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2.2 A Reforma da Universidade no Contexto Europeu

2.2.2 Modelos Comparados de Ensino Superior

Foi na Alemanha do século XIX que o modelo de universidade de pesquisa nasceu, com as ideias de Humboldt e a criação da Universidade de Berlim, em 1810. Até os dias atuais, a ideia de universidade de pesquisa faz parte da cultura universitária da Alemanha. No período do pós-guerra, o governo alemão teve o desafio de reconstruir a universidade livre de intervenções políticas e pensar o fracasso das universidades que não foram capazes de perceber as mudanças no regime político alemão no período entreguerras, além da necessidade de resgatar o treinamento profissional abandonado pelas universidades de pesquisa. Na década de 1960, com a democratização do ensino superior, os desafios tornaram-se ainda maiores. Diante disso, nos anos de 1970, a Alemanha iniciou o processo de diferenciação de suas instituições de ensino superior com a criação das Fachhochschule (FH), com o intuito de oferecer uma formação profissional, criando um sistema binário de educação superior. O governo tentou criar um sistema que integrasse universidades e FH em uma única instituição, a Gesamthochschule, mas a proposta foi rejeitada pela comunidade acadêmica alemã. A partir de 1990, as Fachhochschulen vêm se tornando cada vez mais parecidas com as universidades, pois o governo permitiu que os alunos pudessem cursar seus mestrados nas FH sem precisar passar pelas universidades; então, a pesquisa tornou-se uma possibilidade nas FH. Em 2003, surge uma nova estratégia do governo alemão para diferenciar as instituições de ensino superior, criando um tipo de competição para consolidar as universidades de excelência. O objetivo era elevar algumas universidades para instituições de pesquisa e elite: “Estas receberiam mais investimentos, os melhores alunos e teriam currículos diferenciados” (NUNES, 2012, p. 74). Em 2006, outro processo de seleção entre as universidades foi iniciado.

Vale ressaltar que todo o processo de seleção de universidades é formalmente acompanhado por comitês acadêmicos compostos por professores de outros países, que também participam da seleção de projetos. As propostas são julgadas não só pelo governo e por acadêmicos alemães, mas também por acadêmicos renomados de vários países (NUNES, 2012, p. 75).

O objetivo do governo alemão é constituir universidades de elite – e de classe mundial. O caso alemão, de acordo com Nunes (2012), é um forte exemplo da tentativa de diferenciação institucional, apesar da forte cultura da universidade de pesquisa; nesse sentido, o país busca

novas possibilidades institucionais, as quais contribuíam com o atendimento das demandas da sociedade contemporânea.

Os Estados Unidos possuem o maior número de universidades de pesquisa reconhecidas internacionalmente e seu sistema de ensino superior é um modelo de excelência. Nem todas as universidades lá são de pesquisa. Ao contrário do sistema binário da Alemanha, os Estados Unidos apresentam pluralidade e diversidade institucional.

Para se ter ideia da dificuldade de descrever e classificar tamanha diversidade, registre-se que a Carnegie Foundation classifica as universidades e faculdades em seis principais categorias, que se subdividem em outras subcategorias, perfazendo um total de 57 tipos de instituições (NUNES, 2012, p. 77).

Outra característica do ensino universitário nos Estados Unidos é que os quatro anos de escolaridade não são voltados para a profissionalização; profissões como medicina e advocacia, por exemplo, são aprendidas em nível pós-graduado. Assim como na Alemanha, os Estados Unidos, a partir das décadas de 1960 e 1970, tiveram de enfrentar os problemas advindos da democratização do ensino superior.

Na França, universidade e pesquisa não caminham juntas e as universidades não são instituições que detêm prestígio. O sistema francês é segmentado, baseado em universidades, Grande Écoles e institutos de pesquisa independente. O sistema francês pode ser dividido em três grupos de instituições: as Grande Écoles, as universidades e os institutos universitários de tecnologia, que oferecem cursos de educação superior de curta duração. Na França existe uma diferença entre as instituições que executam a pesquisa e aquelas que treinam para a pesquisa. Nas décadas de 1960 e 1970, o país também enfrentou o processo de democratização do ensino superior. A partir de 2009, seguindo a tendência de reforma da educação superior em nível mundial, a Franca lançou um documento intitulado Estratégia Nacional para a Pesquisa e Inovação.

O documento afirma que o país deixou de ser referência mundial em pesquisa e inovação, pois não reformou seu sistema de educação superior e seus organismos de pesquisa. Afirma, também, que o ensino superior, a pesquisa e a inovação são prioridades absolutas do governo (NUNES, 2012, p. 83).

Na China, a situação se transformou quando o governo chinês adotou o modelo soviético de institutos de pesquisa independente das universidades, na década de 1950. O sistema de desenvolvimento do ensino superior começou tardiamente, em 1980, com o ensino profissionalizante. Nos anos 1990, iniciou o incentivo de universidades de pesquisa de classe

mundial. Houve a escolha e o fortalecimento para a expansão do ensino superior oferecido por universidades de pesquisa de classe mundial, porém nem todas as universidades na China são de pesquisa. Ao lado das universidades, a China possui instituições que oferecem diplomas de dois ou três anos.

Na Inglaterra, para ser universidade, é necessário receber uma acreditação do governo, mas o critério de condução de pesquisa deixou de ser utilizado como importante para a acreditação. São considerados quatro aspectos diferentes:

São eles: (1) o número de estudantes em tempo integral de graduação e pós- graduação deve corresponder a pelo menos 4 mil; (2) pelo menos 3 mil estudantes em tempo integral devem estar em cursos de graduação; (3) as Universidades devem oferecer suporte para o aprendizado do aluno, bem como para seus funcionários; (4) estrutura organizacional das instituições, ou seja, se a organização da instituição atende o modelo de liberdade acadêmica e a tomada de decisão é transparente (NUNES, 2012, p. 85).

Diante desses exemplos, é possível afirmar que o processo de democratização do acesso ao ensino superior contribuiu para repensar os sistemas de ensino neste nível nos diversos países, e o atual contexto de avanço científico e tecnológico também tem motivado muitos países a selecionar instituições capazes de responder aos desafios do mundo contemporâneo. Apesar de as experiências de cada país ou mesmo a experiência do Processo de Bolonha, que pretende reformar o contexto europeu de ensino superior, servirem de modelo para reformas em outras regiões ou países, sempre é preciso adaptar as propostas para os contextos nacionais de oferta de educação superior.