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Educação prisional: realidade e utopia

No documento Romero José de Melo Ribeiro (páginas 100-103)

3 MOVA-BRASIL POSSIBILITANDO A INOVAÇÃO PEDAGÓGICA Acompanhando as transformações sociais e o ímpeto de evolução humana o

QUADRO DE SISITEMATIZAÇÃO DA LEITURA DE MUNDO 1 Situações

4 MOVA-BRASIL: UMA EDUCAÇÃO CAPAZ DE ATENDER ÀS NECESSIDADES DOS ENCARCERADOS

4.1 Educação prisional: realidade e utopia

Iniciada a partir da década de 1950, a educação no sistema penitenciário surgiu da necessidade de reestruturar o conceito sobre unidade carcerária no país. Antes utilizado unicamente como um local de punição e contenção de pessoas rejeitadas pela sociedade por transgredirem as normas de convívio social. Apenas detenções sem propostas de requalificação e transformação dos indivíduos enclausurados.

Entretanto, percebeu-se o fracasso desse objetivo no sistema carcerário. Os índices de reincidência dos crimes não diminuíram e os presos em sua maioria não se transformavam. De acordo com Foucault (2008, p. 153), “a prisão continuava mostrando-se, em sua realidade e em seus efeitos visíveis, como grande fracasso da justiça penal”. Assim, constatou-se o insucesso deste sistema prisional, o que motivou a busca de novos rumos, ocasionando na inserção da educação escolar nas prisões. “A educação do detento é, por parte do poder público, ao mesmo tempo uma precaução indispensável no interesse da sociedade e uma obrigação para com o detento”. (FOUCAULT, 2008, p. 224).

Na busca de reverter a ociosidade e a intranquilidade no cárcere causadas pela falta de ocupação dos presos e em atender aos questionamentos da sociedade sobre medidas de recuperação dos apenados, criou-se a educação carcerária. Dessa criação podemos fazer uma comparação com a invenção da escola pública no auge da Revolução Industrial, como iniciativa da classe dirigente da época ao despertar para a necessidade de escolarizar os proletariados e de possibilitar que adultos frequentassem a escola para atender as necessidades de produtividade e de mão de obra especializada dos grandes proprietários. Além de dar resposta a tomada de consciência da classe fabril, adquirida através dos ideários da Revolução Francesa. A esse respeito o estudioso em educação prisional Marc de Maeyer destacou que:

[...] a educação na prisão tem uma porção de justificativas (explícitas) e preocupações: garantir um mínimo de ocupação para os internos (ter certeza de que a segurança e a calma estejam garantidas), oferecer mão de obra barata para o mercado de trabalho, quebrar o lado ruim da personalidade e construir um novo homem e uma nova mulher, apresentando atitudes e comportamentos adequados para a vida externa [...]. (MAEYER, 2006, p. 19).

Sobre esse despertar para a necessidade de criação de uma educação como forma de controle, longe de diminuir a distância entre a realidade escolar e a realidade exterior, típico do paradigma fabril e semelhante aos propósitos iniciais de dominação ao instituir-se a educação prisional, mas ainda estruturalmente atuais, Fino e Sousa destacam que:

Os planificadores da escola destinada a suprir as necessidades da sociedade industrial, tiveram a intuição de fazê-la corresponder a uma antecipação da realidade que os alunos haveriam de encontrar no futuro, quando se integrassem na vida ativa. Desenharam-na, portanto, segundo um modelo inspirado literalmente nas fábricas. A importância fundamental desse fato radica na circunstância dos alunos, ao entrarem na escola, passarem

imediatamente a ‘respirar’ uma atmosfera carregada de elementos e de significações que se revelam ser muito mais importantes e decisivos que as meras orientações inscritas no brevíssimo currículo ‘oficial’ da escola pública. (SOUSA; FINO, 2001, p. 373).

Formalmente, hoje, os direitos à educação das pessoas privadas de liberdade estão assegurados em normas nacionais e internacionais como determina a Lei nº 7.210 de 11/07/84, que instituiu a Lei de Execução Penal (LEP). Dentre os principais direitos de índole constitucional reconhecidos e assegurados aos apenados destacam-se: o direito à vida, o direito à integridade física e moral; o direito à liberdade de consciência, o direito à instrução e o direito às atividades relativas às ciências, às letras, às artes e à tecnologia. Logo, torna-se uma determinação legal implantar em todos os estabelecimentos prisionais programas de educação de jovens, adultos e idosos de nível fundamental e médio, assim como de formação profissional, contemplam para esta clientela as metas e objetivos da lei vigente. Mas, a realidade demonstra que ainda há um longo caminho a percorrer para sua efetivação.

Nesse sentido, o direito a educação nas prisões (que deve ser garantido) é visto e tratado como um benefício e até um privilégio por profissionais de segurança prisional. Em tal contexto pode-se observar duas lógicas opostas: a da educação que busca a emancipação e a promoção da pessoa e a da segurança que visa manter a ordem e a disciplina por meio de um controle totalitário e violento subjugando os presos. São procedimentos nada educativos. A natureza do estabelecimento penal, como funciona hoje, é hegemonicamente mais punição do que recuperação do apenado. Em tal ambiente de pouco espaço para o exercício da individualidade e da reflexão, a educação fica minimizada.

Evidencia-se, assim, a necessidade de mudar culturas, o discurso e as práticas educativas para compatibilizar a lógica de segurança (de encarceramento) com a lógica da educação (de caráter emancipatório), pois, ambas são convergentes quanto aos objetivos da prisão: a recuperação e a ressocialização dos presos.

Notoriamente, a abordagem de temas como direitos humanos e de combate ao racismo, sexismo, homofobia, intolerância religiosa, entre outras discriminações, contribuirá para se alcançar a pretendida mudança cultural. No entanto, a inclusão dessas temáticas pedagógicas pelo programa de alfabetização prisional MOVA- BRASIL já é uma realidade nas prisões pernambucanas.

Certamente a falta de investimento, estímulo e acesso à educação da população carcerária brasileira têm contribuído para o processo de exclusão social já anterior à prisão. De acordo com o último levantamento do Ministério da Justiça, divulgado em dezembro de 2013, a população carcerária brasileira corresponde a 548.003 presos, entre homens e mulheres. Desse total 19,7% são completamente analfabetos e apenas 11,8% frequentam a escola. Em Pernambuco a realidade não é diferente. Segundo a Gerência de Educação e Qualificação Profissionalizante (GEQP), setor responsável pelo atendimento educacional da Secretaria Executiva de Ressocialização (SERES), órgão que responde pelo sistema penitenciário do Estado, dos 28.769 encarcerados, 4.928 estão matriculados em escola prisional, correspondendo a 17% do seu contingente. E, o mais surpreendente, ainda sobre os dados apresentados pela GEQP, nesse mesmo período, é sobre o índice de analfabetismo nas unidades prisionais de Pernambuco, que chega a 12,2% da sua população carcerária.

Mesmo assim, o quadro da alfabetização no sistema prisional de Pernambuco apresenta resultados positivos desde o ingresso do programa de alfabetização prisional MOVA-BRASIL, representando um decréscimo de 22,2% do número analfabetos desde 2009 (ano anterior ao MOVA-BRASIL nas unidades carcerárias) até dezembro se 2013. Essa redução do índice de analfabetismo entre os reeducandos do Estado demostra o grau de eficácia e representatividade educacional, política e social do programa no sistema prisional de Pernambuco e em particular no presídio de Igarassu.

4.2 Inovação e destaque pedagógico no meio dos conflitos prisionais

No documento Romero José de Melo Ribeiro (páginas 100-103)

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