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Condicionamentos à Elisão de /o/ em Porto Alegre: resultados estatísticos

4 A VARIAÇÃO E A ELISÃO NO PORTUGUÊS

6.3 DESCRIÇÃO DA ANÁLISE ESTATÍSTICA DA ELISÃO DE /o/ EM PORTO

6.3.3 Condicionamentos à Elisão de /o/ em Porto Alegre: resultados estatísticos

A variável Qualidade Fonética da Vogal em Segunda Posição foi selecionada como estatisticamente relevante nas duas rodadas de análise realizadas com a amostra representativa de PB. Os resultɲdos ɲpontɲm ɲ vogɲl coronɲl ε] como o contexto seguinte mɲis fɲvorecedor ao processo de elisão da vogal /o/ nesta variedade do português, com peso relativo de 0,74. São favorecedorɲs, ɲindɲ, ɲs vogɲis ] e [e], cujos pesos relativos são, respectivamente, 0,65 e 0,62. A vogal [a] apresenta comportamento neutro com relação à aplicação da regra variável, com peso relativo de 0,50, enquanto os contextos seguintes iniciados por ],[ã], [i] e [ɔ], para os quais os valores obtidos foram 0,40, 0,27, 0,24 e 0,24, respectivamente, não favorecem o processo em estudo. Tais resultados são apresentados na Tabela 11 a seguir. Tabela 11 - Elisão da Vogal /o/ Porto Alegre – RS (PB): Qualidade Fonética da Vogal em

Segunda Posição

FATORES APLIC./TOTAL % PESO RELATIVO

ε] como era 186/332 56 0,74 ] muito engraçado 37/65 56 0,65 [e] exemplo escolar 118/217 54,4 0,62 [a] frequento assiduamente 150/381 39,4 0,50 ] estudo interpretação 30/98 30,6 0,40 [i] faço isso 33/198 16,7 0,24 [ɔ] muito óbvio 1/7 14,3 0,24 [ã] como antigamente 29/220 13,2 0,27 Total 584/1518 38,5 Input 0,35 Significância 0.000 Fonte: A autora (2013)

Os resultados da Tabela 11 revelam que os três contextos seguintes que favorecem o processo em estudo apresentam um aspecto linguístico em comum, a saber: são vogais coronais. Este resultado corrobora o encaminhamento da discussão em Alencastro (2008) sobre o status da quɲlidɲde dɲ vogɲl seguinte pɲrɲ o fenômeno, em que ɲ vogɲl coronɲl ε] é

apontada como favorecedora tanto em Porto Alegre e Curitiba, a partir da análise estatística realizada no estudo, quanto em Florianópolis, em uma releitura dos resultados de Vargas (2006).

Diante desse quadro, pode-se constatar o favorecimento do grupo formado pelas vogais coronais e analisar o resultado do ponto de vista articulatório, estabelecendo uma relação com os traços que compõem cada vogal. Há, entretanto, que se considerar o fato de não haver favorecimento quando a segunda posição é ocupɲdɲ pelɲs vogɲis i] e ], também coronais. Neste caso, investiga-se, assim como nas Seções 6.1 e 6.2, a relação de dependência entre a variável Qualidade Fonética da Vogal em Segunda Posição e o acento, o que indica o favorecimento de todas as vogais, desde que átonas ou portadoras de acento primário. Para tanto, foi realizado o cruzamento entre a variável Qualidade Fonética da Vogal em Segunda Posição e o acento da vogal em segunda posição. Na Tabela 12 é possível verificar os resultados obtidos.

Tabela 12 - Elisão da vogal /o/ em Porto Alegre - RS (PB): Cruzamento entre a variável Qualidade Fonética da Vogal em Segunda Posição e a indicação de Acento da Vogal em

Segunda Posição Qualidade

da Vogal em Segunda Posição

Acento da Vogal em Segunda Posição

Átona Acento da Palavra Acento da Frase Fonológica

A/T % P.R. A/T % P.R. A/T % P.R.

ε] - - - 185/318 56 0,68 1/14 8 0,10 ] 37/61 56 0,72 0/4 - - - - - [e] 91/167 55 0,69 26/47 55 0,68 1/13 7 0,10 [a] 148/359 41 0,59 2/15 13 0,22 0/7 0 - ] 29/90 32 0,55 1/8 13 0,20 - - - [i] 48/147 32 0,55 4/34 11 0,19 0/17 0 - [ɔ] - - - 1/7 17 0,26 - - - [ã] 24/49 49 0,69 3/109 3 0,05 2/62 3 0,11 Input 0,35 Significância 0,000 Fonte: A autora (2013)

Os resultados obtidos a partir do cruzamento revelaram que, mesmo as vogais que não apresentaram favorecimento na análise da Variável Qualidade Fonética da Vogal em Segunda Posição, são ambientes favorecedores ao processo quando em posição átona. Associados a esse fato, os números obtidos pela análise de contextos em que as vogais ocupam posição de acento da palavra e acento da frase fonológica confirmam a hipótese de dependência entre a

variável Qualidade Fonética da Segunda Posição e a incidência de acento sobre ela. Tal resultado só vem a corroborar a relevância do aspecto prosódico para a elisão, assim como já fora descrito por Bisol (1992, 1996) e corroborado pelas pesquisas subsequentes (Seção 2.4).

O favorecimento de vogais coronais [ɛ] e [e], que ocorre mesmo quando portadoras do acento da palavra, pode ser explicado pela mesma regra apresentada nas Seções 6.1 e 6.2 sobre o favorecimento da vogal [ɛ] à elisão de /a/ e de /e/. Apesar de não terem sido registrados os itens lexicais mais recorrentes na amostra, o trabalho prévio com as ocorrências permite perceɳer que os vocáɳulos iniciɲdos pelɲ vogɲl ε] são, em suɲ mɲioriɲ, pɲlɲvrɲs funcionais acentuadas, como ela, ou formas do verbo ser, como era e é. Com relação à vogal [e], o item lexical ele, classificado como palavra funcional acentuada, é bastante recorrente. A alta aplicação do processo em estudo nos contextos citados não surpreende, se tomada a afirmação de Bisol (1996) sobre a possibilidade da perda do acento da vogal inicial durante o processo de elisão envolvendo estes vocábulos na segunda posição.

As considerações realizadas permitem concluir que não há maior influência da qualidade fonética da vogal em segunda posição sobre o apagamento da vogal /o/ em fronteira de vocábulos na amostra de Porto Alegre, mas uma relação de interdependência da variável supracitada com o acento, aspecto prosódico cujo condicionamento sobre o fenômeno de elisão foi amplamente discutido na literatura (Seção 2.4). Espera-se encontrar a mesma generalidade com relação à amostra do Porto (PE).

6.3.3.2 Distância entre os Acentos

O resultado para a variável Distância entre os Acentos, selecionada na primeira rodada da análise estatística, única da qual fez parte, revelou que o apagamento da vogal /o/ é favorecido na amostra representativa de Porto Alegre quando há distância de uma ou duas

sílabas entre o acento do vocábulo em primeira posição e o vocábulo subsequente, contexto

em que o peso relativo foi 0,62. A presença de clítico, com peso relativo de 0,51, apresenta aplicação ao redor do ponto neutro, e a distância de mais de duas sílabas, com peso relativo de 0,43, apresentam comportamento pouco favorecedor. A Tabela 13 a seguir apresenta os resultados obtidos a partir da análise.

Tabela 13 - Elisão da Vogal /o/ em Porto Alegre - RS (PB): Distância entre os Acentos

FATORES APLIC./TOTAL PORCENTAGEM PESO RELATIVO

Uma ou duas sílabas

como agora

278/622 45% 0,62

Presença de clítico

aberto ao

160/413 39% 0,51

Mais de duas Sílabas

amigo extraordinário

146/483 30,2% 0,40

Total 584/1518 38,5%

Input 0,35 Significância 0.000 Fonte: A autora (2013)

Assim como ocorreu com relação à análise estatística da elisão das vogais /a/ e /e/, a hipótese de que a distância de mais de duas sílabas entre os acentos dos vocábulos envolvidos no processo favorece sua aplicação foi refutada, visto que o favorecimento acorre apenas quando a distância é de uma ou duas sílabas. Conforme já fora previsto na seção anterior, tal resultado corrobora o indício de que se esteja tratando da primeira generalidade entre os processos com as três vogais e refutando completamente, para a amostra de Porto Alegre, a hipótese de Cabré e Prieto (2005), que prevê o favorecimento à elisão quando há maior distância entre os acentos.

Com a expectativa de que o resultado seja distinto para a análise da amostra do Porto, ressalta-se a hipótese de que este resultado diz respeito ao padrão rítmico, sobre o qual a literatura (Seção 3.2), ainda sem um consenso, revela indícios de ser acentual em PB, por conta da presença de acentos secundários, e silábico em PE. Após a discussão dos resultados referentes à amostra do Porto, a análise desta variável será retomada na Seção 6.7 em associação aos pressupostos teóricos discutidos na Seção 3.2 deste estudo.

6.3.3.3 Fronteira Prosódica

A variável Fronteira Prosódica foi selecionada nas duas rodadas de análise estatística, confirmando a relevância já esperada pela hipótese inicial da pesquisa e corroborada pelos resultados referentes às vogais /a/ e /e/ em Porto Alegre (PB). Quando em fronteira de frase

fonológica e na mesma frase fonológica, o peso relativo é de 0,53 e 0,51, apresentando,

ao processo. Em fronteira de frase entonacional, porém, o peso relativo é de 0,10, confirmando o bloqueio ao processo. A Tabela 14 a seguir apresenta os resultados obtidos.

Tabela 14 – Elisão da vogal /o/ em Porto Alegre - RS (PB): Fronteira Prosódica

FATORES APLIC./TOTAL % PESO RELATIVO

Fronteira de Frase Fonológica

[Tenho]ϕ[amigos especiais]

244/545 36 0,53

Mesma Frase Fonológica

[Muito estranho]ϕ[aquilo]

303/845 44 0,51

Fronteira de Frase Entonacional

[Apesar disso,]ϕ[entendo os motivos.]

37/128 28 0,10

Total 584/1518 38,5

Input 0,35 Significância 0,002 Fonte: A autora (2013)

Além de confirmar a relevância da fronteira prosódica, os resultados apresentados na Tabela 13 corroboram a hipótese de que o processo não é sensível a fronteiras de frases fonológicas em PB (BISOL, 1992, 1996), visto que a aplicação é similar quando o contexto está no interior da frase fonológica e em fronteiras, ao passo que é bloqueado quando ocorre em fronteiras de frases entonacionais. Conforme exposto nas Seções 6.1 e 6.2 e 5.3, pretende-se investigar a hipótese de que a maior incidência de pausas em fronteiras previstas como de frases entonacionais seja responsável por este bloqueio. Por outro lado, os contextos em que não há uma ruptura prosódica atribuída à pausa (SERRA, 2009) e a elisão é aplicada seriam resultado de reestruturação na fala espontânea. Assim, supõe-se que as ocorrências de elisão em fronteiras de frases entonacionais previstas estejam relacionadas a sequências em que o falante realiza uma reestruturação prosódica e a produção ocorra como uma fronteira de frase fonológica.

Cabe ressaltar que os estudos de Bisol (1992, 1996), sobre o PB, e Frota (1998), sobre o PE, afirmam que a regra de elisão é sensível a fronteiras de frases entonacionais, enquanto Tenani (2002) atribui o bloqueio exclusivamente à pausa. Considerando a hipótese aqui tomada, não haveria divergência entre os apontamentos das pesquisas anteriores, já que pausas estariam diretamente relacionadas a produções de fronteiras de frases entonacionais. Após a apresentação dos resultados estatísticos sobre a elisão das vogais /a/, /e/ e /o/ no Porto (PE), seguirá a análise sobre este aspecto prosódico, na Seção 6.7.

6.3.3.4 Tipo de Sequência

Selecionada na segunda rodada da análise estatística, única da qual fez parte em razão da relação pouco ortogonal com a variável Distância entre os Acentos, a variável Tipo de Sequência revelou o maior favorecimento ao fenômeno em estudo quando há uma sequência de palavra funcional acentuada+clítico, com peso relativo de 0,74. As sequências formadas por palavra lexical+clítico, palavra lexical acentuada+palavra lexical e palavra funcional

acentuada+palavra funcional acentuada também revelaram favorecimento ao processo, com

pesos relativos de 0,60, 0,57 e 0,55, respectivamente. Quando a ocorrência é construída por

palavra lexical+palavra funcional acentuada e palavra lexical+palavra lexical, cujos pesos

relativos são 0,43 e 0,36, respectivamente, não há favorecimento ao processo. A sequência de

clítico+palavra lexical, única em que há clítico em primeira posição na amostra referente à

vogal /o/ em Porto Alegre, revelou-se bloqueadora ao processo, com peso relativo de 0,11. A Tabela 15, a seguir, apresenta os resultados descritos.

Tabela 15 – Elisão da Vogal /o/ em Porto Alegre - RS (PB): Tipo de Sequência

FATORES APLIC./TOTAL % PESO

RELATIVO Palavra Funcional Acentuada+Clítico

isso e

91/133 68 0,74

Palavra Funcional Acentuada+ Palavra Lexical

isso aconteceu

197/380 52 0,57

Palavra Funcional Acentuada+Palavra Funcional Acentuada muito isso 59/133 45 0,55 Palavra Lexical+Clítico aproveitando as 65/148 44 0,60

Palavra Lexical+Palavra Lexical

carro escuro

143/560 26 0,43

Palavra Lexical+Palavra Funcional Acentuada feito aqui 23/93 25 0,36 Clítico+Palavra Lexical do aluno 6/73 8,2 0,11 Total 584/1518 38,5 Input 0,35 Significância 0,000 Fonte: A autora (2013)

A hipótese inicial para a variável Tipo de Sequência, baseada em Vigário (1997), considera que o processo em estudo seja favorecido por sequências de palavras lexicais, em que as informações morfológicas contidas no vocábulo preservam o significado quando ocorre a perda da vogal final. Os resultados apresentados na Tabela 15, entretanto, corroboram o que já havia sido levantando como indício a partir dos resultados apresentados com relação às vogais /a/ e /e/ em Porto Alegre (PB), ou seja, de que a relevância para o processo está na primeira posição. Assim, com relação à vogal /o/, há indícios de favorecimento da palavra funcional acentuada na primeira posição, considerando os três primeiros resultados apresentados na Tabela 15, ainda que a sequência de palavra

O resultado mais significativo, porém, está relacionado ao bloqueio da aplicação quando a primeira posição é ocupada por um clítico. Tal resultado não só corrobora os estudos de Bisol (1992, 1996) e Veloso (2003) sobre bloqueio do apagamento da vogal final do monomorfema em primeira posição, como também encaminha para a conclusão sobre uma regra comum ao apagamento de todas as vogais finais em Porto Alegre, visto que foi um resultado replicado em todos os resultados estatísticos descritos até aqui. O esperado é que a análise estatística da elisão das vogais /a/, /e/ e /o/ no Porto confirme este indício.