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1. CAPITAL, ESPAÇO URBANO E A PRODUÇÃO HABITACIONAL: MARCO

1.3. O setor imobiliário e a produção capitalista da habitação

1.3.4. Conquistando sobrelucros de localização

Conforme explicamos anteriormente, os sobrelucros de localização resultam de vantagens econômicas relacionadas à compra da terra e a transformação do seu uso. Para obter essas vantagens – ou seja, para se apropriar de tais sobrelucros – os incorporadores realizam negociações fundiárias que acarretam na valorização de algumas áreas. Estas passam a ser alvo da atuação do mercado imobiliário.

Algumas destas negociações encontram-se descritas por Ribeiro (op. cit.). Constituem-se, na verdade, como estratégias adotadas pelos incorporadores que rompem momentaneamente com a estrutura padrão da política fundiária que guia o mercado imobiliário, proporcionando aos mesmos a conquista de sobrelucros. Este rompimento, que significa uma mudança na atuação dos incorporadores com relação à compra da terra, está atrelado a fatores mercadológicos, urbanos e às relações entre setor imobiliário e Estado.

A primeira das estratégias apresentadas pelo autor é a apropriação do sobrelucro de conjuntura. Considerando o movimento cíclico do mercado, marcado por períodos de recessão e expansão econômica, tem-se que este tipo de sobrelucro acontece em momentos de boom imobiliário, ou seja, em fases de crescimento da produção. O ganho extra se dá ao comprar terrenos em momentos que precedem o

boom, quando apresentam preços mais baixos. Nos períodos de alta da produção, os

Entretanto, é válido salientar que os lucros extras conseguidos neste contexto são passageiros, visto que, devido ao aumento da concorrência causado pela expansão do setor, “os preços do terreno subirão ao nível que reduz a margem de lucro dos empreendimentos ao lucro normal”. (op.cit., p. 130) Assim sendo, fica evidente que os melhores momentos para a compra do solo urbano são aqueles caracterizados pela estagnação do setor.

Por ser fruto de uma condição conjuntural, este sobrelucro pode ocorrer em todos os tipos de submercados. É o que percebemos nos últimos anos da década de 2000. A boa fase vivida pelo mercado imobiliário, que tem como suporte políticas de financiamento para compra do imóvel, é caracterizada pelo aumento de moradias não só para os segmentos de alta renda, mas também para as classes populares, impulsionadas principalmente pelo programa Minha Casa Minha Vida. 18

Uma outra estratégia de condução da política fundiária é a busca do sobrelucro de antecipação. Ocorre quando os incorporadores compram terrenos em áreas que futuramente poderão receber investimentos por parte do Estado, em geral na forma de equipamentos coletivos e infraestrutura urbana. O Estado promoveria, assim, parte da transformação do uso do solo. O sobrelucro de antecipação também pode ser alcançado quando mudanças na legislação permitem o aumento do potencial construtivo para determinadas localidades. Os incorporadores que investiram na compra de terrenos aí situados são beneficiados pela conquista de lucros extras.

As demais formas de obtenção de sobrelucros a serem analisadas representam políticas fundiárias alicerçadas em mudanças na divisão social e simbólica do espaço. Constituem-se como ações que envolvem a criação de novas localizações, normalmente destinadas aos segmentos de mercado mais abastados. Os sobrelucros obtidos através deste tipo de política fundiária procedem, portanto, da prática da inovação espacial e da expansão da urbanização.

O sobrelucro de inovação resulta da compra de terrenos em áreas ocupadas por moradias destinadas a uma determinada classe social, para construir habitações a preços mais elevados, designadas a classes com nível de renda superior. Desta forma, os incorporadores compram terrenos a preços inferiores que o praticado nas zonas que costumam atuar, para auferir sobrelucros na transformação do uso do solo. É importante salientar que uma vez iniciado o processo de valorização do solo, seu

18 De acordo com dados publicados na reportagem “Empresários de Pernambuco são os mais otimistas” –

preço tende a aumentar, visto que a atuação de uma empresa costuma abrir portas para outras agirem na mesma localização, movimento que ocasiona o aumento da concorrência por solo. A busca pela inovação espacial é, deste modo, um processo constante.

Para atrair a demanda que pretende atingir e promover o seu deslocamento a estas novas áreas, antes desvalorizadas, o incorporador costuma oferecer no seu empreendimento uma série de equipamentos internos que “compensam a perda das vantagens locacionais, objetivas ou subjetivas.” (RIBEIRO, op.cit., p. 132) O referido autor cita como exemplo desta prática a construção de condomínios fechados no Rio de Janeiro.

O sobrelucro derivado da expansão da urbanização é, como coloca o próprio autor, uma variação da postura descrita acima. Seus ganhos também estão relacionados à transformação do uso do solo, porém com uma diferença. As áreas que são alvos desta prática costumavam ser utilizadas para a atividade agrícola. O alcance deste sobrelucro envolve, portanto, a expansão das fronteiras urbanas. Por não serem dotadas de infraestrutura, tais terras apresentam preços mais baixos que as dispostas nos centros, fato que compensa o investimento. Como explica Ribeiro, “a urbanização da periferia somente torna-se atrativa caso os custos adicionais sejam inferiores ao capital empregado na compra da mesma extensão de solo nas zonas habitualmente destinadas ao submercado que ele pretende atingir.” (op.cit., p.133)

Os imóveis aí construídos devem oferecer um modo de vida diferenciado, baseado num maior contato com a natureza e em todo simbolismo que o termo acarreta. Este é, de fato, o apelo publicitário mais utilizado para a atração da demanda desejada, preferencialmente composta por populações residentes nas áreas mais valorizadas das cidades.

Outra tática utilizada pelos incorporadores para conquistar demanda é, num primeiro momento, destinar algumas parcelas das terras adquiridas à construção de moradias de menor preço. Tais moradias não ofereceriam sobrelucros aos incorporadores, mas atrairiam compradores mais rapidamente. Quando a atividade residencial estiver devidamente fixada no local, são lançados novos empreendimentos, que serão comercializados a preços bem mais altos, garantindo o sobrelucro do incorporador.