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2. O BRASIL NA PRIMEIRA REPÚBLICA (1889-1930)

2.2. A Primeira República (1889-1930)

2.2.1. Constituição do federalismo no Brasil

O federalismo pode ser entendido como uma forma de organização do Estado que tem como característica a dupla autonomia territorial do poder político; o governo federal (central) e os governos membros (descentralizada) (BRANCO, 2007). O federalismo foi institucionalizado com a República em 1889, mas a noção do mesmo surgiu no Brasil antes da Proclamação da República, quando, ainda no século XIX, emergiram os movimentos separatistas e estava ligado ao regionalismo, que pode ser caracterizado pelo comportamento político dos atores regionais que aceitam a existência do Estado-nação, mas tem como objetivo o favoritismo econômico e a autonomia, segundo Love (1980), “anômalo na América Latina e mesmo anacrônico à luz das tendências centralizadoras do México, da Colômbia e da Argentina” (p. XV). Para Cury (2010), federação e federalismo significam:

“[...]contrato, aliança, união, ato de unir-se por aliança e também se fiar, confiar-se, acreditar”. Se assim for, a definição de federação movimenta a ideia de agrupamento de estados autônomos para defesa e ataque sem que a União, embora seja soberana e represente a todos, disponha de poderes praticamente absolutos sobre cidadãos e estados federados. Por outro lado, se o Estado federal tem características que o distinguem de outros tipos de Estado, devemos presumir que apresente certo caráter descentralizador que repercuta no comportamento de quem vive nesse Estado. Nessa lógica, no pensamento político no Brasil (CURY, 2010, p. 152)

74 A instauração do federalismo no Brasil, assim como toda experiência da Primeira República, foi singular e única, tendo primeiramente formada a União e depois as unidades federativas. Esse tipo de formação foi construído assim pois, inexistia no país unidades territoriais autônomas, além disso, a noção de federalismo é diferente em relação a outros modelos, como dos Estados Unidos e do México. No Brasil está ligado à contraposição ao centralismo monárquico e da formação de unidades para a reivindicação de autonomia. Nos países citados esse processo foi diferente, primeiro ocorreu a formação de unidades territoriais autônomas e, após, a da União. Nesses países a noção do federalismo denota união para defesa comum, de unidades que se constituíra e depois entraram em consenso de se unir (ALCÂNTARA, 1993; ABRUCIO, 1998; VÁZQUEZ, 1993).

Merece mencionarse el hecho singular de que Brasil es el único país de tradición federal em que el término federación, aún hoy, se indentifica com descentraliazación, en lugar de significar, como ocorrió em Estados Unidos y en los demás países, la organización de la unión (ALCÂNTARA, 1993. P.308).

Na Constituição de 189110, a questão da organização dos estados no Brasil aparece como: “[...] Constituição e leis próprias [...]”, estas deveriam ser “[...] fiéis aos princípios constitucionais da União [...]”, visíveis no artigo 63; o artigo 64, por sua vez, reservou aos estados minas e terras devolutas em seus respectivos territórios (SILVEIRA, 1978, p. 62). Essa autonomia dos estados gerou polemicas e discussões, do ponto de vista econômico em todo o país (relativo a divisão da renda dos impostos), político (representação no Congresso) e jurídico (dualidade da magistratura), configurando à federação um poder soberano e aos estados um poder autônomo, mas subordinado (CURY, 2001).

A autonomia das províncias era de forma de, pela República, atingir-se a "comunhão da família brasileira", tão sacrificada pela centralização. Eram duas realidades idênticas, o republicanismo e o federalismo. Este só seria viável com a República, uma vez que a centralização era a Monarquia. Não havia, na crença republicana, como federalizar a Monarquia (CASALECCHI, 1987, p.42)

10 Texto da Constituição Federal de 1891 está disponível em:

http://www2.camara.leg.br/legin/fed/consti/1824-1899/constituicao-35081-24-fevereiro-1891-532699- publicacaooriginal-15017-pl.html

75 O federalismo no Brasil vem do interesse das províncias de se tornarem autônomas, principalmente as com maior poder econômico e político como São Paulo, Rio Grande do Sul e Pernambuco que se viam como vítimas de um poder central que muito tirava e pouco contribuía, assim ao longo do período imperial ocorreram no país movimentos separatistas que buscavam a autonomia e independência em relação à Coroa11. Além de movimentos separatistas haviam aqueles que defendiam a implantação do federalismo na constituição da República.

O ideário republicano ao privilegiar o federalismo contemplava esta liberdade, pois não era outra a pretendida pelos agricultores. Aliais a indumentária fortemente federalista vestida pelo PRP teve consequências em sua organização (...) Por isso, o ideário republicano só medraria se desse lugar seguro para o poder e as influências locais. Aceitando desde já que a "lavoura tem valor republicano", conforme propunha Silva Jardim, em 1889, e que o instinto conservador do proprietário não impede a sua manifestação na defesa de seus interesses violados, a vanguarda republicana amplia o seu proselitismo através da imprensa. (CASALECCHI, 1987, p.53)

Como resultado da transformação do sistema político brasileiro, ocorreu a adoção do federalismo dualista com a existência da União e dos Estados como entes federados. Segundo Barroso (1982), o problema da implementação do federalismo no Brasil se deu pelo fato dele não ser adaptado à realidade brasileira, sendo adotada a forma estadunidense que não correspondia com a situação do país. No Brasil o federalismo foi marcado pelas desigualdades regionais, onde os estados mais fortes comandavam. Salva exceções como São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, os demais Estados da federação estavam quase falidos, sem conseguir arrecadar o suficiente para construção de infraestrutura básica (LOVE 1982; LEVINE 1978; WIRTH 1982). O federalismo brasileiro beneficiou e fortaleceu, econômica e politicamente os Estados mais ricos do país, autônomos em relação ao governo central, que se organizavam quase como partidos políticos. Enquanto, que por outro lado, os demais Estados eram cada vez mais dependentes, principalmente em relação à economia (FREYRE, 1945).

Com a nova Constituição de 1891 trouxe a descentralização a estrutura política, estipulando normas que levaram os Estados a adquirirem novos papeis frente a política nacional.

11 Entre esses movimentos estão a Revolução Praieira de Pernambuco de 1848, a Revolução Farroupilha no Rio Grande do Sul em 1835, a Sabinada na Bahia em 1837, entre outros.

76 “era na questão da autonomia política que todas as províncias, sem exceção, se uniram em prol do projeto federalista, porque só neste aspecto poderia haver uma “equalização” dos benefícios a todas as unidades da federação. Autonomia política significava acabar com o controle que o Poder Central tinha sobre as eleições locais e, sobretudo, garantir a eletividade dos antigos presidentes de província, transformados em governadores de estado” (ABRUCIO, 1998, p.33).

Com o federalismo a carreira política dos senadores também mudou. Antes elas eram orientadas por uma lógica nacional e central, uma vez que para ser senador era preciso ser escolhido pelo Poder Moderador, com a mudança de regime, as condições para ser senador eram outras, era necessário que o indivíduo se sobressaísse nos estados. Ou seja, com o início da República era necessário passar pela prova das eleições para ser senador, cargo que passaria a ser decidido na esfera estadual. Desse modo os senadores podem indicar como o novo regime federativo e eletivo afeta o perfil dos eleitos.