Nosso trabalho teve como objetivo principal o estudo do ethos em duas produções teatrais de autoria de Gabriele D‟Annunzio, La figlia de Iorio e Il Martirio di
San Sebastiano. Pesquisa que nos proporcionou uma reflexão a respeito das
questões do estilo decadentista na Itália, da poética dannunziana e do estilo próprio de um poeta, o assim chamado, principalmente na Itália, de dannunzianesimo. Termo que em muitos contextos assume um aspecto pejorativo.
Na busca de respostas para as hipóteses levantadas destaca-se a discussão a respeito do ethos e sua definição nos textos teatrais, visto que tal procedimento é mais frequente em discursos políticos e publicitários. A utilização das teorias a respeito do ethos no discurso teatral viabilizou a descoberta de algumas técnicas discursivas nesse modo de representação artística.
A análise final dos corpora com objetivo de investigar o ethos dannunziano nos permitiu observar que é possível encontrar a veracidade de nossa assertiva nos textos trágicos do dramaturgo. Nosso objetivo era estudar a gênese das inspirações literárias e de que maneira elas se apresentavam no texto teatral. Por serem características próprias de nosso poeta, elas se fazem em qualquer modelo de representação artística que ele escolher.
Dessa forma, é possível verificar que na primeira parte de nosso trabalho, a figura de Gabriele D‟Annunzio foi apresentada em sua complexidade que na maioria das vezes entrelaça vida e obra. Certamente a autobiografia é um elemento constante de suas obras, tal como se observa em suas poesias e romances, quando são apresentados fatos inspirados nos amores por ele vividos.
É importante esclarecer que nossa análise do Ethos dannunziano no teatro centrou-se basicamente nas tragédias La figlia di Iorio e Il Martirio di San Sebastiano, já que suas temáticas de sustentação afastam-se da maioria de sua produção teatral, que tiveram como ponto de partida sua paixão pela atriz Eleonora Duse, com quem viveu uma conturbada história de amor. Contudo, fez-se
necessário lembrar que mesmo na fase do amor tórrido pela Duse, essa não foi sua única inspiração, fato comprovado pelo fascínio com que D‟Annunzio declarava pela leitura de peças gregas e latinas, acentuado por uma viagem à Grécia.
Superada a identificação dos motivos que levaram nosso autor a dedicar-se à arte teatral foi necessário rever aquilo que o compõe: o conceito clássico de tragédia e o conceito dannunziano de tragédia. Para isso, revisamos a função do herói grego e do herói dannunziano e, com isso, revisamos os conceitos de femme fatale e
superuomo, muito determinantes na decodificação da estética decadentista.
Em seguida buscamos demonstrar a definição da poética decadentista e suas influências na obra teatral de D‟Annunzio. Verificou-se, portanto, que o responsável pela entrada dessa poética na Itália foi Gabriele D‟Annunzio e que ao superar a matriz importada, cria a sua própria estética, o dannunzianesimo, que a maioria dos críticos insiste ler apenas em seu aspecto superficial.
Assim, fez-se necessário fazer uma retrospectiva do estilo verista, que na cultura italiana precede o Decadentismo. Após essa distinção, nos foi possível observar como o decadentismo era visto na Itália e apresentar o que de novo ele trazia para a literatura da época, principalmente no que se refere à questão do teatro italiano.
Superada essa etapa, dedicamo-nos à questão do ethos, apresentando uma ampla e clara evolução desse conceito desde a sua aparição na Antiguidade até os estudos atuais feitos dentro no âmbito da Análise do Discurso.
Na Análise do Discurso, encontramos definições e conceitos que nos propiciaram os instrumentos necessários para a nossa investigação.
A definição do conceito de ethos no universo produtivo de D‟Annunzio exigiu a revisão do conceito de cenografia e de gênero teatral, fase em que foram examinados os elementos principais de um texto teatral e quais aqueles que podemos utilizar como ponto de partida na elucidação do ethos dannunziano.
Foi-nos útil também o estudo dos conceitos de ethos prévio e ethos discursivo assim como a definição mais profunda do que é próprio dos elementos do texto teatral.
O capítulo 3 é aquele em que podemos unir todos os conceitos vistos nos capítulos anteriores e investigá-los nos textos teatrais selecionados. Incialmente, apresentamos os pontos principais em que chegaram nossa investigação a respeito das influencias e características dannunzianas para e no teatro e as principais considerações a cerca do estudo do ethos.
Visto isso, iniciamos nossa investigação em La figlia di Iorio e apresentamos artigos de jornal italiano que comprovam seu fundamental valor para a literatura italiana assim como a caracterizam obra prima teatral dannunziana.
Após uma breve introdução ao tema da peça, iniciamos a investigação do ethos discutindo primeiramente os elementos essenciais do gênero teatral para depois aprofundar a questão da influência de temas relacionados a tragédia grega, a questão cultural da região do Abbruzo, o tipo de herói dannunziano em Mila, como a femme fatale e o típico herói grego, em Aligi. Apresentamos também a incansável busca pela palavra, com exemplos do vasto vocabulário de Gabriele D‟Annunzio. Todos esses elementos evidenciam que o ethos dannunziano é caracterizado pelo estilo próprio do autor, denominado dannunzianesimo.
É na abnegação de Mila pela vida que nos salta essa tendência dannunziana peloa maneira fantástica com que finaliza suas peças. A morte de Mila se torna um espetáculo uma vez que ela mesma se atribui a culpa e se atira ao fogo.
Da mesma forma ocorre no segundo texto que analisamos, Il Martirio di San Sebastiano. Nele, o ethos também se destaca em um momento principal: a morte do santo. Para o autor era esse o momento principal e culminante de sua peça, pois a produzia de maneira que fosse espetacular e triunfal.
nos indica que é ali que o ethos dannunziano é evidenciado, há sofrimento, há dor, mas o santo nada sente e, inclusive, atiça os arqueiros para que lancem mais flechas.
O mesmo ocorre com a feiticeira, Mila. Ainda que todos saibam que ela é inocente e que uma das irmãs de Aligi confirme essa hipótese, ela se entrega a fogueira e morre de maneira triunfal.
Assim como o ethos é evidenciado no tema relativo à morte podemos observar que quando D‟Annunzio trata do amor é seu ethos que surge diante dos leitores/espectadores.
Se para o poeta a morte deveria ser algo triunfal, o caminho para ela não poderia ser menos importante. O amor de Mila por Aligi a faz morrer e o amor do santo Sebastiano pela presença Divina também o leva a morte.
O amor nos textos dannunzianos é visto como algo totalmente visceral, profundo e impulsivo e que somente aqueles que não possuem medo da morte o podem viver da maneira mais totalizante possível. Para Gabriele D‟Annunzio, seus personagens só poderiam amar se estivessem totalmente dispostos a se doarem por completo em função desse sentimento e, se necessário fosse, a morte seria o fim.
Essa pesquisa de dissertação de mestrado, portanto, averiguou que o Ethos dannunziano é destacado não só nas características típicas de um texto de gênero teatral, mas, principalmente, nas características próprias do autor, como a maneira em que são tratados os elementos amor e morte.
Seus personagens são os elementos de que ele precisa para que esses temas sejam ressaltados e que cheguem a seu ápice fazendo com que o público também sinta aquilo que ocorre no palco. Eles se transformam, dessa forma, no
superuomo dannunziano e/ou na femme fatale. É nesse ponto que D‟Annunzio consegue realizar a catarse, um elemento do teatro grego, o público/leitor se deixa envolver e se afeiçoar pelo personagem que quando chega o momento de sua morte
o público o instiga a isso. Também desejam que o personagem se mate para que concretizem esse amor.
Por muito tempo o estilo dannunzianesimo foi criticado no âmbito da pesquisa italiana, por ser algo específico e extremamente característico do poeta. Entretanto, após esse estudo, espera-se ser possível que essas amarras negativas que ainda existam em relação a esse fenômeno se desfaçam, uma vez que ao se compreender que o poeta possuía um estilo próprio e que este é evidenciado por seu ethos e, mais ainda, que foi ele o ícone do decadentismo italiano, nada mais coerente do que aceitar e compreender que seu estilo seja visto de uma maneira positiva.
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