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Considerações dos estudantes com deficiência visual que frequentam

6. APRESENTAÇÃO E AVALIAÇÃO DOS CADERNOS ADAPTADOS

6.2. Considerações dos estudantes com deficiência visual que frequentam

Estado.

Durante a realização da pesquisa, cuja proposta também foi orientada a estudantes com deficiência visual, estabeleceu-se uma relação de parceria com os estudantes da ADEVIRP. O diálogo com os estudantes foi realizado após as entrevistas com suas professoras e constituiu um importante instrumento de compartilhamento de experiências distintas e ao mesmo tempo comuns, como podemos perceber nos relatos que serão apresentados a seguir.

Para iniciar a entrevista buscamos compreender a trajetória que envolve o aluno, sua formação,sua deficiência, e sua relação com a escola e com as aulas de Geografia. Seguimos apresentando o caderno do aluno adaptado para leitura e avaliação do mesmo.

Felipe tem 12 anos, nasceu cego e conforme ia se desenvolvendo a visão se restabeleceu parcialmente, hoje tem baixa visão. Frequenta o 7º ano na Escola Estadual Professor Cid Oliveira Leite e está há 6 anos matriculado também na ADEVIRP. O aluno consegue ler com o auxílio de uma lupa.

Uma situação frequente nas escolas do estado é a demora na entrega do material adaptado. O aluno em questão afirmou ser costumeiro utilizar os cadernos comuns com uma lupa, mas que, como esses exemplares vêm contados por aluno, as vezes não sobra um para que ele possa acompanhar as aulas. A solução encontrada por ele é sentar em dupla com algum colega.

Para realizar as poucas tarefas de casa e trabalhos dos quais é solicitado, conta com o apoio da instituição especializada.

Afirmou que grande parte dos professores não leva em consideração sua baixa visão para explicar conteúdos e que consideram que que ao permiti- lo sentar nas carteiras da frente e realizar os trabalhos em dupla já estão dando conta do processo de inclusão. Inexistem atividades extras ou direcionadas. Alguns poucos materiais adaptados são disponibilizados além dos cadernos, como um globo em relevo e alguns esquemas de matemática.

Ao analisar o exercício (Figura 35 e 36) que está presente no caderno do 6º ano, primeiro bimestre, ampliado o aluno não conseguiu compreender que se trata de uma imagem de satélite e de um mapa que se relacionam. Os pixels estourados das figuras e as cores pouco contrastantes não permitem ver a diferença entre as manchas urbanas e a vegetação da imagem. Também fica muito difícil compreender a legenda e os diversos símbolos pictóricos no mapa: “É confuso, a cor do fundo se mistura com as linhas e com os quadradinhos, alguns eu nem consigo ver onde estão. Ainda tem os nomes das cidades no mesmo lugar e está meio embaçado. Eu não gostei!”

Figura 35: Mapa página 7 na versão ampliada do Caderno do Aluno; Figura 36: detalhe para a resolução do mapa. Fonte: acervo pessoal.

Ao ser questionado sobre o ensino de Geografia, disse que sua maior dificuldade são os mapas, que mesmo o mapa ampliado ou o globo terrestre que ele teve contato não foram suficientes. Disse também preferir um layout em que a legenda fique na pagina complementar ao exercício com o mapa e não na pagina posterior, isso faz com que o foco de sua visualização se perca a cada virada de página, tendo que buscar a informação novamente. Caso

estejam na mesma página aquilo que tiver sendo observado, que esteja no foco de sua visão residual, pode ser marcado com o dedo enquanto ele movimenta a cabeça até a legenda, voltando imediatamente para o ponto marcado. Isso torna o material mais prático e eficiente.

Vitor, 15 anos, é um aluno que frequenta a instituição há 7 anos. O estudante nasceu prematuro e perdeu a visão de um olho com apenas um 1 de idade e aos 7 anos perdeu a do outro olho. Frequenta o 8º ano na Escola Estadual Professor Cid Oliveira. Simpatiza com o ensino de matemática, pois diz ser o mais rápido de interpretação e menos cansativo. O aluno lê braile, mas utiliza pouco o caderno adaptado. Como Felipe, este recebe sua versão de material em braile bastante atrasado. Para compensar a falta de material ele utiliza a audição das aulas para compreender conceitos. Vitor também não costuma receber atividades extras ou direcionadas.

Em posse do caderno em braile, ao ser questionado como ele trabalha em dupla, grupo ou interagindo com o professor, o aluno afirmou que geralmente não consegue tirar dúvidas ou compartilhar uma parte do conhecimento.

Quando o professor passa algum texto na lousa ele procura sentar com um colega para que este dite o conteúdo. Neste caso, especificamente, ele destaca a professora de Geografia: “A minha maior dificuldade é que os professores não explicam, principalmente a de Geografia, ditam as perguntas e mandam procurar no livro.” Vale lembrar que os livros didáticos disponibilizados nas salas de livros das Escolas Estaduais não tem a versão adaptada para o braile nem a versão ampliada. Justamente para evitar que se tenha a necessidade desses materiais mais custosos, dentre outras justificativas, a Secretaria da Educação criou os cadernos do São Paulo Faz Escola.

Ao analisar a imagem de satélite e o mapa em braile das páginas 6 e 7 do caderno comum, o estudante com deficiência visual é obrigado a voltar 2 páginas no caderno em braile, onde começa a sua legenda. Como é um mapa com nome de muitas cidades, estas aparecem abreviadas com duas letras e nas páginas anteriores há o nome completo das cidades e a quantidade de habitantes. A legenda então passa a ser apenas textual, os elementos pictóricos (quadrados e pontos) são excluídos na versão em braile.

Figura 37: Imagem da situação de aprendizagem 1, páginas 6 e 7 do caderno comum, adaptados com o uso do braile e Figura 38: Mapa da situação de aprendizagem 1, páginas 6 e 7 do caderno comum, adaptados com o uso do braile

Fonte: acervo pessoal

A imagem de satélite adaptada apresenta apenas os contornos em braile. Nota-se que as figuras aparecem na vertical da página quando imagem e horizontal da página quando mapa (Figuras 37 e 38) Isso dificulta a associação entre os temas apresentados, deve-se localizar o ponto no mapa, verificar sua legenda, decorar o número de habitantes e assim comparar com outras cidades (que também passam pelo mesmo processo de interpretação) e voltar a localizá-las no mapa. Vitor afirma que seria muito demorado e ele não iria conseguir acompanhar a turma.

Vale lembrar aqui que o processo de aprendizagem pelo canal visual é bastante sintético. Já quando estamos tratando da percepção háptica o processo é gradual e deve ser auxiliado pelo modo de apresentação do material. A compreensão bidimensional difere da tridimensional.