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A conciliação entre a transcendência e a imanência de Deus na sua relação com o Mundo no panenteísmo e no pantiteísmo

pantiteísmo de José Maria da Cunha Seixas

1.2.7. A conciliação entre a transcendência e a imanência de Deus na sua relação com o Mundo no panenteísmo e no pantiteísmo

A religião teísta está fundada sobre a fé num único Deus pessoal e provi- dente que se revela ao homem a partir da sua transcendência, recusando as perspetivas panteístas de identificação de Deus com o mundo. Mas o idealis- mo alemão, a partir da noção plotiniana do Infinito que nada deixa fora de si, não pode abdicar da sua conceção imanente de Deus no seio do Mundo, expondo-se à acusação de panteísmo. Ora, o grande desafio para alguns filó- sofos, como o idealista Krause e o ideo-realista José Maria da Cunha Seixas, é conciliar a conceção imanente de Deus com os princípios fundamentais da fé monoteísta. Contra Jacobi, que o acusava de panteísta, Krause defende que o idealismo em que se situa é uma doutrina absolutista que compreende o conhecimento de toda a realidade na intuição do Absoluto, que é o exis- tente em si, mas que não significa um conhecimento que reduza o infinito a finito ou que eleve o finito a infinito314. Defende na sua obra a Filosofia

absoluta da Religião, que, de acordo com o seu sistema panenteísta, a ciência

consiste no conhecimento de Deus ou do Absoluto, pelo que é um Teísmo absoluto, em que não há identificação de Deus com o Mundo, procurando-se conciliar a religião com a ciência e a imanência e a transcendência de Deus com o Mundo315. No mesmo sentido e de modo distinto do ontologismo de

Malebranche, que defende o pensamento de Deus no homem, o pantiteísmo de Cunha Seixas fundamenta-se na teoria espiritualista acerca da ideia inata ou prévia de Infinito e de Absoluto, que Krause faz situar no plano atemático da pré-intuição, partilhando com o bispo jansenista Bossuet a tese de que a razão é, ao mesmo tempo, humana e divina na correlação entre o trabalho pessoal reflexivo e a iluminação do ser supremo: «Se não tivéssemos verda- des eternas, não teríamos a certeza. Se as temos, a inteligência humana está ligada à divina […]»316.

Em diálogo com Cousin, com Krause e com Maine de Biran, o pantiteís- mo de Cunha Seixas estabelece três leis de conhecimento que correspondem

313 Ibidem, p. 371.

314 Cf. Karl Krause, Abriss des Systemes der Philosophie. Herausgegeben von Dr. Paul Hohlfeld

und Dr. Aug. Wünsche, Leipzig, 1886, p. 8.

315 Cf. idem, Die absolute Religionsphilosophie in ihremVerhältnisse zu dem gefühlglaubigen Theis-

mus und nach der in ihr gegebenen endlichen Vermittlung des Supernaturalismus und Rationalismus,

Erster Band, Dresden y Leipzig, 1834, p. 230.

316 José Maria da Cunha Seixas, Princípios Gerais de Filosofia (1898), in Princípios Gerais de Filo-

a três níveis de vida no homem: a) a vida do ser em embrião, em que predo- mina o conhecimento espontâneo, a experiência, a sensibilidade no apego a prazeres e hábitos adquiridos, e o instinto (sensibilidade e espontaneidade); b) a vida do ser em desenvolvimento, em que a sensibilidade é depurada e eleva-se aos sentimentos do amor, do desinteresse, do desejo de ciência, do sentimento do belo e da filantropia; a inteligência eleva-se pela abstração a ideias gerais e à racionalidade de princípios universais; a vontade eleva-se à deliberação refletida na escolha do bem e do mal (inteligência e reflexão); c) a vida do ser segundo a lei ordenadora da razão, em que o homem dá mais apreço ao sentimento do que às sensações; em que dá mais atenção à essência das coisas reveladas pelas leis universais da razão do que às ideias gerais, em que expõe o seu desejo à disposição da razão e eleva a vontade ao amor do bem (razão e harmonia). Neste último nível da vida divina, o homem adqui- re a virtude, elevando-se moralmente acima da sua contingência e avistando o infinito, porque as ideias da razão são formas do espírito e revelações de Deus, permitindo-lhe investigar o mundo supra-sensível e o supremo arqui- teto317. Considera Cunha Seixas que neste terceiro nível de ser, o homem

atinge a harmonia relativa, sendo essa a sua vida divina de acordo com o que lhe é possível atingir por graça na existência terrena, reconhecendo contra os dualismos gnósticos que «[…] o real está no finito e no infinito: que o real está tanto nas coisas múltiplas como na unidade, de que elas procedem, ainda que essa unidade não seja palpável»318.

Em termos psicológicos, estes níveis são descritos pelos conceitos de no-

ção, análise e síntese e, em termos lógicos, pelos conceitos de unidade, varie- dade e harmonia, naquilo que o autor considera ser uma metafísica com leis

de feição experimental e espiritual. Em termos históricos e ao nível do de- senvolvimento da consciência da humanidade, o primeiro nível corresponde à indistinção panteísta das configurações estáticas míticas do real; o segundo nível corresponde ao sensualismo e conceptualismo dos sistemas materialistas e experimentais da ciência e dos sistema abstratos da reflexão analítica num processo dinâmico e antinómico de conservação e evolução; o terceiro nível corresponde à síntese de todo o conhecimento adquirido na harmonia da perspetiva espiritualista contemporânea. O pantiteísmo é uma expressão des- ta corrente espiritualista e procura conciliar as verdades da reflexão metafísi- ca tradicional e da tradição religiosa com as certezas do progresso científico:

Pantiteísmo etimologicamente significa Deus em tudo. Cientifica- mente é o sistema, que, formando a conjugação de todas a ciências e exibindo as determinações destas na permanência de seus princípios

317 Cf. ibidem, p. 437. 318 Ibidem, p. 502.

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e na evolução infinda, que lhes compete, exibe uma síntese harmónica de leis universais sob a unidade do absoluto.319

No mesmo sentido, o autor idealista alemão procurara uma valorização da razão sem negar a fé e uma compreensão da divindade que não se identificas- se com a realidade finita, pelo que na sua obra Compêndio da parte Analítica descreve a teoria panenteísta da relação entre Deus e o Mundo como uma solução em que, ao mesmo tempo, o Mundo está dentro de Deus, mas subor- dinado e fora de Deus. De acordo com a sua teoria, Deus é concebido como Ser supremo que está fora e sobre o Mundo, ou seja, distinto do Mundo, na condição de Ser auto-consciente, infinitamente sapiente e de vontade santa, atuando sobre o Mundo e dentro do Mundo de forma providente320. Para

tal, estabelece a diferença entre Deus como Ser originário ou absoluto, que é prévio a qualquer diversidade, e Deus como Ser supremo ou transcendente ao Mundo; a diferença entre Deus como Ser originário e Deus como Ser global ou Ser enquanto conjunto harmónico de toda a diversidade; e a diferença entre Ser global e Ser unitivo, ou mera síntese das realidades antitéticas. Nesta conceção a diversidade antitética e sintética é imanente a Deus sem que Deus se identifique com ela, integrando a transcendência própria do teísmo, com a afirmação de Deus como Ser supremo, sem negar a presença de Deus na diversidade concebida como essência segunda da mesma divindade. Deus é prévio e está sobre a diversidade enquanto originário e enquanto supremo. Este sistema recolhe do monismo de Espinosa a noção de que Deus é pensa- do como Uno ou absoluto, recolhe do dualismo teísta a noção de que Deus é pensado com Ser supremo prévio e criador do Mundo, e recolhe da visão totalitária panteísta a noção de que Deus é pensado como Ser unitivo321.

Cunha Seixas também partilha com Kause esta noção de totalidade que está sob a ação providencial de Deus, referindo que, à luz das ideias eternas e do ideal de bondade, o homem, não só pode conhecer com certeza algu- mas realidades, como também tem a capacidade de pronunciar juízos morais de aprovação e desaprovação. Seguro de que as ideias absolutas e universais funcionam como verdades para a explicação do mundo criado, o pensador português recolhe de Bossuet a noção de que estas verdades eternas são Deus em nós322. As ideias não são apenas adquiridas, como em David Hume, mas

são também inatas como em Descartes e Bossuet. No entanto, é preciso

319 Ibidem, p. 499.

320 Cf. Karl Krause, Abriss des Systemes der Philosophie. Zunächst als Grundlage für seine Vorlesun-

gen. Erste Abtheilung. Abriss des subjectiv-analytischen Haupttheiles der Philosophie, Göttingen, 1828,

p. 34.

321 Cf. Rafael V. Orden Jiménez, El sistema de la Filosofia de Krause – Genesis y desarrollo del

Panenteísmo, p. 692.

322 Cf. José Maria da Cunha Seixas, Princípios Gerais de Filosofia (1898), in Princípios Gerais de

distinguir com Platão e com Kant as ideias racionais de ordem média, que expressam indiretamente os atributos do ser supremo, como as ideias de ser, unidade, causa bem, ordem, substância, identidade, espaço e tempo que são imagens móveis da eternidade e da imensidade, das ideias racionais da ordem

suprema, que expressam diretamente os atributos do ser supremo, como as

ideias de ser perfeito, unidade perfeita, imutabilidade, eternidade, infinito, absoluto, imensidade, bem supremo, infinito, incondicional323. As primei-

ras são ideias absolutas que revelam o absoluto manifestado nas coisas, as segundas revelam o absoluto em si próprio, mas apenas na medida da nossa conceção.

E, por isso, o autor interroga: como é que o absoluto existe nas coisas sem se confundir com elas? Relacionando este problema com a questão da criação e da aparição do contingente, reconhece não ser possível à filosofia explicar integralmente como é que o absoluto comunica o ser à vida e como é que está em tudo: «Ora a filosofia pode só atingir parte de tais problemas e já cum- pre a sua missão. Pode mostrar o absoluto nas coisas, sem saber claramente senão alguns dos laços entre o finito e o infinito, sem a filosofia deixar de ser ciência por não saber todos os laços»324. Com base neste reconhecimen-

to, interpreta a proposta de Krause como um sistema dialético do ser uno que é posto a si próprio (tese – ser originário), que é posto na diversidade das coisas que se opõem umas às outras (antítese – ser global ou conjunto harmónico da diversidade), que é posto como união das partes com o todo (síntese da unidades antitéticas – ser supremo unitivo)325. Para ilustrar este

esquema, o autor recorre ao exemplo fornecido por Tiberghien: o homem é a unidade (tese); esta unidade manifesta-se na diversidade de dois termos opostos que são o espírito e o corpo (antítese); o espírito une-se ao corpo sem se confundir com a matéria e mantendo-se distinto sem dela se separar (síntese – harmonia)326.

Para explicar que Deus, enquanto Ser de toda a realidade, não se confunde com o Universo, mas também não se opõe ao mesmo, e para explicar como é que Deus que é tudo se pode distinguir das diversas ordens da realidade, Ti- berghien recorre ao exemplo da unidade do homem que inclui a diversidade de espírito e natureza. A unidade que constitui a humanidade não de dilui na diversidade, mas permanece superior e dominadora sobre essa pluralidade: o espírito não é o homem, o corpo também não é homem, porque o homem é superior ao espírito e ao corpo, constituindo-se a realidade em que cada uma dessas dimensões particulares encontra a sua unidade327. A mesma distinção

se aplica às relações de Deus com o Mundo, que é simultaneamente unidade

323 Cf. ibidem, p. 383. 324 Ibidem, p. 385. 325 Cf. ibidem, p. 404. 326 Cf. ibidem, p. 404.

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indivisa ou inteira e superior da essência. Deus é indeterminado, porque é tudo e é determinado, porque não é o Espírito, não é a Natureza, é o Ser supremo a toda a particularidade e, como tal, transcendente ao Mundo328.

Em alternativa ao pensamento da unidade de que Deus é tudo e tudo é uno, em que o mundo se constitui como uma emanação da substância divina, como é típico do panteísmo oriental e do politeísmo grego (imanência e panteísmo), e em alternativa ao pensamento da diversidade, em que Deus é espírito e perfeição e o Mundo é matéria e nada, criado por vontade divina e exterior ao Criador, tal como é típico da Cristianismo tradicional (transcen- dência e dualismo), o pensador belga propõe o pensamento de Deus indeter- minado que está em tudo sem ser nada em particular; é espírito e natureza, mas, ao mesmo tempo, Deus é o único puro e simples da essência, pelo que Espírito e Natureza devem estar em Deus, sob Deus e por Deus como deter- minações da essência divina. Neste sentido, Deus é Ser supremo que está fora e sobre o Mundo, pelo que é, ao mesmo tempo, imanente e transcendente, uno e inteiro e, ao mesmo tempo, Ser Supremo porque não tem os limites das realidades determinadas do Espírito e da Natureza329.

Podemos estabelecer um paralelismo com a ilustração de Krause: Deus como unidade absoluta (tese); esta unidade manifesta-se na diversidade re- lacional de Deus supremo, natureza e razão (antítese); Deus supremo cria- dor, razão e natureza unem-se sem se confundirem e sem se separarem na humanidade (síntese e harmonia). Na sua obra Sistema na parte da Analítica dedicada ao Órganon330 e na segunda intuição parcial da parte Sintética,

Krause recorre a uma figura de três círculos em interceção dentro de um cír- culo maior, para explicar o modo da imanência e da transcendência de Deus infinito em relação aos seres finitos. Com esta ilustração procura explicitar em termos gráficos a relação metafísica entre Deus e o Mundo, as partes e o todo. O círculo máximo corresponde ao Ser e inclui três circunferências com interseção entre si: a superior corresponde ao Ser supremo e as duas inferio- res correspondem à razão e à natureza. A interseção destas três define uma superfície triangular que corresponde à sua síntese, isto é, ao Ser unitivo do organismo dos seres dentro do Ser.

Temos Deus ou o Ser supremo como prévio à razão (ser espiritual) e à natureza (ser corporal), ou dito de outra maneira, temos razão e natureza unidas pelo Ser com o Ser supremo sob si. A síntese correspondente à in- terseção ou união entre o Ser supremo, a razão e a natureza, constitui o ser unitivo da humanidade, ou seja, o homem é o ser unitivo de Deus, espírito e corpo331. Em resumo, o círculo superior dentro do círculo máximo de Ser

corresponde ao Ser supremo e a interseção dos círculos inferiores com o

328 Cf. ibidem, p. 181. 329 Cf. ibidem, p. 183.

330 Cf. Karl Krause, Vorlesungen über das System der Philosophie, Göttingen, 1828, pp. 347 e ss. 331 Cf. ibidem, p. 400.

círculo do Ser supremo corresponde às seguintes realidades: a) a união do Ser supremo com o ser espiritual (razão); b) a união do Ser supremo com o ser corporal (natureza); c) a união do Ser supremo com o ser espiritual e o ser natural unidos que corresponde à humanidade unida com o Ser supremo (ser unitivo); d) a união do ser espiritual com o ser corporal sem o ser supremo, que corresponde à humanidade dentro do Ser ou de Deus, mas não dentro de Deus como Ser supremo. Dentro de Deus, temos Deus como Ser supremo, a razão, a natureza e a humanidade.

Neste âmbito panenteísta, Guillaume Tiberghien constrói o mesmo gra- fismo, na tão criticada visão geométrica do divino, para descrever a realidade de Deus como Ser uno que é tudo e contém em si tudo o que é determinado (círculo maior). Os outros círculos mais pequenos estão em Deus, sob Deus e por Deus e constituem as determinações parciais do grande círculo, que não esgotam a essência divina. Assim tudo está em Deus, mas Deus excede a realidade e, nesse sentido, não pode ser confundido com a visão panteísta em que Deus é tudo e tudo é Deus, de forma simétrica. Dentro do grande círcu- lo do Ser de Deus, há o círculo superior de Deus supremo que é distinto do Mundo (tese); há o círculo do Espírito e o círculo da Natureza (antítese); e na interceção dos três há a Humanidade que, na unidade com o Ser supremo, constitui o ser harmónico do Mundo (síntese). Desta maneira se constitui o organismo absoluto da realidade, na dinâmica da unidade, diversidade e harmonia, em que nada pode ser concebido fora de Deus332.

Embora concorde que este sistema do ser, manifestação e harmonia, supe- ra o de Hegel, José Maria da Cunha Seixas considera que é uma classificação insustentável por estar mal fundamentada em termos de filosofia do conhe- cimento e por misturar o experimental com o ontológico333. Assim, fazendo

a comparação com Kant, considera que em vez de surgir como resultado de uma dedução analítica é apresentada como hipótese, para só depois ser demonstrada sem justificar bem a distinção entre aquilo que é ontológico e aquilo que não é. Cremos que a crítica não é feita em diálogo direto com Krause, mas a partir da classificação apresentada pelo krausista belga Gui- llaume Tiberghien, que se resume da seguinte maneira: ao ser em si próprio (tese) correspondem as categorias de essência, forma e existência; ao ser no seu conteúdo (antítese – oposição ou relação coordenada de partes) corres- pondem as categorias de determinação e exclusão, identidade e diferença, unidade e multiplicidade, afirmação e negação, interior e exterior, tempo e eternidade; ao ser em relação com o seu conteúdo (síntese – transcendên- cia ou relação subordinada na totalidade orgânica e harmoniosa de pleni- tude, perfeição e beleza), correspondem as categorias de transcendência e

332 Cf. Guillaume Tiberghien, Introducción á la Filosofía y Preparación á la Metafísica, pp. 185-

-186.

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imanência, causa e efeito, superioridade e inferioridade334. De acordo com

esta classificação, Cunha Seixas não concorda, por exemplo, que a categoria de causa apareça apenas na síntese e que se misture o empírico com o racio- nal, acusando a metafísica de Krause de imaginativa, assente numa teodiceia

de desenho e numa ontologia figurativa335. Em alternativa vai defender uma

classificação pantiteísta que, no entanto, confessa assentar na proposta de Krause para substituir a dialética hegeliana e na filosofia cristã da Trindade, resumindo-se nos conceitos de unidade, variedade e harmonia: «Cada ser é

um e três: é um na substância ou no seu todo: variado na forma e subme-

tido à hierarquia pela ordem: toda a coisa tem portanto unidade, forma e ordem»336.

Antes de continuarmos com a classificação pantiteísta de Cunha Seixas, regressemos à metafísica figurativa de Krause acerca da relação entre a uni- dade do Ser e a diversidade da sua manifestação no Mundo. Como nos diz Krause no Compêndio do Sistema, através da intuição os elementos conheci- dos do organismo dos seres são o Ser (Deus), o Ser supremo, a subordinação ao Ser (Deus) e ao Ser como Ser supremo por parte da razão (ser racional), da natureza (ser corporal) e da união essencial como ser unitivo, que na sua realidade mais interna significa o ser unitivo unido também com o Ser (Deus) e com o Ser supremo que constitui o ser da Humanidade. Enquanto se distinguem do Ser supremo em sua união, estão fora ou sob Deus como Ser supremo, mas em nenhum sentido estão fora do Ser como Ser, isto é como Ser Uno e total337. Ao conjunto da natureza e da razão em sua união,

que inclui a Humanidade, perante o Ser supremo, Krause dá o nome de Mundo. O Ser é prévio à diversidade da realidade representada pelos círculos e pela sua interceção e está sobre ela enquanto Ser supremo, pelo que, embo- ra esteja unido ao Mundo, não pertence ao Mundo338. Desta maneira Krause

considera que não se pode dizer que Deus é o Mundo ou que o Mundo é Deus, mas que o Mundo é dentro e por Deus, de tal forma que Deus, como Ser supremo está fora e sobre o Mundo, acrescentando que a designação «dentro de» significa a relação de dependência da essência do mundo em relação à essência de Deus339.

Ora, a melhor maneira de explicar esta diferença, que evita a perspetiva panteísta, é dizer que há uma realidade do Ser (Deus) que excede as realidades

334 Cf. José Maria da Cunha Seixas, Princípios Gerais de Filosofia (1898), in Princípios Gerais de

Filosofia e outras obras filosóficas, p. 405.

335 Cf. ibidem, pp. 406-407. 336 Ibidem, p. 500.

337 Cf. Karl Krause, Abriss des Systemes der Philosophie. Herausgegeben von Dr. Paul Hohlfeld

und Dr. Aug. Wünsche, Leipzig, 1886, p. 198.

338 Cf. idem, Vorlesungen über das System der Philosophie, Göttingen, 1828, p. 400.

339 Cf. idem, Vorlesungen über das System der Philosophie. Erster Band. Intuitivanalytischer Haup-

intersecionadas de natureza, razão e Ser supremo, o mesmo acontecendo com um excesso do Ser supremo em relação à razão e à natureza: tudo está dentro de Deus, mas este excede essa realidade diversa e, por isso, não é possível ao homem intuir de forma penetrante a essência divina na sua totalidade. Há algo de mistério em Deus perante a intuição absoluta do homem. De acordo com esta teoria, o Mundo não é idêntico a Deus, mas é semelhante a Deus enquanto existe dentro, sob e por Deus e enquanto existe fora de Deus como Ser supremo340. A relação do Mundo com Deus é uma relação de imanência

do Mundo no seio de Deus.

O panteísmo nega a transcendência ou a ultramundanidade de Deus, pelo que Deus é identificado com o Universo. O deísmo nega a imanência ou a intramundanidade de Deus, pelo que Deus e Mundo estão separados, movendo-se este como máquina fabricada pelo arquiteto segundo as suas

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