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3 AS RELAÇÕES DE PODER NA NEGOCIAÇÃO DE SIGNIFICADOS EM UMA COMUNIDADE DE PRÁTICA

3.5 Considerações finais e futuras investigações

Este artigo teve como objetivo identificar e analisar as relações de poder entre discursos na negociação de significados na CoP OEM-BA. Os resultados indicam que, nessa comunidade, foi possível identificar relações de poder entre os discursos acadêmicos (da matemática) e os discursos não acadêmicos, quando os membros negociavam significados relativos ao ensino e à aprendizagem de operações com números inteiros, bem como relações de poder entre os discursos interdisciplinares e os discursos intradisciplinares, quando os membros negociavam significados relativos ao ensino e à aprendizagem de grandezas diretamente e inversamente proporcionais. Essas relações de poder foram identificadas na fase de elaboração das tarefas matemáticas.

As relações de poder entre os discursos acadêmicos e os não acadêmicos, inicialmente, possibilitaram um isolamento que impulsionou uma dupla classificação e hierarquia, de acordo com as tarefas elaboradas pelo subgrupo. As duas primeiras tarefas conduziam para uma classificação forte e hierarquia explícita, uma vez que nelas havia um distanciamento entre a Matemática formal e as situações cotidianas. Já a terceira tarefa conduzia para uma classificação fraca e hierarquia implícita, pois nela havia uma aproximação entre a Matemática formal e situações cotidianas envolvendo noções de lucro e prejuízo.

Na negociação de significados, os membros optaram pelas duas primeiras tarefas, ao mobilizarem ideias e experiências que favoreceram o distanciamento entre a Matemática formal e situações contextualizadas. Esse distanciamento tornou as fronteiras entre os dois discursos mais nítidas, convergindo para uma classificação forte e uma hierarquia explícita.

Já as relações de poder entre os discursos interdisciplinares, inicialmente, possibilitaram um isolamento que impulsionou uma classificação fraca e uma hierarquia implícita, quando o subgrupo apresentou uma tarefa que permitia a articulação ou aproximação entre a Matemática e a Física. No entanto, na negociação de significados, alguns membros identificaram limitações que inviabilizaram a formalização da Matemática, no que diz respeito à proporcionalidade entre as grandezas diretas e inversas. Essa limitação desencadeou uma reformulação da tarefa pelo subgrupo.

A negociação de significados resultou numa variação no grau de manutenção das fronteiras entre os discursos intradisciplinares, pois a nova proposta da tarefa pelo subgrupo não permeava mais a articulação entre a Matemática e a Física, envolvendo apenas termos e conceitos da própria Matemática. Em torno disso, a classificação fraca e a hierarquia implícita variaram para uma classificação forte e hierarquia explícita. Essa variação também impulsionou o surgimento das relações de poder entre os discursos interdisciplinares, visto que a nova tarefa envolvia diferentes conteúdos Matemáticos. Diante da aproximação de alguns conteúdos Matemáticos, podemos inferir que a classificação foi fraca e a hierarquia implícita. Ou seja, também encontramos uma dupla classificação e hierarquia, mas dependendo da relação entre os discursos interdisciplinares ou os discursos intradisciplinares.

Com base nesses resultados, podemos inferir que a negociação de significados na CoP OEM-BA ofereceu mais possibilidades de variação das relações de poder do que os materiais curriculares educativos, já que os materiais reificados congelam as experiências e, consequentemente, não revelam o processo de negociação que originou o material. Esse resultado sugere que as CoPs têm mais potencial de formação que os materiais curriculares educativos investigados por Prado, Oliveira e Barbosa (2016), mesmo reconhecendo que os materiais envolvidos foram diferentes. Além disso, os resultados desta pesquisa deram visibilidade a variações nos princípios e nas hierarquias subjacentes no encontro entre acadêmicos e escolares.

Além disso, podemos concluir que tanto o fortalecimento quanto o enfraquecimento no grau de manutenção das fronteiras entre os diferentes discursos mostram uma preocupação da CoP OEM-BA em refletir que nem toda situação contextualizada ou relacionada a outras disciplinas favorecem a formalização da Matemática e, consequentemente, em “assegurar”, por meio da tarefa, a aprendizagem de conceitos matemáticos pelos estudantes.

Longe de tentar generalizar os resultados deste artigo, sugerimos que outras investigações, acerca das relações de poder entre discursos, entre espaços e entre sujeitos, sejam realizadas e possam ampliar os horizontes das CoPs, de modo que cada vez mais a comunidade científica reconheça que as relações de poder estão subjacentes a qualquer relação social e que é preciso lidar com elas no âmbito da formação de professores a fim de estreitar o diálogo entre universidade e escola.

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4 A CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADES EM UMA COMUNIDADE DE PRÁTICA NA