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CONCLUSÃO GERAL

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PARQUE NACIONAL DO IGUAÇU (BR)

CONCLUSÃO GERAL

A fronteira por si própria representa o território do controle, da transição e das contradições. Apesar de local, está conectada com o global, numa relação dialética. Este conjunto de condições torna-a uma rica área de estudos transversais e interdisciplinares. Como os são os temas ambientais e os históricos. Neste trabalho foram discutidos aspectos relacionados à gestão de áreas protegidas transfronteiriças, um instrumento para conservação da biodiversidade em escala de paisagem e dentro de um contexto regional, ainda pouco explorado na realidade brasileira.

A pesquisa permitiu chegar a algumas conclusões. Apesar do discurso de melhoria da conservação da biodiversidade pela conservação transfronteiriça, neste trabalho foi verificado não existirem estudos que de fato comprovem essa relação. Foi observado, no caso do modelo europeu, que as relações pessoais estabelecidas com a cooperação dão suporte para o enfrentamento das dificuldades, sendo esse o grande benefício da iniciativa e também o mais palpável e rapidamente verificado.

Não há receita para a cooperação, ela deve ser estimulada naqueles pontos mais fortes e comuns aos envolvidos, pelo menos nas fases iniciais. Assim ocorre nas áreas europeias visitadas, entretanto, alguns pontos mínimos devem ser considerados e uma avaliação contínua deve ser estabelecida. Outro ponto observado no caso europeu é do sentido de unidade estabelecido pelo histórico comum e influenciado pelo bloco econômico da União Europeia, contribuindo para que as fronteiras, ideológicas, políticas ou econômicas, sejam mais maleáveis. O valor dado à cultura regional e local contribui para manutenção da identidade de cada área resultando numa paisagem realmente sociobiodiversa.

No caso dos parques estudados, verificam-se mais semelhanças do que diferenças, uma vez que compartilham de uma formação vegetal única, de uma reserva importante de água e, ainda, de elementos históricos, sociais, culturais e econômicos, por vezes distintos, porém, convergentes. Existe uma bagagem de cooperação entre os parques, tendo como marco a atribuição de Sítio do Patrimônio Mundial Natural da UNESCO. A instituição tem papel importante para a evolução da cooperação ao acompanhar, sugerir e registrar as ações dos parques, entretanto, a análise ainda é muito focada sobre os valores naturais.

Foco este predominante também na percepção dos entrevistados sobre os Sítios. Os valores estéticos condizem com a atribuição do aspecto excepcional, que confere o título da UNESCO e, apesar de ter uma função importante para as pessoas, não extrapola para benefícios sociais relevantes. Neste sentido, verificou-se ser o valor moral uma conexão para a valorização intrínseca da vida sob todas as suas formas e, consequentemente, para valores integrativos, como vislumbrados na cooperação. Esta, por sua vez, retroalimenta o sistema, consolidando atitudes mais altruístas e universalistas. A capacitação orientada por valores é necessária para construção do diálogo e da mediação de interesses, melhorando a gestão das unidades.

E, para auxiliar na formação de uma visão integrada sobre o ambiente, foi apresentado estudo de caso das resultantes ambientais decorrentes de antigas ocupações no Parque Nacional do Iguaçu demonstrando a associação entre sociedade e natureza, patrimônio natural e cultural deste Sítio. Esse projeto-piloto configura-se como uma potencial linha de pesquisa a ser implementada na região, fornecendo subsídios para criação de trilhas interpretativas, atividades educacionais e folhetos de divulgação científica.

Existem motivos fortes para a conservação transfronteiriça, alavancados principalmente pelos valores naturais da região. Mesmo que os valores culturais estejam em um segundo plano, há potencial para explorá-los e construir uma identidade regional. As dificuldades apresentadas contribuem para uma percepção de distanciamento entre o ideal e a

prática da ação cooperativa, visualizada pela diferença de importância atribuída pelos gestores enquanto valor e a importância enquanto inserção na agenda institucional. As principais forças que minam a iniciativa estão na esfera política e no desinteresse institucional, ou seja, nas barreiras ideológicas.

Pelo lado brasileiro há uma resistência à abertura da fronteira e medo do fantasma da perda de soberania, além de uma instituição ambiental fraca, dilapidada por sucessivos governos com a crônica falta de continuidade dos projetos. Essa constatação é verificada no discurso dos gestores, que por sua vez mostram maior resistência à iniciativa ou se sentem impedidos de tomar algumas decisões. No lado argentino parece haver menor resistência a esses aspectos, havendo liderança para a iniciativa transfronteiriça, uma instituição gestora com regras claras e limites definidos. O discurso dos gestores reflete esses aspectos.

A participação de representantes da sociedade civil foi essencial para a inclusão das ameaças culturais como motivo para a iniciativa transfronteiriça e dar maior força a ela. Neste sentido, a existência do Conselho do Parque Nacional do Iguaçu é de suma importância para reunir os interessados e ser um ponto de conexão entre eles e entre o parque argentino. Entretanto, parece haver limites da inserção de suas contribuições na gestão do parque devido a problemas de representatividade e de adoção das demandas pela instituição gestora.

Por outro lado, o Parque Nacional Iguazú não possui essa esfera formal de participação, mas parece ouvir a população e materializar os anseios em ações, como entrada gratuita para residentes do município, espaço para venda de produtos regionais e artesanato guarani, com a participação dos indígenas, dentre outros. A falta de uma esfera formal dificultou a participação nessa pesquisa, pois despenderia grande esforço e tempo para reunir os interessados. A participação social, formal ou não, pode ser uma das vias de troca de experiência entre os gestores.

A cooperação entre os parques foi categorizada no nível 2, da consulta entre os pares, para o nível 3, relativo à colaboração. Um ponto forte é o setor de proteção, reflexo da grandeza dos atributos naturais e conflitos socioambientais comuns aos parques. Pelo lado brasileiro poderia ser dado suporte tecnológico e financeiro e, pelo lado argentino, suporte técnico do corpo de guarda-parques. No setor de pesquisa, poderia ser realizada aproximação entre os responsáveis buscando clarear processos de licença para pesquisadores e equalizar as informações e para trocar dados da região. No turismo, o parque argentino poderia oferecer o

know-howde tratamento com os guias e o valor de visitação e, o lado brasileiro pode passar

sua experiência com grandes eventos.

Tantas outras ações podem ser realizadas, inclusive, na harmonização do plano de manejo. Algumas podem ser conduzidas e implantadas imediatamente através de acordos e memorandos entre as equipes gestoras e, outras, poderiam ser reforçadas pelos gestores para instâncias governamentais. Tendo em vista o grande potencial e vontade de ação conjunta através da cooperação, foi sugerido que se monte um grupo de trabalho dentro do conselho do parque brasileiro com representantes da sociedade civil e do parque argentino e que seja elaborado um plano de ação da conservação transfronteiriça. Isso poderá dar mais força e poder local para pressionar as autoridades a apoiar a iniciativa.

As diferenças sociais, econômicas e das políticas ambientais dos países que compartilham fronteiras mostram-se empecilhos para que ações conjuntas de preservação ambiental sejam implementadas. No entanto, percebe-se que a política ambiental do MERCOSUL e UNASUL pressupõe uma flexibilização da fronteira política, o que pode abrir caminhos para novas iniciativas de cooperação fronteiriça no futuro. A gestão biorregional através da implementação de áreas protegidas transfronteiriças pode ser um ponto de convergência de políticas que integrem interesses econômicos, ambientais e políticos. A fronteira entre Brasil e Argentina mostra-se um interessante local de estudo para pensar sobre

Verifica-se os parques numa situação crítica de sua existência, tendo em vista a velocidade das mudanças socioambientais globais deste século. Não é possível determinar o momento do ciclo adaptativo deste sistema, sabendo da continuidade do aporte tanto de atividades exploratórias como das conservacionistas. É prudente dizer que as decisões tomadas neste momento determinarão o direcionamento de um novo ciclo. Neste contexto, a cooperação através da formação de redes de relacionamentos, amizade, respeito mútuo e confiança entre as pessoas e as instituições de governança dos parques pode potencializar a resiliência e redirecionar a dinâmica da paisagem. Conclui-se ser a política de áreas protegidas transfronteiriças includente do componente humano, revelando além dos aspectos naturais, os culturais que compõe a relação sociedade-natureza.

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