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Concepção de educação no MOVA-BRASIL

No documento Romero José de Melo Ribeiro (páginas 85-89)

3 MOVA-BRASIL POSSIBILITANDO A INOVAÇÃO PEDAGÓGICA Acompanhando as transformações sociais e o ímpeto de evolução humana o

3.2 Concepção de educação no MOVA-BRASIL

Entender a educação como ato de aprendizagem que busca desenvolver um processo de emancipação e humanização do educador exige pensá-la para além da lógica do mercado, substituindo, em grande medida a competição pela colaboração, o papel do indivíduo isolado em seu próprio mundo - pelo papel do cidadão, atuando em numa coletividade e comprometido com a sociedade da qual participa, fazendo sua própria história e por ela sendo condicionado.

Acreditar na possibilidade de uma educação em que educador e educando sejam vistos como sujeitos do processo em um movimento de colaboração respeitosa entre ambos, contrário à tese segundo a qual o educador detém o conhecimento e o

transmite ao educador que recebe esses conhecimentos, memoriza-os e reproduz ao longo da vida.

Neste programa de aprendizagem, a relação entre educador e educando é de compartilhamento de saberes diferentes, cada um com uma carga de conhecimento e sua parcela de responsabilidade na construção de novos conhecimentos. Cabe ao educador lançar mão de procedimentos metodológicos para que os educandos reconheçam que sabem um conjunto de coisas e ajam para saber o que ainda não sabem. Esses saberes devem ser sempre contextualizados a fim de que os educadores percebam a importância desses conhecimentos para suas vidas e possam, desse modo, saber mais e melhor.

Não se trata aqui de uma visão reducionista nem utilitarista dos processos de aprendizagem, segundo a qual todo conhecimento deve servir a um fim específico imediato na vida do educando. Sabemos que nem tudo que se aprende em um dia pode ser posto em prática no dia seguinte. Trata-se, antes, de entendermos os diferentes processos de aprendizagem educacional como a ampliação e o aprofundamento de conhecimentos que, por meio do estabelecimento de relações entre eles, nos possibilitam agir com mais propriedade em diversas situações do nosso dia a dia, utilizando dos diferentes domínios dos saberes que a humanidade já construiu.

Desse modo, o aprendizado de uma determinada equação matemática, por exemplo, pode não ser posto em prática logo em seguida, mas o raciocínio lógico matemático, certamente, será de grande valia na vida de qualquer pessoa que vive em sociedade como a nossa, na qual os aspectos da cognição e da lógica fazem parte do dia a dia. A esse respeito Paulo Freire expressa que:

Essa relação respeitosa entre educador e educando é parte da crença segundo a qual não existem saberes superiores ou melhores; existem saberes diferentes e inconclusos que necessitam do diálogo para se complementarem. Ainda que essa complementação seja sempre provisória, uma vez que o saber completo, absoluto, jamais será alcançado, nem por isso, ou até por isso, sua busca jamais terá um fim. Trata-se de um fim jamais alcançado e sempre perseguido. (FREIRE, 2008, p.96).

Essa concepção de educação do programa MOVA-BRASIL está diretamente vinculada ao conceito de educação popular, possibilitando que os educadores e

educandos situem-se e ajam reflexivamente no contexto local e geral da sociedade. O educador é o provocador no processo de construção de saberes do mundo e na compreensão do mundo que o cerca, estimulando o educando, por meio do diálogo, a trocar experiências, ampliar saberes e intervir na sociedade. Onde o diálogo é condição para o conhecimento, que implica comprometimento com a promoção da vida. Nesse sentido, o ato de conhecer se dá num contexto social em que o diálogo é o mediador e o fertilizador deste processo.

Quanto à importância da dialogicidade na construção conjunta do conhecimento foi possível encontrar em relatos do Ministério da Educação (MEC) caracterizações fundamentais desse processo de aprendizagem.

[...] características essenciais da formação humana. Reconhece a pessoa como sujeito histórico, em permanente construção de si mesmo. Trabalha-se com relações humanas de colaboração, de corresponsabilidade e solidariedade. [...] trabalha-se com relações entre pares, em círculo, olho no olho, partilhando e contrapondo entendimentos, compreensões diferentes numa construção coletiva de soluções. Superam-se e evitam-se as relações de ‘ensinação’, que fazem com que no grupo um fale e os outros ouçam submissamente. [...] todos aprendem e ensinam. [...] exigem respeito e reconhecimento da contribuição do outro na dialogicidade. [...] apoia-se no pressuposto de que ninguém consegue ser só, isolado no mundo. Parte do entendimento de que de que o homem é um ser eminentemente social e, como afirmou Paulo Freire, que o homem só consegue ser na medida em que outros homens também o são. (MEC, 2006, p.39-40).

Por isso é que o programa de alfabetização MOVA-BRASIL dialoga com os saberes da comunidade e dos educados. Eles são considerados de grande importância para a humanidade por fazerem parte do conjunto de conhecimentos que as pessoas construíram ao longo da vida, estão baseados nas experiências concretas do seu dia a dia.

Nesse processo, o reconhecimento e a valorização desses saberes são constitutivos da aprendizagem e da educação como prática da liberdade, visando-se estabelecer a devida articulação entre esses conhecimentos e os saberes historicamente sistematizados pela humanidade, na perspectiva da qualidade social que buscamos com a prática pedagógica, que tem como principal finalidade contribuir para a construção da autonomia de todos os envolvidos.

De acordo com a concepção de educação do programa de alfabetização MOVA- BRASIL e a concepção libertadora de educação, o educador não pode ser visto como

uma caixa vazia que recebe os depósitos dos educadores, ainda impregnados do paradigma tradicionalista e conceitos retrógrados. Nessa concepção paradigmática, a relação que se estabelece entre educador e educando é de sujeito e objeto, sendo o educando um mero recipiente pronto a receber os saberes do educador. Nesse caso, não há diálogo e a relação entre os participantes é vertical, ficando marcada a hierarquia entre educador e educando.

A esse respeito, Sousa descreve bem essa elação entre educador e educando, apontada por Paulo Freire na concepção paradigmática da educação.

A concepção bancária do processo de ensino / aprendizagem é, no entanto, cada vez mais posto em causa. Paulo Freire descreve-a bem como a linearidade processual de alguém que educa e alguém que é educado, de alguém que disciplina e alguém que é disciplinado, de alguém que fala e de alguém que escuta, de alguém que prescreve e de alguém que segue a prescrição, de alguém que escolhe o conteúdo e de alguém que o recebe como um depósito, de alguém que sabe e alguém que não sabe, de alguém que é sujeito do processo e alguém que é dele objeto. (SOUSA, 2010, p. 4).

Essa concepção de educação perpassa pela compreensão da incompletude e inacabamento do ser humano. Desse modo, todo tempo é tempo de aprender, pois não é um ato finito, mas de constante renovação. Essa perspectiva dialoga com a noção de alfabetização, a qual se associa a uma visão ampla de educação, que se estende ao longo de toda vida e que considera, portanto, que as pessoas estão permanentemente se educando em diversos âmbitos sociais, para além da escola. E, por que não entre muralhas de uma prisão física?

A educação passa a ser entendida como uma condição necessária ao desenvolvimento pessoal e social. Como educador popular, Paulo Freire (1987) defende que a educação sozinha não pode transformar a sociedade, mas, sem ela, tampouco a sociedade muda, pois ela jamais é neutra, mas, sim, impregnada de intencionalidade.

Nesse modo a conscientização da educação a partir das escolhas em vários aspectos da evolução social recai sobre o sentido de mudanças paradigmáticas em que Fino descreve a condição para essas práticas enquanto inovação pedagógica.

A inovação pedagógica implica mudanças qualitativas nas práticas pedagógicas e essas mudanças envolvem sempre um posicionamento crítico, explícito e implícito, face às práticas pedagógicas tradicionais. É certo que há fatores que encorajam, fundamentam ou suportam mudanças, mas a

inovação, ainda que se possa apoiar nesses fatores, não é neles que reside, ainda que pode ser encontrada na maneira como são utilizados. Se quisermos colocar a questão em termos de ruptura, no sentido de Khun (1962) atribui a ruptura paradigmática, a inovação pedagógica pressupõe um salto, uma descontinuidade. Neste caso, descontinuidade relativamente ao velho e onipresente paradigma fabril, tal qual é descrito por Toffler (1970) e Gimeno Sacristán (1985), e acontece localmente, isto é, no espaço físico ou virtual, onde se movem aprendizes e professores, funcionando estes, deliberadamente, como agentes de mudança, E consiste na criação de contextos de aprendizagem, incomuns relativamente aos que são habituais nas escolas, como alternativa à insistência nos contextos de ensino. (FINO, 2001, p. 1).

Desde modo, o ato de educar pressupõe estar consciente das escolhas realizadas em relação aos conteúdos, às metodologias, à avaliação, à comunicação e à convivência. Dependendo das decisões, ou seja, das escolhas que fazemos, a educação que realizamos pode ser transformadora, emancipadora e inovadora. Contribuindo para a aprendizagem e dinâmica social.

No caso do programa MOVA-BRASIL, busca-se a concretização da concepção crítico- libertadora através de mecanismos de aprendizagem, inovação e transformação que em sua essência de ensino norteia a construção da identidade de sujeitos / educandos como cidadãos de direito.

No documento Romero José de Melo Ribeiro (páginas 85-89)

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