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A conclusão de um trabalho é sempre provisória e também é a parte mais difícil. Colocar um fim para a história que se está construindo é como um parto complicado: dói muito. A paixão pelo objeto de estudo nos deixa tão inebriado que, a cada resposta que descobrimos, novas questões são elaboradas incitando novas análises. É nesse momento que nos damos conta de que o tempo finda e temos que pôr um ponto final nas questões que nos colocamos.

O percurso de pesquisa para nós foi uma aventura prazerosa, pois ao utilizarmos uma gama de fontes diferenciadas, pudemos aprender muito. Houve dois momentos especiais nessa aventura de historiadora que gostaríamos de destacar. O primeiro foi a aplicação de questionário com os docentes, quando alguns, além de responder as questões interrogaram sobre o trabalho e levantaram questões que mereciam ser analisadas. Outro momento, foi na coleta dos depoimentos dos reitores, presidentes e diretores da ADCESP. O contato com cada um, a disponibilidade para falar de suas experiências e a disposição para refletir sobre a UESPI foi nos dando fôlego para ampliarmos a discussão. Foi no momento de construção da fonte que fomos crescendo como pesquisadora, ganhando segurança para tratar do tema sindicalismo docente superior.

Estudar sindicalismo docente superior no Piauí foi um desafio ao qual nos propomos em um momento de muitos embates entre os sindicatos e o Estado. O ano de 2003 foi marcado por uma série de greves do sindicalismo do funcionalismo público no Piauí e no Brasil: muitos se levantaram contra o projeto de reforma da previdência. No Piauí, assumia o governo Wellington Dias- PT que, assim como o governo federal, também tinha propostas de reformas do Estado. Os professores da UESPI já vinham de um período de oito anos sem reajuste salarial, então, aproveitaram o momento de ebulição e também foram às ruas e ao Palácio do Governo(Karnak), exigir aumento salarial.

Para alcançar os objetivos definidos na pesquisa fizemos um longo percurso, no qual a abertura para conhecimentos novos foi o impulsionador das estratégias elaboradas ao longo do estudo de tese. O estudo da teoria de Gramsci e suas categorias explicativas, como: Estado Ampliado, hegemonia, intelectual orgânico, intelectual tradicional, sociedade civil e as suas explicações sobre o papel do partido político e do sindicato foram fundamentais para construímos a análise das fontes.

Para estudarmos a relação da ADCESP com o Estado e reitoria, partimos da categoria de Estado Ampliado de Gramsci, o qual engloba tanto a sociedade política quanto a civil,

numa interação permanente. Assim, fizemos uma análise dos governos de Collor a Lula, para explicarmos as transformações que foram sendo operadas no interior do Estado pela classe dominante, obedecendo às diretrizes da política neoliberal. Dentro desses princípios, o mundo do trabalho foi transformado pela flexibilização das relações de trabalho e a desregulamentação de direitos anteriormente adquiridos pelos trabalhadores em luta. Esse processo teve início no governo Collor, que deu início ao processo de privatização das empresas estatais e diminuição das atribuições do Estado, abrindo espaço para a iniciativa privada e atuação do capital internacional. Contando com o apoio da Força Sindical, que ajudou no processo de amortecimento da luta dos trabalhadores, ao mesmo tempo em que contribuía para a flexibilização das relações trabalhista, ao defender o emprego acima de tudo, favoreceu a implantação de reformas no mundo do trabalho que resultaram em prejuízos para os trabalhadores.

Com o governo de Fernando Henrique Cardoso, a política neoliberal ganhou forças e se concretizou através de um processo de reformas do Estado que atingiu vários setores, foram feitos cortes nas políticas sociais, saúde e educação e os trabalhadores foram duramente reprimidos em suas manifestações em busca de direitos. Atingiu ainda o mercado de trabalho, ocasionando uma retração no emprego formal e ampliação do emprego informal e do terceirizado, precarizando ainda mais as condições de trabalho e de proteção social dos trabalhadores que, no novo contexto, foram obrigados a aceitar relações trabalhistas mais flexíveis e ter que conviver com a insegurança no emprego. Situação vivida inclusive, nas universidades com o professor do quadro provisório, que trabalha por um tempo determinado sem ter todas as garantias trabalhistas. A adoção da política neoliberal pelo governo brasileiro, dificultou a ação sindical. Os sindicatos passaram a conviver com uma conjuntura de difícil mobilização da classe, devido à redução do número de sindicalizados e de relações mais flexíveis de trabalho, tendo que, a partir daí, redirecionar a luta para a defesa do emprego e dos direitos conquistados em lutas passadas, não conseguindo ampliar a luta por direitos novos, como a redução da jornada de trabalho e a garantia dos direitos previdenciários.

Foi ainda no governo de FHC que a reforma universitária começou a ser implantada, facilitando a ampliação do ensino superior privado, com regras mais flexíveis para a criação de faculdades e centros de ensino superior. O resultado foi o sucateamento das universidades públicas, que tiveram que funcionar com cortes de recursos e ameaça de diminuição dos direitos dos docentes, obrigando estes a reagirem através de longas greves.

Durante as administrações do PT, tendo à frente Lula como presidente, esperava-se que este pudesse conter o avanço da política neoliberal, mas segundo os estudiosos do PT e

do movimento sindical, este partido teria se transformado para se adequar à ordem e se credenciar como partido eleitoral. Essa mudança de rumo e de princípios teria afetado o modo petista de governar, ao fazer alianças com a classe dominante brasileira e tentando controlar o movimento sindical através da CUT. Esta apoiou o governo Lula em ações que, visivelmente, prejudicaram os trabalhadores.

Com a postura da CUT de colaboracionismo ao governo do PT, o movimento sindical sofreu mais um racha, quando muitos sindicatos se desfiliaram da CUT e se organizaram através da Coordenação Nacional de Lutas/Conlutas e da Intersindical. Mais tarde, a Conlutas passa a se organizar como Central Sindical e Popular e recebe nos seus quadros parte dos grupos dissidentes da CUT. Assim, o movimento sindical ganhou uma central de oposição ao governo petista e através dela passou a organizar várias manifestações de protestos contra o avanço da política neoliberal e as reformas do Estado. O ANDES/SN filiou-se à Conlutas e levantou-se em defesa da educação pública e contra o sucateamento da educação superior e o processo de reformas que foram implantadas nessa modalidade de ensino, como a Educação a Distância.

Vimos que o movimento sindical teve que enfrentar vários desafios, nesse novo contexto de desregulamentação das relações de trabalho. O sindicalismo docente enfrentou o mesmo dilema do período de sua fundação: a relação entre sindicato e partido. Ainda hoje, os sindicalizados que mantêm uma visão conservadora do sindicato baseado no modelo coorporativo, questionam a relação entre sindicato e partido político, muitos filiados não abraçam a luta em forma de greve utilizando como justificativa a aproximação estreita entre partido e sindicato como prejudicial à luta. Em contrapartida, os sindicatos docentes filiados ao ANDES/SN, na sua maioria, são dirigidos por lideranças filiadas ao PSTU e ao PSOL. A partir de suas diretrizes, os partidos têm imprimido um tom mais aguerrido aos debates e às críticas à política neoliberal, ampliando a luta docente, para além dos muros da Universidade e dos interesses salariais da categoria. Têm ainda, defendido a união da luta dos trabalhadores e durante toda a administração do PT, se mantiveram sempre na oposição às políticas aplicadas por esse partido. Mesmo assim, não têm conseguido convencer as bases sindicais que a luta deve ser ampliada, ocasionando greves com pouca adesão, mesmo em contextos de grande pressão por parte do Estado.

Gramsci nos seus escritos, já pregava a necessidade da relação entre partido e sindicato como necessária para o fortalecimento da luta e como meio para os trabalhadores conquistarem espaço nas estruturas do Estado, a fim de tornarem seus projetos hegemônicos. Outro ponto destacado por ele é o da avaliação da força política do grupo, para se averiguar o

grau de homogeneidade que possui para dar prosseguimento à luta. “O momento seguinte é a relação das forças políticas, ou seja, a avaliação do grau de homogeneidade, de autoconsciência e de organização alcançado pelos vários grupos sociais [...].” (GRAMSCI, 2012, p. 41). Essa avaliação é para saber o grau de consciência política coletiva do grupo social. No contexto de nosso estudo, percebemos que a formação oferecida pela ADCESP à sua base não foi suficiente para promover a superação do grau de consciência política coletiva dos seus associados, permanecendo ainda no primeiro grau definido por Gramsci de econômico-corporativo. Também não percebemos essa formação política da base como prioritária pela ADCESP, pois estes encontros de formação ocorrem de forma esporádica e não têm boa divulgação e mobilização dos docentes para delas participarem. Muitas vezes, o sindicato faz algumas atividades formativas visando cumprir o que determina o ANDES/SN para as Associações Docentes, mas não se preocupam com a participação da base. Entretanto, em todas as greves organizadas pela ADCESP foi questionada a pouca participação dos docentes e o seu grau de consciência política, já que só se organizavam para lutar por melhoria salarial.

No estudo das greves da ADCESP, constatamos que as pautas de lutas foram se ampliando ao longo do tempo. Em 2003, primeira greve analisada, a pauta principal era só a questão salarial, defesa do salário que já estava há oito anos sem reajuste. De 2011 em diante, as pautas se ampliam para atender aos interesses de outros segmentos da universidade, como discentes e técnicos administrativos, impulsionando a luta por melhoria estrutural para todos os campi da universidade. O sindicato tendeu a ampliar as críticas ao governo, mas isso nem sempre bem aceito por seus associados.

Constatamos, ainda, que a realidade estrutural e organizacional da UESPI se apresentava como um grande problema, fruto da forma improvisada e desorganizada do seu processo de expansão para o interior do Estado, com a oferta de cursos no período de férias para formar os professores da rede estadual e municipal em nível superior. Desse processo, resultou o fechamento de vários convênios entre universidade e prefeituras, associações, sindicatos para o oferecimento dos cursos. Em 2003, quando a nova administração da universidade assumiu e fez o balanço da situação da universidade, descobriu uma realidade alarmante: a maioria dos cursos em funcionamento não tinha nem autorização para funcionar, muito menos projeto político pedagógico e condições de oferecer um diploma para o aluno, por falta de regularização. Além disso, a universidade enfrentava problemas financeiros, por falta de pagamentos das instituições com as quais tinha selado convênios, ocasionando em atraso salarial dos docentes que haviam ministrado aulas nos cursos em períodos de férias e