem sempre as conexões são necessárias. Uma determinada espécie, como um pequeno mamífero, talvez possa circular em áreas de pastagem, evitando possíveis gastos com recuperação de áreas degradadas. Portanto, as eventuais conexões entre os fragmentos devem ser planejadas com base nas teorias da Ecologia das Paisagens, que considera os diversos tipos de uso do solo. O mosaico não pode ser nem tão pequeno que impeça a manutenção da biodiversidade, nem tão grande que impossibilite a gestão integrada da área. As ações propostas pele planejamento tem de ser factíveis e de acordo com a dimensão do mosaico e seu contorno.

As áreas de interstícios, normalmente ocupadas por terras privadas, geralmente possuem Áreas de Preservação Permanente e Reservas Legais que devem ser incorporadas à estratégia de conservação da biodiversidade na área do mosaico. Quando a propriedade privada não tiver sua Reserva Legal averbada e devidamente protegida, pode-se lançar mão de ferramentas como a servidão florestal e ambiental, além dos Termos de Ajustamento de Conduta – TACs, em parceria com o Ministério Público. A criação de RPPNs, ainda que se faça por um processo burocrático e demorado, nunca deve ser descartada. Seu incentivo eventualmente pode trazer frutos positivos que, para efeito de conservação, são fundamentais.

Considerando as infinitas possibilidades de desenhos e estratégias, os mosaicos devem ser estrategicamente planejados caso a caso, incorporando não só as unidades de conservação, mas outras áreas protegidas e terras privadas. Por envolver áreas extensas, distintos proprietários de terras e diferentes esferas da administração pública, a criação dos mosaicos requer que várias instituições participem de sua criação e gestão.

Há, basicamente, 3 formas de integrar as terras privadas numa estratégia de conservação. A primeira, mais dispendiosa e complicada, seria a desapropriação para a transformação em unidade de conservação. Uma estratégia não recomendável, a princípio. A segunda seria o incentivo à transformação de parte da propriedade em RPPN, que depende da aceitação do proprietário e demanda arranjos complexos. A terceira, que não exclui as demais, é a mais natural e, talvez, a mais simples: a inclusão das Áreas de Preservação Permanente e Reservas Legais na estratégia de conservação.

Se cada propriedade respeitasse o código florestal, ter-se-ia mais 20% de sua área preservada no bioma Mata Atlântica, por exemplo, porcentual considerável para fins de conservação. As APPs, aliadas às Reservas Legais, podem servir de conexão entre as unidades de conservação do mosaico. O código florestal permite ainda o uso da ferramenta da Servidão Florestal. A servidão florestal é o mecanismo que permite ao proprietário de imóvel rural com Título de Domínio oferecer parte de sua fazenda para figurar como reserva legal de terceiros, desde que esteja localizada na mesma bacia hidrográfica, que prevê que o dono de uma área poderá emitir certificado e negociar um valor com os interessados em preservá-la a fim de compensar a destruição de reserva legal nas terras. A servidão florestal pode, pois, ser usada ainda como uma ferramenta econômica, pois valoriza as áreas preservadas. A servidão florestal busca atender ao princípio da função social da propriedade e de preservação do meio ambiente.

A servidão ambiental, por sua vez, é um acordo objetivando a proteção de uma determinada área de terras, cujo proprietário concorde em impor uma limitação de uso, temporária ou perpétua, ao imóvel, abrindo mão de algum ou alguns componentes de seus direitos, como uso, fruição ou gozo. Por meio da servidão ambiental, o proprietário destina a totalidade ou parte de sua área para fins de preservação ambiental, impondo uma ou mais limitações de uso do imóvel protegido. A servidão de conservação pode ser instituída em favor de uma pessoa, de alguma entidade privada ou do próprio poder público.

A realidade, entretanto, é que poucos proprietários preservaram suas APPs e Reservas Legais. Em muitos casos, é preciso recuperá-las. Para tanto, torna-se imperativa a participação do Ministério Público. O Projeto Corredores Ecológicos – PCE usou com sucesso os Termos de Ajustamento de Conduta, conhecidos com TACs, com os proprietários privados18, garantindo o cumprimento da legislação e, por conseguinte, a inclusão das propriedades privadas nas estratégias de conservação por meio das APPs e Reservas Legais. Tal ação pode ser potencializada se usada em conjunto com mecanismos de pagamento por serviços ambientais, que serão discutidos adiante.