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4h Concurso público: seleção autocentrada ou etapa inicial da vida funcional?

Depois de analisar os casos do Ministério da Saúde e do INSS, tem-se que as provas — como não poderia deixar de ser — possuem limitações avaliativas. Isso é bem evidente no caso das provas de múltipla escolha. Porém, é razo- ável supor que toda avaliação possui limites. Partindo desse pressuposto, o problema se agrava já que é possível visualizar — do ponto de vista jurídico e gerencial — o certame como uma etapa isolada da vida funcional do servidor. Como um modelo, é possível dividir a vida ativa do servidor público em qua- tro momentos: preparação ao certame, o concurso, o estágio probatório e a requalificação:

Curso de formação Concurso Público Preparação ao concurso público Estágio probatório

Vida funcional e contínua requalificação

Ingresso Confirmação

É interessante notar que a relação entre esses quatro momentos da vida funcional dos servidores é pouco — ou nada — tratada pela literatura técnica. De forma intuitiva, as pessoas com experiência na administração pública rela- tam que existe alguma relação entre formação no ingresso e o certame. Esta necessidade de adaptação ao serviço público pode ocorrer por meio de um curso como parte do certame ou como um curso de adaptação e palestras. Mas não existe um modelo definido de qual seria a melhor opção, como se infere da entrevista realizada com servidores do MP:

É sempre questionado por que fazer curso de formação en- quanto segunda etapa de concurso. Há um problema de objeti- vos: se é uma proposta educacional de qualificar a pessoa para o trabalho, como é que isso se coaduna com a proposta de sele- ção? Afinal, se não é uma parte da seleção, não deveria ser dado durante o concurso; deveria ser feito após o ingresso. (MP) Bem se visualiza que existem dois modelos: curso como parte (etapa) do certame ou curso como adaptação, em termos de formação:

Além de ser uma tradição de determinadas carreiras, um cur- so de formação é uma segunda etapa em concursos para pre- parar servidores para atividades que não correspondem a uma atividade profissional em sentido estrito. Se você seleciona um médico, é pressuposto que ele já conheça as técnicas que vão ser aplicadas na medicina. A única diferença seriam as normas internas do hospital no qual ele vai trabalhar. Agora, se você con- trata um gestor ou um advogado para trabalhar na administração pública, há outro contexto do que efetivamente ele vai fazer; não tem uma formação profissional que o prepare diretamente para

ESTUDOS DE CASO DE DOIS CONCURSOS 111

essa atuação. Então, por isso o sentido do curso de formação previamente ao ingresso. (...) Hoje, os cursos de formação estão previstos nas legislações específicas das carreiras, que definem o ingresso por meio de um concurso com duas etapas. A segunda é o curso de formação (...). No momento, a gente não está preven- do mexer em lei para tratar dessa questão. Uma das propostas do GT é a de que se desenvolva um estudo futuro porque tem que ser feita uma discussão junto aos órgãos que hoje têm esses cur- sos de formação para a sua adequação. A proposta também não é acabar com o curso de formação, mas instituí-lo após o ingresso se você entende que ele é necessário. (...). Hoje, talvez, eu diria assim que fosse mais fácil fazer enquanto eles são candidatos do que depois deles serem servidores. (MP)

Como pode ser visto na figura inicial, o curso de formação está situado em um espaço ambíguo, que varia de carreira para carreira. Em algumas, ele pode ser um conjunto de palestras para boas-vindas, sem avaliação. Em outras, pode ser parte do certame e finda seus efeitos com o término do processo de recrutamento. A entrevista com servidores do MP demonstra que há — dentro dos debates correntes — uma grande preocupação com o estágio probatório:

Os próprios consultores da área de setoriais trouxeram es- sas sugestões de que o estágio probatório deveria ser tratado como prévio à efetivação. Que esta efetivação só deveria ocorrer depois, já que ele seria uma oportunidade de você verificar se a pessoa tem as competências necessárias. Assim, se ela não viesse a se adequar, deveria ser retirada do quadro. É um problema. Há problemas no estágio probatório. Primeiro, a legislação é muito arcaica e insuficiente. Depois é a questão de gestão. Eu acho que outra proposta de trabalho futuro é alinhar melhor a questão do estágio probatório enquanto um período anterior à efetivação. Afinal, quem já ingressou não tem mais preocupação; está garan- tido por 30 anos. Agora, se você tivesse um concurso com uma primeira etapa normal, um ingresso, uma formação, e você tivesse um estágio probatório bem peneirado e que pudesse, realmente, ao longo desse período, verificar as pessoas que não têm as com- petências necessárias para ser efetivado no cargo, e você tivesse como substituir essas pessoas, isso atenderia bem. (MP)

De fato, são necessários mais estudos e pesquisas para avaliar como está sendo processado — do ponto de vista gerencial — o estágio na administração pública. A falta de informação sobre o tema é grande e, conforme menciona- do, pouco estudada em cotejo com o tema dos concursos públicos. Ao que se apresenta, seria relevante existir algum meio de continuidade de avaliação entre as provas dos certames e o início da vida funcional do servidor. Do ponto de vista de uma política de pessoal, seria interessante pensar em estruturas de carreira submetidas à avaliação contínua, é claro, como se infere da entrevista havida com servidores do Ministério da Saúde. Contudo, como esta pesquisa focalizou apenas nos concursos de ingresso, cabe anotar que a realização de cursos com provas e atividades de supervisão para todas as carreiras, mesmo aquelas que possuem curso de formação como parte do certame, seria um elemento relevante para auxiliar as metodologias avaliativas, que — como pres- suposto central — sempre possuem limitações.