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Considerações Finais

No documento Download/Open (páginas 147-150)

Nosso trabalho objetivou principalmente conhecer as representações sociais dos moradores da Cidade de Deus sobre a Unidade de Polícia Pacificadora. O estudo possibilitou delinearmos os diferentes olhares dos moradores para o projeto de pacificação. As dificuldades encontradas no campo nos fez questionar se a paz e segurança alardeadas pelo projeto de pacificação se destinam de fato a estes sujeitos. Temos a tendência a pensar, a partir dos dados de nossa pesquisa, que o projeto de segurança passa ao largo dos moradores da Cidade de Deus.

Ao longo da construção desse trabalho, levantamos diferentes informações acerca da relação que os moradores da Cidade de Deus estabeleceram com a UPP. Vimos que mesmo constituindo-se oficialmente como bairro, que passou por um processo de favelização, é inegável que sua representação social é de uma favela, sendo assim, vinculada a imagem de um local que inspira cuidados, potencialmente perigoso. Objeto de intervenção da política pública de segurança mais atual, postulada pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro.

Vimos ao longo da revisão teórica que historicamente a segregação espacial em nossa cidade favoreceu o estabelecimento de uma separação asfalto X favela, situação que possibilitou a estruturação da desigualdade social, o crescimento do tráfico nas regiões periféricas, que contribuiu para reforçar inúmeros olhares estigmatizantes sobre os espaços de favela. Consequentemente, diferentes intervenções foram agenciadas com vistas a dar conta do problema favela, não orientadas por um olhar macro, abarcando fatores econômicos, políticos, sociais e simbólicos. Muitas intervenções orientadas para a repressão e contenção da violência que se acredita ser produzida nesses espaços.

Acreditamos que as políticas voltadas à população de favela ou bairros favelizados devam ser orientadas pelas necessidades destas populações, reconhecendo-as como sujeitos de direito e integradas a cidade formal. Ao longo do trabalho podemos constatar que resumir a questão da segurança em ocupação policial não é suficiente para resolver os problemas, mas colaboram para a perpetuação de relações abusivas com a parcela desfavorecida da população. Ao dar ênfase ao discurso dos moradores da Cidade de Deus, esta pesquisa procurou colaborar para ampliação do campo de reflexões sobre a Unidade de Polícia Pacificadora. Dando destaque a perspectiva dos moradores que tem seu cotidiano atravessado pela política de pacificação. Buscamos identificar as representações sociais que construíram coletivamente, bem como delinear a vivência destes sujeitos com o processo de pacificação, as

transformações de seu dia a dia e sua avaliação sobre o trabalho da UPP. Entendemos que a escuta dos sujeitos atingidos pela estratégia, pode colaborar para dar luz às dificuldades e desafios postos a consolidação ou revisão da atuação da Unidade de Polícia Pacificadora.

Sabemos que historicamente a relação polícia/morador de favela é atravessada por inúmeros problemas, por conta disso, a relação de proximidade se constitui verdadeiro desafio, é preciso desconstruir os significados simbólicos atribuídos ao morador de favela e ao agente policial, com vistas a dirimir atritos e conflitos entre tais grupos.

Os estudos sobre as UPPs apontam tanto para avanços quanto para dificuldades, e nossa pesquisa levantou dados que os corroboram em muitos aspectos. O programa de pacificação parece despertar certa ambivalência em alguns setores da sociedade civil, que ora tende a apoiar, ora tende a criticar dura e severamente. Situação refletida pelos moradores da Cidade de Deus. Os resultados sinalizam para a necessidade de revisão do projeto de pacificação e uma avaliação criteriosa do modo como tem sido conduzido.

Neste estudo foi possível identificar, por meio das respostas dos participantes, que as representações construídas pelos moradores de uma maneira geral têm uma dimensão avaliativa, de caráter negativo. Vale destacar que eles demarcam uma vivência ambivalente em relação ao processo de pacificação e demonstram crítica em relação à atuação policial em seu local de moradia. Foi possível identificar que os sujeitos compreenderam a dinâmica da UPP no território, assim como as modificações ocorridas a partir do estabelecimento do policiamento permanente. Uma pequena parcela dos moradores reconhece ter tido ganhos pessoais pós-pacificação. E sobre a relação estabelecida com os policiais da UPP, esta parece ser marcada pelo distanciamento e desconfiança. Um número significativo dos sujeitos indicou não confiar nos agentes, assim como nos policiais de um modo geral. Podemos afirmar que os moradores da Cidade de Deus não avaliam a UPP como uma política pública de segurança adequada aos seus anseios.

Além disso, cabe apontar que os moradores demonstram críticas em relação aos conteúdos informados sobre a UPP na mídia de um modo geral. Indicam compreender a possível parcialidade das notícias veiculadas sobre o trabalho das unidades.

Ao final deste estudo, ficam alguns questionamentos sobre o campo das políticas públicas de segurança. Como pensar um projeto de segurança que abarque toda a cidade, reconhecendo-a sem distinção, divisão, encarando a todos como sujeitos de direitos?

Parece-nos que mais pesquisas precisam ser realizadas sobre o tema, com diferentes grupos sociais, também abarcando metodologias variadas, para que possamos produzir conhecimento necessário e relevante, que contribua para subsidiar intervenções no campo das

políticas de segurança mais adequadas a realidade da população, sem perder a perspectiva do compromisso social.

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