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1. INTRODUÇÃO

1.4. CONSTRIÇÃO PREMATURA DO DUCTO ARTERIOSO NA VIDA

A constrição prematura do ducto arterioso é caracterizada pelo estreitamento vascular transitório que pode variar de intensidade, desde uma discreta redução de calibre ductal até seu completo fechamento. A resposta constritora do ducto arterioso depende da idade gestacional e habitualmente não ocorre antes de aproximadamente 27 semanas de gestação, apesar desse vaso já estar histologicamente maduro previamente 78. Essa anormalidade cardiovascular funcional, na ausência de conhecidos fatores desencadeantes, é considerada uma alteração infrequente, sendo incipiente a experiência com essa patologia, tanto no período gestacional, quanto no pós-natal.

A determinação ecocardiográfica das dimensões cardíacas fetais fornece uma importante referência quantitativa utilizada na avaliação do coração fetal. Em fetos normais ocorre um aumento gradual do diâmetro ductal a partir do segundo trimestre de gestação até o termo. Estudos morfométricos evidenciaram que o diâmetro do ducto arterioso é de aproximadamente 2.75 mm na 20a semana de gestação, 5 mm na 30 a semana e cerca de 6.5 mm próximo do termo. O diâmetro ductal é menor do que os vasos adjacentes e o menor diâmetro ductal encontra-se na sua porção medial. Em fetos próximos do termo, o comprimento do ducto arterioso é de aproximadamente 1cm 86.

A utilização da ecocardiografia fetal para a detecção intra-uterina de anormalidades funcionais e estruturais do coração fetal permitiu a identificação e o planejamento antecipado do manejo a ser adotado no período neonatal imediato. O ecocardiograma com Doppler de fluxo em cores constitui o mais sensível recurso não- invasivo para a visibilização do fluxo sanguíneo e sua dinâmica dentro das câmaras

cardíacas e vasos. A aferição do fluxo e do gradiente de pressão pelo ducto arterioso através da técnica Doppler ecocardiográfica permitiu a identificação e a monitorização dos fetos com risco de desenvolvimento de constrição prematura do ducto arterioso e a realização de intervenção precoce, quando necessária 34, 87, 88. Os critérios diagnósticos utilizados para definir constrição ductal são baseados na avaliação do fluxo ao Doppler, não sendo utilizada a medida do diâmetro ductal como parâmetro de escolha.

No segundo e no terceiro trimestre de gestação, fetos normais apresentam aumento linear das velocidades de fluxo ductal com o aumento da idade gestacional 34, mas a relação entre as velocidades sistólica e diastólica é constante 89. O aumento da velocidade de fluxo ductal é resultante de inúmeras variáveis, incluindo o diâmetro ductal, a complacência da parede do vaso, os fluxos sistólico e diastólico ductais e a função ventricular direita. Não houve correlação, entretanto, com a frequência cardíaca fetal. Por conseguinte, as velocidades de fluxo do ducto arterioso fetal devem ser relacionadas com a idade gestacional para uma adequada avaliação 90.

Em estudos experimentais, foi demonstrado que a constrição mecânica do ducto arterioso gerou aumento da velocidade sistólica, diastólica e da pressão arterial média pulmonar, enquanto a pressão da aorta descendente permaneceu inalterada. O gradiente transductal aferido pelo Doppler pulsado ao ecocardiograma foi similar ao gradiente sistólico de pressão pico a pico hemodinâmico durante a constrição ductal. Essa excelente correlação reforça a possibilidade de detecção ecocardiográfica de alterações na dinâmica do ducto arterioso. O ducto arterioso fetal apresenta velocidade de fluxo sistólico maior do que qualquer outro vaso do sistema cardiovascular. A velocidade normal do fluxo sistólico ductal varia de 0.5 a 1.4 m/s,

com média de 0.8 m/s e a velocidade diastólica entre 0.06 a 0.3 m/s 34 podendo ser identificada após a 13a - 16 a semana gestacional 24 (Figura 3).

Figura 3: Doppler pulsado do fluxo ductal fetal com parâmetros dentro do limite da normalidade. Observa-se velocidade sistólica de 1.28 m/s e velocidade diastólica de 0.25 m/s.

O índice de pulsatilidade é uma medida de variabilidade da velocidade do sangue em um vaso, igual à diferença entre o pico sistólico e velocidade diastólica mínima dividida pela velocidade média durante um ciclo cardíaco. O aumento do índice de pulsatilidade sugere aumento de resistência vascular e é utilizado para monitorizar a impedância ao fluxo em vasos periféricos. Os valores normais do índice de pulsatilidade ductal encontram-se entre 2.2 e 3; quando maior do que 3 sugere

aumento do débito ventricular direito e quando menor ou igual do que 2.2, considera- se constrição ductal. O uso do índice de pulsatilidade na avaliação do fluxo ductal é útil por ser independente da angulação do ultra-som 34, 87, 91, 92.

Estudos Doppler ecocardiográficos sugerem um aumento do débito cardíaco e do volume de fluxo sanguíneo associado à redução da pós-carga à medida que evolui a gestação, podendo esses achados serem resultantes da diminuição gradativa da resistência vascular placentária ou do aumento do fluxo vascular pulmonar 90. O índice de pulsatilidade também é útil no diagnóstico diferencial nos casos em que há aumento do fluxo ductal sem constrição concomitante 87. Essa situação também pode ocorrer após o uso de simpaticomiméticos para o tratamento do trabalho de parto prematuro, gerando aumento da velocidade sistólica no ducto arterioso resultante de um aumento do débito ventricular. O aumento do débito ventricular direito gera aumento do volume de sangue bombeado da artéria pulmonar para a aorta descendente, com consequente aumento da velocidade máxima de fluxo ductal. Se apenas a velocidade de fluxo máxima ductal é aferida, a avaliação pode ser mal interpretada como constrição ductal fetal. A forma da onda de fluxo ao Doppler, entretanto, é diferente daquela observada nos casos de estreitamento do ducto. Na constrição ductal, as velocidades de fluxo através do ducto diminuem gradativamente do pico sistólico até o final da diástole, entretanto o fluxo aumentado através de um ducto amplamente patente demonstra um rápido descenso após o pico de velocidade sistólica e torna a aumentar durante a diástole. Essa diferença pode ser evidenciada com a aferição da velocidade média de fluxo, ou seja, o cálculo do índice de pulsatilidade permite fazer um diagnóstico adequado, pois considera a medida de velocidade média de fluxo transductal como uma de suas variáveis 93, 94.

Os fetos com constrição ductal apresentam velocidades de fluxo maiores e um índice de pulsatilidade significativamente menor do que os fetos normais, entretanto o aumento do débito ventricular direito que cursa com aumento da velocidade máxima e com velocidade média de fluxo normal resulta em aumento do índice de pulsatilidade. O índice de pulsatilidade não se altera com a idade gestacional e deve ser usado, conforme descrito anteriormente, para firmar o diagnóstico de constrição ductal 87.

Alguns autores sugerem que o aparecimento de insuficiência tricúspide possa ser utilizado como fator preditor de constrição ductal. Pode ser mais facilmente identificada tecnicamente e ser detectada de forma mais precoce do que a constrição ductal. A insuficiência tricúspide em fetos com anatomia cardíaca normal é um achado freqüente durante o exame de rastreamento ecocardiográfico e pode indicar alterações fisiológicas características, como o aumento da pré-carga ou pós-carga, insuficiência miocárdica ou arritmia. A associação com alteração na dinâmica ductal pode refletir um aumento marcado na resistência ao fluxo ventricular direito e provável isquemia do músculo papilar subvalvar tricuspídeo 95, 96. Especula-se que os músculos papilares da válvula tricúspide sejam particularmente sensíveis à isquemia, e que a isquemia subendocárdica leve possa resultar em disfunção valvar 97, 98. A progressão da constrição ductal pode resultar no aparecimento de regurgitação tricúspide holossistólica com velocidade de até 2 m/s 99. É necessário excluir dentre os diagnósticos diferencias da insuficiência tricúspide, afastada a presença de cardiopatia congênita, o diabetes materno, anormalidades extra-cardíacas, infecções, arritmia cardíaca fetal, hidropisia não-imune, aneurisma do “septum primum”, alteração da complacência ventricular secundária à hipertrofia e o retardo do crescimento intra- uterino 100.

A constrição ductal fetal tem uma apresentação ao Doppler similar aos achados do pós-natal da coarctação da aorta. O diagnóstico diferencial da constrição ductal fetal com a coarctação da aorta é considerado difícil, já que ambos cursam com alteração das câmaras direitas, devendo ser visibilizados e avaliados os arcos ductal e aórtico. Pode-se confirmar ao diagnóstico de constrição ductal tendo como base os critérios estabelecidos e passíveis de aferição previamente descritos, enquanto que na coarctação aórtica não se observa alteração no fluxo ductal 34.

Nos pacientes que apresentam oclusão total do ducto arterioso, considera-se diagnóstica a ausência de fluxo transductal. A ecocardiografia com Doppler em cores mostra-se um método sensível para a avaliação desse diagnóstico e permite detectar o restabelecimento do fluxo no vaso após interrupção do estímulo mecânico, permitindo uma análise fidedigna do fluxo no ducto arterioso 34.

A constrição ductal leve cursa com acentuada alteração da onda de fluxo do ducto arterioso com aumento da pressão na artéria pulmonar de aproximadamente 15mmHg e ausência de regurgitação tricúspide. O aumento em 50% da pressão na artéria pulmonar em relação à pressão inicial e a aferição de um índice de pulsatilidade menor do que 1 na vigência de alterações no desempenho ventricular direito caracterizam constrição ductal grave 96. Entre esses extremos do espectro da constrição ductal, podem ser observados diferentes graus de repercussão.

O tratamento fundamental da constrição ductal, além da óbvia suspensão das substâncias potencialmente responsáveis pela sua instalação, é a interrupção da gestação quando indicado. No período neonatal imediato, o fechamento fisiológico do ducto, associado às modificações hemodinâmicas próprias dessa fase, permitem que sejam normalizadas as alterações cardio-circulatórias secundárias ao aumento da pós- carga ventricular direita. Entretanto, como já referido, o aumento prolongado da

pressão ventricular direita pode, ao ser transferido aos pulmões, causar uma vasoconstrição arteriolar pulmonar reativa, especialmente em neonatos predispostos, com a instalação de um quadro de hipertensão arterial pulmonar, que irá exigir tratamento intensivo 101, 102.

Na prática clínica, evidenciada a constrição ductal associada ao uso de substâncias inibidoras da prostaglandina, deve-se orientar a suspensão das mesmas. A imediata interrupção do uso dessas substâncias pode reduzir as velocidades sistólica e diastólica ductais e aumentar o índice de pulsatilidade, com possibilidade de normalização das alterações hemodinâmicas.

Os casos leves podem ser tratados somente com a diminuição da dose da substância causadora da constrição, mas está indicado em todos esses fetos o acompanhamento ecocardiográfico seriado 103, 104. Deve-se avaliar e monitorizar cada um dos fetos em caso de gestações múltiplas, tendo em vista que somente um concepto pode estar comprometido 105-107. Nos casos graves, pode haver necessidade de interrupção da gestação.

A evolução clínica, após o nascimento, depende da severidade da insuficiência cardíaca direita intra-uterina e da resposta à elevação da resistência vascular pulmonar

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. O diagnóstico precoce possibilita a imediata intervenção terapêutica, com melhora do prognóstico.

1.5. O PAPEL DOS ANTI-INFLAMATÓRIOS NA GÊNESE DA

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