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Sem aviso, abro braços e pernas ao mesmo tempo Nesse rompante assumo a posição de combate e defesa: pernas esticadas meu pé direito, apoiado sobre

3.2. Consolidações do frevo no século

Composições importantes do frevo, como a música “Vassourinhas”, foram criadas na primeira metade do séc. XX, e difundidas no carnaval e nas rádios locais, como a Rádio Clube e Rádio Jornal do Commercio, no entanto, o ápice do frevo é considerado a década de 1950, quando da criação da Fábrica de discos Rozemblit. Segundo Teles (2000), de 1954 a 1968, a Rozemblit foi uma das mais atuantes gravadoras do país, para ele a mais importante de capital exclusivamente nacional, com filiais nos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul. Assim, ele afirma: “Foi também a única empresa do gênero fora do eixo Rio - São Paulo a formar um acervo cujo interesse transcende o paroquial, com dezenas de fonogramas fundamentais para a história da musica brasileira.” (Teles, 2000:18).

A Rozemblit tinha como diretor artístico o maestro e compositor Nelson Ferreira, e seu investimento no frevo tornou-o ritmo “rival da marchinha carioca no carnaval pernambucano e no de vários estados brasileiros, sobretudo no Norte/Nordeste.” (Teles, 2000: 25). O símbolo dessa disputa de mercado é a música “Evocação n. 1”, de Nelson Ferreira, que alcançou sucesso nacional no carnaval de 1957.

Se a Rozemblit era o principal estimulador e difusor da música do frevo, os concursos de Passo, promovidos inicialmente pelas rádios locais, eram a grande vitrine para os dançarinos do frevo. Passistas que se exercitavam e criavam, nos ensaios de orquestra realizados em ruas e clubes do Recife, disputavam nesses concursos a melhor e mais criativa interpretação para os frevos executados ao vivo pelas orquestras dessas rádios. A dança

frevo alcançou algum relevo social34, recebendo destaque na revista de circulação nacional O Cruzeiro, de 1957, cuja reportagem “Caem no frevo as garôtas” apresentava os seguintes versos, ilustrados por desenhos de garotas realizando movimentos de frevo:

Nunca fui a Pernambuco Mas não sou das mais calouras E ao som do frevo maluco Sei caprichar nas “tesouras”.

No texto narrativo, vê-se que a realização da dança Frevo era limitada. Nele o jornalista explica: “FREVO aqui é sinônimo de batucada, samba, movimento, porque nem sempre as garotas conhecem as minúcias e segredos da dança pernambucana.” .

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No Recife, a complexidade da dança também encontrou dificuldades de se propagar em sua totalidade. Para o jornalista José Teles (2000), o desaparecimento de passistas deve-se ao sucesso dos bailes carnavalescos da década de 1970, quando predominou o frevo de bloco, um tipo de frevo com andamento musical mais lento, derivado do pastoril e acompanhado por cordas, em vez dos metais, e que possui letras para serem cantadas em coro. Nesse frevo, as evoluções dos corais não criaram espaço para as danças individuais e acrobáticas do frevo. Vale salientar que os bailes carnavalescos foram também uma forma que a elite encontrou de realizar o carnaval de forma a separar-se das

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outras classes sociais. O crescimento do carnaval, com multidões nas ruas e avenidas, é também considerado por Teles (2000) um fator social de declínio da dança.

Já o mestre passista Nascimento do Passo vê na chegada da TV, e na conseqüente perda de espaço das rádios, elemento determinante para o declínio do frevo, pois as emissoras de rádio mantinham suas orquestras, empregando músicos e compositores e, portanto, mantendo os artistas em condições de trabalho e de criação.

Também a Ditadura Militar, o fechamento da Fábrica Rozemblit e o programa habitacional que conduziu a população menos privilegiada para Centros Habitacionais (COHABs) longe do centro da cidade, na década de 1960, são alguns fatores sociais que ajudaram a diminuir a força popular do frevo. O fato é que, em 1971, restavam apenas 08 clubes-de-rua, dos 100 que existiam em 1900 (Oliveira, 1985). Assim, no início da década de 1970, o trabalho de Nascimento do Passo, com a criação da Escola de Frevo, pode ser visto como um dos principais fatores de continuidade da dança Frevo. E também de sua reorganização, o que será detalhado posteriormente.

A música do frevo também teve reduzido o espaço que ocupava no cenário nacional, apesar de ser considerada um dos embriões da música do carnaval baiano que se destaca nacionalmente na década de 1990. Diferentemente do fenômeno de popularidade que alcançaram na década de 1950, as novas produções não penetraram na programação das rádios e os sucessos dispersaram-se em esparsas criações por cantores de renome nacional como Gilberto Gil, Chico Buarque, a exemplo do “Chuva, suor e cerveja”, de Caetano Veloso, da década de 1970. Para o jornalista José Teles, “o frevo tornava-se uma música de músicos”. No final da década de 1980, a música do frevo passou por um período de popularidade através do sucesso alcançado por artistas como Alceu Valença e o projeto Asas da América, que propunham diferentes abordagens do frevo. Também os trabalhos do Quinteto Armorial e do Quinteto Violado sobre o frevo são considerados por Adriana Gehres (2007) importantes para a penetração do frevo nas “camadas médias” do Recife, do fim do século XX. Na década de 1990 o frevo teve papel de pouca importância na produção musical do movimento manguebeat35. Neste, os maracatus e o samba foram predominantes.

Em suma, o frevo é um gênero artístico de dança e de música de origem urbana, desenvolvido fora do sistema convencional de arte, no encontro de diferentes classes

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O movimento manguebeat foi um movimetno artístico, com ênfase na área musical, e que ganhou destaque nacional e internacional pela forma como propôs utilizar ritmos e imaginário das culturas populares. Este, estava ligado “a rede de circulação de conceitos Pop”, conforme Manifesto Mangue e apresentou diálogos com o rock, o hip hop e o hard core. Seus integrantes reclamam uma autonomia e atualização das idéias regionalistas anteriores. Este movimento é considerado deflagrador de um renascimento cultural local.

sociais. No decorrer do século XX o frevo se especializa no campo artístico como gênero musical e como dança que ganham visibilidade nacional na década de 1950. As mudanças sociais e econômicas restringem sua atuação enquanto fenômeno social ao período carnavalesco e pré-carnavalesco, no entanto, enquanto produção artística, o frevo é desenvolvido por artistas profissionais, passando a dialogar com questões e tradições da arte convencional. Nesse processo, apresenta-se a dupla tensão: por um lado, a ideologia sobre a preservação da cultura popular tenta enquadrar o frevo em categorias pré-estabelecidas e, por outro, recusa-se a absorver suas transformações como parte de um processo legítimo. O próximo capítulo aprofunda o outro campo de tensão: a introdução do frevo no campo da arte convencional. Nele, focalizo as questões da dança frevo e seu processo de legitimação enquanto prática artística.

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Carlinhos “tesourinha”, passista “anônimo”,

4. O processo de construção das Escolas de Frevo