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Submercados: a segmentação do mercado e a diferenciação do preço da

1. CAPITAL, ESPAÇO URBANO E A PRODUÇÃO HABITACIONAL: MARCO

1.3. O setor imobiliário e a produção capitalista da habitação

1.3.3. Submercados: a segmentação do mercado e a diferenciação do preço da

Vimos, no tópico que trata da renda fundiária, a importância da localização para a fixação dos preços da moradia e de como estes podem resultar de uma situação de monopólio. Vimos também que, a depender do ponto de inserção do imóvel no espaço urbano, varia a diferença entre seu preço de produção e seu preço de mercado. Isto acontece porque existe uma distinção espacial baseada em critérios econômicos, sociais, urbanísticos e simbólicos, que afeta tanto a demanda quanto a oferta, fazendo com que um imóvel implantado em determinada localização obtenha uma maior valorização que outro, consequentemente um maior preço.

Esta situação significa que “há um leque de ofertas dirigidas a várias classes da população” (ALVES 2009), baseadas principalmente na capacidade econômica da demanda, nas qualidades urbanas que a localização possui e na divisão simbólica do espaço. Tal fato levou alguns autores a concluir que o mercado de moradias é segmentado, composto por vários submercados que possuem condições diferenciadas

de formação de preços. É o que afirma Roca Cladera (1989 p. 39 apud ALVES 2009) quando coloca que

O mercado (...) não se caracteriza por um funcionamento equilibrado, competitivo e unitário, mas por sua anisotropia espacial, ou seja, por seu desenvolvimento segmentado em todo conjunto de submercados. Na cidade, não se consegue um ótimo locacional do conjunto de usuários urbanos, mas uma série de subótimos, para cada relação oferta/ demanda concreta, em cada um dos submercados. Trata-se, em resumo, de um mercado caracterizado pela restrição da oferta, ou seja, pela generalização de práticas monopolistas.

Sobre esta característica do mercado, Abramo (2007. b) ressalta que a segmentação promove a homogeneidade socioespacial do entorno residencial. Isto significa que as diversas classes sociais tendem a agrupar-se de acordo com sua capacidade de compra em determinadas áreas, provocando simultaneamente a hierarquização e a distinção do espaço urbano. Em outras palavras, tem-se no ambiente construído a reflexão da estratificação de renda da população brasileira.

A partir da reflexão disposta acima, alguns autores realizaram estudos sobre a atuação segmentada do mercado de moradias nas cidades, como Leal et al. (2009). Em seu trabalho, realizado com base em pesquisa desenvolvida na Região Metropolitana do Recife, encontramos a categorização de três segmentos de mercado. São eles: o segmento rentista-patrimonial, o empresarial concorrencial e o empresarial oligopolista. O primeiro, responsável pelo fornecimento de imóveis para o aluguel, age predominantemente nas áreas periféricas. Já o empresarial concorrencial é conformado por grupos imobiliários que tem a sua oferta direcionada para a produção de imóveis de médio valor aquisitivo, construídos mediante o uso de tecnologias- padrão. O segmento empresarial oligopolista é aquele dominado por poucas empresas. Estas mobilizam uma grande quantidade de recursos financeiros em suas operações imobiliárias, que por isso possuem um alto valor de mercado. Constituem- se como empreendimentos de primeira linha localizados em bairros nobres, destinados tanto à demanda interna quanto externa.

Já Ribeiro (1997) identifica três submercados que conformam o sistema de produção capitalista da moradia: o submercado de cooperativas e companhias estaduais de habitação, o submercado normal e o submercado monopolista. O primeiro é regido por condições diferentes das estudadas anteriormente, visto que sua produção é estruturada por uma instituição pública. Neste caso, “não é a apropriação de um lucro de incorporação que orienta a produção”. (op.cit., p. 124) Por não fazer parte do nosso foco de estudo, não deteremos nossa atenção neste submercado.

No submercado normal, a produção imobiliária toma forma em áreas urbanas onde as vantagens locacionais, bem como seu prestígio perante a divisão simbólica do espaço, não exercem um papel tão significativo. Por este motivo, apresentam preços fundiários mais baixos, o que possibilita um aumento da produção de imóveis. Segundo o autor, é neste submercado que se estabelece o preço regulador da moradia, ou seja, as condições de produção determinam os preços praticados no mercado, fazendo com que os incorporadores estabeleçam uma situação de concorrência.

Todavia, são admitidas algumas variações de preços, decorrentes dos seguintes fatores: i) suas áreas de atuação apresentam diferenciações, principalmente quanto ao aspecto infraestrutural; ii) as próprias condições do sítio conferem diferenciações à produção habitacional. Tendo em conta esta situação, Ribeiro (op.cit.) reconhece a existência de micromercados.

O submercado monopolista é aquele caracterizado pela prática de preços de monopólio, isto é, preços fundamentados em condições não-reprodutíveis. Para o autor, tal segmento atua em áreas que se configuram como um espaço-capital, ou seja, áreas que concentram “os elementos que conferem maior (e melhor) utilidade ao uso capitalista: infraestrutura e equipamentos coletivos”. (op.cit., p. 127) Nestas áreas, dotadas de significados que remetem ao prestígio social e ao sucesso econômico, os preços fundiários são altos, o que leva a uma produção reduzida. Os agentes imobiliários que conseguem adquirir terrenos aí são aqueles que possuem uma grande capacidade financeira, aptos a realizarem empreendimentos com maior potencial de rentabilidade.

É, portanto, no submercado monopolista (ou no segmento empresarial oligopolista) que os incorporadores detêm maiores lucros. Porém, ao atuarem nas localizações mais privilegiadas das cidades, são obrigados a despenderem uma quantia significativa de capital na negociação da propriedade fundiária. Tal fato lhes obriga a criar permanentemente novas localizações, onde o preço da terra é mais barato. Ao promover a transformação no uso destas parcelas de solo, o incorporador tem a chance de se apropriar do sobrelucro de localização, ou seja, a diferença entre o preço de compra do terreno (mais barato) e o preço de venda do imóvel (acrescido por conta da mudança no uso). Assim, atuam no espaço urbano segundo duas posturas, identificadas por Ribeiro (op.cit.): ora se comportam como reprodutores da divisão econômica e social do espaço, ora como transformadores, quando adquirem

sobrelucros. O ciclo de concentração dos investimentos imobiliários é explicado abaixo por Lacerda (1996 p.14),

Os promotores imobiliários dirigem as operações imobiliárias para aquelas localizações onde potencialmente poderão realizar maiores margens de lucro. O resultado é uma concentração de investimentos nestas localizações, estabelecendo um modelo de ocupação. Uma vez definido este padrão, os proprietários fundiários ocupam uma melhor posição para se apropriarem dos ganhos fundiários e, conseqüentemente, os promotores reorientam seus investimentos para outras zonas. Eis por que a estrutura interna da cidade apresenta zonas com diferentes etapas de ocupação.

A criação de novas localizações é determinada por alguns tipos de estratégias dos incorporadores, que influem de modo relevante na divisão social e simbólica do espaço. Ribeiro (op. cit.) cita a renovação urbana, que envolve a reconstrução de espaços de forma abrangente, a degradação simbólica, subjetiva ou objetivamente, gerada pelo surgimento de novos espaços e a expansão das fronteiras urbanas. Tais estratégias serão melhor compreendidas no próximo item.