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Previsão do comportamento da estaca sob efeito de carregamento transversal

Conforme sucintamente abordado no subitem anterior, o comportamento do sistema solo-estaca durante a aplicação de uma carga lateral é influenciado pelas condições de rigidez do elemento estrutural em comparação à rigidez do maciço.

O conjunto é dito rígido quando as deflexões e momentos do elemento estrutural não representam o principal problema da interação, e o dimensionamento do projeto é em função da resistência limite do estrato. Sistemas flexíveis, de outra forma, tendem a apresentar momentos de flexão superiores ao suportado pelo material estrutural (Mp, My) e deflexões críticas, requerendo para a verificação do projeto uma análise dos efeitos tensão-deflexão (FARO, 2014). Assim, a análise da capacidade última da estaca tende a ser baseada em uma decisão entre o estado limite (limite superior e inferior) para falha estrutural ou uma deflexão excessiva. (ISENHOWER; WANG, 2012)

Diferenças entre estacas rígidas e flexíveis podem ser observadas também no formato da linha elástica após o carregamento horizontal puro. Nas denominadas flexíveis, a resistência do solo junto à base inferior é nula, enquanto nas rígidas a resistência de ponta é significativa e contribui no equilíbrio de forças, conforme demonstrado na Figura 2.1 para estacas de topo livre (ALONSO, 1989; BROMS, 1964a,b; DAVISSON, 1970).

O diagrama de momentos fletores e esforços cortantes ao longo do fuste da estaca também varia de acordo com a rigidez do elemento estrutural. Entretanto, diferentemente da consolidação no

meio geotécnico de que os valores da reação do solo na ponta de estacas rígidas são expressivos, a significância dos momentos fletores e esforços cortantes nessa posição para esse tipo de estacas são discutíveis e variam conforme autores e metodologias.

Davisson (1970) e Alonso (1989), por exemplo, assumem como importantes os esforços cortantes e momentos fletores atuantes na ponta do elemento estrutural rígido (Figura 2.1 b). Para Broms (1964b), de outra forma, o momento da ponta de estacas de base livre é assumido como nulo, sejam estas rígidas ou flexíveis.

Figura 2.1: comportamento da linha elástica e momento fletor ao longo da estaca após aplicação de carga lateral, conforme classificação da estaca por rigidez relativa: (a) flexível; (b) rígida (Adaptado de ALONSO, 1989).

Exemplos práticos, como o ensaio em centrífuga realizado por Georgiadis et al. (1992) para uma estaca protótipo de 1,092m de diâmetro e 9,05m de comprimento útil (Figura 2.2 a e b) e o ensaio em campo de Haldar et al. (2000) para uma estaca de diâmetro médio igual a 0,755m e Lútil de 3,20 metros (Figura 2.2 c), mostram esforços próximo à base inferior consideravelmente inferiores aos máximos medidos, com uma tendência à nulidade.

Para estacas flexíveis, de forma consolidada, passa a existir uma profundidade a partir da qual os momentos são considerados desprezíveis, e o valor de momento máximo tende a aparecer no terço superior do comprimento do fuste (Figura 2.1 a).

Outra variável de grande influência para o comportamento do elemento estrutural durante o carregamento transversal e a sua classificação quanto à rigidez é a sua respectiva condição de topo. Dentre as condições de topo existentes, uma estaca pode ser considerada com topo fixo,

__________________________________________________________________________________________ Bruna Spricigo (spricigobruna@gmail.com). Dissertação de Mestrado. PPGEC/UFRGS. 2019.

quando há imposição de uma rotação nula junto à superfície do terreno devido ao acréscimo de rigidez ou fixação do elemento estrutural, ou com topo livre, quando a cabeça da estaca permite uma rotação.

Figura 2.2: diagramas de momentos fletores e esforços cortantes para estacas rígidas (a, b adaptados de GEORGIADIS et al., 1992), (c adaptado de HALDAR et al., 2000).

Segundo a metodologia adotada por Broms (1964a,b), para estacas com topo livre, o sistema se comportará como rígido quando o momento máximo atuante for inferior ao momento de plastificação do elemento estrutural, e o elemento tenderá a rotacionar por inteiro (Figura 2.3 e). Caso a ação da força transversal gere um momento equivalente ao de plastificação da estaca, essa apresentará uma rótula de plastificação no ponto de maior momento, tendendo a rotacionar na parte antecedente a esse ponto e se manter estável abaixo do mesmo. A geração de uma rótula plástica no conjunto o classifica como flexível (Figura 2.3 d).

Para um conjunto com topo restringido, como diferença do comportamento do sistema de topo livre, uma rótula plástica tenderá a se formar na seção em que o corpo da estaca se torna livre para rotação. Nesse caso, será configurada situação de rigidez intermediária quando, abaixo dessa rótula, a estaca inteira rotacionar (Figura 2.3 a), e um sistema flexível quando a rotação se limitar a uma segunda rótula plástica (Figura 2.3 b). Caso o elemento estrutural se desloque sem rotação e formação de rótula para casos de topo fixo, é caracterizado como um sistema rígido (Figura 2.3 c) (BROMS, 1964a,b).

(2.2) Figura 2.3: mecanismos de ruptura para estacas de topo engastado (a,

b, c) e topo livre (d, e).

Assim sendo, vários autores criaram fatores para conseguir quantificar a rigidez relativa do sistema solo-estaca e classificá-las como rígidas ou flexíveis. Dentre eles, aparecem os trabalhos de Vesic (1961), US. Navy1, Davisson e Robinson2, Broms3, Davisson4 e Werner 5. Uma das formas mais utilizadas para caracterizar esse comportamento é definida por Matlock e Reese (1961), os quais relatam que a influência do solo para com o sistema é considerável apenas até um comprimento característico λ ou, até sua inversa, rigidez equivalente T. A classificação do conjunto pode ser feita pelo seu comprimento adimensional T/Lútil (ARAÚJO, 2013), dos quais:

T – fator de rigidez do conjunto estaca-solo ou inversa do comprimento característico (T=1/λ), em L. Equacionado como:

𝑇 = √𝐸𝐾𝑝𝐼𝑝

ℎ 4

,

para solos argilosos pré-adensados, quando o módulo de reação do solo Kh tende a ser constante

com a profundidade. Também encontrado na literatura como R; 𝑇 = √𝐸𝑛𝑝𝐼𝑝

ℎ 5

,

para solos argilosos normalmente-adensados ou granulares, nos quais o módulo de reação do solo varia com a profundidade a uma taxa nh;

1U.S. Navy. Design Manual: Soil Mechanics, Foundation and Earth Structures. NAVDOCKS DM-7. Washington. 1962.

2Davisson, M. T.; Robinson, K. E. Bending and buckling of partially embedded piles. 6th ICSMFE, vol. 2, 1965. 3Broms, B.B. Design of laterally loaded piles. Journal of Soil Mechanics and Foundation Division, ASCE, SM3, 1965

4Davisson, M.T. Estimating buckling loads for piles. II Panamerican Congress on Soil Mechanics and Foundation Engineering. Sao Paulo. 1963.

__________________________________________________________________________________________ Bruna Spricigo (spricigobruna@gmail.com). Dissertação de Mestrado. PPGEC/UFRGS. 2019.

Lútil – comprimento da estaca abaixo do nível do terreno, em L; sendo:

EpIp – rigidez flexional da estaca, em FL²;

Kh – módulo de reação horizontal do solo, em FL-².

nh – constante do coeficiente de reação horizontal do solo, em FL-³;

Os coeficientes Kh e nh serão detalhados nos subcapítulos subsequentes deste trabalho.

A partir desses comprimentos característicos, um conjunto solo-estaca pode ser classificado quanto à sua rigidez e em função do seu comprimento adimensional como (DAVISSON, 1970):

Tabela 2.1: classificação de conjuntos solo-estaca submetidos a carregamento transversal em função da rigidez.

Condição Classificação quanto à rigidez relativa

Lútil/T ≤2 Estaca rígida

2˂Lútil/T ˂4 Estaca intermediária

Lútil/T ≥4 Estaca flexível

Fonte: Davisson (1970).

Alguns autores não contemplam em seus métodos a classificação de estacas intermediárias, considerando-as simplesmente como rígidas (Lútil/T<4).

Nesse contexto, existirá um comprimento crítico Lcrit a partir do qual o deslocamento e o momento máximo da estrutura manter-se-ão constantes e independentes dos esforços aplicados em seu topo. Este fator indica que, a partir de determinada profundidade, o comprimento da estaca não é influente no processo de composição de resistência do conjunto (ISENHOWER; WANG, 2012).

Por essa razão, o Lcrit é fator de grande influência na análise e dimensionamento de estacas submetidas a carregamentos transversais, sendo prática de projeto utilizar um comprimento do elemento estrutural tal qual superior ao comprimento crítico do sistema, de forma a buscar um comportamento flexível do conjunto (SU et al., 2018).

Entretanto, o valor desse comprimento crítico tende a aumentar com o acréscimo das deflexões aplicadas ao sistema, assim como diminuir com o acréscimo da altura livre entre a superfície e o ponto de aplicação de carga.

Assim sendo, o dimensionamento da seção estrutural torna-se um importante fator para a análise da interação solo-estaca, uma vez que a rigidez do elemento influencia não só a resistência limite da estrutura (pu), como também o comportamento tensão-deformação (H x y) e a forma de ruptura do conjunto (BORN, 2015).

Previsão do comportamento do solo sob efeito de carregamento transversal