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Congresso da III IC

No documento A Insurreição Comunista de 1935 (páginas 30-36)

O acontecimento mais importante no âmbito da III IC, no período de 1930 a 1935, foi a realização do VII congresso, entre os dias 25 de julho a 20 de agosto de 1935, em Moscou. Este congresso contará com a participação de delegações de todos os partidos comunistas a ela filiados (como seções da IC). Resumidamente, pode-se dizer que a sua realização foi consequência da nova conjuntura internacional, com a ascensão e consolidação do nazifascismo.

No dia 2 de agosto, George Dimitrov faz um longo dis- curso em que defende a constituição de frentes populares, estratégia mais adequada naquele momento histórico e na qual os partidos comunistas teriam um papel fundamental a desempenhar, articulando a mais ampla frente de combate ao nazifascismo. A ANL é citada como exemplo a ser seguido

(esta referência será usada posteriormente – e repetida com insistência – pelos militares brasileiros para mostrar os vínculos da Internacional Comunista com a ANL, tida como extensão do partido comunista).

Vitoriosa esta tese, a estratégia que havia sido definida no VI congresso, inaugurando o chamado “terceiro período”, devia ser abandonada. Tratava-se agora de priorizar a luta contra o nazifascismo e constituir frentes únicas anti-imperialistas e criar governos de caráter nacional, popular e revolucionário, tal como havia sido formulado pela ANL no Brasil.

No entanto, pouco depois, no início de 1935, Luís Carlos Prestes e alguns assessores da Internacional Comunista, entre eles Olga Benário, Harry Berger (Arthur Ernest Ewert) e sua esposa Sabo,6 o argentino Rodolfo Ghioldi, dois sovi- éticos disfarçados de belga Leon Jules Vallée (na realidade, Pavel Stuchevski) e a esposa Alphonsine (Sofia Semionova Stuchevskaya) e o norte-americano, Victor Allen Barron e as respectivas esposas, chegam clandestinamente ao Brasil

6 Sobre Harry Berger, há uma excelente reconstituição de sua perma- nência no Brasil feita por José Joffily, resultado da leitura de extensa bibliografia e pesquisa em jornais, revistas arquivos, bibliotecas e outras instituições. Ver: JOFFILY, José. Harry Berger. Curitiba: Paz e Terra/Universidade Federal do Paraná, 1987.

a fim de preparar uma Insurreição armada.7 Assim, como compatibilizar a ideia de uma frente ampla, como foi o caso da Aliança Nacional Libertadora no Brasil, com a Insurreição armada? Se a ANL é citada como modelo a ser seguido, como explicar a preparação de um Levantearmado? A constituição de governos populares era incompatível com a tática insurrecional? Para Paulo Sérgio Pinheiro não havia qualquer incompatibi- lidade, isso era perfeitamente compreensível, uma vez que a perspectiva insurrecional correspondia à antiga tendência no âmbito da IC e “não é por acaso que um das pedras angulares do programa inicial da III internacional era representada pelo reconhecimento de que a insurreição armada representava a única estrada a percorrer para a vitória da revolução proletá- ria” (PINHEIRO, 1987, p. 637-638). Nesse sentido, a Rebelião de 1935 tem suas raízes num modelo mais longínquo e decorre 7 Em 2010, foi publicado no Brasil o livro Johnny, a vida do espião que

delatou a rebelião comunista de 1935. É a biografia de Johann Heinrich

Amadeus de Graaf, conhecido como Johnny, que veio para o Brasil em 1935 junto com outros integrantes da IC “um seleto grupo formado por Prestes, Ewert, Johnny, o chefe do partido comunista argentino Rodolfo José Guioldi, outros dois argentinos, um italiano, um ame- ricano, cinco membros do partido brasileiro – entre eles o chefe do comitê revolucionário do Rio de Janeiro – e Pavel Vladimirovich Stuchevski viajaria para o Rio de Janeiro”(p. 259). A vir para o Brasil, Johnny já estava a serviço do serviço secreto britânico, infiltrado na IC e informa todos os passos do PCB no país e a preparação do levante. [...] transmitia as informações a Alfred Hutt, (superinten- dente assistente-geral da Ligth e o segundo principal agente do SIS - o primeiro era o embaixador britânico Hugh Gurney). Este as repassava ao embaixador inglês Gurney, que codificava o material e telegrafava para Londres. A comunidade de inteligência britânica selecionava, então, as informações e as entregava ao Ministro do Exterior, Oswaldo Aranha, no Itamaraty, o Ministério das Relações do Brasil. Por sua vez, o Itamaraty informava a Vargas e Felinto Muller, chefe da Polícia Civil e diretor da DESPS (Delegacia Especial de Segurança Política e Social) (p. 270). Mesmo assim, com todas as informações, o levante do 21º BC de Natal, pegou de surpresa não só a cúpula do partido, como o governo e seus espiões, incluindo o alemão agente duplo Johnny.

diretamente da tomada do poder pelos bolcheviques, em 1917, “como protótipos para futuras revoluções” e entre os fatores que ajudam a compor um quadro na qual a perspectiva insur- recional encontra justificativa estão as análises que se farão sobre os exércitos na América Latina. No caso do Brasil das interpretações das rebeliões tenentistas – e da coluna Prestes – “e a visão militarizada da insurreição nos países coloniais e semicoloniais [...] que contribuirão, na ótica da internacional comunista, para a possibilidade de sucesso de uma insurreição armada no Brasil” (PINHEIRO, 1987, p. 423).

Essas considerações têm o mérito de ampliar o quadro de análise em que se insere a possibilidade da uma Insurreição armada, em vez de compreendê-la simplesmente como resultado de informações fantasiosas, inexatas e triunfalistas de Antônio Maciel Bonfim, o “Miranda”.

João Quartin de Moraes, analisando esta questão, afirma que “a efervescência política dos quartéis constitui um dado objetivo da situação nacional. Este dado exerceu, não somente em Miranda, mas certamente também em Prestes, muito maior influência do que a mão de Moscou na decisão desencadeadora

manu militari da revolução proletária” (MORAES, 1994, p. 158). O

argumento central de Quartin é no sentido de negar qualquer orientação de Moscou para o desencadear dos Levantes. William Waak, ao descrever longamente às inflexões da internacional sobre o PCB, baseado em pesquisas realizadas em arquivos de Moscou, diz a esse respeito “o tema central desse enredo seria repetido por Prestes até o final de sua vida: a responsabili- dade cabia apenas ao partido comunista brasileiro, que havia

enganado em Moscou os contemplativos e bem intencionados camaradas soviéticos” (WAAK, 1994, p. 338).8

Embora certamente os “camaradas soviéticos” não tenham autorizado os Levantes (pelo menos da forma como se deram em Natal, Recife e Rio de Janeiro), parece inegável que sabiam de sua preparação.

O que procuraremos demonstrar nos capítulos que se seguem é precisamente, tendo como “pano de fundo” esse quadro mais geral, a especificidade do Levante em Natal, como resultado da conjugação de alguns fatores. Iniciaremos fazendo uma breve retrospectiva da história política do Rio Grande do Norte.

8 A respeito do livro Os camaradas, de William Waak, há uma crítica de João Quartin de Moraes em relação às alusões do autor quanto inflexões da III Internacional Comunista sobre o PCB e mais especificamente quanto aos Levantes militares em Natal, Recife e Rio de Janeiro. Ver o artigo de João Quartin de Moraes (Os camaradas), publicado na Revista de Sociologia e Política da UFPR (1994, n. 2, p. 141-143).

No documento A Insurreição Comunista de 1935 (páginas 30-36)