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5 COLETA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS DA

5.3 CONFRONTAÇÃO DOS DADOS COLETADOS NA

A presente etapa foi desenvolvida buscando apresentar os dados primários coletados analisando os mesmos a partir do referencial teórico e das categorias de análise propostas neste estudo. Considerando as entrevistas semiestruturadas realizadas com os agentes, produtor e processador, da cadeia vitivinícola do Meio-Oeste de Santa Catarina, procurou-se responder o objetivo proposto de compreender as relações existentes entre tais segmentos produtivos. Como forma de atender este objetivo, inicialmente, buscou-se identificar os tipos de estruturas de governança adotadas pelas vinícolas presentes na região selecionada. Para tanto, utilizou-se como referência a classificação de estruturas de

governança – integração vertical, formas híbridas e mercado – proposta por Williamson (1985, 1996) e Ménard (2004).

Tendo as estruturas de governança descritas por esses autores como ponto de referência, tomou-se como suporte para compreensão das mesmas os pressupostos comportamentais dos agentes, e os atributos das transações realizadas entre os segmentos. Na sequência, buscou-se descrever a composição das estruturas de governança adotadas, considerando os custos de transação, os custos de mensuração e os recursos estratégicos presentes nesta cadeia produtiva.

5.3.1 Estruturas de Governança

A partir dos dados primários coletados com a pesquisa de campo, constatou-se que todos os produtores entrevistados vendem sua produção de uva para as vinícolas da região, sendo que somente 23% deles, além de vender uma parcela da uva para as vinícolas, comercializam o restante da produção in natura. Isso indica que os produtores entrevistados dependem da vinícola para vender suas produções, já que na ausência de negociações com esses beneficiadores o mercado livre não consegue adquirir todo o volume produzido.

Pelo lado da empresa beneficiadora a decisão de externalizar a produção está ligada ao fato de que 19% delas não possuem parreirais, o que induz à compra de uva de terceiros. Nesse caso, a ausência de ativos e recursos para a produção requer que as atividades sejam realizadas fora da empresa. Há ainda, as cantinas que adquirem uvas de outros produtores pra complementar a produção própria.

Outro fator que leva a vinícola a externalizar a produção, na visão dos produtores, é pelo fato de que os custos de transação externos a ela são menores do que os internos, sendo mais vantagem adquirir de terceiros. Isso remete as colocações de Coase (1937) e Williamson (1985, 1996) de que na presença de custos internos elevados de coordenação ou governança, há motivos para as empresas manterem relações com fornecedores.

Das 32 vinícolas analisadas nos itens quantitativos, 25 delas, o que equivale a 78%, adquiriram uva de terceiros e 15, o equivalente a 47%, compraram vinho de outras cantinas, sendo que 44% delas adquiriram uva e vinho de terceiros na safra de 2014/2015. Além do baixo custo de adquirir externamente, a ausência de recursos, como terras para plantar parreiras capazes de produzir o total que necessitam

ou determinada variedade para processamento leva a vinícola a comprar de terceiros.

Apesar da grande maioria das vinícolas manterem relações com fornecedores de uva e vinho, 19% delas atuaram somente com produção própria. A integração de atividades dentro da estrutura da empresa facilita a adaptação às mudanças, além de possibilitar que as mesmas sejam feitas assim que demandadas, evitando consultas com parceiros, conforme colocado por Williamson (1996). Neste sentido, conforme Argyres e Zenger (2012), as atividades devem ser internalizadas quando o custo de governar as mesmas por meio do mercado excede o custo de gerencia-la hierarquicamente na empresa.

Entretanto, mesmo as vinícolas que atuam somente com a produção de uva e vinhos próprios não tem sua estrutura completamente verticalizada, dependem de fornecedores para adquirir insumos para produção ou de terceiros para realizar a distribuição dos produtos. Isso porque conforme lembra Langlois (1992), mesmo possuindo uma estrutura integralizada verticalmente, nenhuma empresa tem capacidades necessárias para atuar em todas as atividades da cadeia de produção.

A Figura 21 retrata os tipos de relações comumente estabelecidas entre produtores de uva e vinícolas da região Meio-Oeste catarinense. No esquema 1, a vinícola não externaliza atividades, realizando as etapas da produção de uva e fabricação de vinho dentro da sua estrutura produtiva. O número 2 refere-se ao tipo de estrutura onde a vinícola mantém relações com fornecedores, na qual a cantina adquire produtos de terceiros, podendo ser tanto uva quanto vinho. A compra da uva é realizada com os produtores, enquanto o vinho é adquirido de outras cantinas.

Figura 21: Tipos de relações estabelecidas entre os produtores de uva e as vinícolas do Meio-Oeste de Santa Catarina conforme destacado na pesquisa de campo, 2015

Fonte: Elaborado pela autora a partir dos dados coletados com a pesquisa de campo (2015)

Conclui-se, a partir da pesquisa de campo, que a grande maioria das vinícolas do Meio-Oeste de Santa Catarina atuam horizontalmente, mantendo relações com fornecedores de uva e vinho. Esse tipo de relação incorre, dentre outros, em custos de negociação, já que geralmente exige-se um prévio encontro para combinar elementos referentes à transação. Entretanto, as formas híbridas são favoráveis por transferir os riscos ou problemas para terceiros. Há ainda, as que preferem concentrar as atividades dentro da sua estrutura, portanto, verticalmente integradas, o que possibilita o maior controle das atividades, porém nesse caso, os riscos são de inteira responsabilidade da vinícola. Assim, conforme Poppo e Zenger (1998) serão escolhidas as estruturas de governança que aumentem o desempenho da empresa através da minimização dos custos de transação e de produção.

5.3.2 Teoria dos Custos de Transação

Dessa forma, as relações estabelecidas na atividade vitivinícola do Meio-Oeste catarinense podem ser amparadas em dois tipos de governança apresentados no escopo teórico da TCT. O primeiro é a integração vertical, apresentada teoricamente por Williamson (1985) e praticada pelas vinícolas que realizam a maior parte das atividades dentro da sua estrutura produtiva. A internalização das atividades proporciona maior controle, autoridade e monitoramento das transações,

como colocado por Williamson (1985), Ménard (2004), Crook et al (2013).

A partir das entrevistas constatou-se que a ausência de contratos desenquadra os mesmos na qualificação de estruturas de governança via contrato, indicada por Williamson (1985, 1996). Contudo, podemos enquadrar tais relações estabelecidas na cadeia vitivinícola do Meio- Oeste com estudos realizados por Menárd (2004). Dessa forma, o segundo tipo de estrutura que pode ser encontrado na região como formas híbridas, constituída desde arranjos informais até arranjos mais formais (MÉNARD, 2004). Esse tipo de relação é caracterizada pelas parcerias entre os agentes, apresentadas no Meio-Oeste através das transações com terceiros. Dada a falta de contratos que amparem as transações na cadeia vitivinícola do Meio-Oeste, as relações nesse setor podem ser enquadradas em governança informal.

Na ausência de salvaguardas contratuais, as relações entre os produtores de uva e as vinícolas são sustentadas pela confiança entre as partes. Mesmo sabendo da existência de oportunismo nas relações (WILLIAMSON, 1981,1985; MÉNARD, 2004), as partes afirmam ter um bom relacionamento e parceria. Isso se deve também pelo fato de que muitos dos produtores transacionam com o atual comprador da produção a um longo período. Soma-se a isso o fato da região ser pequena e a maioria das vinícolas estarem concentradas em três municípios, o que segundo relatos, promove a difusão de informações sobre a produção, produtores e vinícolas. Nesse caso, segundo Zylbersztajn (2005), acordos informais são amparados por salvaguardas reputacionais e outros mecanismos sociais que tendem a inibir pressupostos comportamentais como o oportunismo.

À medida que os produtores e processadores vão se conhecendo e criando relações de longo prazo, maior confiança e fidelização surgem nas relações. A reputação torna-se um atributo prezado pela vinícola para manter as transações. Pelo fato de não haverem contratos para salvaguardar as relações as vinícolas resolvem informalmente os problemas que surgem, corroborando com a utilização de meios extracontratuais em relações mais estáveis como exposto na teoria por Ménard (2004) e Crook et al (2013).

Assim como o oportunismo, a racionalidade limitada é outro pressuposto comportamental que influencia as transações. A incapacidade de prever todos os aspectos envolvidos nas negociações pode estar associada ao ambiente em que a empresa está inserida ou ao

comportamento dos agentes (WILLIAMSON, 1981, 1985,1996; FARINA et al, 1997; ALMEIDA; ZYLBERSZTAJN, 2012). Nesse sentido, a dimensão comportamental refere-se à dificuldade de prever as atitudes dos agentes envolvidos nas transações ou relacionada à incapacidade de antever contingências futuras. Na perspectiva da vinícola a limitação cognitiva está relacionada às incertezas em relação ao comportamento dos produtores, notadamente no que diz respeito à entrega da produção e a qualidade da mesma. Pelo âmbito dos produtores isso se reflete nas decisões dos vinicultores, relacionadas às variedades exigidas pela vinícola, pelo preço pago pela fruta e continuidade das transações na safra seguinte. Para Williamson (2002), essa limitação pode exigir ajustes e adaptações das partes ao longo da transação, de modo a se adequar as exigências da outra parte.

Juntamente com a limitação cognitiva, a incerteza, um dos atributos das transações, reflete-se nos segmentos entrevistados pela assimetria de informações, apresentada no aporte teórico por Williamson (1985); Zylbersztajn (1995); Farina et al (1997), dentre outros. As principais incertezas ligadas à atividade, sentidas pelos dois segmentos analisados, são em relação ao clima, a qualidade da uva, o preço da fruta e da necessidade de uva e vinho na safra seguinte. Isso porque não há como antecipar, prever ou assegurar que a demanda pela fruta ou pela bebida serão mantidas ou aumentadas no próximo ano, que o clima seja favorável, que implica na maturação da uva e consequentemente no preço da fruta.

As transações ocorrendo com maior frequência tendem a aumentar o conhecimento, parceria e fidelidade entre os segmentos, reduzindo as incertezas e as chances de ocorrerem problemas nas negociações, conforme apontado por Williamson (1985, 1996, 2002) e Zylbersztajn (1995). Além disso, segundo Farina et al (1997), as transações recorrentes tendem a diminuir os custos relacionados a coleta de informações e adaptações as mudanças. Como constatado com as entrevistas, nos casos em que há transação com fornecedores, a frequência entre vinícola e produtores tende a ocorrer todos os anos durante a safra. Nos casos em que a produção vendida para a vinícola é significativa, podem ser entregues diversas cargas de uva na semana. Em relação às negociações de vinho, estas tendem a ocorrer de acordo com a necessidade da vinícola, que varia com a demanda de vinho. Como verificado na pesquisa de campo, há relatos de até quatro compras da bebida por ano.