Neste capítulo, são apresentadas conclusões e observações referentes ao estudo dos mecanismos de transferência de carga entre estacas predominantemente rígidas e solo arenoso submetidos ao carregamento lateral ativo, assim como sugestões para futuros trabalhos.
CONCLUSÕES
A partir deste estudo, verifica-se a complexidade da interação solo-estaca durante a aplicação de carregamentos transversais, sendo o comportamento do conjunto influenciado principalmente pelas múltiplas não-linearidades do solo, pela relação geométrica e rigidez relativa do elemento estrutural e pelo nível de deslocamentos e cargas observados.
A metodologia de análise e modelo constitutivo adotados para representar carregamentos laterais em estacas são essenciais em projeto, e devem ser aprimorados para a obtenção de resultados coerentes à realidade de ensaio, dando-se preferência a modelos capazes de considerar a não-linearidade do maciço, o material do elemento estrutural, e a tridimensionalidade da distribuição de esforços.
Avaliando neste trabalho o problema de carregamento lateral em solos arenosos a partir de um modelo numérico e dois modelos analíticos, com considerações de um comportamento do solo elasto-plástico (Modelo Numérico e Modelo Analítico por Diferenças Finitas) e elástico- perfeitamente-plástico (Modelo Analítico pelo Método dos Deslocamentos), foram verificados:
• resultados coerentes com a literatura para deslocamentos aceitáveis pelas normas nacionais e internacionais e pela prática geotécnica;
• respostas de esforços e comportamento carga-deslocamento de topo do conjunto solo- estaca equivalentes entre os modelos analíticos, e com pouca dispersão às aferições do modelo numérico, quando adequadamente compatibilizados;
• maior sensibilidade dos diagramas de deslocamentos e reação horizontal do solo na comparação entre os modelos adotados, com uma tendência a valores de resistência última superiores a partir da limitação proposta pelo API (2002, 2014) e pontos de resistência máxima do solo mais próximos à superfície para a modelagem numérica;
• rigidez relativa do elemento estrutural para casos reais em acordo com os resultados observados pelos modelos numérico e analíticos e em conformidade à classificação proposta por Davisson (1970);
• forte influência dos efeitos de tridimensionalidade estimados para representar a cunha de ruptura no comportamento do conjunto solo-estaca dos modelos analíticos;
• influência representativa da coesão no comportamento de resistência do conjunto solo- estaca, sendo considerada para modelos analíticos a partir do cálculo da resistência limite proposto por Reese e Van Impe (2001);
• resultados consistentes para coeficientes de reação horizontal para solos arenosos linearmente crescentes com a profundidade, a partir do equacionamento desenvolvido por Bowles (1997) e constantes adotadas por Reese e Cox (1968 apud REESE; VAN IMPE, 2011);
• relações entre Kh e Es observadas para os modelos analíticos e numérico aferidos de
acordo às sugestões descritas pela literatura;
• rigidez da curva carga-deslocamento de topo simulada pelos modelos analíticos muito superior à observada nos ensaios experimentais para casos em escala reduzida, quando uso do nh proposto pelo API (2002, 2014), sendo esta uma limitação da metodologia
utilizada;
• aferição dos modelos analíticos para casos em escala reduzida com valores de nh na ordem de 4 a 15 vezes o proposto pelo API (2002, 2014);
• aferição dos modelos analíticos para casos em escala real com valores de nh equivalentes ao proposto pelo API (2002, 2014);
• rigidez da curva carga-deslocamento de topo não dependente do ângulo de atrito para deslocamentos admissíveis de até 10%D no caso de aferição de modelagem reduzida à
1 x g, devido aos baixos esforços observados;
• módulos de deformabilidade e reação horizontal do solo como parâmetros governantes do comportamento das estacas carregadas transversalmente em solo arenoso, influenciados consideravelmente pelo nível de tensões na interface do conjunto;
__________________________________________________________________________________________ Bruna Spricigo (spricigobruna@gmail.com). Dissertação de Mestrado. PPGEC/UFRGS. 2019.
Considerando-se a modelagem reduzida em laboratório para o estudo de caso do solo arenoso de Araquari em condição medianamente compacta e estacas predominantemente rígidas com mesmo diâmetro (1/2”) e dois comprimentos (18,25cm e 36,5cm), foi observado ainda:
• homogeneidade do solo reconstituído em câmara de calibração por meio do processo de pluviação;
• relação entre a dimensão do grão de areia de Araquari e o diâmetro do elemento estrutural, condições de contorno, e altura de pluviação em conformidade aos valores sugeridos na literatura para não serem gerados efeitos de escala representativos;
• reprodutibilidade de resultados carga-deslocamento entre estacas de mesma geometria submetidas a carregamento lateral monotônico, verificando comportamento de
hardening e comprovando a inexistência de efeitos de escala devido às dimensões do
tanque e condições de contorno;
• maiores forças necessárias para deslocar em mesma medida o topo das estacas de maior comprimento;
• necessidade de calibração dos parâmetros do solo para representatividade dos resultados de laboratório, vista a perda de escala devido a não equivalência do nível de tensões; • adequada aferição dos parâmetros do solo de ambas as estacas com uso dos modelos
analíticos e numérico para deslocamentos de até 3%D a 10%D, em condições monotônicas de carga, com uma constante de reação do solo de 2,4MN/m³ para os modelos analíticos, e um módulo de deformabilidade Es de 238 kPa (estacas curtas) e de 476 kPa (estacas longas) para o modelo numérico;
• resultados da retroanálise para a estaca de menor comprimento, a partir do uso de acelerômetro e giroscópio no topo e consideração de rotação constante em profundidade, condizentes às simulações numérica e analíticas;
• para a estaca de menor comprimento, constante de reação horizontal do solo obtida a partir da retroanálise do ensaio físico monotônico em escala reduzida em concordância ao valor sugerido para areias fofas por Terzaghi (1955) e aquele aferido a partir dos modelos de apoio, em condições de ruptura normativas.
• ponto de rotação para a estaca curta retroanalisada variando entre 0,77Lútil a 0,89Lútil no decorrer do ensaio de carregamento, apresentando valores superiores ao sugerido pelos modelos numérico e analíticos, principalmente no estágio de deslocamento final (20,09N), mas em concordância a outros trabalhos da literatura para condições de ruptura até 10%D;
• posição de momento máximo para a estaca par variando entre 0,3 Lútil a 0,5Lútil, crescente no decorrer do ensaio;
• melhor ajuste das curvas p-y retroanalisadas para a estaca de menor comprimento para função hiperbólica do tipo 𝑝 =1 𝑦
𝐾ℎ𝑖𝑛𝑖𝑐𝑖𝑎𝑙 ⁄ +𝑦⁄𝑝𝑢
e resistência última do solo adotada de acordo com a expressão 𝑝𝑢
𝐷 = 𝑁𝛾
′𝑧𝑛 = 𝐴 𝐾
𝑝² 𝛾′𝑧𝑛, com valores dos coeficientes de ajuste de 0,968 (A) e 0,702 (n);
• valores médios da constante nh para os níveis mobilizados do ensaio físico, a partir da função hiperbólica de ajuste das curvas p-y retroanalisadas, muito próximos aos aferidos analiticamente;
• resistências últimas representativas às curvas p-y extrapoladas do modelo físico para a estaca par inferiores às observadas pelo método proposto pelo API (2002, 2014) e pelo método de Reese et al. (1974) para profundidades até meio comprimento útil. A partir dessa cota, os modelos da literatura passam a apresentar, além de maior rigidez inicial, valores últimos de reação superiores, cada vez mais destoantes àqueles ajustados conforme retroanálise;
• taxa de recuperação média dos deslocamentos em estaca de maior comprimento até 3 vezes superior à registrada na estaca de menor comprimento para as fases de descarga; • influência da taxa de carregamento no decorrer dos ensaios cíclicos para valores
superiores à 0,01mm/s;
• influência dos ciclos no carregamento da estaca de maior comprimento, com acréscimo de resistência para os ciclos finais.
Desta forma, compreendem-se os principais mecanismos de transferência de carga entre solo arenoso e estaca para situações de carregamento transversal, observando-se a influência das
__________________________________________________________________________________________ Bruna Spricigo (spricigobruna@gmail.com). Dissertação de Mestrado. PPGEC/UFRGS. 2019.
condições de contorno, do nível de tensões e deslocamentos aplicados, da rigidez do elemento estrutural, das condições de resistência e densidade consideradas para o solo e da relação de interdependência entre deslocamentos e reações horizontais no comportamento do conjunto. Verifica-se ainda a importância de se compreenderem as limitações dos modelos utilizados, buscando-se corretas aferições e validações de casos reais.
A influência observada nos ensaios em escala reduzida e respectivos modelos de apoio devido à taxa de carregamento e ao ângulo de atrito exige maior aprofundamento no assunto, incluindo maior número de ensaios e uso de modelos mais fidedignos para completa compreensão.