• Nenhum resultado encontrado

Segundo Sandoval (2014), a consciência política é formada por aspectos identitários, pela cultura por meio da interação social, pelo conjunto de crenças internalizadas pelo indivíduo e pela percepção politizada do contexto social onde o sujeito está inserido. O autor nos apresenta o conceito de consciência como um construto social: um processo que transforma o pensar e promove reflexão e transformação do indivíduo a partir de suas experiências e vivências, passivas ou ativas, na interação social.

O caráter não determinista do conceito em relação à mobilização e participação política é ressaltado, uma vez que indivíduos podem também se sentir desmobilizados a atuar politicamente diante do contexto vivido. Ou seja: um estado em que os indivíduos têm consciência, mas escolhem agir ou não.

São consideradas sete dimensões psicosociológicas no modelo de Consciência Política proposto por Sandoval, que são articuladas entre si: (1) Identidade Coletiva; (2) Expectativas e Crenças Sociais (3) Sentimentos de Interesses Antagônicos e a Identificação de Adversários (4) Eficácia Política; (5) Sentimentos de Justiça e Injustiça; (6) Vontade de Agir Coletivamente; (7) Metas e Propostas de Ação Coletiva.

3.3.1 Identidade Coletiva

Trata-se da forma como indivíduos estabelecem uma identificação psicológica de interesses e sentimentos de solidariedade e pertença a um ator coletivo. Essa dimensão consiste no sentimento de identificação e pertinência a um grupo social. O elemento de identificação baseia-se na representação coletiva e na imagem pública demonstrada pelos líderes grupais. Ou seja, na maneira que os indivíduos identificam-se com interesses coletivos e fazem aflorar sentimentos de solidariedade e pertinência a grupos identitários.

3.3.2 Crenças, Valores e Expectativas Sociais

São representações sociais sobre a natureza, a estrutura, as práticas e finalidades das relações sociais, que constituem a sociedade e expressão da ideologia política dos indivíduos. São o conjunto de crenças, valores e expectativas sociais dos indivíduos, formados também pela interação social. São, portanto, reflexos da ideologia política dos indivíduos. São representações sociais da natureza, da estrutura, das práticas e finalidade das próprias relações sociais dos indivíduos. São individuais, mas compostas por meio das interações aos vários grupos sociais dos quais o indivíduo participe, ou não participe, constituindo assim o seu sentimento de pertencimento ou não pertencimento a este ou aquele grupo.

3.3.3 Interesses Coletivos e Adversários Antagônicos

É uma dimensão chave para a consciência política. Consiste nos sentimentos individuais em relação aos interesses materiais e simbólicos em contraposição aos interesses de outros grupos. A presença de interesses antagônicos leva à concepção da existência de adversários coletivos na sociedade. Trata-se de uma dimensão individual, de sentimentos simbólicos e/ou materiais identificados como opostos e antagônicos aos interesses de outros grupos. A identificação de um adversário visível estimula a mobilização dos indivíduos para uma ação coletiva contra esse adversário, de forma coordenada, contra um oponente individual ou grupal.

3.3.4 Eficácia Política

Definida como sentimento pessoal da capacidade de intervir em uma situação política. Essa dimensão é entendida como o sentimento do indivíduo sobre sua capacidade de intervir em uma situação ou contexto político. Indivíduos com sentimento de eficácia baixo normalmente atribuem a três fatores a causa dos acontecimentos: (1) forças transcendentais, desastres naturais ou intervenção divina, que provocam consequentemente reações de submissão e conformismo às situações de conflito social; (2) auto-atribuição: busca de soluções isoladas e autoculpabilização pelas questões sociais, e, (3) atribuição da causa à ação individual ou de grupos específicos. Sandoval, baseado na teoria de atribuição de Hewstone (1989), ressalta que o terceiro fator contribui para sensibilizar as pessoas a se tornarem atores políticos, responsáveis pela transformação social.

3.3.5 Sentimentos de Justiça e Injustiça

Nível de reciprocidade social entre atores considerados justos pelo indivíduo. Esta dimensão refere-se à forma que o indivíduo percebe sua condição dentro do arranjo social e da reciprocidade social entre os atores sociais, das obrigações e recompensas, percebidas como justas ou injustas. Sempre que os indivíduos acreditam que o equilíbrio nas relações se voltou contra eles, eles compreendem esta ruptura na reciprocidade como injustiça.

3.3.6 Vontade de Agir Coletivamente

Dimensão instrumental da pré-disposição para agir coletivamente contra injustiças cometidas contra o indivíduo. Apoiado em Klandermans (1992), Sandoval nos traz aqui uma dimensão que trata da predisposição individual para atuar coletivamente, de forma a reparar as situações percebidas como injustas. São identificados três aspectos que levam à participação coletiva: (1) custos e benefícios em relação às relações interpessoais do indivíduo na participação coletiva; (2) ganhos ou perdas materiais, e (3) riscos percebidos pelo indivíduo na participação e avaliação da capacidade organizativa do movimento coletivo proposto. Salvador

refere à Teoria da Escolha Racional dos Movimentos Sociais proposta por Olson (1965), e acrescenta que a escolha de participar ou não baseia no significado individual das informações, permeadas pela análise dos próprios sentimentos de eficácia política, interesses próprios, avaliação dos adversários e sentimentos de justiça e injustiça.

3.3.7 Ações e Objetivos do Movimento Social

Esta dimensão refere-se a quanto o indivíduo sente que os objetivos e propostas do movimento social e de sua liderança estão de acordo com seus próprios interesses simbólicos, como dirigem suas demandas por justiça contra o adversário identificado e à percepção de que as ações coletivas propostas estão dentro do escopo dos seus próprios sentimentos de eficácia política em um dado período de tempo. Trata-se de uma avaliação global da correspondência entre os objetivos da ação coletiva, e os objetivos e percepções individuais e todos os demais fatores envolvidos. São avaliados: a ação coletiva, as estratégias propostas em relação aos seus próprios sentimentos de justiça e injustiça, interesses e percepção da eficácia política. A possibilidade de atuar politicamente é acrescentada por Salvador, ao incluir uma nova e oitava dimensão à sua conceituação:

3.3.8 Predisposição para Intervir

Segundo o autor, esta dimensão, somada às demais dimensões expostas anteriormente nos darão um perfil das características da ação coletiva e sua capacidade de promover a predisposição psicopolítica dos seus participantes e integrantes para promover a ação coletiva proposta.

“Além disso a compreensão de como certas ações individuais ou coletivas ocorrem ou deixam de ocorrer não é apenas uma questão de circunstância histórica, ou da percepção do indivíduo e de sua realidade social, mas também do repertório disponível de ações possíveis e da legitimidade atribuída às mesmas por seus atores. É nessa terceira acepção que sentimos a necessidade de agregar a “predisposição para intervir” às outras dimensões da consciência política”. (SANDOVAL, 1994, p. 58).