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Superior para o Século XXI – UNESCO (1998)

A Declaração Mundial sobre o Ensino Superior para o Século XXI: Visão e Ação, de 1998, foi um documento produzido na Conferência Mundial sobre Educação Superior, realizada pela UNESCO, em Paris, entre os dias 5 a 9 de outubro de 1998. Conforme depoimento do

professor Marco Antônio Rodrigues Dias15 (UNESCO, 1998, p. 1), “mais de 180 países se fizeram representar nesse conclave, mais de 120 ministros presidiram as delegações nacionais oficiais, perto de cinco mil pessoas participaram dos trabalhos, entre eles mais de 300 estudantes”. Segundo Dias (UNESCO, 1998, p. 1), a etapa preparatória da Conferência, entre 1996 e 1998, atingiu todas as regiões do mundo, e a Conferência “contou com uma mobilização jamais verificada em torno de um programa, pelo menos no que diz respeito ao ensino superior”. A análise geral da Declaração Mundial sobre o Ensino Superior para o Século XXI: Visão e Ação – 1998 (UNESCO, 1998) nos permite destacar uma preocupação em iniciar uma profunda reforma na educação superior em todo o mundo. É possível verificar, no documento, uma constante inquietude com o futuro e com a necessidade das instituições de ensino superior, entre elas as universidades, estarem preparadas para o século XXI. É recorrente, na Declaração, a necessidade de as instituições de ensino superior serem capazes de atuar como uma referência para previsão, alerta e prevenção em um mundo em constante transformação. Em tempos de incerteza, ainda conforme o documento, as instituições de ensino superior devem estar preparadas para mudar e provocar a mudança. Nesse sentido, a missão da educação superior é educar, formar e produzir pesquisas que ofereçam conhecimentos teórico-práticos para a sociedade presente e futura.

Diante desse futuro, é preciso constantemente prevenir, planejar e avaliar as atividades das instituições de ensino superior. O documento alertou para a necessidade de estabelecer vínculos com o mundo do trabalho e com os diversos setores da sociedade. Nesse repensar das IES para o século XXI, um dos destaques do processo de reforma é a necessidade de rever currículos e métodos de ensino, sobretudo a utilização das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs), como forma de democratizar a oferta de ensino superior, prevendo inclusive a existência de instituições totalmente virtuais que, respeitando as características nacionais/regionais, possam contribuir com a oferta de educação superior, sobretudo nos países pobres ou em desenvolvimento.

Por meio da análise geral da Declaração Mundial sobre o Ensino Superior para o Século XXI: Visão e Ação – 1998, podemos apontar, ainda, uma necessidade de repensar o conceito de ensino superior e de universidade para o século XXI. Temos um tempo presente preocupado em prever e planejar o futuro, tendo em vistas as constantes transformações no conhecimento e em sua aplicação, que modificam constantemente o processo de produção e as vivências em

15 Marcos Antônio Rodrigues Dias foi o coordenador principal da Conferência Mundial sobre Educação Superior

(1998) e diretor da Divisão de Ensino Superior da UNESCO (Paris) de outubro de 1981 a fevereiro de 1999, quando se aposentou.

sociedade, condicionando um repensar das instituições. Um contexto que apontou para a necessidade, conforme a Declaração, de rever os vínculos entre as instituições de ensino superior, o mundo do trabalho e os diversos setores da sociedade. As atividades desenvolvidas pelas instituições de ensino superior, em um mundo em constante transformação do conhecimento e em suas formas de aplicação, precisam ser desenvolvidas em conjunto com o mundo do trabalho e com a sociedade. Essas constatações apontaram para a dificuldade que as instituições de ensino superior do século XXI teriam em definir suas atividades de forma autônoma, sobretudo em relação à definição dos currículos, capazes de oferecer a formação necessária para atender as demandas da sociedade do conhecimento.

Diante desses desafios, a Conferência Mundial sobre Educação Superior teve como objetivo propiciar um debate em nível internacional, buscando reforçar a avaliação da necessidade de reforma nas instituições de educação superior no mundo todo, bem como oferecer diretrizes gerais para a implementação da reforma nos diversos países.

O título da Conferência nos remete ao elemento tempo – “século XXI” –, muito recorrente nos documentos internacionais ou nacionais produzidos nesse período. Os debates giram em torno da necessidade de uma educação superior para o século XXI, na necessidade de uma universidade para o século XXI. Destaca-se a necessidade de repensar o ensino superior e reformar a universidade; nesse processo existe a necessidade de ampliar a participação de diversos setores no debate, entre eles, os governos em níveis local e global, e o mercado econômico.

Para uma análise mais específica da Declaração Mundial sobre o Ensino Superior para o Século XXI: Visão e ação – 1998, temos um documento composto por um preâmbulo e 17 artigos divididos em três eixos temáticos: Missões e Funções da Educação Superior, Formando uma Nova Visão de Educação e Da Visão à Ação. No preâmbulo da Declaração lemos que o objetivo é “colocar em movimento um processo de profunda reforma na educação superior mundial” (UNESCO, 1998). Ainda no preâmbulo da Declaração, foi destacada a necessidade de visão futura da sociedade no século XXI e, como consequência, a função da educação em geral e a educação superior em particular, também nesse contexto. A necessidade de se formar uma nova visão de educação superior para atender as demandas do século XXI foi reforçada ao longo de todo o documento. Outro elemento destacado no decorrer do documento foi a necessidade de ampliar a participação dos que pensam as soluções para a educação superior do século XXI, conforme lemos no preâmbulo:

Considerando que a transformação e expansão substancial da educação superior, a melhoria de sua qualidade e pertinência, e a maneira de resolver as principais dificuldades que a afligem exigem a firme participação não só de governos e instituições de educação superior, mas também de todas as partes interessadas, incluindo estudantes e suas famílias, professores, o mundo dos negócios e a indústria, os setores públicos e privados da economia, os parlamentos, os meios de comunicação, a comunidade, as associações profissionais e a sociedade, exigindo igualmente que as instituições de educação superior assumam maiores responsabilidades para com a sociedade e prestem contas sobre a utilização dos recursos públicos e privados, nacionais ou internacionais (UNESCO, 1998).

É recorrente, na Declaração, as demandas por reformas que antes eram pensadas em âmbito dos governos e das instituições de ensino superior; agora, no caso do ensino superior e da universidade do século XXI, seria necessário incluir outros setores da sociedade interessados no debate. Um elemento destacado no que se refere à questão da autonomia didático-científica das instituições foi a necessidade de cooperação e intercâmbio entre as IES, de modo a contribuir com a redução das disparidades de oferta de educação superior entre os países pobres e em desenvolvimento dos países desenvolvidos, em que a utilização das TICs seriam ferramentas fundamentais na implantação do processo.

Interessante notar que no artigo 2º da Declaração, intitulado “Função ética, autonomia, responsabilidade e função preventiva”, temos uma preocupação que está presente no documento como um todo, voltada para a necessidade de uma previsão dos acontecimentos futuros como forma de planejar as ações no presente. Há um presente preocupado com as tendências da sociedade futura, conforme destacado na letra c do citado artigo 2º: “ampliar suas funções críticas e prospectivas mediante uma análise permanente das novas tendências sociais, econômicas, culturais e políticas, atuando assim como uma referência para previsão, alerta e prevenção” (UNESCO, 1998).

No artigo 6º, que trata do tema “Orientação de longo prazo baseada na relevância da educação superior”, temos que a representação do tempo histórico presente no documento influenciou diretamente os aspectos da formação na educação superior, a necessidade de prever tendências em um futuro incerto e em rápida transformação pelo desenvolvimento acelerado da ciência e da técnica, o que faz com que se reforce a necessidade de uma formação geral ampla e que o processo de especialização ocorra de forma contínua, de modo a permitir a reorientação da formação.

A preocupação deve ser a de facilitar o acesso a uma educação geral ampla, especializada e frequentemente interdisciplinar para determinadas áreas, focalizando- se as habilidades e aptidões que preparem os indivíduos tanto para viver em uma diversidade de situações como para reorientar suas atividades (UNESCO, 1998).

No artigo 7º, que trouxe a temática “Reforçar a cooperação com o mundo do trabalho, analisar e prevenir as necessidades da sociedade”, destacou-se o fato de que vivemos em uma sociedade onde novos paradigmas de produção aparecem a todo momento e estão baseados no conhecimento e na sua aplicação e, nesse sentido, os vínculos entre a educação superior, o mundo do trabalho e outros setores da sociedade devem ser constantemente reforçados e renovados. Na letra b do mesmo artigo 7º, lemos que esse vínculo deverá ser estabelecido com a participação nos órgãos que dirigem as instituições de ensino superior, propiciando outros aspectos, como o “intercâmbio de pessoal entre o mundo do trabalho e as instituições de educação superior, e da revisão curricular visando uma aproximação maior com as práticas de trabalho” (UNESCO, 1998).

Em um tempo histórico, em que o conhecimento e a sua aplicação constantemente geram novos paradigmas de produção, existe a necessidade de as instituições de ensino superior, entre elas as universidades, estarem vinculadas ao mundo do trabalho e à sociedade de maneira geral, como forma de estarem preparadas para mudar ou provocar a mudança; esses elementos são materializados na necessidade de repensar o currículo.

No artigo 7º, a declaração sugere que as instituições de ensino superior e o mundo do trabalho avaliem conjuntamente os processos de aprendizagem, inclusive destacando que “dentro do marco de sua função de previsão, as instituições de educação superior podem contribuir para a criação de novos trabalhos, embora esta não seja a sua única função” (UNESCO, 1998). É destacada, no documento, a necessidade de o ensino superior desenvolver, nos formandos e nos egressos, habilidades empresarias e senso de iniciativa, pois eles “serão chamados para deixar a situação de buscar trabalho para assumirem acima de tudo a função de criar trabalho” (UNESCO, 1998).

A questão da diversificação de modelos de educação superior foi destaque no documento como forma de atender a democratização da demanda, inserindo grupos cada vez mais diversificados e, em um processo de educação continuada, criar a possibilidade de entrar e sair facilmente dos sistemas de educação. Essas instituições precisam oferecer uma variedade de educação e formação, “habilitações tradicionais, cursos breves, estudo de meio período, horários flexíveis, cursos em módulos, ensino à distância com apoio, etc.” (UNESCO, 1998).

Na letra a do artigo 9º (intitulado “Aproximações educacionais inovadoras: pensamento crítico e criatividade”) temos um elemento voltado para a representação do tempo histórico. O documento afirma que vivemos em um mundo de rápida mutação, fator que justifica a necessidade de as instituições de ensino superior iniciarem uma profunda reforma na maneira

de acesso, nos currículos, nos métodos de ensino, práticas e meios de difusão do conhecimento, bem como nos vínculos e parcerias com os mais amplos setores da sociedade.

No artigo 12, que fala sobre “O potencial e o desafio da tecnologia” no processo de democratização da oferta da educação superior, destacou-se o papel de instituições e sistemas de educação superior totalmente virtuais, alertando, no entanto, para o respeito às identidades culturais e sociais.

No artigo 13, com o tema “Reforçar a gestão e o financiamento da educação superior”, na letra d frisou-se que “é indispensável fomentar a cooperação Norte-Sul com vistas a se obter o financiamento necessário para fortalecer a educação superior nos países em desenvolvimento” (UNESCO, 1998).

O artigo 15º tratou a temática “Compartilhar conhecimentos teóricos e práticos entre países e continente”, destacando a importância de compartilhar conhecimentos teóricos e práticos em nível internacional, como guia das relações entre instituições de educação superior nos países e, nesse sentido, fomentar a necessidade de a “dimensão internacional estar presente nos planos curriculares e nos processos de ensino e aprendizagem” (UNESCO, 1998).