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Capítulo II – Metodologia

1. Apresentação geral do desenho de investigação

1.5. Considerações sobre a análise de conteúdo

Todas as investigações pressupõem que os dados empíricos serão analisados segundo uma coerência metodológica e, cientificamente, balizadas. Na análise dos dados procedentes da técnica da observação e da técnica do inquérito, é usual optar por uma técnica de análise das comunicações que visa identificar indicadores para a produção de inferências, referentes à produção ou receção destas mensagens. Escolhemos então a análise de conteúdo porque, por exemplo, para Berelson (citado em Vala, 1986), “a análise de conteúdo é uma técnica de investigação que permite a descrição objetiva, sistemática e quantitativa ou qualitativa, do conteúdo de manifesto da comunicação” (p.103). Esta técnica permitiu-nos analisar a informação recolhida através da observação, do inquérito por entrevista e por questionário, e das conversas informais também realizadas, (ver em anexo as grelhas de registo de observação e a transcrição das entrevistas) e facilitou-nos a reflexão acerca de todo o material recolhido e, a sua inclusão triangulada ao longo do estudo.

Segundo Bogdan e Biklen (1994), a análise de dados, “é o processo de busca e de organização sistemático de transcrições de entrevistas, de notas de campo e de outros materiais que foram sendo acumulados, tem como objetivo aumentar a compreensão desses mesmos materiais e de lhes permitir apresentar aos outros aquilo que encontrou” (p.205). Ao darmos início, neste estudo, à análise de conteúdo, foi crucial ter este referencial metodológico bem presente, na medida em que, existe um risco acrescido de dispersão, quando o volume de informação obtida é considerável.

Olabuénaga (1999) diz que “a análise de conteúdo não é outra coisa senão uma técnica para ler e interpretar o conteúdo de toda a classe de documentos26 e, mais concretamente (ainda que não exclusivamente), de todos os documentos escritos” (p.192). Esta é uma técnica que aparenta ser simples mas que é bastante intrincada e extremamente importante, uma vez que congrega muitas etapas e conceitos. Esta técnica permite-nos aceder a outras informações ou pistas que, à partida, não estavam visíveis, desocultando-as de cada vez que fazemos uma leitura cada vez mais cuidada e profunda. Olabuénaga (1999) ressalta, contudo, a diferença entre a análise de conteúdo e análise documental, sendo que no primeiro tipo de análise não só o texto é importante como o contexto em que foi produzido também. A análise documental apenas recai sobre o

103 texto. Uma vez que o texto pode dizer muito mas o contexto em que foi produzido também, tal facto, permitir-nos-á fazer inferências, que segundo o autor, é um elemento central da análise de conteúdo (p.195). Significa que ao analisarmos um texto escrito, por exemplo, podemos inferir sobre as características pessoais e sociais do autor desse texto mas também do público ao qual se destina. Há, ainda, possibilidade de inferir acerca do texto se a mensagem que se pretende transmitir é clara e inequívoca ou se, por outro lado, há a intenção de fazer passar outra mensagem de forma, subliminarmente, sub-reptícia.

De facto, foi nossa preocupação ter todos estes aspetos em consideração. Ao longo da análise de conteúdo pudemos organizar a informação recolhida de acordo com os procedimentos que a literatura recomenda. Tivemos, ainda, em linha de conta que para Bardin (1977) a análise de conteúdo é “um conjunto de técnicas de análise de comunicações visando obter, por procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/receção (variáveis inferidas) destas mensagens” (p.42). Foi fundamental, para nós, a elaboração de instrumentos de registo que nos permitiram sistematizar e categorizar todos os dados obtidos, anteriormente, na fase do trabalho de terreno. Foi com base nas três fases de categorização de Bardin (1977) que concretizámos uma tarefa que, de início, se apresentava bastante árdua e complexa. Assim, inicialmente, na fase da pré-análise, fizemos uma leitura flutuante, isto é, uma primeira leitura despreocupada mas com rigor e objetivos. Tivemos, por isso, atenção a tudo o que nos permitisse identificar temas- chave, fazer anotações (a que retomámos na fase seguinte), e à escolha de documentos, considerados por nós, como mais relevantes. Na segunda fase, a da exploração do material, procedemos, então, à codificação da informação pré-analisada. Uma vez que optámos pelo critério semântico para a categorização da informação, fizemo-lo através do seu agrupamento por Unidades de Registo e Unidades de Contexto, que fomos selecionando à medida, que fazíamos uma segunda leitura, mais cuidada e aprofundada a toda a informação recolhida/obtida.

Ressaltamos, ainda, os requisitos, seguidos por nós, identificados por Bardin (1977) para a criação das categorias e que são os seguintes: a exclusão mútua; a homogeneidade; a pertinência; a objetividade; a fidelidade e a produtividade e através dos quais, formámos as categorias.

104 Na terceira e última fase, dedicámo-nos ao tratamento dos resultados obtidos, às inferências que fizemos, e à interpretação dos mesmos, conforme recomendado por este autor. Tornou-se, nesta fase, mais evidente quais as categorias apuradas e até a descoberta de novas categorias, que a priori, não cogitávamos a hipótese de poderem surgir. Foi com base no tratamento da informação que pudemos retirar as conclusões que apresentamos no final desta investigação. Há, no entanto, um aspeto que gostaríamos de destacar e que se prende com o aspeto inferencial referido por Guba & Lincoln (1985)

(…) os dados não são vistos como sendo oferecidos pela natureza mas como algo resultante da interação entre o inquiridor e as fontes (humanos ou não humanos). Os dados são, por assim dizer, as construções27 fornecidas pelas e nas fontes; a análise de conteúdo leva à reconstrução dessas construções (p.332).

Foi, sem dúvida, importante incluir as nossas inferências na análise desenvolvida e que abarcou todos os dados que recolhemos, isto porque, a reconstrução que levámos a cabo, foi baseada nas construções dos sujeitos observados mas às quais adicionámos as nossas ilações àquilo que observávamos, no ambiente natural dos sujeitos e do fenómeno.

Precisamente por se situar numa lógica de análise compreensiva e indutiva, a análise de conteúdo, tem sido, por este motivo, alvo de muitas críticas, mais do que os paradigmas de análise tradicional de carácter hipotético-dedutivo, cujos pressupostos estão mais de acordo com a análise de textos curtos sendo, portanto, pouco útil para o tratamento em entrevistas longas (Guerra, 2006).

2. Os procedimentos metodológicos operacionalizados nesta