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2 INSTRUMENTOS E ESTRATÉGIAS PARA CONSERVAÇÃO DA

4.4 A DEGRADAÇÃO DO BIOMA MATA ATLÂNTICA

A história da destruição da Mata Atlântica se confunde com a história do Brasil (DEAN, 1996). Ela começou a ser degradada com a chegada dos portugueses em 1500. Embora vastas áreas já eram ocupadas por grupos indígenas, segundo Holanda 1995 apud Medeiros et al., 2004, as descrições são de uma floresta intocada, de grande riqueza natural, muito próxima do que seria o paraíso terrestre para os portugueses.

Os colonizadores das terras brasileiras sempre tiveram uma relação predatória com as florestas, que lhe fornecia o sustento de maneira farta. Houve supressão de vastas áreas de modo a abrir espaço para expansão da lavoura, assentamentos das cidades. A madeira era o principal produto extraído, não havendo valorização dos produtos não madeireiros. Não havia, naquele momento qualquer percepção da importância dos benefícios ambientais gerados pela floresta (DEAN, 1996). Destruir a floresta era essencial para o desenvolvimento das sociedades humanas e sinônimo de posse e domínio da terra (MEDEIROS, 2006).

O Pau-brasil, presente ao longo da costa, era muito apreciado por seu uso econômico, e foi fartamente explorado, antes mesmo do ouro e das pedras preciosas - também abundantes

26 Wigold Schaffer, Coordenador do Núcleo para a Mata Atlântica e Campos Sulinos do Ministério do Meio Ambiente – NAPMA (inf. Pessoal, 2007).

no “novo mundo”. Somente em 1859, após mais de 3 séculos de exploração, o monopólio da coroa portuguesa sobre o Pau-brasil terminou. Constatou-se que o volume contrabandeado era maior que o das vendas oficiais e já existiam corantes produzidos a partir do alcatrão mineral (CAPOBIANCO, 2001; DEAN, 1996)

A Exploração predatória não se limitou ao Pau-brasil, pois a Mata Atlântica possuía outras espécies de árvores de alto valor econômico para a construção naval, de móveis, edificações. Madeiras nobres como sucupira, canela, canjarana, jacarandá, araribá, pequi, jenipaparana, peroba, urucurana e vinhático, foram intensamente exploradas (DEAN, 1996). A maioria das matas “primárias” e hoje colocadas sob a proteção das unidades de conservação, foram desfalcadas já há dois séculos (DEAN, 1996).

Outras espécies como as bromélias, cactos e orquídeas foram intensamente exploradas. Muitas vezes, árvores eram derrubadas tão somente para facilitar a extração dessas plantas (DEAN, 1996). Além dos recursos vegetais, também houve comércio de carne, couros e peles de animais silvestres da Mata Atlântica. Eram valorizados a onça, o veado, a lontra, a paca, cobras, jacarés, anta, outros e outros animais, além de penas e plumas e carapaças de tartarugas (DEAN, 1996).

O sistema de concessão de sesmarias contribuiu fortemente para a destruição da Mata Atlântica. Os proprietários recebiam gratuitamente suas terras e a esgotavam até a total exploração da mata. Em seguida, facilmente obtinha outra ao governo para repetir o ciclo de exploração. Não fazia sentido preservar uma propriedade já que poderia ser substituída por outra sem custo. Este modelo instituído pela Coroa Portuguesa durou séculos (DEAN, 1996), após o período colonial. A Empresa South Brazilian Lumber and Colonisation Comp. Ltda, por exemplo, recebeu concessão para explorar milhares de hectares das florestas ricas em araucárias e embuias na região sul do Brasil (CAPOBIANCO, 2001).

Todos os principais ciclos econômicos após a exploração do pau-brasil também contribuíram fortemente para a destruição da Mata Atlântica. A mineração do ouro e diamantes, a criação de gado, as plantações de cana-de-açúcar e café (DRUMMOND, 1997) a industrialização, o plantio de soja e fumo foram todos responsáveis pela degradação do bioma (CAMPANILI & PROCHNOW, 2006).

Mesmo recentemente, a exploração da Mata Atlântica teve importância econômica nacional. Segundo Capobianco (2001), até meados de 1970, o bioma contribuía com 47% da produção de madeira em tora no país, somando um total de 15 milhões de metros cúbicos. Devido à exploração insustentável, esta soma caiu para 7,9 milhões de metros cúbicos em 1988.

Em um bioma onde as espécies estão muito entrelaçadas em uma rede complexa de interdependência, o desaparecimento de uma planta ou animal compromete as condições de vida de várias outras espécies. Muitas espécies estão ameaçadas de extinção. O comércio ilegal, por exemplo, é responsável pelo quase desaparecimento do palmito juçara (Euterpe edulis). A lista de espécies ameaçadas de extinção publicada pelo Ibama, em 1989, trazia 202 espécies de animais consideradas em extinção, das quais 171 eram da Mata Atlântica. Na lista mais recente, publicada pelo Ministério do Meio Ambiente em 2003, traz dados mais preocupantes: a lista de ameaçados de extinção contém 633 espécies, a maior parte habitando a Mata Atlântica. Do total de 265 espécies de vertebrados ameaçados, 185 estão nesse bioma, sendo 100 endêmicos. Das 160 aves, 118 ocorrem na Mata Atlântica, sendo 49 endêmicas. Entre os anfíbios, as 16 espécies ameaçadas são endêmicas da Mata Atlântica. Das 69 espécies de mamíferos ameaçados, 38 ocorrem no bioma, sendo 25 endêmicas, como o Muriqui (Brachyteles arachnoides), o maior primata das Américas. Muitas espécies podem ter sido extintas antes mesmo de catalogadas (CAMPANILLI & PROCHNOW, 2006).

Com o processo de ocupação do território nacional concentrado, até meados do século passado, na faixa litorânea, a Mata Atlântica foi o bioma brasileiro mais impactado pelas ações dos seres humanos. A SOS Mata Atlântica, em parceria com o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), faz desde os anos 1990 um estudo sistemático, de cinco em cinco anos, dos remanescentes da floresta. O primeiro índice, de 1990, foi de 8,8%. Estimava-se que, em dezembro de 2006, restavam cerca de 6,9% de matas primárias e secundárias em estágio avançado de recuperação (SOS Mata Atlântica & INPE, 2006). Desses remanescentes, 43% estariam na região Sudeste, 40,5% no Sul, 15,5% no Nordeste e menos de 1,0% no Centro-Oeste (MMA, 2006). O processo de fragmentação da Mata Atlântica atingiu níveis críticos em muitas regiões do País. A extração predatória de madeira, plantas ornamentais e outros produtos florestais e a caça, constituem, ainda, ameaças permanentes. Essa situação

crítica da Mata Atlântica fez com que a Conservation International – CI incluísse o bioma entre os cinco primeiros colocados na lista de Hotspots27.

Em janeiro de 2007, o Ministério do Meio Ambiente divulgou um estudo por ele encomendado que apontava que a Mata Atlântica tem cerca de 27% de remanescentes (Cruz et al., 2007). Esses dados ainda serão validados com o IBGE que vai checar se o mapa está de acordo com as informações colhidas em campo. Alguns fatores podem explicar a diferença entre o levantamento do MMA e aquele feito pela SOS Mata Atlântica e Inpe. A base de dados empregada pelo MMA usou o Mapa dos Biomas Brasileiros de 2004, enquanto a SOS Mata Atlântica utiliza o Mapa de Vegetação do IBGE, elaborado em 1993. Outro fator é que as florestas secundárias em estado avançado de regeneração entraram no cálculo do MMA, o que não ocorre nas análises da SOS Mata Atlântica. O mapa mais recente usa uma escala de 1: 250.000 e não considera áreas menores que 40 hectares. A malha da SOS é mais fechada. Ela usa imagens de 1 para 50 mil e leva em consideração áreas a partir dos 5 hectares. O conceito de remanescentes adotado no levantamento do MMA é mais abrangente que o do Atlas, incluindo as fitofisionomias não florestais e todos os tipos de formações pioneiras, inclusive as comunidades aluviais e os cordões arenosos (Cruz et al., 2007)

A análise do mapeamento final possibilitou distinguir que os principais remanescentes de floresta em termos quantitativos e de continuidade estão associados a dois fatores principais: a) Regiões e unidades geomorfológicas em domínios morfoestruturais de faixas dobradas (montanhas), escarpas ou bordas de planaltos e vales fluviais encaixados; e b) O Sistema de Unidades de Conservação (Cruz et al., 2007).