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O MAPA DA MINA: INTRODUÇÃO

Capítulo 1 ESCOLHENDO AS GEMAS: O REFERENCIAL TEÓRICO

1.1. FORMAÇÃO DE PROFESSORES

1.1.2 Concepções atuais

Autores como Perrenoud (2001), Taruni (1999), Pimenta (1997), Mizukami (2002), entre outros, indicam que nas últimas décadas vemos crescer os questionamentos sobre o papel do conhecimento, do professor e do aluno dentro do sistema educacional. Para Taruni (1999) as discussões sobre formação de professores da educação básica se intensificaram, em sincronia com o movimento de revitalização da escola normal, as reestruturações dos currículos e dos cursos de pedagogia deram lugar a um novo olhar sobre os cursos de formação em nível superior e um aumento no número de publicações de autores a respeito da formação docente.

Porém, na era do telefone com vídeo ainda enfrentamos sérios bloqueios com relação a qualquer inovação na estrutura de instituições e cursos de formação de professores. Entre eles podemos citar a separação tradicional entre professores polivalentes – educação infantil e primeiros anos do ensino fundamental – e professor especialista de disciplina. Essa diferenciação criada pela primeira legislação no século XIX e vigente até hoje discrimina, em uma ordem de menor/maior, tanto em relação aos cursos como ao trabalho, salário e carreira. O resultado dessa discriminação na formação de professores da educação básica está diretamente relacionado à fragmentação entre as áreas disciplinares e os níveis de ensino, assim como a separação da pesquisa na formação inicial de professores. Em outros países os centros de formação de professores incluem varias especialidades, além de estudo, pesquisa, e extensão (GATTI, 2010).

Outros bloqueios citados por pesquisas na área são: a dissociação teoria/prática na formação docente, ou seja, até as disciplinas mais especificas são abordadas de forma descritiva, sem o foco que relacione adequadamente as teorias às práticas (VIEIRA- ABRAHÃO, 2007; GAMA, 1996); o desequilíbrio em relação à teoria e às práticas, em favor dos tratamentos mais teóricos, o que leva a formação a um patamar abstrato desintegrado do contexto concreto no qual o profissional vai atuar (GATTI, 2010); a incerteza quanto ao melhor momento do estágio durante a formação, se ao final, no meio, ou desde o inicio do curso (GATTI, 2010); a escassez dos conteúdos a serem ministrados na educação básica, que geralmente são abordados de forma genérica ou superficial; a tendência da formação de profissionais técnicos, voltada para a solução de problemas práticos e imediatos (TARDIF, 2010).

Mizukami (2002) assevera que a aproximação da sociedade a uma situação mais democrática nos faz superar os enfoques tecnológicos, funcionalistas e burocratizados e nos aproxima a um caráter mais relacional, dialógico, cultural-contextual e comunitário. Essas mudanças sociais alteram o papel da escola e superam a concepção de saber escolar como conjunto de conhecimentos eruditos, passando a aderir perspectivas mais complexas como a da formação de cidadãos.

Mizukami (2002) completa que como o professor tem que lidar com o conhecimento em construção e não somente com a transmissão de conhecimentos via técnica, o modelo de racionalidade técnica não dá mais conta da formação de professores, então esse desenvolvimento passa a se dar por meio de situações práticas e sua problematização, o que exige o desenvolvimento do processo de reflexão.

A autora parte da concepção de Knowles & Cole (1995) de que a formação de professores se dá dentro de um processo de desenvolvimento continuo durante toda a sua vida.

Então a ideia de formação docente na atualidade diverge da que prevaleceu até pouco tempo atrás, em que se concentrava principalmente no que hoje chamamos de formação inicial ou em eventos, como por exemplo, os cursos de curta duração (oficinas de reciclagem, capacitações etc.) Esse modelo desatualizado apoiava-se no conceito de acúmulo de conhecimentos tidos como teóricos para uma posterior aplicação da teoria e da técnica científica (SCHÖN, 1983 apud. MIZUKAMI, 2002). O conceito atual de formação docente ampara-se no paradigma da racionalidade prática que vê essa formação como um processo contínuo.

A concepção tecnicista do trabalho docente como a aplicação de teorias, talvez seja eficiente em situações idealizadas de práticas pedagógicas, porém pouco eficientes frente à multiplicidade de situações enfrentadas na sala de aula (MIZUKAMI, 2002). Um conceito estimulado no presente sobre o campo da formação de professores é o conceito de reflexão de Donald Schön (1983). Donald Schön expandiu o conceito de Dewey para a prática reflexiva e separou-o em três componentes básicos apresentados por ordem crescente de complexidade: o conhecimento-na-ação, a reflexão-na-ação e a reflexão-sobre-a-ação. O conhecimento-na- ação pode ser entendido como o saber/fazer. A reflexão-na-ação, por sua vez, constitui-se como o processo mediante o qual os professores, aprendem a partir da análise e interpretação da sua própria atividade. A reflexão-sobre-a-ação possibilita que o professor pense sobre o

que fez na sua aula e descubra de que forma o seu conhecimento-na-ação pode ter contribuído para que tenha alcançado os resultados observados, portanto se trata de um processo consciente. Deste modo, a reflexão sobre a ação não apresenta uma relação direta com a ação presente (Schön, 1983).

Concordamos com Pimenta (2002) em relação a sua crítica ao construto de professor reflexivo quando a autora assevera que ele se trata de um conceito político-epistemológico que requer o acompanhamento de políticas públicas consequentes para sua efetivação. Caso contrário, se transforma em mero discurso ambíguo, falacioso e retórico servindo apenas para culpar os professores, ajudando os governantes a encontrarem um discurso que os exime de responsabilidades e compromissos.

Também estamos de acordo com Perrenoud (2001) quando afirma que a abordagem central dos programas de formação de professores deveria ser formar profissionais capazes de organizar situações de aprendizagem (PERRENOUD, 2001, p.11). Essa acepção vai muito além de saber fazer truques, gestos estereotipados etc. Estudos sociológicos sobre profissões mostram o desenvolvimento da maior parte dos ofícios relativos a profissionais das ciências humanas. Dessa forma, para corresponder aos desafios da transformação necessária ao sistema educacional, o papel do docente deve evoluir (PERRENOUD, 2001). O autor faz uma diferenciação entre o profissional antes tido como prático e que agora adquire durante longa formação a capacidade de realizar com autonomia e responsabilidade atos intelectuais, não rotineiros na busca de objetivos inseridos em situação complexa.

Até o presente momento discorremos sobre o desenvolvimento do conceito do trabalho docente e formação de professores. Escolhemos uma perspectiva histórica para a partir dela chegarmos a questões atuais. Esperamos ter demonstrado a evolução desse conceito no qual o trabalho docente foi visto como algo espontâneo e até mágico desde uma perspectiva de capacidades exclusivamente empíricas do professor.

Em seguida esse conceito passou por um momento tecnicista, no qual o foco estava nos processos e na divisão das partes que o compõem. E chegamos a uma perspectiva de formação reflexiva de professores, que enfoca o desenvolvimento de capacidades reflexivas para a tomada de decisões e resolução de problemas.

Como vimos, os paradigmas da formação de professores passaram por grandes transformações, alguns autores (BELLONI, 2002; KUENZER, 2001) indicam que outra mudança tem relação ao status e função da formação inicial e continuada.

Segundo esses autores, em decorrência das mudanças sociais, principalmente a dinamicidade que o desenvolvimento científico-tecnológico – mudança da base eletromecânica pela base microeletrônica - causa nos processos produtivos. A formação rígida de bases taylorista/fordista muda para uma formação mais flexível (BELLONI, 2002, 119), na qual o papel dos conteúdos é relativo ao eixo da proposta curricular (KUENZER, 2001).

É importante ressaltar aqui a seguinte lógica de que quanto mais simplificadas as tarefas, mais se exige “conhecimentos profissionais” e se faz menos necessário o “saber fazer”. Ao contrário, quanto maior a complexidade do contexto, dos instrumentos de produção, informação e controle, mais se faz essencial o “saber fazer”.

Dessa forma o foco da formação profissional passa a estar no desenvolvimento de capacidades pedagógicas crítico-reflexivas, na gestão de incertezas e de novidades, e na tomada de decisão rápida em situações inesperadas (ORTIZ ALVAREZ, 2010). A função do profissional passa de cumpridor de tarefas preestabelecidas e estáveis – habilidades desenvolvidas pela escola na forma de memorização e repetição – para um perfil de autonomia ética e discernimento para gerir situações de articulação entre constrangimentos externos e espaços individuais de decisão (KUENZER, 2001).

Uma vez que a empregabilidade depende de novas características, que o senso comum acredita serem adquiridas por “diferenciação e sofisticação de trajetória, a partir de uma base comum de conhecimentos” (KUENZER 2001, p. 18), as certificações escolares antigas já não bastam e a flexibilidade do currículo e a educação continuada ganham valor.

Para Kuenzer (2001), essa flexibilidade do currículo gera ganhos e perdas. Deixamos de formar especialistas com percursos curriculares fixos a uma base sólida de formação geral de natureza interdisciplinar para dar espaço a uma formação geral do currículo com base na diversificação dos percursos curriculares, na qual existe a possibilidade da escolha da ênfase do currículo, e de sua terceira parte, ou seja, disciplinas complementares que imprimem originalidade à formação.

A mesma autora completa que a quebra das barreiras entre áreas de conhecimento a partir da nova realidade de trabalho derruba a divisão entre ciência básica e aplicada, entre humanidade e tecnologia, o que força a superação da fragmentação das estruturas de currículo e a superação do conteudismo.

Esse movimento promove um deslocamento do conceito de conteúdo como produto acabado do pensamento humano, para uma concepção que privilegia o conteúdo incorporado ao processo, ou seja, o conhecimento dos processos que fazemos para produzir conhecimento.

Dentro da mesma diretriz o Edital 04/97 da Secretaria de Ensino Superior do MEC incentiva à formação geral como estratégia para enfrentar a dinamicidade das mudanças do mundo do trabalho defendendo a possibilidade de que “cada curso é um percurso” e orienta o enxugamento dos cursos.

Contudo, de acordo com Kuenzer (2001) e Santos (2010), a defesa de uma formação flexível que supere o formalismo conteudista não é compatível com a redução dos cursos de graduação, ainda mais na concepção proposta que articula o geral ao particular, à teoria à prática, o conteúdo ao método, a formação científico-tecnológica à formação sócio- histórica, a razão à estética. (KUENZER 2001, p 21)

Concordamos com esses autores em que o perigo que representa esta flexibilização e redução da graduação é levar-nos da “formação geral” para a “formação genérica” e conferir ao ensino superior o status de terceira etapa do ensino básico.

Outro perigo citado por Kuenzer (2001) é o aligeiramento e precarização da formação causados pela falta de investimentos de grande porte nas instituições públicas federais e instituições comunitárias que em outros tempos eram pólos produtores de conhecimento. A autora ressalta que os cursos de graduação não serão igualmente ralos para todos, pois aqueles que por sua origem social tiverem recursos para frequentar o shopping das qualificações (KUENZER, 2001, p. 22), terão ampliadas as suas chances de empregabilidade.

Dessa forma ocorre uma mudança de paradigma, a formação inicial ganha flexibilidade de currículo e a formação continuada é valorizada. Uma das alternativas que se apresenta para a formação continuada é a EAD, pois ela exige autonomia do participante e pode adaptar-se a seu horário de trabalho. Além de inserir o professor no uso das tecnologias, se apresenta como economicamente mais barata e pode ser aplicada extensivamente a um grande número de participantes e a uma larga extensão geográfica (KUENZER, 2001).

O campo do ensino aprendizagem/aquisição de línguas, EALin, também passou pelos diferentes conceitos de formação de professores. Assim, a seguir procuramos mostrar alguns aspectos relevantes para a formação de professores de línguas.