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PARTE II – ESTUDO EMPÍRICO

CAPÍTULO 7 Resultados e Discussão

7.3 Condições contextuais que influenciam a escolha profissional e de carreira: uma

A “Carta ao Presidente da República” se configurou como uma das estratégias para indagar a incidência dos fatores que influenciam a escolha profissional e de carreira, um dos propósitos avançados neste estudo. Neste sentido, após a leitura flutuante, foi possível constatar a pertinência da análise destas narrativas por terem mobilizado e trazido à tona outros fatores socioeconômicos que na visão dos participantes, dificultam suas aspirações e escolhas de carreira.

Desta feita, em base aos critérios já referenciados, das 17 cartas coletadas foram analisadas e discutidas dezesseis (16) cartas. Para garantir a preservação da identidade e singularidade dos participantes, as cartas foram codificadas com as siglas CPR1, CPR2, referentes à Carta ao Presidente República 1, Carta ao Presidente da República 2, sucessivamente. Alguns trechos extraídos das cartas tomadas em consideração para análise serão ilustrados gradualmente. Os depoimentos dos participantes fizeram referência a um contexto social e econômico e foram organizados em dois núcleos temáticos. O primeiro núcleo sobre as demandas relacionadas com oportunidades de formação para realizar suas escolhas profissionais e de carreira foi organizado com o subtítulo “a escolha profissional e de carreira e as demandas de oportunidades de formação”. E, no segundo núcleo foram reunidas narrativas que evidenciam algumas denúncias que na visão dos participantes influenciam negativamente e (in)diretamente nas próprias escolhas profissionais e de carreira, sob o subtítulo “escolha profissional e de carreira diante das denúncias de práticas de corrupção”.

Antes de adentrar nas análises é importante alertar que as falas veiculadas em cada “Carta ao Presidente da República” ilustram as histórias contadas pelos indivíduos, e enquanto parte das histórias e vida estão vinculadas à um determinado contexto social, cultural, histórico econômico e político (McMahon & Watson, 2015). Portanto, se na proposta dos referidos autores, as histórias de carreira refletem as culturas onde são construídas e contadas, decorre que as narrativas destes sujeitos devem ser “lidas” e “validadas” em função do contexto social em que foram construídas. Isto posto, segue a análise e discussão inserida no primeiro núcleo temático.

A escolha profissional e de carreira e as demandas de oportunidades de formação

As falas inseridas nesse núcleo temático mostram como os participantes (d)enunciam as barreiras que dificultam a concretização das escolhas, em particular o acesso às instituições de formação no nível superior. As falas dos participantes estão relacionadas com a insuficiência de instituições de ensino superior, a expansão desigual de tais instituições e a ausência de políticas públicas voltadas para a educação e a promoção de oportunidades de formação profissional. Mais especificamente, os participantes interessados em algumas carreiras lamentam o fato de que as instituições relacionadas com tais carreiras são ainda insípidas e que em consequência disto não respondem à grande procura dos jovens que precisam enfrentar os desafios apresentados pelo atual mercado de emprego. Na ótica destes participantes, a não satisfação desta demanda devido a insuficiência de instituições de natureza pública está estreitamente vinculada ao fato de que a maioria dos cursos apontados são apenas ministrados em instituições que se localizam na zona sul do país, o que de certa forma, embora implícito nos seus relatos, pode ser visto como uma espécie de reprodução das desigualdades regionais que de certa forma caracterizam as relações sociais e políticas entre o norte e o sul do país. Alguns fragmentos apresentados a seguir corroboraram tais afirmações.

“Venho por este meio pedir que facilite-nos na nossa educação, não que estas não estão facilitadas mas quero dizer que ponha algumas escolas mais perto, por exemplo existem faculdades que somente estão na capital do país, no caso da Faculdade de Relações Internacionais, de Jornalismo, entre outras, assim torna-se um pouco mais difícil porque para além da distância e o alojamento, é muito complexo ir para lá, visto que nem todos tem familiares” (CPR10) (12ª classe, 16 anos, sexo masculino).

“Peço sua gentileza presidencial para aumentar as faculdades de estudo mas não privadas, para que as pessoas tenham mais facilidades nos estudos, melhor dizer com a sua vida própria e isso seria mais fácil ter vagas para estudos” (CPR6) (9ª classe, 15 anos, sexo masculino).

“Vim por este meio pedir por muito para mandar pôr o Instituto Aduaneiro Governamental aqui em Nampula. Senhor Presidente, peço pelo menos em três regiões do nosso País, haver pelo menos um Instituto governamental em cada capital. Senhor Presidente, nós não temos condições para ir a Maputo” (CPR11) (11ª classe, 16 anos, sexo masculino).

“O curso que eu desejo fazer é Jornalismo, visto que este curso é pouco abrangente em todas as províncias e isso coloca barreiras no meu sonho, porque no norte só é possível cursar na universidade UCM, que é a Universidade Católica de Moçambique e depois de fazer o curso terei que ir fazer especialização em Maputo, Capital. Na verdade, eu queria que o senhor presidente criasse condições de ao menos em cada região do país duas faculdades qualificando especialistas na área de comunicação” (CPR2) (12ª classe, 18 anos, sexo feminino).

“Gostaria que houvesse mais universidades, mais faculdades de formação de jornalismo e gostaria também que os salários dos jornalistas aumentassem um pouco

mais e houvesse também escolas primárias e secundárias em todo o país e mais universidades, faculdades em todas as províncias de Moçambique para que aqueles que querem realizar seus sonhos mais não conseguem realizar por falta de condições pode-se fazer universidades nas suas próprias províncias” (CPR 15)(10ª classe, 15 anos, sexo feminino).

As demandas dos participantes incluem outras especialidades, como a formação para a docência em nível superior que apenas é oferecida por uma instituição pública o que torna a disputa da relação candidato vaga mais desafiante, conforme notifica o registro de um dos participantes.

“Sou um estudante dedicado, gostaria de fazer o meu curso numa das universidades do nosso país, mas com as condições que os meus pais oferecem vejo que ser um pouco difícil, então venho por este meio pedir a vossa excelência para pode fazer mais universidades de formação de professores, porque na nossa província só vejo a UP então isso há concorrência com menos vagas” (CPR3) (12ª classe, 18 anos, sexo masculino).

Os participantes mostram também que embora tenham apoio moral e afetivo da família, a ausência do apoio instrumental (por exemplo, apoio financeiro) associado à ausência ou insuficiência de instituições públicas de formação, agiganta as dificuldades na escolha e decisão, tendo em conta que as instituições de natureza pública permanecem como a única alternativa e esperança de realização pessoal e profissional, deste grupo cuja maioria das famílias vive situações de baixa renda, desemprego e outras situações de vulnerabilidade. O extrato a seguir pode sustentar a leitura avançada anteriormente.

“Eu, estudante da 9ª classe penso em ser contabilista, mas tenho poucos recursos por isso deposito minhas esperanças nas faculdades públicas, mas com o número de salas do curso haverá muitas dificuldades para ingressar na faculdade, por isso peço que com a sua tomada de poder que possam ser feitas mais faculdades públicas” (CPR9). (9ª classe 16 anos, sexo feminino)

Os relatos referenciados até aqui parecem preocupantes na medida em que podem em parte, constituir de base para fundamentar a indecisão vocacional, o desenvolvimento de crenças negativas acerca do mercado de trabalho para estes participantes. De fato, conforme afirma Faria (2013) as condições de emprego/desemprego da família podem funcionar como variável capaz de influenciar a escolha, o compromisso e a execução dos planos de carreira dos seus filhos, o que sugere, para esta camada de adolescentes, intervenções que contemplem a família e que visem “trabalhar as percepções acerca do próprio indivíduo (autoeficácia, autoestima, interesses, habilidades, valores) e do contexto socioeconômico e cultural que o cerca, da forma mais realista possível” (Levenfus, 2016, p.31).

Outro aspecto vincado pelas narrativas tomadas em resenha, está relacionado com a insuficiência de incentivos integrados no contexto de políticas públicas de educação, que na perspectiva destes participantes não se reduz a simples distribuição de benefícios sociais mas em incentivos financeiros (por exemplo, bolsas, financiamentos) e oportunidades de formação (criação de mais instituições de ensino superior), geograficamente abrangentes e equitativas18, e considerando que a maioria de instituições do ensino superior presentes na região norte cujos cursos interessam a estes participantes, são de caráter privado o que agrava a situação. Sobre este aspecto, os relatos a seguir tornam-se mais explícitos.

“Tenho o sonho de algum dia me formar em Jornalismo. Infelizmente a minha província não possui universidades para este curso, assim, como muitos outros pontos do país, a maior parte, ou até quase todas com um sonho como o meu tem de viajar para a capital do país por via de bolsas, bolsas essas que são nada suficientes para a massa de jovens como eu. Gostaria de pedir ao Senhor Presidente, que amplie mais infraestruturas de universidades de Jornalismo, uma vez que o mercado do mesmo está cada vez mais vasto e aderido. Peço também que crie condições que essas universidades sejam públicas, como outras de comunicação” (CPR16) (12ª classe, 18 anos, sexo masculino).

“Aqui é uma aluna da 12ª classe, que tem um sonho em ser Jornalista, mas não tenho como porque meus pais não tem condições de pagar o curso e só a faculdade tem no Maputo, eu estou em Nampula, então queria pedir ao Presidente que oferecesse mais bolsas de estudos, não para os filhos de ricos mas sim para aqueles que necessitam de ajuda ou das bolsas ou melhor construir faculdades que oferecem esses cursos para nós que não temos condições de irmos lá no Maputo para fazer o curso, uma faculdade que oferece esses cursos para nós aqui no norte. Aqui nós temos a UCM, só que oferece alguns cursos, mas meus pais não conseguem pagar lá na UCM.” (CPR1) (12ª classe,18 anos, sexo feminino).

O nível socioeconômico destes participantes parece comprometer mais uma vez as suas aspirações. Sobre esta situação, parece ainda aplicável a conclusão do estudo realizado por Oliveira e Melo-Silva (2010), onde entre outros aspectos, se destaca que o nível socioeconômico incide sobre a escolha de carreira. Para corroborar o achado do referido estudo parecem pertinentes os trechos seguintes.

“Eu quero no futuro formar-me como engenheiro mas para isso é necessário ter possibilidades socioeconômicas, e meus pais não tem essas possibilidades de fazer com que eu me forme” (CPR8) (10ª classe, 16 anos, sexo masculino)

“Eu gostaria de ser médica e para isso peço ajuda ao senhor presidente. A minha família me apoia com o pouco que tem para eu conseguir alcançar os meus objetivos. Eu gostaria que me ajudasse com bolsa de estudo para que eu possa realizar o meu sonho. Tenho dificuldades em comprar material escolar e de entrar na universidade para me formar” (CPR5) (9ª classe, 16 anos, sexo feminino).

18

Sobre este aspecto, é importante elucidar que por muito tempo a região norte de Moçambique ficou privada de instituições de ensino superior, apenas na década 1990 as províncias do norte do país puderam ser contempladas com instituições de ensino superior público.

Os relatos destes participantes podem corroborar ainda o estudo efetuado por Dias e Sá (2014), o qual, com o intuito de apreender a relação do estatuto sociocultural da família com a escolha acadêmica bem como o significado percebido na família na entrada de um dos elementos no Ensino Superior, concluiu que os recursos educativos e econômicos das famílias dos estudantes são fatores-chave nos processos de escolha e matrícula na ES.

Sobre as dificuldades financeiras dos pais um outro participante desabafou nos seguintes termos:

“Venho por este meio pedir ao Senhor Presidente que aumente 50% do salário dos trabalhadores do Estado, peço isso porque a maioria dos jovens estão desempregados por falta de condições econômicas dos encarregados, talvez seja o dinheiro que ganham é insuficiente, eu sei que o dinheiro nunca chega, mas pelo menos com um aumento um pouco muda alguma coisa, a maioria dos jovens que concluíram a 12ª classe estão nos bairros a beberem, a fazerem filhos de qualquer maneira por falta de ocupação, eu peço para implementar uma faculdade em Nampula para facilitar-nos” (CPR4) (12ª classe, 18 anos, sexo feminino).

Sobre o desabafo evidenciado no relato anterior Levenfus (2016, p. 30), alerta que as experiências negativas de desemprego podem funcionar como crise no seio familiar e gerar possíveis sentimentos de incerteza e medo do desconhecido.

Quando os filhos vivenciam tentativas infrutíferas por parte dos pais, desenvolvem ansiedade diante da percepção de falta de controle nesse domínio, afetando a autoestima e a confiança em si mesmos e no sistema econômico. Uma visão mais pessimista do mundo do trabalho pode se instalar, diminuindo suas aspirações e oportunidades futuras.

As reflexões levantadas em torno dos depoimentos analisados parecem confirmar o que a literatura aponta, ou seja, a importância de se focalizar em intervenções fundamentadas na perspectiva holística, contextual e preventiva (Duarte et al., 2010; Savickas et al., 2009). Para o contexto moçambicano, esta recomendação assume um caráter urgente diante das inúmeras ameaças e situações de vulnerabilidade (gravidez precoce, os casamentos prematuros, HIV, apenas para exemplificar) que põe em risco o desenvolvimento dos adolescentes moçambicanos. Nesse sentido, é interessante notar que os próprios participantes apontam a educação como a única e principal via para prevenir a emergência destes comportamentos e situações indesejáveis, sugerindo intervenções que vão além da simples instrução, mas que devem focalizar o desenvolvimento de habilidades sociais (Del Prette & Del Prette, 2014), um desafio que exige criação de espaços onde os jovens possam exprimir- se e treinar-se em termos de competências sociais e profissionais. O caráter não assistencialista dos incentivos solicitados pelos participantes do estudo parece mais detalhado nos relatos transcritos a seguir.

“Considerando que há também vários jovens do meu ponto do país com capacidades e vontade, que faça com que essas mesmas universidades sejam acessíveis, uma vez que a maioria não dispõe de condições financeiras. Que dê oportunidades e promova também concursos de descoberta de talentos nessa área, pois tenho observado que existem muitos jovens que já não possuem possibilidades de continuar com os estudos, mas possuem talentos para exercer essa profissão e fazer com que o país esteja cada vez melhor com as ideias que possuem, mas falta oportunidade, são limitadas as suas visões” (CPR 16) (12ª classe, 18 anos, sexo masculino).

“O apoio da minha família que me foi importante e continua a ser, foi o que me levou a escrever esta carta ao Presidente para que possa arranjar um lugar, mesmo sendo pequeno, na justiça para eu mostrar o que sou capaz de fazer” (CPR7) (12ª classe, 18 anos, sexo feminino).

As demandas de oportunidades formuladas por estes participantes assumem ainda significado se encarados à luz do registro de Barros (2010/2011) quando afirma o exposto a seguir.

Alguns autores sugerem ainda a importância de promover competências de assertividade ou de resolução de conflitos (Haggan, 2000), ou de aspectos específicos com o propósito de aumentar a sua empregabilidade, como construir network, fazer um curriculum, treinar-se para entrevistas, adquirir experiências de trabalho, em part-time ou a tempo inteiro ou participar em atividades extracurriculares (p. 149).

Assim sendo, as políticas de incentivo solicitadas pelos participantes devem visar “o desenvolvimento de capacidades, interesses, crenças, valores, hábitos de trabalho e/ou competências que lhes facilitem a adaptação e a participação plena na vida social, profissional e econômica num contexto de mudança, de forma satisfatória para si e em direção ao bem comum” (Barros, 2010/2011, p.146).

Em continuidade com as leituras avançadas o próximo núcleo reforça as demandas de oportunidades por meio de práticas fundadas na justiça e na igualdade de oportunidades.

Escolha Profissional e de carreira diante das denúncias de práticas de corrupção

Para fundamentar este segundo núcleo temático foram discriminados alguns trechos extraídos de seis (6) cartas (CPR1, CPR11; CPR12, CPR13, CPR14, CPR15). Na sua maioria, os relatos reportam diferentes formas e percepções de situações de injustiça, desigualdade e práticas corruptivas que assolam o mercado e o mundo de trabalho e no geral a sociedade moçambicana, contexto dentro do qual, os participantes modelam suas escolhas profissionais e suas identidades.

Acima de qualquer ideologia e/ou filiação política, é importante tomar em consideração a importância das denúncias não apenas enquanto variáveis que interferem nos

processos de escolha e de decisão, mas em função da formação integral dos participantes desta intervenção enquanto futuros cidadãos.

A primeira linha de reflexão gira em torno de algumas práticas irregulares denominadas pelos participantes com o termo “corrupção”. Na acepção dos participantes, o termo corrupção inclui práticas descritas como “compra e venda de vagas” de emprego, aspectos que, segundo os autores, tornam a escolha não apenas desafiante, mas constrangedora levando-os a experimentar sentimentos de impotência. A dramaticidade instigada por estas práticas é particularmente ilustrada nos relatos a seguir.

“Agora Senhor Presidente, se nós queremos fazer o curso da nossa livre e espontânea vontade, e não temos condições, que vamos fazer? Há muita corrupção neste país, que vamos fazer nós sem condições? Espero que depois de ter lido a carta pense bem e nos ajude” (CPR11) (11ª classe, 16 anos, sexo masculino).

“Senhor Presidente, veja como sofre o povo moçambicano, o povo é tão pobre e não merece, se tem tanto amor porque não zera a corrupção? Visto que é um elemento que nos interrompe crescimento a nível do país. Também é tão difícil um sujeito ser engenheiro com tanta pobreza, e nós que não temos dinheiro, pela corrupção estar dentro de nós, e eu que não tenho dinheiro o que faço?” (CPR13) (10ª classe, 16 anos, sexo masculino).

“Eu sou um jovem estudante pré-universitário, eu coloco-te a minha preocupação, eu quero ser um técnico agropecuário mas há muita corrupção, então tentei e estou tentando mas a única coisa que estou a colocar é de estar preparado em dinheiro, isto quer dizer que eu tenho que comprar emprego e meus pais não trabalham, eles são camponeses não tem dinheiro, como é que eu vou fazer? Eu já estudei, tenho documentação mas não é nada, não implica se estudou ou não, o mais importante é dinheiro, como meus pais não tem dinheiro eu não terei nada no futuro, mas estudei. Eu reclamo por isso não pode voltar ou não ser só assunto de dinheiro para ter emprego” (CPR12) (10ª classe 16 anos, sexo masculino).

“E pedimos emprego sem suborno, os empregadores empregam aqueles que tem dinheiro e nós que não temos onde vamos parar? Por isso, peço vossa excelência que pense nas crianças, nós alunos onde vamos parar?” (CPR1) (12ª classe, 18 anos, sexo feminino).

Os relatos apresentados revelam, de um lado, a gravidade destas práticas a qual se agiganta na medida em que afetam diretamente as camadas sociais mais desfavorecidas e permeiam todo o tecido social e de outro lado, o quanto estes participantes, para além de se sentirem ameaçados, acolhem a oportunidade para assumir uma posição que os coloca como “porta voz” da classe mais desfavorecida, vale dizer, da mais afetada pela reprodução das desigualdades sociais que se prolongam na difícil batalha e corrida que se vive no mundo e mercado de emprego no modo de produção capitalista. Neste sentido, a redação desta Carta, parece uma oportunidade para recorrer ao imbatível “poder” do futuro Presidente da República que pode determinar o fim das referidas práticas.

Embora a maioria manifeste uma visão positiva do trabalho (Morim, 2001), cumpre evidenciar dois aspectos patentes no CPR 12. Neste relato, nota-se que, de um lado, o autor (participante) manifesta uma percepção negativa sobre o contexto social no qual está inserido, em particular a dinâmica do mundo e mercado de emprego, conforme o trecho “eu quero ser um técnico agropecuário mas há muita corrupção, então tentei e estou tentando mas a única coisa que estou a colocar é de estar preparado em dinheiro, isto quer dizer que eu tenho que comprar emprego”, o que pode afetar de forma negativa as escolhas e consequentemente o processo de construção de suas identidades e suas “trajetórias profissionais” (Rossier, 2015, p.153), de outro lado, chama particular atenção a sua visão limitada do trabalho, ao valorizar apenas o trabalho formal e remunerado : “meus pais não trabalham, eles são camponeses não tem dinheiro”. Esta posição do sujeito mais uma vez sugere a necessidade de se trabalhar sobre os sentidos do trabalho, um dos principais temas da educação para a carreira. As percepções negativas do contexto social moçambicano avançadas anteriormente foram ilustradas em outros relatos, onde os participantes desabafam:

“Eu (...), embora que sou pobre, mas isso não estou a falar que os pobres não realizam seus sonhos, mas para nós pobres é difícil encontrar trabalho, por isso peço