• Nenhum resultado encontrado

artigo 26.º da Lei da Droga foi ponderada, tendo apenas sido aplicada numa (Caso 2).

IV. Hiperligações e Referências bibliográficas 1 Hiperligações

1. Enquadramento Jurídico Evolução legislativa

1.4. Consumidor-traficante e traficante-consumidor

Face ao que antecede, cumpre integrar as figuras do consumidor-traficante e, por seu turno do traficante-consumidor, no quadro legal vigente.

De forma breve e sintética cumpre referir que “o consumidor ocasional é aquele que de forma acidental, episódica, imprevista, fortuita, consome drogas; O consumidor ocasional é fundamentalmente, aquele que cede às circunstâncias, como é o caso, daqueles que consomem em festas, nas quais há um ambiente favorável ao consumo. Todavia, se todas as semanas for a uma festa e consumir, ainda que esse não fosse o seu objectivo prioritário, já não será um consumidor ocasional, porque faltará a característica da acidentalidade, mas sim será um consumidor habitual que “procura” o consumo. Em qualquer caso, um consumidor ocasional ou um consumidor habitual, não pode ser um dependente, porque esse será já um consumidor toxicodependente, isto é, alguém em quem já está instalada a dependência física e psicológica, constituindo a droga o centro dos seus interesses”.36

Analisados os diversos normativos legais considera-se que o consumidor-traficante será aquele que para além de consumir substâncias ou produtos estupefacientes age com “a vontade de desenvolver sem autorização e sem ser para consumo pessoal, as actividades descritas no tipo e a representação e o conhecimento por parte do agente da natureza as características estupefacientes do produto objecto da acção e uma actuação deliberada, livre e consciente de ser proibida a conduta”.37

A sua conduta será punível, nos termos do disposto no artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro. No entanto, caso a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações a conduta do agente será punível nos termos do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro. No Acórdão do STJ, proferido no âmbito do Processo n.º 3156/02, de 27-06-2002, disponível

em www.dgsi.pt pode ler-se, no sumário que “Importa analisar a forma como a jurisprudência

tem interpretado os crimes mais frequentes, ou seja, os dos artigos 21.º, 25.º e 26.º. Embora timidamente enunciado, teve o legislador o propósito de não «meter no mesmo saco» todos

36 LOBO, Fernando Gama, Droga – Legislação, Notas Doutrina e Jurisprudência, 2.ª Edição, Lisboa, Quid Juris, 2010, p. 148.

37 LOBO, Fernando Gama, Droga – Legislação, Notas Doutrina e Jurisprudência, 2.ª Edição, Lisboa, Quid Juris, 2010, p. 51.

PUNIBILIDADE DO CONSUMIDOR-TRAFICANTE E DO TRAFICANTE-CONSUMIDOR DE ESTUPEFACIENTES

5. Enquadramento jurídico, prática e gestão processual

os traficantes, distinguindo entre os casos «graves» (artigo 21.º), os muito graves (artigo 24.º), os pouco graves (artigo 25.º) e os de gravidade reduzida (artigo 26.º), redução essa motivada no fundo pela condição de toxicodependente do agente. Pois bem: a jurisprudência esvaziou quase completamente os artigos 25.º e 26.º, remetendo para o artigo 21.º a generalidade das situações. Para tanto, faz uma interpretação «contra legem» do artigo 25.º. Com efeito, estabelece este artigo que se aplica às situações em que «a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade» das drogas. A interpretação que parece mais consentânea com o texto (e com a epígrafe do artigo) é a de que o legislador quis incluir aqui todos os casos de menor gravidade, indicando exemplificativamente circunstâncias que poderão constituir essa situação. Assim, será correcto considerar-se preenchido este crime sempre que se constate a verificação de uma ou mais circunstâncias que diminuam consideravelmente a ilicitude, como poderá ser, por exemplo, uma quantidade reduzida de droga, ou esta ser uma «droga leve», ou quando a difusão é restrita, etc. O crime do artigo 25.º é para o pequeno tráfico, para o pequeno «retalhista» de rua» (Eduardo Maia Costa, Direito penal da droga, RMP 74-103, pp. 114 e seguintes)”.

Por seu turno, traficante-consumidor será aquele que “quando, pela prática de algum dos factos referidos no artigo 21.º, tiver por finalidade exclusiva conseguir plantas, substâncias ou preparações para uso pessoal, sendo a sua conduta punível nos termos do disposto no artigo 26.º.

Como acima referido, a Jurisprudência, de forma unânime, considera que “o crime do artigo 26.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, que se refere ao tipo do traficante consumidor, exige que o agente, ao praticar qualquer dos factos referidos no artigo 21.º, tenha por finalidade exclusiva conseguir plantas, substâncias ou preparações para uso pessoal (…)”, assim “resulta ser elemento ou requisito essencial do crime de traficante-consumidor que o agente, ao praticar qualquer dos factos referidos no artigo 21.º, tenha por finalidade exclusiva conseguir plantas, substâncias ou preparações para uso pessoal, pelo que, sempre que não venha provado que o agente tenha por finalidade exclusiva conseguir plantas, substâncias ou preparações para uso pessoal afastada fica imediatamente a incriminação pelo crime previsto e punido pelo artigo 26.º”.38

A relação entre o crime de tráfico de estupefacientes (por norma o de menor gravidade, previsto no artigo 25.º) e o crime de consumo (previsto no artigo 40.º) é discutida na Jurisprudência.

Se se considerar que o bem jurídico protegido no primeiro caso é a saúde pública em geral e no segundo caso a saúde privada do consumidor em especial, não existirão obstáculos a um concurso real, efectivo, da prática de um crime de tráfico e da prática de um crime de consumo (neste sentido vide Ac. ST, de 26.04.89 in BJM, 328-253).39

38 Ac. TRC, Processo n.º 64/14.0PEVIS.C1, de 09.01.2017, disponível em www.dgsi.pt.

39 LOBO, Fernando Gama, Droga – Legislação, Notas Doutrina e Jurisprudência, 2.ª Edição, Lisboa, Quid Juris, 2010, p. 55.

PUNIBILIDADE DO CONSUMIDOR-TRAFICANTE E DO TRAFICANTE-CONSUMIDOR DE ESTUPEFACIENTES

5. Enquadramento jurídico, prática e gestão processual

Em sentido contrário, pronunciou-se o Ac. do TRE, Processo n.º 653/14.2TDLSB.E1, Relator João Gomes de Sousa, de 15.12.2015, disponível em www.dgsi.pt, afirmando que “Existe concurso legal, aparente ou impuro de crimes entre o crime de tráfico de estupefacientes do artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro e o crime de consumo, do artigo 40.º, n.ºs 1 e 2, do mesmo diploma”.40

Refere o Douto Acórdão que “A simples condenação demonstra que o tribunal recorrido considerou a existência de um concurso real de crimes. Esse não é o nosso entendimento. Trata-se, a nosso ver, de um caso claro de concurso legal, aparente ou impuro, pois que o comportamento do arguido integra várias previsões legais, mas só uma é aplicável ao facto já que aí esgota a ilicitude da conduta e se consome a protecção pretendida, aqui, pelo artigo 21.º do diploma. Isto é, trata-se de um caso de consumpção pura pois que a norma que prevê e pune o crime mais grave (artigo 21.º) consome a que prevê e pune o menos grave (artigo 40.º), por aquela dar maior protecção ao bem jurídico”.

No que concerne ao traficante-consumidor e a sua relação com o crime de consumo, poderá considerar-se que se está perante um concurso aparente, uma vez que o crime de tráfico para o consumo, consome o de puro consumo, uma vez que aquela actividade mais grave contém esta.41

Em jeito de conclusão dir-se-á que, “continuando a lei a não estabelecer qualquer fronteira quantitativa para distinguir o consumo do tráfico, sendo cada caso um caso, quando o agente detiver uma quantidade de droga superior ao necessário para o seu consumo durante dez dias, deverá apurar-se o concreto circunstancialismo que rodeia tal facto em ordem à percepção, se a destina realmente ao seu consumo (artigo 40.º) ou ao tráfico (artigos 21.º, 25.º e 26.º), permitindo-se, assim, a contra prova do perigo (abstracto) típico, respeitando-se o princípio da culpa”.42

O inquérito crime afigura-se fundamental para se decidir se a ocorrência se encontra na esfera criminal (se o crime é o de consumo ou o de tráfico - tipo base, privilegiado ou agravado) ou na esfera contra-ordenacional.

40 No mesmo sentido, vide CARDOSO, Rui, “Crime de Consumo de Estupefacientes – Novas e Velhas Respostas para Velhos e Novos Problemas”, Revista do CEJ, II, 2018, pp. 143-187.

41 LOBO, Fernando Gama, Droga – Legislação, Notas Doutrina e Jurisprudência, 2.ª Edição, Lisboa, Quid Juris, 2010, p. 94.

42 LOBO, Fernando Gama, Droga – Legislação, Notas Doutrina e Jurisprudência, 2.ª Edição, Lisboa, Quid Juris, 2010, p. 147.

PUNIBILIDADE DO CONSUMIDOR-TRAFICANTE E DO TRAFICANTE-CONSUMIDOR DE ESTUPEFACIENTES

5. Enquadramento jurídico, prática e gestão processual

2. Prática e Gestão Processual